Produtividade do Supremo

Veja algumas importantes decisões do ministro Pertence

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12 de julho de 2006, 7h00

Todo final de semestre, a assessoria dos ministros do Supremo Tribunal Federal tem por hábito dar uma olhada no ranking de produtividade do tribunal. Em algumas ocasiões, a Consultor Jurídico já publicou o levantamento dos mais rápidos no gatilho. Esse tipo de pesquisa, gerada pelos computadores do Supremo, apresenta dois problemas.

Um é que há diferentes critérios de medição do rendimento de cada gabinete. Há quem considere processos que ainda pendem de recurso na Casa ou despachos interlocutórios como decisão de fato. Outros só consideram caso solucionado aquele processo que já foi baixado ou arquivado.

O segundo problema é que os próprios ministros do Supremo consideram ficção esses rankings, já que em um único processo, em que se constrói uma nova tese jurídica, pode-se investir mais tempo, energias e talento que em 500 outros cujo entendimento já está pacificado.

Para homenagear a qualidade sobre a quantidade, a ConJur passa a relatar algumas das mais importantes decisões, começando por algumas inovadoras formuladas pelo decano da Corte, o ministro Sepúlveda Pertence.

Produção 2006

Dos 5.642 atos do ministro Sepúlveda Pertence (contadas decisões interlocutórias e as que colocaram um ponto final no processo no STF), destaca-se o que determinou que os dados guardados no computador são documentos da mesma natureza dos documentos de papel guardados nos arquivos de aço ou armários de empresas.

Pelo voto de Pertence, que prevaleceu no julgamento da questão, os ministros do Supremo entenderam que dados armazenados na memória do computador não têm direito ao sigilo que a Constituição reserva à correspondência. O ministro relator sustentou que a Constituição protege a troca de dados, e não os dados em si. A inviolabilidade alcança a interferência de um terceiro na troca de informações.

O que estava em discussão era a apreensão do computador de um empresário acusado de crime tributário. Os ministros concluíram que o Mandado de Busca e Apreensão autorizava que o computador fosse recolhido e entenderam que os dados contidos deles não estão sob a proteção constitucional. Portando, podem ser usados como provas.

Foi do gabinete de Pertence que saiu também, este ano, a decisão de que as sociedades de profissões regulamentadas têm de pagar, ao menos por enquanto, a Cofins. O entendimento é o de que lei ordinária pode alterar lei complementar, quando esta tratar de matéria que a Constituição reservou a lei comum.

No caso, o ministro Pertence revogou acórdão do STJ por considerar que a Corte invadiu função do STF e derrubou indiretamente a súmula que sustentava a isenção da contribuição.

Ao julgar a discussão do teto salarial dos ministros do STF (e, portanto, do funcionalismo público) Pertence derrubou a tese de que o direito adquirido tenha força maior que o limite estabelecido pelo teto salarial. Mas manteve a tese da irredutibilidade salarial, liderando uma nova construção. Por maioria, os ministros asseguraram o recebimento do acréscimo de 20% sobre o salário de quatro ministros aposentados até que o montante seja absorvido pelo teto salarial.

Direito de defesa

O embasamento das decisões do ministro Sepúlveda Pertence costumam vir acompanhadas de amplos estudos do direito de defesa. Entre esses casos, destaca-se a discussão do conflito entre a antiga e a nova redação do Código de Processo Civil, no que toca à autenticação de cópias constantes dos autos — Agravo de Instrumento 466.032. O voto é de 2004, mas ilustra o trabalho.

Pelo mandamento anterior, as cópias deveriam ser autenticadas em cartório. Pelo novo texto, basta uma declaração de próprio punho do advogado para validar a cópia. Coube a Pertence uma construção nova da interpretação quando o advogado apenas assinou cada folha sem fazer, expressamente, a declaração pedida no CPC. O ministro entendeu que a declaração é dispensável, desde que esteja presente a assinatura.

Em caso de discordância ou suspeita de fraude, afirmou, cabe ao advogado da parte contrária notificar o juízo que se encarregará da verificação. Pode parecer pouco, mas basta imaginar a inutilidade de se repetir uma mesma declaração em centenas de páginas para se concluir que não é pouco.

O gabinete do ministro guarda outra decisão que nem volume nem a relevância aparente da causa definem a sua importância, também de 2004. Coube a Pertence trabalhar em cima de um caso referente a um valor tão baixo que sequer existe no sistema monetário brasileiro: R$ 0,009 (nove décimos de centavo).

O caso em questão foi a decisão de um juiz que declarou deserto um recurso pela falta de pagamento da taxa de depósito judicial em um recurso inominado. O valor, 10% de R$ 76,59, deveria ser de R$ 7,659. Como não existe milésimo de real, foi recolhido R$ 7,65. O juiz não aceitou o arredondamento e o desprezo de R$ 0,009. O De um lado, um banco, de outro, uma factoring. Invalidado o recurso, a causa pararia por ali.

Pertence, na mesma linha do amplo direito de defesa, desenvolveu longo raciocínio para concluir que o juiz não poderia ter declarado o recurso deserto por falta do devido preparo — já que nem o recorrente poderia pagar uma fração monetária inexistente, nem o banco poderia dar o troco pelo mesmo motivo. O recurso foi restaurado.

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