Aposentadoria tributada

Incidência do IR sobre aposentadoria deve observar lei da época

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18 de julho de 2006, 13h23

O Imposto de Renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste do benefício determinado pela Justiça não for maior que o limite legal fixado para isenção. A decisão é da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Os ministros rejeitaram recurso do INSS contra aposentados da Rede Ferroviária Federal.

A Turma entendeu que a incidência do IR deve observar a legislação, as alíquotas e faixas de isenção previstas à época da concessão do benefício. O Recurso Especial do INSS ao STJ foi admitido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Na mesma ocasião, o Recurso Extraordinário para a apreciação do Supremo também foi admitido. Por isso, os autos foram encaminhados ao STF.

O relator no STJ, ministro Luiz Fux, esclareceu que o IR não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste determinado na sentença condenatória não ultrapassar o limite para isenção do imposto. “Ora, se os proventos, mesmos revistos, não seriam tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública.”

O ministro destacou que a questão discutida trata do cabimento da incidência do IR sobre proventos de aposentadoria recebidos incorretamente. Para ele, quando há erro da administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob a possibilidade de penalizar-se o contribuinte por ato do Fisco, violando os princípios da legalidade e da isonomia.

Nesse caso, segundo o relator, a revisão judicial tem natureza de indenização devido ao fato de que o aposentado deixou de receber mês a mês.

Leia a decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 617.081 — PR (2003⁄0225957-4)

RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL — INSS

PROCURADOR: FABIO MAGRINELLI COIMBRA E OUTROS

RECORRIDO: ANTONIO GONÇALVES DE OLIVEIRA E OUTROS

ADVOGADO: JACKSON SPONHOLZ

EMENTA

TRIBUTÁRIO. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS ATRASADAS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE. VALOR MENSAL DO BENEFÍCIO ISENTO DE IMPOSTO DE RENDA. NÃO-INCIDÊNCIA DA EXAÇÃO.

1. O pagamento decorrente de ato ilegal da Administração não constitui fato gerador de tributo.

2. O imposto de renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste do benefício determinado na sentença condenatória não resultar em valor mensal maior que o limite legal fixado para isenção do referido imposto.

3. A hipótese in foco versa o cabimento da incidência do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria recebidos incorretamente, por isso que, à luz da tipicidade estrita, inerente ao direito tributário, impõe-se a manutenção do acórdão recorrido.

4. O Direito Tributário admite na aplicação da lei tributária o instituto da eqüidade, que é a justiça no caso concreto. Ora, se os proventos, mesmos revistos, não seriam tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública. Ocorrendo o equívoco da Administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob pena de sancionar-se o contribuinte por ato do Fisco, violando os princípios da Legalidade e da Isonomia, mercê de chancelar o enriquecimento sem causa da Administração.

5. O aposentado não pode ser apenado pela desídia da autarquia, que negligenciou-se em aplicar os índices legais de reajuste do benefício. Nessas hipóteses, a revisão judicial tem natureza de indenização, pelo que o aposentado deixou de receber mês a mês.

6. Recurso especial desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki (voto-vista), Denise Arruda, José Delgado e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 20 de abril de 2006 (Data do Julgamento)

MINISTRO LUIZ FUX

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 617.081 — PR (2003⁄0225957-4)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX(Relator): Trata-se de recurso especial interposto pelo INSS com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional contra acórdão que restou assim ementado (fl. 170):

—” EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA POR ARBITRAMENTO. NECESSIDADE. RENDIMENTOS DECORRENTES DE DECISÃO JUDICIAL. DESCONTO DO IMPOSTO DE RENDA.

A execução foi extinta por inexistirem os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (art. 267, IV do CPC), uma vez que não se fundou em título líquido. Tal matéria, diga-se, pode ser conhecida de ofício pelo Juiz, consoante o § 3º do art. 267 do CPC, não havendo que se falar em sentença ultra petita.


Tendo em vista que os valores devidos até janeiro de 1990 foram apurados em liquidação por arbitramento, os valores devidos após janeiro de 1990 devem seguir a mesma forma de liquidação, pois os mesmos critérios devem ser observados para a apuração de todos os valores.

