Parte legítima

Partido responde por calúnia cometida pelos militantes

Autor

7 de julho de 2006, 13h56

Se os militantes agem em nome da sigla e na defesa de seus interesses, o partido é parte legítima para figurar como réu em ação indenizatória. Não importa se a demanda é movida contra o diretório municipal, estadual ou federal, pois o partido é um só. O entendimento

unânime é da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que condenou o PT a indenizar em R$ 9 mil um homem caluniado por partidários. Cabe recurso.

O autor da ação alega que, nas vésperas das eleições de 2002, estava fazendo uma reforma na casa de uma colega de trabalho quando militantes políticos passaram a acusá-lo de estar comprando votos mediantes à entrega de saco de cimentos. Houve briga entre os envolvidos e o acionamento da Brigada Militar. A situação, segundo o autor, deixou sua filha muito assustada e ela teve que ser internada em um hospital por 10 dias.

Fundamentos

A primeira instância extinguiu a ação. O autor recorreu da sentença. O relator, desembargador Luiz Ary Vessini de Lima, explicou que o partido político não é responsável por atos praticados por meros simpatizantes que não tenham qualquer vínculo, mas responde pelos praticados na defesa de seus interesses e em seu nome.

Os envolvidos imputados como autores das ofensas relataram que muitos se encontravam no diretório municipal quando foram alertados sobre o suposto delito eleitoral.

O desembargador asseverou que a simples comunicação, de boa-fé de, um crime junto à autoridade competente não gera qualquer dever indenizatório. No entanto, a situação registrada é diferente. “Não se trata de mera cientificação da autoridade, mas sim de exercício arbitrário das próprias razões”, afirma.

Leia a íntegra da decisão:

responsabilidade civil. partido político. legitimidade passiva. ato praticado por militantes. calúnia. danos morais caracterizados.

Em tendo os militantes do réu agido em seu nome e na defesa de seus interesses, é o mesmo parte legítima para figurar no pólo passivo de demanda indenizatória. Desimporta, inclusive, se a demanda é movida contra o diretório municipal, estadual ou federal, pois o partido é um só.

No mérito, situação em que os partidários do réu, em véspera de eleição e na defesa dos interesses daquele, caluniaram o demandante, imputando-lhe a autoria de crime eleitoral de compra de votos. Em tais condições, o dano moral está in re ipsa, decorrendo do próprio ilícito indenizável. O valor da indenização deve ser arbitrado de modo a atender o seu caráter reparatório e pedagógico, em consonância com as peculiaridades do caso concreto.

DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO.

Apelação Cível: Décima Câmara Cível

Nº 70014374771: Comarca de Palmeira das Missões

ERICO QUADROS SANTOS: APELANTE

PT- PARTIDO DOS TRABALHADORES: APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana (Presidente) e Des. Paulo Roberto Lessa Franz.

Porto Alegre, 25 de maio de 2006.

DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)

ÉRICO QUADROS SANTOS ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais em face do PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT, sustentando que, em 05/10/02, ao retornar da loja onde havia comprado um saco de cimento a fim de realizar um serviço de pedreiro na casa de Waldemar Célio Lopes e Maria Medianeira Menezes Lopes, foi acusado por militantes do réu, de que estaria comprando votos daqueles através de sacos de cimento, inclusive pelo fato de que em seu carro havia propaganda política de candidatos do PMDB. Houve briga entre os sujeitos envolvidos, sendo acionada a Brigada Militar. Tal situação deixou a filha do requerente muito assustada, e foi preciso levá-la ao Hospital da Criança, onde permaneceu pelo período de 10 (dez) dias.

A sentença, às fls. 131/136, julgou a ação extinta, por força do art. 267, VI, do CPC, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 500,00 (quinhentos reais). Suspensa a exigibilidade, por litigar sob o pálio da AJG.

