Carnaval com futebol

Gaviões da Fiel desfila e concorre no Grupo Especial

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21 de fevereiro de 2006, 20h00

Ao contrário do que determinou a Ligas das Escolas de Samba, a Gaviões da Fiel vai desfilar e ser julgada no concurso das escolas sob os mesmo critérios estabelecidos para todos os participantes do Grupo Especial. A decisão é da 33ª. Vara Cível de São Paulo que aceitou Embargos de Declaração da escola corintiana.

A Justiça paulista já havia garantido a participação da escola no Grupo Especial, mas a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo divulgou um Regulamento Oficial para o Carnaval de 2006 que contraria a decisão da Justiça.

O texto estabelece que a Gaviões desfila no Grupo Especial mas inventou um concurso especial para enquadrar a escola num recém-criado “Grupo Especial das Escolas de Samba Esportivas”. A Gaviões é o braço carnavalesco da torcida organizada do mesmo nome que apóia o Corinthians nos estádios de futebol.

Com a decisão da Justiça, que a Liga promete acatar, o Grupo das Esportivas terá a participação de uma única escola, a Mancha Verde, do Palmeiras. A escola já pode comemorar o título de campeã.

Contra a decisão da Liga Independentes das Escolas de Samba, a Gaviões alegou na Justiça que teme ser impedida de participar do concurso do Grupo Especial, o que implicaria em grandes perdas.

Para o juiz que aceitou o pedido de embargos da escola “não fosse a insistência da ré em procurar utilizar todo o tipo de subterfúgio para tentar descumprir a decisão judicial que lhe fora desfavorável, seria desnecessário mencionar que a decisão que assegura à Gaviões da Fiel Torcida a participação no Grupo Especial Geral pressupõe que esta escola será julgada pelos mesmos jurados e pelos mesmos critérios, de forma a permitir a concorrência salutar e igualitária com todos os demais participantes deste seleto grupo especial geral.”

A escola também comprovou que a Liga também alterou o dispositivo do artigo 45 do regulamento que permitia o uso de símbolo de clube. Para o juiz, “mal disfarça a ré [a Liga] a sua pretensão de ver afastado o símbolo de clube de futebol a que notoriamente se vincula a autora Gaviões da Fiel. Seria o mesmo que assegurar um veto — sem razão justificável se não um desejo incontido e mal disfarçado de afastar a vinculação do público à escola — aos demais símbolos que fazem parte do pavilhão das demais escolas.”

Por isso o juiz estabeleceu que essas cláusulas da resolução que vão de encontro com as decisões judiciais são nulas. E em caso de descumprimento da decisão,independentemente da responsabilidade criminal por prática de crime de desobediência, a Liga deverá pagar R$ 50 mil de multa.

Processo: 583.00.2005.082749-0

Leia a íntegra da sentença:

Vistos.

1. Levando em conta que os autos do processo continuam em poder do procurador do réu para possível apelação, sem retornar, até esta data, ao Cartório, passo analisar a petição, autuada como expediente, em face da possibilidade de perecimento do direito, devendo a Escrivania providenciar, oportunamente, sua juntada aos autos.

2. Informa a autora, sob a forma de novos embargos declaratórios, que a despeito da garantia registrada na sentença, permanecerá vulnerável a artifícios e artimanhas que poderão ser apresentados, com fundamento em arestas entrevistas pela ré, no momento do desfile, ceifando, assim, e de chofre, a apoteose rica e paulatinamente preparada no curso de mais um ano, hipótese que, se ocorrida, importará posterior, odiosa e insuficiente demanda reparatória. E forçoso é admitir que seu temor não é infundado.

A sentença não deixou qualquer dúvida sobre a inclusão da autora GRÊMIO GAVIÕES DA FIEL TORCIDA no GRUPO ESPECIAL GERAL do carnaval de 2006. Do dispositivo da sentença, constou,

“JULGO PROCEDENTE o pedido, mantendo a tutela antecipada anteriormente concedida, suspendendo os efeitos da deliberação da LIGA que afastou a autora do desfile do Grupo Especial Geral, para o fim de garantir à autora GREMIO GAVIÕES DA FIEL TORCIDA o direito de participar daquele grupo e do respectivo desfile do Carnaval de 2006 nos dias que lhe são próprios.” Não há dúvida, portanto, que a autora GAVIÕES DA FIEL deveria participar do respectivo Carnaval de 2006 nos dias que lhe são próprios e no GRUPO ESPECIAL GERAL, o que equivaleria a dizer – e seria completamente desnecessário explicitar, se não fosse a insistência da ré em encontrar subterfúgios – segundo as regras aplicáveis às demais escolas do mesmo GRUPO ESPECIAL GERAL.

As razões que levaram este magistrado a admitir esta circunstância constam especificamente da sentença, sendo desnecessário repeti-las e têm relação com a injustiça do afastamento, sob suposta tentativa de conter a possibilidade de violência entre torcidas rivais, mas que somente alimentaria, isto sim, eventual processo neste sentido, com a criação do GRUPO ESPECIAL ESPORTIVO. O dispositivo suspenso, que aparentemente teria o escopo de especializar o carnaval, evitando que a violência entre torcidas se espraiasse, provoca sentido contrário à sua finalidade e vem sendo usado, aparentemente, pelas demais escolas, de forma abusiva – o que a insistência em subterfúgios para deixar de cumprir a decisão também sugere – apenas como instrumento para evitar a concorrência das escolas filiadas a torcidas organizadas vinculadas a times de futebol.

