Vaga no Supremo

Atual sistema de escolha para o STF é o mais adequado

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11 de janeiro de 2006, 10h40

*Editorial publicado nesta quarta-feira (11/1), no jornal O Estado de S.Paulo.

Com a aposentadoria do ministro Carlos Velloso, na próxima semana, o presidente Lula deverá indicar outro ministro para o Supremo Tribunal Federal. Será o quinto por ele escolhido. E, caso os ministros Nelson Jobim e Sepúlveda Pertence também renunciem ao cargo, como se comenta, o primeiro por pretender disputar as próximas eleições e o segundo por estar entediado com as lides forenses, Lula poderá indicar mais dois nomes.

Na vigência do regime democrático, nenhum presidente da República teve possibilidade de influir tanto na linha doutrinária do Supremo. Nos países com sólida tradição judicial, os ministros de uma corte suprema são escolhidos entre grandes juristas e advogados respeitados. Raras vezes se viram, nesses países, escolhas ditadas por critérios partidários, interesses corporativos e estratégias de marketing.

Nas quatro indicações que já realizou para o STF, o presidente Lula não seguiu critérios doutrinários. Cedendo a interesses políticos, escolheu nomes sem maior expressão intelectual e com orientações doutrinárias distintas. Com opiniões discrepantes sobre quase todas as matérias, os votos desses ministros têm sido conflitantes, o que torna as decisões da corte imprevisíveis, disseminando com isso a incerteza jurídica no País. Recentemente, um desses ministros, após votar num processo rumoroso, voltou atrás e mudou radicalmente o teor de seu voto. Uma decisão alterada assim justifica a opinião de que os ministros indicados por Lula colocam a política à frente do direito, minando a confiança da sociedade no STF.

Essa opinião é reforçada pelo ‘clima de feira’ que se estabeleceu na disputa pela vaga de Velloso. Assessores do Planalto comentam a possibilidade de ser indicado um político petista a ser escolhido de uma lista formada pelo ex-ministro Tarso Genro e pelos deputados Luís Eduardo Greenhalgh e Sigmaringa Seixas. Juízes federais reivindicam a indicação de um colega, como se o STF fosse o fim da carreira judicial.

Juízes estaduais defendem o quinto ministro a ser indicado por Lula em meio a acirrada disputa nome de um desembargador paulista que chegou ao Judiciário pelo quinto constitucional, após militar na ala quercista do PMDB. Políticos paranaenses fecharam questão em torno do nome de um professor de direito em Curitiba. Um procurador gaúcho lançou sua campanha pela internet. Duas procuradoras mineiras foram lembradas em nome de uma hipotética disposição do presidente Lula de nomear a segunda mulher para o STF. A situação chegou a tal ponto que, para evitar o pior, o ministro da Justiça filtrou essa profusão de candidatos, encaminhando ao Palácio do Planalto uma lista com 11 nomes.

A verdade é que, para substituir o ministro Velloso, e também Jobim e Pertence, caso venham a renunciar, o presidente não deve escolher nomes egressos de partidos, nem fazer concessões a lobbies e marketing, nem, tampouco, optar por juristas sem expressão nacional, se não quiser dar munição àqueles que pretendem retirar do chefe do Executivo a prerrogativa de indicar os ministros do STF. É o caso do senador Jefferson Perez (PDT-AM), autor de um projeto que confere aos órgãos de representação da Justiça, Ministério Público e advocacia o direito de indicar, cada um, dois candidatos a cada vaga aberta no STF, cabendo aos ministros da corte escolher um dos seis nomes.

O senador acredita que esse mecanismo ‘despolitizaria’ o STF. O problema é que o projeto despe um santo para vestir outro, conferindo a corporações jurídicas o direito exclusivo de escolher quem fará parte do STF. Sendo o principal papel do Supremo controlar a constitucionalidade das leis, ele é uma corte eminentemente política, na acepção mais ampla do termo, motivo pelo qual sua composição não pode ficar à mercê de interesses corporativos. O mais sensato é deixar o presidente da República com a prerrogativa de indicar os nomes dos ministros e o Senado com a incumbência de sabatiná-los e aprová-los — ou não — como ocorre hoje.

Inspirado no modelo vigente nos Estados Unidos, o atual sistema de escolha é o mais adequado. O importante é a qualidade dos nomes escolhidos pelo presidente da República. É sobre isso que Lula tem de refletir, para dar ao STF coerência doutrinária e aos cidadãos e empresas a segurança jurídica que dele esperam.

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