Em razões de recurso, às fls. 139/142, diz que a sentença deve ser reformada. Destaca contradição do juízo de primeiro grau quanto à fundamentação pertinente à ilegitimidade passiva do demandado. Alega que no dia do fato ocorreram diversas ocorrências policiais contra o partido requerido, e cita nomes dos dirigentes deste. Enfatiza a incidência dos arts. 241, 243, parágrafo 1°, e 250, parágrafo 1°, ambos do Código Eleitoral. Assevera que é de responsabilidade do Diretório Municipal do PT a responsabilização pelos danos acarretados ao apelante. Cita julgados e requer o provimento do apelo.


Em contra-razões, às fls. 156/161, a ré, preliminarmente, postula pela manutenção da ilegitimidade passiva prolatada. No mérito, refuta as articulações esposadas no recurso, e pugna pelo seu não provimento.

Subiram os autos.

O processo foi submetido à revisão.

É o relatório.

VOTOS

Des. Luiz Ary Vessini de Lima (RELATOR)

Eminentes Colegas! Em que pese extremamente bem fundamentada, a r. sentença deve ser revertida.

Trata-se de ação de indenização em razão de ato praticado por militantes do Partido dos Trabalhadores a qual restou extinta sem resolução de mérito, tendo em vista o reconhecimento da ilegitimidade passiva do réu.

Convém, de início, apreciar a referida condição da ação.

Os artigos 241 e 243, IX e §1º, ambos da Lei nº 4.737/65 assim preceituam:

Art. 241. Toda propaganda eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga, imputando-lhes solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos.

Art. 243. Não será tolerada propaganda:

(…);

IX – que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública.

§ 1º O ofendido por calúnia, difamação ou injúria, sem prejuízo e independentemente da ação penal competente, poderá demandar, no Juízo Civil a reparação do dano moral respondendo por este o ofensor e, solidariamente, o partido político deste, quando responsável por ação ou omissão a quem que favorecido pelo crime, haja de qualquer modo contribuído para ele.

(…).

É certo, portanto, que o demandado não pode responder por atos praticados por meros simpatizantes seus e que não tenham consigo qualquer vínculo, mas apenas pelos praticados na defesa de seus interesses e em seu nome.

No caso dos autos, pelo que dessume da prova oral produzida em sede de inquérito policial (fls. 35/57), os próprios envolvidos imputados como autores das ofensas ao demandante assumiram, ainda que indiretamente, que estavam a serviço do PT. Na ocasião, véspera de 1º turno de eleição, muitos deles afirmaram que estavam no diretório do partido quando receberam uma denúncia de que o ora demandante estava comprando votos, ocasião em que “foram verificar”.

Assim, os atos praticados foram na defesa dos interesses do demandado, o que o torna parte legítima para figurar no pólo passivo da demanda.

Por outro lado, argumenta o réu de que o legitimado para a causa seria o Diretório Municipal de Palmeira das Missões e não o Diretório Estadual do Partido, o que não merece prosperar, na medida em que, como bem salientou o magistrado a quo, o Partido dos Trabalhadores é um só, não havendo distinção entre o PT de Palmeira das Missões do PT Regional e de outras localidades, ainda que se subdivida em diretórios.

Firmada a legitimidade passiva do demandado, passo ao enfrentamento da questão de fundo, nos termos em que preceitua o artigo 515, §3º, do CPC.

Pois bem.

Narra o demandante que, no dia 05/10/2002, véspera do 1º turno das eleições para Governador do Estado, entre outros, estava na casa Waldemar Célio Lopes e Maria Medianeira Menezes Lopes, ajudando-os em uma reforma, quando os partidários do réu invadiram o domicílio e passaram a acusá-lo de estar comprando votos mediante a entrega de sacos de cimento.

Afirmou, inclusive, que sua filha pequena, a qual sofre de problemas respiratórios, estava junto e passou mal em função do ocorrido, tendo que ser hospitalizada.

