Não foi a intenção

Presidente do TJ gaúcho afirma que não quis ofender Busato

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21 de fevereiro de 2006, 14h21

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, desembargador Osvaldo Stefanello, afirmou que não pretendeu ofender o presidente da OAB, Roberto Busato, ao dizer que ele “não conhece nada juridicamente”.

As explicações de Stefanello foram apresentadas ao Superior Tribunal de Justiça, onde Busato entrou com interpelação judicial contra o desembargador. Para o presidente da OAB, se fosse confirmada a declaração de Stefanello, divulgada pela imprensa, configuraria crime contra a sua honra.

Em sua defesa, o desembargador afirma que a frase não tinha caráter ofensivo e que, em nenhum momento, pretendeu macular a honra do advogado.

Leia a íntegra das explicações do desembargador Osvaldo Stefanello apresentadas ao STJ

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO FRANCISCO PEÇANHA MARTINS RELATOR – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

INTERPELAÇÃO JUDICIAL

PROCESSO N. 4394/RS (2005/0203722-6)

REQUERENTE: Dr. ROBERTO ANTONIO BUSATO

REQUERIDO: Des. OSVALDO STEFANELLO

EXPLIÇÕES DO REQUERIDO

OSVALDO STEFANELLO, brasileiro, casado, Desembargador, Chefe do Poder Judiciário e Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, residente e domiciliado, à Rua Corcovado, 392, apto. 301, Porto Alegre, Carteira de Identidade Civil nº 8005091858/SSP-RS, por seu advogado infrascrito, ut instrumento de mandato em anexo, vem ante V.Exa., nos autos do processo acima epigrafado, em resposta ao pedido de explicações, dizer e, a final, requerer o que abaixo segue:

PRELIMINARMENTE

O instrumento de procuração acostado à inicial registra a outorga pelo Doutor Roberto Antonio Busato de poderes ao ilustre advogado, Dr. Marcelo Rocha de Mello Martins, para sua representação no oro em geral.

2. O referido instrumento, destarte, desatende a exigência constante do artigo 44 do Código de Processo Penal, de menção, mesmo resumida, do fato supostamente constitutivo de crime contra a honra.

E certo que, no art. 44, a nossa lei adjetiva alude, explicitamente, à queixa, isto é, a inicial da ação penal de iniciativa privada, sendo pacifica, nesse colendo Superior Tribunal de Justiça, a orientação de que a falha no instrumento de mandato, não superada no prazo decadencial, conduz à extinção da punibilidade (HC 2004/0149296-9, 5ª. T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17.5.2005, in DJ 01.08.2005 p. 486).

É indiscutível que a ratio desse dispositivo se projeta sobre as medidas preparatórias, como é o caso da interpelação judicial, dada sua função teleológica de proteger o outorgante (e também do interpelado) contra os riscos do excesso do mandato.

Assim, por defeito de representação, o processo é de ser sumariamente arquivado.

MERITO

3. Juntando cópia de exemplar do Jornal Zero Hora edição de 5 de novembro de 2005, o Interpelante pediu que o ora Suplicante explicasse o sentido que pretendeu conferir à frase: “o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (Roberto Busato) não conhece nada juridicamente”.

O Requerente deseja registrar, antes de tudo, que não conferiu conteúdo ofensivo à frase e que ao pronunciá-la não o fez com o propósito de macular a honra objetiva ou subjetiva do Doutor Roberto Antonio Busato.

Entende, data vênia, que nem o próprio Interpelante a considerou como inquestionavelmente ofensiva, tanto assim que optou por ingressar com o pedido de explicações, isto é, com a presente medida preparatória, que tem por finalidade precípua o aprofundamento dos fatos, para propiciar a eventual identificação de ofensa.

Conforme lição desse egrégio Superior Tribunal de Justiça, “o que se procura saber, por meio da explicação, é o que realmente quis dizer o autor da referencia, alusão ou da frase. Em outras palavras, as explicações do notificado se destinam a esclarecer se a inferência do notificante corresponde ao que aquele pretendeu exteriorizar” (Revista Trimestral de Jurisprudência, volume 79, pagina 25).

Insiste o Requerente que não ofendeu e não quis ofender o eminente Presidente da nobre Ordem dos Advogados do Brasil, a quem respeita e homenageia pelas relevantes funções que ocupa na defesa dos valores em se estrutura o nosso Estado Democrático de Direito.

Em verdade, o ora Peticionário considera que, ao empregar a citada frase, outra coisa se não se pronunciar, instado pela Imprensa, no debate desencadeado por representantes da egrégia Ordem dos Advogados do Brasil acerca do posicionamento dos Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil.

No dia 30 de outubro o ilustre Presidente da Comissão Antinepotismo da OAB., Dr. Vladimir Rossi havia afirmado ao Globo que a Resolução do CNJ tinha que ser cumprida e que a legislação estadual não poderia prevalescer.

