Consultor Jurídico

Primeiro grau impulsiona garantia de direitos aos gays

23 de janeiro de 2006, 16h56

Por Sylvia Mendonça do Amaral

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Recentes notícias veiculadas na mídia nacional demonstram, com nitidez, as transformações pelas quais vem passando nossa sociedade, entre elas, o crescimento do respeito à orientação sexual dos indivíduos. Três exemplos atuais comprovam o fato.

O primeiro deles vem da região Nordeste, mais exatamente da justiça de Pernambuco, que concedeu a uma homossexual o direito de receber pensão previdenciária em decorrência do falecimento de sua companheira. Decisão essa que segue entendimento já adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.

O segundo vem do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que passou a reconhecer a união estável dos seus funcionários homossexuais e a possibilidade de que eles sejam inclusos como dependentes nos benefícios concedidos. A decisão veio da assessoria jurídica da pasta ao analisar pedido de um dos servidores do ministério que queria incluir seu companheiro como dependente.

Embora a união estável entre pessoas do mesmo sexo não esteja prevista na Constituição brasileira, e não exista legislação que trate do assunto, a assessoria jurídica do MDA baseou sua decisão em outras já tomadas pela Justiça brasileira, ao interpretar conceitos constitucionais como o direito à igualdade.

Por fim, o terceiro e último exemplo vem do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul — notoriamente inovador com relação aos outros tribunais brasileiros quando se fala em causas homossexuais —, ao reconhecer a união estável entre duas mulheres e determinar que a companheira viúva entre na partilha de bens.

Essa postura do Tribunal do Rio Grande do Sul, que há pouco tempo era o único a reconhecer as uniões homoafetivas, foi determinante para que desembargadores de tribunais de outros estados passassem a decidir da mesma forma. É o que se evidencia da decisão proferida pelo juiz de primeira instância de Pernambuco. É evidente que tal decisão pode ser alterada quando for apreciada pelos desembargadores em segunda instância, mas não se pode deixar de considerá-la um avanço.

Nesse sentido, também a recente decisão do TJ gaúcho deve ser vista como uma demonstração de firmeza em seu propósito de fazer justiça e inserir na sociedade um segmento marginalizado. São três decisões comprobatórias de que as relações homossexuais vêm sendo mais aceitas, seja pela sociedade em si, seja pelo Judiciário e agora, também, por um órgão governamental.

Nada mais justo. As relações entre duas pessoas do mesmo sexo são relações de amor, companheirismo, afeto e tudo o mais que envolve as relações heterossexuais. Daí não poder haver qualquer distinção entre elas, sob pena da ocorrência da discriminação e violação de princípios constitucionais que garantem a todos os cidadãos o direito à igualdade, à privacidade, liberdade e tantos outros.

Devemos considerar ainda que o fato de os casais homossexuais terem se exposto mais perante a sociedade também colaborou para que tivessem mais liberdade de pleitear seus direitos junto ao Poder Judiciário. A partir do momento em que expressam sua orientação sexual perante a sociedade, sentem-se mais à vontade para buscar a igualdade dos direitos conferidos aos casais heterossexuais.

A busca por esses direitos provoca reações no Poder Judiciário, que algumas vezes é levado a reconhecer tais uniões, sob pena de negar direitos a um segmento que também precisa de amparo e proteção, tal como conferido a todos os demais cidadãos.

As decisões de primeira instância, cada vez mais freqüentes, impulsionam os tribunais superiores a adotarem posturas semelhantes, levados que são à reflexão sobre as condições desta parcela da sociedade e das relações homoafetivas. São essas decisões favoráveis aos homossexuais que fazem com que um dia possamos dizer que nossa sociedade é justa e age de acordo com os princípios da igualdade pregados pela Constituição Federal, nossa lei maior.