Destaco a prova oral produzida no inquérito policial. Roger Lorenzoni disse (fls. 36/37):

…que na tarde de sábado,véspera das eleições, estava num dos comitês do partido na Vila Mutirão e foram informados que o senhor conhecido como Érico estava distribuindo cimento (sacos) à população, para a candidatura de Germano ou Brito. Ao chegar no local já havia inúmeras pessoas em vários veículos na rua e que se comunicavam com o senhor Érico…Todas as pessoas presentes, segundo o depoente, suspeitavam de compra de votos através do fornecimento de material de construção, tendo em vista que o senhor Érico que é professor possuir veículo inapropriado para fretes. Houve uma discussão generalizada entre as pessoas que estavam no local. Érico, o dono da casa, que o depoente não conhece e as pessoas que tentavam esclarecer o que estava realmente acontecendo. O casal dono casa agrediram fisicamente cidadãos que estavam no local perplexos e desconfiados de que estava havendo fraude eleitoral…O depoente diz ter se retirado do local antes das demais pessoas e tomou conhecimento de que continuou ocorrendo agressões físicas e verbais por parte de Érico e proprietários da casa contra os que ali permaneceram desconfiados da existência de flagrante de crime eleitoral…


Luiz Aires de Castro, um dos policiais que atendeu ao chamado, referiu (fl. 38):

…o depoente na condição de testemunha declara que recebeu telefonema no quartel que haviam tumulto na casa, que haviam pessoas exigindo notas fiscais dos materiais que estavam sendo usados e que andaram “se empurrando”, informações essas repassadas pelos donos da casa que não lembra o nome, pois não foi o depoente quem preencheu a ficha de atendimento. Que ao chegarem no local estavam apenas os proprietários da casa e as pessoas que as tinham ofendido já haviam se retirado do local…Que antes de chegarem na casa citada, uma quadra mais ou menos encontraram um grupo de umas 20 pessoas em cinco veículos, que eram todos do PT, isto foi confirmado pelos donos da casa, que os militantes já haviam se retirado ao chegar na casa onde houvera o princípio de tumulto.

Valdemar Célio Lopes, proprietário da casa onde ocorreu o tumulto, afirmou (fls. 39/40):

…o depoente declara que estava no sábado fazendo uma reforma, colocando umas portas na sua casa, que sua esposa já havia contratado o ÉRICO que é seu colega de trabalho, pois ele fez um preço bem barato e, como já haviam comprado o resto do material, aproveitaram o tempo para lidar. Que chegaram na sua casa um grupo de mais de 25 pessoas com bandeiras do PT, vários veículos com propaganda do Partido dos Trabalhadores e que à frente estava um rapaz que nem sabia o nome e quando Érico quis sair para fora do pátio, esse rapaz, que depois soube ser o Roger Lorenzoni, disse que dali ninguém saía e se referiu a Érico, bem como Rose também disse que queriam a cabeça de Érico. Roger queria saber das notas dos materiais. Disse também que Érico era acostumado a comprar votos e que devia ter comprados os mesmos…O depoente mandou sua filha buscar as notas, porém Roger não esperou para olhar as notas. Houve um tumulto com outras pessoas que estavam no local, isto é, que acompanhavam o Roger, houve um empurrar-empurra, quando o próprio depoente foi empurrado e quase o derrubaram, ofendiam os donos da casa com palavrões, que Rose, irmã de Jorege Brizola era uma das mais alteradas. Que Elzamir chegou a empurrar sua esposa dizendo que não era com “ela”. Que o depoente pediu que fossem embora, parassem com a “baixaria, mas eles estavam bem loucos”. Que mandou sua filha chamar a Brigada e que Roger disse que “não precisa chamar, eu vou chamar a Brigada”. Que ligaram novamente para a BM, e quando sua filha disse que estavam vindo, as pessoas começaram a dispersar-se rapidamente. Que discutiam com Érico e o xingavam…