O ora Requerido contestou essa manifestação (ver clipping, em anexo), afirmando que o Conselho Nacional de Justiça não tinha legitimidade para legislar, garantindo, de qualquer modo, que o nepotismo está banido no Rio Grande do Sul.

Na mesma data, o digno Presidente da OAB e ora Requerente, conforme o clipping em apenso, ao tomar conhecimento da reação contraria de parte da magistratura à Resolução n. 7, do CNJ, afirmou que a contratação desregrada de parentes podia acobertar a pratica de atos de corrupção no Poder Judiciário e no dia 3 de novembro afirmou, em Manaus, que a citada reação constitua um descalabro e um desproposito”.

Por conseguinte, ao se manifestar, nos termos já referidos, no dia 5 de novembro (cfe. clipping em anexo), sobre as declarações do ilustrado Presidente, carregadas de potencialidade ofensiva, data vênia, porque o acobertamento de atos de corrupção, o descalabro e o desproposito são incompatíveis com as ações inerentes aos cargos e as políticas que os presidentes dos Tribunais de Justiça, dentre eles o ora Interpelado, traçam e executam, na órbita do Poder judiciário dos Estados, o Peticionário nada mais fez senão contradita-las e ao mesmo tempo posiciona-las sob a perspectiva exclusivamente jurídica, sob o argumento de que o que deveria preponderar era a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul e não a Resolução do CNJ.

Esse entendimento a consistente, na visão do Suplicante, ante o conhecido principio de que as normas constitucionais preponderam sobre as de hierarquia inferior. O Requerente dispensa aprofundamentos quanto a esse ponto, em homenagem a Vossa Excelência e também ao ilustrado Interpelante, que é um conhecido e qualificado jurista.

Então, ao se inteirar das declarações antes registradas e ao responder às perguntas da jornalista Marciele Brum – do Jornal Zero Hora – Requerente agiu não com o fim de agredir a honra do digno Presidente da OAB, mas isto sim, com o propósito de esclarecer a opinião publica sobre a sua posição quanto a norma incidente, nesse só aparente conflito de normas reguladoras dessa polemica questão da contratação de familiares de magistrados, no serviço publico do Poder Judiciário.

Mesmo que a frase empregada pudesse configurar injuria, o que o Requerido admite, neste momento, só para poder argumentar, ainda assim não haveria sentido nesta interpelação, como medida preparatória de futura ação penal, por inexistir crime contra a honra a punir, ante o entendimento pretoriano de que não são ofensivas as palavras quando proferidas ou “… no calor de debates” ou em “em entrevista coletiva” a Imprensa, por configurar modalidade de retorsão imediata (Revista dos tribunais, n. 593/414, relator Rafael Mayer, in ALBERTO FRANCO, Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, RT., São Paulo, 7a,. ed., 2001, vol. 2, p. 2335), como na espécie.

4. O Requerente e o Requerido são homens públicos que ocupam cargos e exercem funções publicas de extraordinária relevância e que, por isso mesmo, estão, cotidianamente, sujeitos ao debate, às pressão da mídia, sendo daí imperiosa a compreensão da extensão e profundidade das palavras dadas como supostamente ofensivas nos limites fática e politicamente acima contextualizados.

REQUERIMENTO

5. Por todos esses motivos, o Requerente vem apresentar a sua resposta ao presente pedido de explicações, postulando que os autos sejam arquivados, por defeito na representação o processual do ora interpelante.

Se, por hipótese, Vossa Excelência entender de ordenar a entrega dos autos ao Interpelante, pede, então, que o faça em despacho sem valoração ou manifestação de mérito.

E que, chancelando a melhor doutrina (ROGERIO TUCCI, Pedido de Explicações, Ciência Penal, 1979, 2/71; ANIBAL BRUNO, Direito Penal, 1966, V. iv, P. 338, CUSTODIO DA SILVEIRA, Direito Penal, I vol. II, p. 209, HELENO FRAGOSO, Ligges de Direito Penal, 1955, v. I, p. 146 e CELSO DELMANTO, Código Penal Comentado, Renovar, 2000, p. 288), a expressão “a critério do juiz, usada tanto no Código Penal (art 144) como na Lei de Imprensa.(art 25, parágrafo 10), no entender do STJ, “se refere ao Juiz perante o qual for proposta a ação penal subseqüente, e não ao pedido de explicações”, (Questão de Ordem na Petição n. 4/PR, Corte Especial do STJ, rel. Min. Bueno de Souza, j. em 9.11.1989, publ. DJU de 5.2.1990, p. 445, RSTJ, vol. 00007, p. 00227, RT, Vol. 00656, p. 00336).

Porto Alegre, 11 de janeiro de 2006

José Antonio Paganella Boschi

OAB 54.617

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