A ausência de impugnação do cálculo pela União não importa no seu reconhecimento, pois o mesmo é destituído de executividade, por lhe faltar o requisito da liquidez.

Os valores devidos a título de Imposto de Renda retido na fonte devem ser descontados apenas quando do efetivo pagamento dos valores. Tais descontos não representam violação à coisa julgada, pois, embora o título executivo não tenha determinado expressamente, esta dedução é imperativa, decorrendo de lei tributária vigente na época em que os pagamentos deveriam ter ocorrido e não o foram.

O imposto de renda não deve incidir sobre o valor total devido, mas sobre cada uma das parcelas devidas e não pagas na época própria, devendo ser observada a legislação vigente no mesmo período para fins de determinação de alíquotas e faixas de isenção. Em relação aos juros, pelo fato de que se constituem em parcela única e autônoma, o desconto deve ser efetuado sobre o montante total devido. É nesse sentido que deve ser interpretado o art. 46 da Lei nº 8.541⁄92, sob pena de afronta ao princípio constitucional da isonomia.

Não subsiste a isenção tributária aos autores por contarem com mais de 65 anos de idade, pois a EC nº 20⁄98 revogou expressamente o art. 153, § 2º, II, da CF⁄88 que conferia tal isenção, o qual carecia de autoaplicabilidade.

A revogação da Resolução nº 01 de 09⁄02⁄00 do TRF⁄4 não significou qualquer isenção, uma vez que a Lei nº 8.541⁄92 continuou a prever que os rendimentos recebidos por força de decisão judicial constituem fato gerador do imposto de renda.” (Destaque nosso)

Noticiam os autos, que o INSS opôs embargos à execução movida pelos autores, ora recorridos, na qualidade de aposentados da RFFSA, sustentando a ocorrência de excesso de execução de sentença que determinou a obrigação de pagar complementações de aposentadoria.

A sentença dos embargos à execução julgou parcialmente procedente o pedido de excesso de execução em relação ao período posterior a janeiro de 1990, diante da falta de título líquido, certo e exigível, determinando, ainda, a necessidade de liquidação por artigos, fixando o valor da execução em R$ 1.853.288,92 (um milhão, oitocentos e cinqüenta e três mil, duzentos e oitenta e oito reais e noventa e dois centavos), com posição em junho de 1998; determinou a dedução e o efetivo recolhimento do Imposto de Renda, deixando de arbitrar honorários de advogado, nos termos do artigo 21 do CPC, porquanto entendeu caracterizada a sucumbência recíproca.

Irresignados, apelaram os embargantes, sustentando, preliminarmente, violação do artigo 460 do CPC, porquanto a sentença tratou de questões estranhas àquelas suscitadas pelo INSS, requerendo fosse reduzida a prestação jurisdicional aos limites do pedido. No mérito, sustentaram ser ilegal a limitação dos valores a janeiro de 1990, haja vista que, quando deferida a realização de perícia, ainda não vigia a nova sistemática de liquidação da Lei nº 8.898⁄94. Sustentaram, também, que os cálculos apresentados nos moldes do artigo 604 do CPC não foram impugnados pelo réu. Asseveraram ter havido violação da coisa julgada, uma vez que o título executivo não determinou qualquer desconto fiscal ou previdenciário nos valores devidos, acrescentando, nesse sentido, que o desconto do Imposto de Renda mostrou-se inconstitucional, pelo fato de que o crédito dos apelados, ora recorridos, referem-se a períodos anteriores a 1983, não se lhes aplicando o disposto na Lei 8.541⁄92.

O acórdão recorrido deu parcial provimento ao apelo dos autores, para esclarecer que os rendimentos a que se refere a Lei nº 8541⁄92, artigo 46, devem ser considerados não em sua totalidade, mas tendo-se em conta a parcela relativa a cada período devido, salvo no tocante aos juros, os quais deveriam ser considerados em sua totalidade, para efeito de incidência do imposto de renda. O acórdão manteve a sucumbência recíproca nos termos em que reconhecida na sentença.