No depoimento de Maria Medianeira Menezes Lopes (fl. 41), assim restou consignado:

…a depoente confirma que teve sua casa invadida, sua privacidade, foi ofendida, rebaixada, caluniada, humilhada pelos manifestantes do Partido dos Trabalhadores tendo identificado Rose Brizola, Elzamir que trabalha no MOVA, Roger Lorenzoni…Que o tumulto foi criado porque a depoente e seu esposo contrataram o Érico para colocar duas portas na sua casa, que todo o material foi adquirido pela depoente, seu marido e sua filha…Quando os tumultuadores chegaram, Érico já estava terminando o serviço e estava com a colher de pedreiro lavando-a…A depoente acha que a bronca deles era com Érico, e não tinham que envolver a depoente e sua família, pegassem na rua ou qualquer outro lugar…

Já a testemunha Rose Elaine de Moraes Brizola (fl. 44) sustentou que:

…tinham um comitê no Mutirão e foram avisados que poderia estar havendo “compra de votos na residência envolvida”…que o veículo de Érico estava com uma parte para fora do pátio da residência e estava tirando dois sacos de cimento para dentro da residência e já havia suspeita sobre Érico de que o mesmo estava fazendo compra de votos. Estranha mesmo, pois ele não possui carro de frete, não pertence àquela comunidade. Que ao descer do carro, esteve na calçada e na rua em frente à residência, mas não entrou no pátio, que estavam tentando impedir a compra de votos que é “um direito do cidadão”. Que quando chegou mais gente do seu pessoal, companheiros de partido, Érico e a dona da casa, Maria Medianeira, se alteraram e proferiram palavras de baixo calão contra os companheiros em geral…Que todo mundo se envolveu na discussão pois queriam a nota fiscal e então Érico perguntou a Roger quem era ele…

O depoimento de Luiz Carlos Manfrin Nalifico restou registrado nos seguintes termos (fl. 45):

…que ia passando na frente da casa onde deu-se os fatos e viu um tumulto de gene, parou seu veículo para ver o que estava acontecendo. Que devia haver umas 20 pessoas, umas dentro do pátio da residência, outras na frente do portão. Viu com certeza que as pessoas que estavam na frente da residência algumas com bandeiras do PT…O depoente diz que já conhecia o Roger e o viu dentro do pátio e ouviu “ele pediu as notas do cimento e não deixava o Érico sair pra lugar nenhum”. Que a sua impressão era que eles intimidavam o rapaz não o deixando movimentar-se…O depoente confirma que Roger gritava muito e inclusive vários companheiros do mesmo chamavam por seu nome. Que os companheiros de Roger lhe diziam “vamo pegar ele, não deixa ele sair”…


Elzamir Ferreira da Silva referiu (fl. 46):

…declara que estavam fazendo um trabalho na Vila Mutirão, estavam visitando algumas casas, no sábado, ficou sabendo por companheiros que Érico estava circulando várias vezes na vila e se perguntaram se ele fazia “frete”, era comentário geral, pois conhecia como funcionário “de escola”. Que foram a depoente junto com alguns companheiros checar o que estava acontecendo na residência onde Érico se encontrava, que os donos da casa são seus conhecidos…A depoente disse que apenas queriam esclarecimento dobre o material que fora comprado, ouviu que alguém solicitou nota fiscal, houve um tumulto generalizado e que o dono da casa os ameaçou…Que foram agredidos verbalmente pelos donos da casa e também de Érico, houve muita baixaria. A depoente confirma que a moça mostrou algum documento que poderia ser a nota fiscal, mas seus companheiros não fizeram questão de ver justamente para não entrar no pátio e aumentar o tumulto. Que alguns companheiros realmente estavam com identificação do partido, bandeiras do PT…

No depoimento de Diego Mello Mendonça foi dito (fls. 47/48):

