Grande Irmão

EUA quer obrigar Google a entregar dados de internautas

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29 de janeiro de 2006, 18h45

O Ministério da Justiça dos Estados Unidos entrou com ação judicial para obrigar a Google Inc. a entregar às autoridades norte-americanas uma amostra de uma semana de pesquisas em seu site. A empresa se recusa a entregar os dados com a justificativa de que a divulgação das informações revelaria segredos operacionais desenvolvidos por seus engenheiros.

Três outros provedores que oferecem serviços de busca de dados em seus sites – a America On Line, a Microsoft e a Yahoo – entregaram as informações solicitadas pelo Ministério da Justiça. Segundo reportagem de Paulo Sotero para o jornal O Estado de S.Paulo, publicada neste domingo (29/1), a ação do governo abriu uma nova frente no que os críticos consideram uma ofensiva da administração Bush para cercear as liberdades públicas.

As autoridades norte-americanas alegam que os dados que pediram à Google, em agosto do ano passado, são cruciais para tentar restaurar uma lei de 1998 sobre proteção de crianças contra pornografia e exploração sexual na internet. A lei foi barrada pela Suprema Corte, que a considerou excessiva e incompatível com a Primeira Emenda da Constituição americana, que garante a liberdade de expressão.

As informações, diz o governo, são necessárias para estabelecer um conjunto de fatos capaz de demonstrar que a lei federal de 1998 seria mais eficaz do que o uso de filtros para dificultar o acesso de crianças a sites pornográficos. De acordo com a Nielsen-Net Ratings, mais de 38 milhões de pessoas, ou um quarto dos usuários ativos da internet nos EUA, visitaram sites pornográficos no mês passado. Segundo a Adult Video News, uma publicação especializada, os americanos gastaram US$ 2,5 bilhões no chamado “entretenimento online para adultos”, no ano passado.

De acordo com o Estadão, o caso aumentou as suspeitas de intromissão indevida do Estado na vida dos cidadãos suscitadas pela revelação, no mês passado, de um programa secreto de escuta telefônica e monitoramento de e-mails pela Agência Nacional de Informação. O presidente George W. Bush criou o programa depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 e o usou dezenas de vezes desde então.

Com o Congresso prestes a iniciar audiências públicas sobre o grampo extrajudicial, Bush iniciou uma ofensiva para convencer os americanos de que, como comandante supremo das Forças Armadas de um país em guerra, tem autoridade constitucional para permitir escutas sem permissão judicial dentro do território americano, quando as comunicações envolvam suspeitos de ligações com terroristas. Segundo as pesquisas, a opinião pública está rachada.

“Esse é um exemplo de que o governo parece pensar que tem o direito de ter todo tipo de informação sem justificativa adequada”, afirmou Aden J. Fine, advogado da União Americana das Liberdades Civis, referindo-se à disputa entre o governo e a Google. Especialistas em leis sobre direito à privacidade disseram que embora não se oponham a intimações do governo em casos em que há suspeita de crime, a demanda apresentada à Google é excessivamente vaga e não faz sentido.

“Uma vez cruzada essa fronteira, não há retorno. Se uma companhia como a Google responder a esse tipo de intimação, na próxima vez o governo pedirá tudo o que pediu agora e um pouco mais”, disse Marc Rotenberg, do Centro de Informação sobre Privacidade Eletrônica, ao Washington Post.

Segundo Rotenberg, a posição da Google é particularmente importante nessa disputa porque, em contraste com as demais companhias que operam buscas na internet, a empresa, além de ser a força dominante, é a única que retém em sua base de dados informações que permitem identificar o autor das buscas.

Ironicamente, a Google concorda com o governo. Nicole Wong, a assessora jurídica da Google, afirmou na semana passada que continuará resistindo à intimação do governo, não porque veja nela uma violação da privacidade de seus usuários, mas porque teme que sejam revelados segredos profissionais.

A aceitação pela Google, na semana passada, da autocensura imposta pelo governo de Pequim para autorizar que ela opere na China confirmou que a preocupação principal da empresa é com seus negócios e aumentou a preocupação entre os especialistas em direito à privacidade sobre o desfecho do caso nos EUA.

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