Merece destaque o trecho do acórdão recorrido que decidiu acerca do imposto de renda incidente sobre os rendimentos obtidos por força da decisão judicial (fl. 165), verbis:

-“Os valores devidos a título de Imposto de Renda retido na fonte e Previdência Social devem ser considerados apenas quando do efetivo pagamento dos valores, ou seja, após a expedição do precatório requisitório. Por isso, embora devidos, é desnecessário que tais valores sejam incluídos no cálculo exeqüendo, pois sua dedução apenas realizar-se-á no momento oportuno.


Tais descontos, frise-se, não representam violação à coisa julgada, pois, embora o título executivo não tenha determinado expressamente, esta dedução é imperativa, decorrendo de lei tributária vigente na época em que os pagamentos deveriam ter ocorrido e não o foram.

Nesse sentido:

EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÁLCULO DE LIQUIDAÇÃO. DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS. RETENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA. I. Corretos os cálculos de liquidação e a determinação do desconto previdenciário, mesmo que não prevista na decisão exeqüenda, porque decorre diretamente da lei. 2. A retenção do imposto de renda só se fará quando do efetivo pagamento. 3. Remessa oficial improvida. (TRF⁄4ªRegião – QUARTA TURMA – DECISÃO: 20⁄05⁄1997 – unânime PROC: REO NUM: 0463533-6 ANO: 96 UF:RS – DJ DATA: 04⁄06⁄1997 PG: 40768 – Relator: JUIZ JOSÉ LUIZ B. GERMANO DA SILVA)

Assim, os descontos são devidos nos termos da legislação vigente na época em que os valores deveriam ter sido pagos e não foram em face da conduta ilegal dos réus, devendo ser observada a legislação vigente no mesmo período. Desta forma, em relação ao montante devido, não se pode somar o valor total e dele descontar o imposto de renda com base na alíquota vigente na época do pagamento do precatório. O desconto há que ser feito observando-se as alíquotas e faixas de isenções vigentes na época em que os pagamentos deveriam ter sido feitos. Em relação aos juros, pelo fato de que se constituem em parcela única e autônoma, o desconto deve ser efetuado sobre o montante total devido, aplicando-se ao caso o disposto na Lei nº 8.541⁄92.

(…)

É nesse sentido que deve ser interpretado o art. 46 do Lei nº 8541⁄92, sob pena de afronta ao princípio constitucional da isonomia.

(…)

Não é o caso de incidência retroativa de lei tributária, uma vez que o fato gerador do imposto de renda, como visto, se perfectibiliza quando os valores estiverem disponíveis, ou seja, quando ocorrer o efetivo pagamento através de precatório requisitório. Atendidos, portanto, os princípios da legalidade e irretroatividade da lei tributária.

(…)

No que tange à violação ao § 1º do art. 46 da Lei 8.745⁄92, não assiste razão aos apelantes, pois seus incisos não se aplicam, propriamente, ao caso dos autos, como se extrai do dispositivo legal em comento:

‘Art. 460 — O Imposto sobre a Renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rendimento se torne disponível para o benefíciário.

§ 1º Fica dispensada a soma dos rendimentos pagos no mês, para aplicação da alíquota correspondente, nos casos de:

I – juros e indenização por lucros cessantes;

II – honorários advocatícios;

III – remuneração pela prestação de serviços de engenheiro, médico, contador, leiloeiro, perito, assistente técnico, avaliador, testamenteiro e liquidante.’

(…)

Isto posto, dou parcial provimento à apelação dos autores para esclarecer que os rendimentos a que se refere a Lei nº 8.541⁄92, art. 46, devem ser considerados não em sua totalidade, mas tendo-se em conta parcela relativa a cada período devido, salvo no tocante aos juros, os quais devem ser considerados em sua totalidade, para efeito de incidência do imposto de renda, observados os termos da fundamentação. Mantenho a sucumbência recíproca nos termos em que reconhecida na sentença.

É o voto.”