…na véspera do 1º turno das eleições, sábado à tarde “dera uma garoazinha”, o depoente estava na parada de ônibus se abrigando junto com alguns amigos quando chegaram uns 20 veículos na casa de D. Maria Medianeira…Que viu que eram pessoal do PT pois portavam bandeiras do partido…quando viu, Roger Lorenzoni o qual conhecia de vista, viu quando ele entrou portão adentro e dirigiu-se diretamente ao Érico e ouviu quando Roger “alterado” pediu as notas do cimento para Érico e que “só saía dali se apresentasse as notas”…Não lembra com exatidão quantas pessoas entraram dentro do pátio. Que das pessoas que entraram dentro do pátio, alguns dos participantes portavam bandeiras do PT…

José Luiz Saldanha afirmou (fl. 50) esclarece pouca coisa, pois, “chegou no final”.

José Rodrigues do Nascimento, por sua vez, relatou (fls. 52/53):

..que na véspera das eleições do primeiro turno, subia no Mutirão “por acaso”, não estava sabendo das denúncias surgidas sobre a possível tentativa de compra de votos no local, ao ver seus companheiros chegarem na casa, também chegou junto. Só conhecia “de rua o Érico”, que já estavam lá o Roger, a Rose, a Suzete, o Marcelino. Que o Roger e outro companheiro estavam conversando com o Érico. Que o pessoal não estava dentro do pátio, que o Érico estava com a roupa suja de massa de cimento dando a impressão, a princípio, que estava trabalhando na casa. Havia denúncia recebida por seus companheiros que Érico teria comprado cimento e poderia estar “comprando votos a troco de material”. Viu que Roger discutia com o pessoal da casa e Érico , que tinham uma nota e que havia controvérsia sobre a data da compra já que havia suspeita de não ser o mesmo material. Que alguns companheiros, talvez o Roger que estava mais perto da filha do casal, deve ter olhado a nota fiscal…O depoente acha que o fato de Érico “ser muito político influiu nas suspeitas de compras de voto”, mas que no dia dos fatos ele disse que não tinha nada a ver com compra de votos, que estava só trabalhando no local.

Antoninho Vani (fl. 54) também chegou depois que o acontecimento já havia terminado, e, portanto, nada de conclusivo apresentou.

Max André de Aguiar Eloy (fl. 55) disse que estava passando pelo local e viu o autor descarregando sacos de cimento sem a respectiva nota fiscal, Advertiu-o de que estava cometendo um crime e levou um tapa, retirando-se do local antes da chegada dos demais militantes.

Janine Lopes prestou os seguintes esclarecimentos (fls. 56/57):

…estavam reformando a sua casa quando chegaram um monte de pessoas dentro do seu pátio, digo, entraram portão adentro e acusaram que estavam sua família vendendo votos para Érico e para o partido dele, o Rigotto. Que conhece um dos que entraram no pátio, o Roger Lorenzoni, a Elzemar, uma outra moça que não lembra o nome e outros que não conhece…e que foi Roger que acusou que “nós estávamos recebendo cimento, areia e material de construção e pedia as notas”…

Após uma criteriosa análise da prova oral reproduzida, resta incontroverso que os militantes do partido requerido efetivamente envolveram-se em confusão com o demandante, imputando-lhe a autoria de crime eleitoral de compra de votos.

Reiteradamente tem-se decidido que a simples comunicação de crime junto à autoridade competente, se de boa-fé, não gera qualquer direito/dever indenizatório.

Todavia, no caso dos autos, a situação é diferente, na medida em que não se trata de mera cientificação da autoridade, mas sim de exercício arbitrário das próprias razões.

Acontece que, ao invés de adotar as medidas legais cabíveis, deslocaram-se até onde estava o autor passaram a caluniá-lo, de maneira escandalosa, dizendo que aquele estava comprando votos, o que, pelo visto, não correspondia à verdade, a julgar-se pelas evidências constantes nos autos. Veja-se, ainda que tudo ocorreu no pátio e em frente à casa onde se encontrava o demandante, chamando a atenção da vizinhança e dos transeuntes.


