Terra revolta

MST diz que assentamento na Teijin é irreversível

Autor

6 de julho de 2006, 17h15

O processo de assentamento nas terras da fazenda Teijin, em Nova Andradina (MS), iniciado com a divisão de terras promovidas pelo Incra, é irreversível. A opinião é da direção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Mato Grosso do Sul que divulgou nota nesta quinta-feira (6/7) exigindo, segundo a direção, que se respeite os direitos das famílias e que o assentamento seja consolidado definitivamente pela Justiça. O MST diz que a suspensão do processo de reforma agrária e a remoção das famílias da área podem levar a um estado de convulsão social.

A nota foi divulgada em repúdio à decisão do Superior Tribunal de Justiça, na última quarta-feira (5/7), que modificou decisão da própria corte concedeu a reintegração de posse da Teijin a seus donos. Com a suspensão da liminar dada anteriormente pelo STJ, ficou valendo a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que suspendeu o processo de reforma agrária das terras e determinou a desocupação da fazenda pelo MST. O STJ também decidiu encaminhar o processo para o Supremo Tribunal Federal por se tratar de questão constitucional.

As 1.067 famílias do Movimento Sem-Terra vivem na fazenda de 28 mil hectares há sete anos, integradas ao projeto de assentamento do Incra. Para o MST “a decisão do STJ em favor do grupo japonês ofende a lei, o Estado Democrático de Direito e prejudica diretamente mais de 5 mil brasileiros e brasileiras” que fazem parte das famílias assentadas. Segundo o MST, os lotes da fazenda já foram distribuídos pelo Incra e muitas famílias já começaram a construção de suas casas. O documento não comenta o fato de as famílias terem ocupado a fazenda antes de uma decisão judicial para o caso.

O MST também alega que os proprietários não conseguiram comprovar a produtividade da fazenda e já foram desapropriados duas vezes. “A Justiça Federal demorou, injustificadamente, um ano para determinar ao ex-proprietário a retirada do gado, o que até hoje não ocorreu. É estranho que a mesma Justiça que levou todo esse tempo para fazer cumprir a lei a um único indivíduo estrangeiro proprietário de um latifúndio, que não cumpre os requisitos da função social da terra, é a mesma que tão rapidamente profere uma decisão para retirada de mais de 5 mil pessoas da área.”

Para o advogado da fazenda, Diamantino Silva Filho, além de o Incra prosseguir com a desapropriação de uma terra que não é qualificada para a agriculrura, mas só para a pecuária, o instituto está dividindo as terras em módulos muito menores do que os indicados por eles mesmos. “O Incra estabeleceu que a menor fração que esta fazenda pode ser dividida é de 45 hectares porque entende que menos que isso seriam minifúndios improdutivos. No entanto, pretende entregar para cada família um módulo de 25 hectares, o que significa que essa terra não vai ser suficiente para a subsistência da família,”diz Diamantino.

Segundo Diamantino, o Incra não está preocupado em como essas famílias vão morar e produzir nessas terras, mas apenas em fazer uma distribuição de lotes.

Veja a íntegra da nota do MST:

“O STJ (Superior Tribunal de Justiça) cassou decisão proferida pelo próprio tribunal e manteve a reintegração de posse da área da Fazenda Teijin ao grupo japonês Teijin, antigos proprietários da área de 28 mil hectares no município de Nova Andradina, no Mato Grosso do Sul.

Na terça-feira (04/06), o ministro Barros Monteiro, presidente do Tribunal, cancelou a definição do vice-presidente do STJ, ministro Peçanha Martins, que manteve a posse da área ao INCRA. Ele tinha suspendido a decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região de São Paulo, que concedia liminar de suspensão do processo administrativo de desapropriação e manutenção da posse dos latifundiários.

A decisão do STJ em favor do grupo japonês ofende a lei, o Estado Democrático de Direito e prejudica diretamente mais de 5 mil brasileiros e brasileiras, das 1.067 famílias ligadas ao MST e à Fetagri (Federação dos Trabalhadores na Agricultura).

As famílias estão acampadas na região há mais de 7 anos e foram integradas legalmente no projeto de assentamento por decisão do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e com o acompanhamento da Ouvidoria Agrária. A área foi declarada improdutiva pela perícia judicial determinada pela Justiça Federal em 2000, no governo presidente Fernando Henrique Cardoso, e concluída no mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O sorteio oficial das parcelas já foi feito pelo órgão federal da Reforma Agrária e todas as famílias que estão sendo assentadas na área estão distribuídas em seus lotes e iniciaram a construções das casas. Os recursos para habitação e fomento estão na conta de todas as famílias, que receberam o primeiro crédito de implantação. As estradas e outras obras de infra-estrutura já foram licitadas e estão em andamento.

Os proprietários não conseguiram comprovar a produtividade do imóvel. Antes disso, tiveram garantidos todos os seus direitos, como grupo estrangeiro, que adquiriram um imenso latifúndio durante o regime militar de mais 62 mil hectares de terras férteis. Encravada nas margens da BR-267, nos limites de Mato Grosso do Sul e São Paulo, a área é ideal e privilegiada de infra-estrutura, paga pelo povo brasileiro.

Mesmo assim, o grupo Teijin não conseguiu cumprir a função social da terra, em relação à produtividade, e foram por duas vezes desapropriados. O Incra fez o projeto de assentamento Casa Verde, reduzindo a área para cerca de 27 mil hectares em uma das principais bacias leiteiras do Estado. Isso comprova que as terras são viáveis para Reforma Agrária. Em 2002, a área continuava improdutiva e foi novamente desapropriada no projeto de assentamento Teijin.

A Justiça Federal demorou, injustificadamente, um ano para determinar ao ex-proprietário a retirada do gado, o que até hoje não ocorreu. É estranho que a mesma Justiça que levou todo esse tempo para fazer cumprir a lei a um único indivíduo estrangeiro proprietário de um latifúndio, que não cumpre os requisitos da função social da terra, é a mesma que tão rapidamente profere uma decisão para retirada de mais de 5 mil pessoas da área.

O MST considera que a decisão do STJ causa um estranho precedente, já que entre 2001 e 2005 os expropriados entraram com 12 ações contra o Incra. Todas foram desqualificadas pela Justiça. Além de pressionar o governo brasileiro, os proprietários estimulam o governo japonês a fazer uma intermediação com o Itamaraty. Paradoxalmente, o governo do Japão se recusou a participar do Fórum da Reforma Agrária da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação), em Porto Alegre, por causa dessa área.

As 540 famílias na área ligadas ao MST repudiam a concessão da decisão proferida pelo STJ, que sem conhecer a realidade da área, procedeu de maneira fria e desumana, prejudicando milhares de trabalhadores e trabalhadoras que ali estão em pleno direito, assentados pelo Incra com garantia constitucional.

É difícil evitar uma convulsão social ou uma catástrofe. A opinião pública está solidária. Temos o respaldo da sociedade sul-mato-grossense e brasileira, pois o caso ultrapassa fronteiras. Para as famílias beneficiárias, o processo de assentamento é irreversível. Exigimos e esperamos que se respeite os direitos das famílias e que seja consolidado definitivamente pela Justiça o assentamento.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!