Carta no Correio

Decisão da Justiça Federal questiona monopólio dos Correios

Autor

28 de janeiro de 2006, 6h00

O monopólio do serviço postal pela ECT — Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ainda não foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal. O tema está sendo discutido em uma ADPF — Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, cujo julgamento está suspenso em razão de pedido de vista da ministra Ellen Gracie. Mas a polêmica em torno do tema segue. E não só no Brasil. No Japão, a pretensão do primeiro ministro Junichiro Koizumi chegou a ter seu mandato ameaçado por querer privatizar os serviços postais no país.

É o que comprova uma decisão da 2ª Vara da Justiça federal em Florianópolis, Santa Catarina. Ao julgar a ação impetrada pela ECT, o juiz federal Carlos Alberto da Costa Dias indeferiu o pedido para que a empresa Transmoto — Transporte de Documentos Express Ltda ficasse impedida de distribuir e entregar títulos de créditos títulos de cobranças, talões de cheque, cartões de crédito, tickets e panfletos e informativos publicitários.

A decisão teve por base o entendimento de que as cartas comerciais não seriam consideradas como cartas, no sentido estabelecido pela Constituição da República, o que deixaria tais documentos fora do monopólio no texto constitucional.

O magistrado, para definir o que vem a ser carta, usou o texto da lei 6.358/78, segundo a qual carta é “objeto de correspondência, com o seu envoltório, sob forma de comunicação escrita, de natureza administrativa, social, comercial ou qualquer outra forma, que contenha informações de interesse específico do destinatário”.

Ao citar precedente do extinto Tribunal Federal de Recursos, Costa Dias lembrou que o monopólio “só abrange cartas missivas, os cartões postais que trouxerem o endereço do destinatário e a correspondência fechada como carta, dizendo ainda (…) que nesta última se compreende todo invólucro cerrado, com sobrescrito, cujo conteúdo não se possa verificar sem violação”.

“Quer dizer, ou a correspondência cai no monopólio pela sua natureza de mensagem (carta missiva, cartão postal com endereço) ou pelo fato de estar fechada indevassavelmente como carta ou em invólucro cerrado. Fora daí não adianta pelejar com o sentido das palavras”, apontou o magistrado.

Para definir o contorno do que seja a carta comercial, o magistrado recordou decisão do, à época, juiz federal Jirair Meguerian (hoje, desembargador federal). “É (a carta comercial) documento representativo de um direito. Jamais pode ser confundido como objeto representativo de correspondência, de comunicação.

A decisão foi comemorada pelo advogado da Abraed — Associação Brasileira das Empresas de Distribuição, Dauro Dórea. “Percebe-se que, aos poucos, o Judiciário, mesmo nas Instâncias monocráticas, está se sensibilizando para a questão da inexistência do monopólio postal. A recente decisão da 2ª Vara Federal de Florianópolis é um exemplo do claro entendimento da vertente atual da questão da exclusividade dos Correios frente a nova Constituição, de 1988. O entendimento do juiz sentenciante vai ao encontro do voto do Ministro Carlos Ayres Brito no julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental 46 em trâmite no Supremo Tribunal Federal e, ainda, encontra perfeita consonância com o voto do relator, Ministro Marco Aurélio, que em 69 laudas, esgotou de forma brilhante a celeuma criada em torno do suposto monopólio que os Correios alegam ter”, avaliou o advogado.

Dórea ainda ponderou que a distribuição de títulos de crédito, títulos de cobrança, talões de cheque, cartões de crédito, tickets, panfletos e informativos publicitários sequer configuram exclusividade de entrega pelos Correios, porque extrapolam o interesse que o Estado poderia querer tutelar.

“Trata-se de questões comerciais que interessam apenas às empresas e à população consumidora que poderá obter melhores resultados com a saudável concorrência (melhores preços e maior qualidade dos serviços). Não haveria motivo para o Estado querer interferir em atividade privada de natureza econômica”, disse o advogado da Abraed.

No Supremo, antes da paralisação do julgamento, o placar era de três votos a favor do monopólio (Eros Grau, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso), dois votos a favor do monopólio parcial (Carlos Ayres Britto e Gilmar Mendes) e um voto pelo fim do monopólio (Marco Aurélio, o relator).

ADPF 46

Proc. 2005.72.00.006877-2

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!