O INSS opôs embargos de declaração, pelos quais sustentou a ocorrência de contradição, porquanto o acórdão teria afirmado que o fato gerador do imposto de renda não se perfectibiliza quando os valores estiverem disponíveis aos autores, afirmando, por outro lado, que os descontos são devidos nos termos da legislação vigente na época em que os valores deveriam ter sido pagos e não foram. Sustentou, também, omissão no acórdão, porquanto não teria demonstrado os motivos pelos quais ocorrera afronta ao princípio da isonomia, na hipótese de se aplicar o artigo 46 da Lei nº 8.541⁄92.

O acórdão rejeitou os embargos de declaração (fls. 181⁄183).

Em suas razões de recurso especial, sustenta o INSS, que o acórdão recorrido negou vigência aos artigos 46 da Lei 8541⁄92, 43 e 105 do CTN, 2º da Lei de Introdução ao Código Civil, 12 da Lei 7713⁄88, ao determinar a ultra-atividade da lei tributária a fatos geradores ocorridos após sua revogação. O INSS entende que a data do fato gerador do imposto de renda, in casu, corresponde ao da efetiva disponibilidade da verba trabalhista, e, não, àquela correspondente ao reconhecimento do direito à verba. Sustenta, alternativamente, que o acórdão recorrido violou o artigo 535 do CPC, porquanto manteve-se omisso e contraditório em relação aos dispositivos supra indicados.


O prazo para a apresentação das contra-razões decorreu in albis, conforme registro constante à fl. 217 dos autos.

O recurso especial foi admitido pelo Tribunal a quo, razão pela qual subiram os autos ao E. STJ.

Recurso extraordinário interposto na origem, também admitido, o qual aguarda julgamento do presente recurso, para remessa ao Colendo Supremo Tribunal Federal.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 617.081 – PR (2003⁄0225957-4)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS ATRASADAS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE. VALOR MENSAL DO BENEFÍCIO ISENTO DE IMPOSTO DE RENDA. NÃO-INCIDÊNCIA DA EXAÇÃO.

1. O pagamento decorrente de ato ilegal da Administração não constitui fato gerador de tributo

2. O imposto de renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste do benefício determinado na sentença condenatória não resultar em valor mensal maior que o limite legal fixado para isenção do referido imposto.

3. A hipótese in foco versa o cabimento da incidência do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria recebidos incorretamente, por isso que, à luz da tipicidade estrita, inerente ao direito tributário, impõe-se a manutenção do acórdão recorrido.

4.O Direito Tributário admite na aplicação da lei tributária o instituto da eqüidade, que é a justiça no caso concreto. Ora, se os proventos, mesmos revistos, não seriam tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública. Ocorrendo o equívoco da Administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob pena de sancionar-se o contribuinte por ato do Fisco, violando os princípios da Legalidade e da Isonomia, mercê de chancelar o enriquecimento sem causa da Administração.

5.O aposentado não pode ser apenado pela desídia da autarquia, que negligenciou-se em aplicar os índices legais de reajuste do benefício. Nessas hipóteses, a revisão judicial tem natureza de indenização, pelo que o aposentado deixou de receber mês a mês.

6. Recurso especial desprovido.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX(Relator): Preliminarmente, assente-se que os dispositivos supostamente violados foram devidamente prequestionados, permitindo a ampla cognição do presente recurso.

Cumpre afastar, também, a violação do artigo 535 do CPC, porque não restou configurada, uma vez que o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu na hipótese dos autos.

Para corroborar a assertiva, recomenda-se a transcrição de passagem do voto condutor dos embargos de declaração (fls. 182 e 183):

-” Sustenta o embargante o ocorrência de contradição no acórdão, pois embora tenha afirmado que o fato gerador do imposto de renda se perfectibiliza quando os valores estiverem disponíveis aos autores, afirmou que os descontos são devidos nos termos da legislação vigente na época em que os valores deveriam ter sido pagos e não foram. Não se verifica a alegada contradição, mas apenas entendimento adotado pelo julgador em duas situações distintas.

A primeira situação diz respeito à possibilidade de incidir imposto de renda sobre os rendimentos obtidos por força de decisão judicial, nos termos do art. 46 da Lei nº 8745⁄92, ainda que os créditos dos autores se refiram a períodos anteriores à vigência da referida Lei. Exatamente quanto a essa circunstância e em resposta ao apelo dos autores que insurgiram-se contra tal possibilidade, é que o Relator consignou que não se trata de retroatividade de lei tributária, tendo em vista que o imposto incidirá no momento do efetivo pagamento.