Constatada ausência de veracidade das acusações e chamada a polícia pelos donos da casa onde se deram os acontecimentos, os militantes prontamente se retiraram do local antes mesmo da chegada da Brigada Militar, o que demonstra a ciência de que haviam cometido abuso.

Assim, os danos morais causados ao demandante estão in re ipsa, isto é, decorrem do próprio evento danoso. Nesse sentido:

AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. E-MAIL. CALÚNIA. Admitindo o réu que foi quem redigiu e encaminhou e-mail a seus clientes, contendo informação caluniosa a respeito do autor, não pode querer eximir-se do dever de reparar o dano moral que causou. Mantido o quantum indenizatório, fixado de conformidade com os parâmetros adotados pelo Colegiado. AGRAVO RETIDO E APELOS DESPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70009559212, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 05/05/2005).

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS DECORRENTES DE CALÚNIA E DIFAMAÇÃO. CARTA ACUSANDO SEMINARISTA DE LADRÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. Comporta ser indenizado por dano moral seminarista acusado de ladrão perante a comunidade em que vive e no ramo de sua atividade profissional. O valor deve ser arbitrado em dosimetria equilibrada. Apelo improvido. (Apelação Cível Nº 70004328308, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio dos Santos Caminha, Julgado em 03/04/2003).

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. OFENSA À HONRA. INJÚRIA E DIFAMAÇÃO. TIPIFICAÇÃO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. VALOR. A responsabilidade civil por injúria, calúnia ou difamação prescinde de intenção de prejudicar. A simples divulgação de imputação de conduta desonrosa, capaz de atingir a dignidade da pessoa, por culpa do agente, caracteriza ilícito, que gera o dever de indenizar os danos correspondentes. A liquidação do dano sujeita-se à cláusula geral de liquidação instituída no artigo 1.536, § 1º, do CCB de 1916, que remete a tradução econômica do dano ao prudente arbítrio do juiz. Verba indenizatória majorada para equivalente a vinte (20) salários mínimos. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. (Apelação Cível Nº 70004804043, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mara Larsen Chechi, Julgado em 17/03/2004).

Caracterizada a responsabilidade do réu e o dano, passo à quantificação da indenização.

O autor, ao que tudo indica, é pessoa humilde, tanto que litiga com AJG. A verba reparatória, portanto, deve reparar o dano sem, contudo representar o seu enriquecimento injustificado. De outro lado, tem-se um partido político de notório poderio financeiro, valendo aqui o caráter pedagógico da medida.

Os danos, propriamente ditos, foram de relativa extensão, tendo em vista que o autor passou por situação constrangedora na frente de outras pessoas, inclusive a própria filha pequena que estava junto com ele na ocasião. Todavia, não chegou a responder criminalmente pelas falsas imputações.

Consideradas estas peculiaridades do caso concreto, arbitro os danos morais em R$ 9.000,00, que devem ser corrigidos monetariamente pelo IGPM a contar desta data e acrescidos de juros legais desde a citação.

Face o seu maior decaimento (o autor pediu R$ 12.000,00), caberá ao réu o pagamento de 80% das despesas processuais, mais honorários de sucumbência que vão arbitrados em 15% do valor da condenação. O demandante, por sua vez, arcará com o restante das custas, mais R$ 400,00 ao procurador da parte adversa, restando suspensa a exigibilidade em face da AJG de que goza.

Por todo o exposto, manifesto-me por PROVER PARCIALMENTE o apelo, nos termos que acima constam.

É como voto.

Des. Paulo Roberto Lessa Franz (REVISOR) – De acordo.

Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana (PRESIDENTE) – De acordo.

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA – Presidente – Apelação Cível nº 70014374771, Comarca de Palmeira das Missões: “DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME.”

Julgador(a) de 1º Grau: SEBASTIAO FRANCISCO DA ROSA MARINHO

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