Coronel do Carandiru

Debate é válido, mas é intolerável desmoralização da Justiça

Autor

  • Silvio Mendonça

    é juiz de direito aposentado. Foi professor de Economia Política e Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Unisantos. Atualmente é conselheiro fiscal do Diretório Nacional do PSB.

26 de fevereiro de 2006, 7h00

Para a fúria de pretensiosos defensores dos direitos humanos, o coronel Ubiratan foi absolvido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. O coronel era responsabilizado pela morte de 111 pessoas (que depois se soube serem menos) na Casa de Detenção do Carandiru, durante famoso episódio em que um motim de presos foi debelado. O saldo final da rebelião foi cerca de uma centena de presidiários mortos e dezenas de policiais feridos, dentre estes o próprio coronel, que comandou a tropa até a sua entrada no presídio, quando desmaiou após ser atingido pela explosão de um televisor.

A polêmica sobre a responsabilidade das mortes foi desde o início alimentada por grupelhos que se arrogam na condição de defensores dos direitos humanos. Sem dar a mínima importância para as circunstâncias de como os fatos realmente se deram, essas pessoas condenaram, sem julgamento, todos os policiais que participaram da ação, sem lhes dar direito de defesa, sem dar a menor credibilidade para a sua versão. A única versão verdadeira — na concepção bitolada desses fanáticos da justiça caolha — era e sempre foi a dos presos.

Agora, no julgamento do recurso da defesa, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, por 20 votos a dois, absolveu o coronel Ubiratan. O Órgão Especial do Tribunal de Justiça, para quem não sabe, é composto pelos 25 desembargadores mais antigos do estado de São Paulo. São, portanto, julgadores no mínimo tecnicamente exímios e aprimorados, que chegaram ao ápice da carreira da magistratura estadual. Porém, além disso, para quem conhece o perfil dos desembargadores paulistas, são eles, seguramente em sua ampla maioria, homens de elevada competência e seriedade.

Pois não é que a “turma dos direitos humanos” saiu enfurecida da sessão de julgamento, atacando de forma imbecil e grosseira a decisão judicial? Ora, esses tolos, que ganham tanto espaço na mídia (porque, afinal, geram polêmica, e polêmica é notícia), se têm pensamentos diferentes, pelo menos deveriam respeitar as decisões do Poder Judiciário, porque é nele que nos asseguramos do imprescindível julgamento imparcial e justo.

Se há erros de julgamento, eles podem ser corrigidos por meio de recurso para um tribunal superior. Mas é uma temeridade que qualquer grupo organizado incite ou comece algum tipo de campanha contra decisões judiciais.

O Estado de Direito sobrevive, necessariamente, pela independência de seus juízes. Quando os juízes forem reféns da opinião pública ou da imprensa, o Estado de Direito estará abalado em suas raízes.

É interessante que as pessoas debatam as decisões judiciais, que os órgãos de comunicação denunciem fatos, promovam discussões. Entretanto, é intolerável ver se ensaiar uma ação organizada para desmoralizar uma decisão judicial. Ela é soberana na solução de uma controvérsia. Se há irresignação dos que não a aceitam, a Constituição Federal garante o direito de recurso que, no caso do coronel Ubiratan, poderá ser exercido pelo Ministério Público, com seus quadros do mais alto gabarito.

Mas não me venham com patrulhamento da convicção dos juízes, porque eles precisam ter liberdade para examinar a prova e expressar o seu veredicto. Sem isso, peca-se pelo desrespeito à ordem jurídica e ao próprio regime democrático. E não podem ser os energúmenos de plantão o obstáculo para impedir o Brasil na marcha pela consolidação da sua jovem democracia e pelo aprimoramento de suas instituições.

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    é juiz de direito aposentado. Foi professor de Economia Política e Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Unisantos. Atualmente, é conselheiro fiscal do Diretório Nacional do PSB.

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