A outra situação refere-se à legislação a ser aplicada para proceder aos descontos do imposto. Conforme exarado no acórdão, o imposto de renda não deve incidir sobre o valor total devido, mas sobre cada uma das parcelas devidas e não pagas na época própria, observando-se as alíquotas e faixas de isenções vigentes naquela época, pois os autores não podem ser prejudicados em face da conduta ilegal do réu, ora embargante, que não procedeu aos pagamentos no momento oportuno. O fato do embargante entender inaceitável o posicionamento adotado pelo relator do acórdão, não justifica a interposição dos embargos.

Da mesma forma, não procede a alegação de omissão na decisão, tendo em vista que através da simples leitura do voto condutor depreende-se o motivo por que haveria afronta ao princípio da isonomia caso se aplicasse o art. 46 da Lei nº 8541⁄92 em sua literalidade. Conforme referido anteriormente, os rendimentos pagos através de decisão judicial não podem ser considerados em sua totalidade, mas tendo-se em conta a parcela relativa a cada período, pois se assim não fosse, os autores teriam tratamento diverso em relação aos contribuintes que receberam rendimentos mensalmente na época devida.”


Rejeita-se, portanto, a preliminar de nulidade do acórdão dos embargos de declaração, porquanto não vislumbrada a violação do artigo 535 do CPC.

No mérito, insurge-se a recorrente contra a incidência de imposto de renda sobre diferenças atrasadas, pagas acumuladamente mediante precatório, mercê de ação revisional de benefício.

Assim dispõem os dispositivos que se alega malferidos:

Art. 43 do CTN: “O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”

Art. 12 da Lei 7.713⁄88: “No caso de rendimentos recebidos acumuladamente, o imposto incidirá, no mês do recebimento ou crédito, sobre o total dos rendimentos, diminuídos do valor das despesas com ação judicial necessárias ao seu recebimento, inclusive dos advogados, se tiverem sido pagas pelo contribuinte, sem indenização.”

Acrescente-se que, o que ensejou o pagamento das diferenças foram os reajustes praticados pela Autarquia Previdenciária de forma contrária ao que determinava a legislação vigente, não concorrendo os beneficiários para que o pagamento dos mesmos se operasse de uma só vez.

Trata-se, portanto, de ato ilegal praticado pela Administração, que omitiu-se em aplicar os índices legais de reajuste do benefício e que, por decisão judicial, foi instada a pagar acumuladamente de uma só vez, lançando sobre o quantum total, o imposto de renda. Isto resultou em que os aposentados fossem apenados pelo atraso da autarquia.

Faz-se conveniente a transcrição do artigo 46 da Lei n. 8.541⁄92:

“Art. 46. O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rendimento se torne disponível para o beneficiário.”

Todavia, ainda que este Sodalício tenha assentado o entendimento de que o referido dispositivo é auto-aplicável, merece prevalecer o entendimento segundo o qual, o pagamento decorrente de ato ilegal da Administração não pode constituir fato gerador de tributo, posto que inadmissível o Fisco aproveitar-se da própria torpeza em detrimento do segurado social.

Deveras, a hipótese in foco versa proventos de aposentadoria recebidos incorretamente e não rendimentos acumulados, por isso que, à luz da tipicidade estrita, inerente ao direito tributário.

O Direito Tributário admite na aplicação da lei o recurso à eqüidade, que é a justiça no caso concreto. Ora, se os proventos, mesmos revistos, não seriam tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública.

Ocorrendo o equívoco da Administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob pena de sancionar-se o contribuinte por ato do Fisco, violando os princípios da Legalidade e da Isonomia, mercê de chancelar o enriquecimento sem causa da Administração.

