Bancos e consumo

Decisão sobre aplicação do CDC nos serviços bancários é adiada

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22 de fevereiro de 2006, 16h44

O ministro Eros Grau pediu vista dos autos e o Supremo Tribunal Federal adiou nesta quarta-feira (22/2) a definição do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade que questiona a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas relações dos bancos com seus clientes. A ADI foi ajuizada pela Consif — Confederação Nacional do Sistema Financeiro.

Ao pedir vista, o ministro afirmou que trará o processo de volta para julgamento dentro do prazo regimental da Corte, que é de duas sessões. Nesta quarta, ao trazer seu voto depois ter pedido vista há quase quatro anos, o presidente do Supremo, ministro Nelson Jobim, votou de acordo com o relator da questão, ministro Carlos Velloso, já aposentado.

De acordo com o entendimento que prevalece até agora, parte dos serviços bancários como a compensação de cheques, sistema de auto-atendimento, entrega de cartão de crédito ou o tempo de espera nas filas devem seguir as diretrizes do Código de Defesa do Consumidor. Já as taxas de juros nas operações não podem ser fixadas de acordo com o CDC, pois são da esfera do Sistema Financeiro Nacional.

Ou seja, o Código incide na relação entre banco e cliente, mas não na política financeira. Velloso afirmou que fixar a política monetária é matéria exclusiva do Sistema Financeiro e deve ser regulada por lei complementar, conforme decidido anteriormente pelo Supremo no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade 4.

Antes de retomarem o julgamento, os ministros discutiram questão de ordem na qual se debateu se o julgamento deveria ou não prosseguir. Isso porque o artigo 192 da Constituição foi alterado pela Emenda Constitucional 40.

Em sua atual redação, o artigo prescreve: “O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”.

Na redação anterior, ainda vigente quando do ajuizamento da ADI e do voto do relator, havia vários incisos hoje suprimidos. Os ministros entenderam, porém, que não seria necessário à espera por um novo relator. Ficaram vencidos Sepúlveda Pertence, Carlos Ayres Britto e Eros Grau.

Em seu voto, o ministro Nelson Jobim diferenciou o regime jurídico a que se submetem os consumidores e os que considerou como agentes econômicos — poupadores e mutuários.

De início, ele estabeleceu uma diferença entre o consumo e a caderneta de poupança. O primeiro seria direcionado para a satisfação de um interesse pessoal ou uma necessidade — levando à extinção, desaparecimento, depreciação de um produto ou serviço. Já a poupança decorreria de um excedente de capital — além de ser um ato de renuncia ao consumo.

Quanto ao consumidor, Jobim entendeu haver, nesse caso, uma relação retributiva, um pagamento do que se usa. O poupador, por sua vez, não consome, mas aplica ou guarda valores. Nesse sentido, os bancos seriam as instituições que, por excelência, realizam a atividade de pegar de quem tem mais e emprestar a quem tem menos. No caso dos mutuários, seriam os que têm menos pegando dinheiro de quem tem mais. Às instituições bancárias cabe o papel de intermediar a situação, remunerando mutuante e recebendo dos mutuários.

A partir da diferenciação, Nelson Jobim apontou que, no caso dos consumidores, como decorrência da relação de hipossuficiência (inferioridade) em relação às grandes empresas, haveria necessidade de uma proteção ao direito subjetivo, individual.

No entanto, quando se trata de um poupador ou mutuário, há uma situação mais extensa. Em razão dos reflexos na economia, haveria uma necessidade de proteção a direitos transindividuais, já que todos os cidadãos estariam envolvidos.

“Poupador e mutuário não são protegidos na perspectiva histórica do indivíduo, mas enquanto agentes econômicos”, disse o ministro.

O presidente do Supremo lembrou que a política monetária decorre da escolha feita pelo voto. Estaria, assim, regulada pelas autoridades monetárias competentes: o Banco Central e o Conselho Monetário — e não deveria se submeter ao CDC. Caso contrário, os Procons poderiam se meter na política da taxa de juros. Rememorou, inclusive, da Resolução 2878 do Banco Central, o chamado Código de Defesa do Cliente Bancário.

O ministro ainda falou que a aplicação do CDC em operações bancárias seria “deletério (prejudicial) do ponto de vista econômico”, ao seguir o voto do relator, Carlos Velloso. “O Supremo já entendeu ser inconstitucional a ampliação desproporcional do CDC”, afirmou.

Porém, ressalvou que haveria situações nas quais o Código de Defesa do Consumidor poderia ser aplicado. Seriam as situações em que o banco prestasse um serviço bancário — remunerado ou não por tarifa. Após o voto de Jobim, os ministros seguiram para o intervalo. Ao final da paralisação, Eros Grau decidiu pelo pedido de vista.

ADI 2.591

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