Quanto à aplicação “equânime” da norma tributária, leciona Hugo de Brito Machado, in Curso de Direito Tributário, 20ª ED, p. 44:

“O princípio da igualdade é a projeção, na área tributária, do princípio geral da isonomia jurídica, ou princípio pelo qual todos são iguais perante a lei. Apresenta-se aqui como garantia de tratamento uniforme, pela entidade tributante, de quantos se encontrem em condições iguais. (…)

O princípio da igualdade, numa visão formalista e dirigido apenas ao aplicador da lei, pode significar apenas o caráter hipótético da norma, a dizer que, realizada a hipótese normativa, a conseqüência deve ser igual, sem qualquer distinção decorrente de quem seja a pessoa envolvida.”

Por fim, cumpre afastar a violação do artigo 105 do CTN, que assim dispõe:

-” Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do art. 116.”

Em verdade, o acórdão ao assentar que: ” não é o caso de incidência retroativa de lei tributária, uma vez que o fato gerador do imposto de renda, como visto, se perfectibiliza quando os valores estiverem disponíveis, ou seja, quando ocorrer o efetivo pagamento através de precatório requisitório”, aplicou o mesmo entendimento jurisprudencial firmado pelo E. STJ, no sentido de que o imposto de renda não deve incidir sobre o valor total devido, mas sobre cada uma das parcelas devidas e não pagas na época própria. Sendo assim, não restou configurado fato gerador pendente.

Assim, o cálculo do desconto do imposto de renda deverá ser efetuado em observância das tabelas e alíquotas vigentes “nos meses a que se referirem”. Neste sentido, cita-se decisão da Primeira Turma, no Resp nº 492.247⁄RS, de minha relatoria, DJ de 03.11.2003, que firmou entendimento no sentido de que a incidência do imposto de renda sobre o total dos rendimentos recebidos no mês em razão de sentença judicial configuraria lesão aos princípios da legalidade e da isonomia. Consta do citado precedente a seguinte ementa:

“TRIBUTÁRIO. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS ATRASADAS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE. VALOR MENSAL DO BENEFÍCIO ISENTO DE IMPOSTO DE RENDA. NÃO-INCIDÊNCIA DA EXAÇÃO.

1. O pagamento decorrente de ato ilegal da Administração não constitui fato gerador de tributo.

2. O imposto de renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste do benefício determinado na sentença condenatória não resultar em valor mensal maior que o limite legal fixado para isenção do referido imposto.

3. A hipótese in foco versa proventos de aposentadoria recebidos incorretamente e não rendimentos acumulados, por isso que, à luz da tipicidade estrita, inerente ao direito tributário, impõe-se o acolhimento da pretensão autoral.

4. O Direito Tributário admite na aplicação da lei o recurso à eqüidade, que é a justiça no caso concreto. Ora, se os proventos, mesmos revistos, não são tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública. Ocorrendo o equívoco da Administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob pena de sancionar-se o contribuinte por ato do fisco, violando os princípios da Legalidade e da Isonomia, mercê de chancelar o enriquecimento sem causa da Administração.

5. O aposentado não pode ser apenado pela desídia da autarquia, que negligenciou-se em aplicar os índices legais de reajuste do benefício. Nessas hipóteses, a revisão judicial tem natureza de indenização pelo que o aposentado isento, deixou de receber mês a mês.

6. Recurso especial provido”.

Deveras, o imposto de renda não deve incidir sobre o valor total devido, mas sobre cada uma das parcelas devidas e não pagas na época própria, observando-se as alíquotas e faixas de isenções vigentes naquela época. Os recorridos não podem ser prejudicados em face da conduta ilegal do INSS relativa ao não pagamento no momento oportuno.

Destarte, forçoso concluir que, nos casos de valores recebidos, decorrentes da procedência de ação judicial de revisão de aposentadoria, a interpretação literal da legislação tributária implica afronta aos princípios constitucionais da isonomia e da capacidade contributiva, pois a renda que deve ser tributada deve ser aquela auferida mês a mês pelo contribuinte, sendo descabido ‘puni-lo’ com a retenção a título de IR sobre o valor dos benefícios percebidos de forma acumulada por mora da Autarquia Previdenciária.l

Pelo exposto, nego provimento ao recurso especial, para manter o acórdão recorrido pelos seus próprios fundamentos.

É como voto.

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