O texto votado no dia 16 de janeiro de 2006 – logo depois da publicação da sentença e tendo esta como motivação – como Regulamento Oficial para o Carnaval de 2006, prevendo que “em virtude da decisão judicial prolatada pela 33ª Vara Cível da Capital a agremiação GAVIÕES DA FIEL TORCIDA participará dos desfiles do GRUPO ESPECIAL, em relação ao concurso, por decisão unânime, a agremiação ficará sujeita aos critérios de competição do grupo Especial das Escolas de Samba Esportivas” (este grifo é meu)(conforme artigo 46 do Regumento Oficial de Carnaval do Grupo Especial de 2005)” é frontalmente contrária à própria decisão judicial, assegurando à GAVIÕES DA FIEL há quase seis meses participação no GRUPO ESPECIAL GERAL, nos dias que lhe são próprios e com as suas regras respectivas, e não outras agora criadas para um novo grupo especial esportivo.

Aquela antecipação da tutela foi confirmada pela segunda instância, que não a suspendeu, em que pese o agravo interposto e pela própria sentença depois prolatada. Não fosse a insistência da ré em procurar utilizar todo o tipo de subterfúgio para tentar descumprir a decisão judicial que lhe fora desfavorável, seria desnecessário mencionar que a decisão que assegura à GAVIÕES DA FIEL TORCIDA a participação no GRUPO ESPECIAL GERAL pressupõe que esta escola será julgada pelos mesmos jurados e pelos mesmos critérios, de forma a permitir a concorrência salutar e igualitária com todos os demais participantes deste seleto grupo especial geral. Mas não é só.

Reclama a autora – e também lhe assiste razão – que a ré, no mesmo dia 16 de janeiro p.p., também alterou um dispositivo com vista a atingi-la e desrespeitar a decisão judicial que assegurou a sua participação no GRUPO ESPECIAL GERAL ao qual fora elevada por méritos próprios. Teria a ré alterado o dispositivo do artigo 45 do Regulamento anterior, que permitia o uso de símbolo de clube, “(i) quando os mesmos fizerem parte do símbolo da agremiação constante de seu primeiro pavilhão (desde que exposto exatamente como constou de seu pavilhão oficial)”, ou “(ii) quando comprovadamente sua utilização encontrar evidente justificativa no enredo”, para simplesmente inserir nova norma estabelecendo que: “Fica proibido o emprego de símbolos de clubes de futebol (distintivos, brasões, etc) em alegorias, fantasias e indumentárias de merendeiros)” (artigo 12, letra “c” do novo regulamento). Mal disfarça a ré a sua pretensão de ver afastado o símbolo de clube de futebol a que notoriamente se vincula a autora GAVIÕES DA FIEL. Seria o mesmo que assegurar um veto – sem razão justificável se não um desejo incontido e mal disfarçado de afastar a vinculação do público à escola – aos demais símbolos que fazem parte do pavilhão das demais escolas. Seria o mesmo que abolir a coroa que simboliza a IMPÉRIO DA CASA VERDE (conferir site http://www.imperiodecasaverde.com.br/), ou a letra “x” e o algarismo “9” da X-9 PAULISTANA (conferir site http://www.x9paulistana.com.br), ou a águia da ÁGUIA DE OURO (conferir site http://www.aguiadeouro.com.br), para citar apenas algumas dentre as escolas deste grupo especial. A escola GAVIÕES DA FIEL sempre trouxe em seu pavilhão a figura do gavião que segura o símbolo do time S.C. CORINTHIANS PAULISTA, conforme pode ser observado do próprio símbolo retirado do site da escola (http://www.gavioes.com.br), que segue abaixo:

E a retirada deste símbolo do time – inserto no pavilhão da escola –, portanto, seria a retirada da própria alma desta escola que sempre procurou identificação com aquela agremiação esportiva, assim como fazem outros com identificação por regiões da cidade, criando verdadeira comunidades envolvidas com a escola em cada um dos bairros da capital. Ainda que movida por interesses nobres, o que não se evidencia à primeira vista, em face das outras atitudes da própria ré, não há nada que possa justificar a mudança de regulamento de última hora que pode prejudicar a escola GAVIÕES DA FIEL, inclusive no que pertine à confecção de carros alegóricos, alegorias, adereços, etc, que não são realizados no mês previsto para a realização do desfile. Em outras palavras, mais uma vez, necessária a intervenção do Poder Judiciário, para evitar que se prejudique o desfile da escola GAVIÕES DA FIEL no GRUPO ESPECIAL GERAL do carnaval de 2006 desta cidade de São Paulo.

3. Levando em conta que o magistrado deve assegurar providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento da tutela determinada (artigo 461 do C.P.C. com a redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994), e que, segundo o parágrafo quinto do mesmo dispositivo: “§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. (Redação dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)”, hei por bem fixar – independentemente da responsabilidade criminal por prática de crime de desobediência – multa equivalente a R$ 50.000,00 por cada ato que revele intenção de descumprimento da antecipação de tutela e sentença já prolatadas, que asseguram – seria desnecessário mencionar – à GAVIÕES DA FIEL TORCIDA a participação no GRUPO ESPECIAL GERAL do Carnaval 2006, pressupondo que esta escola será julgada pelos mesmos jurados e pelos mesmos critérios, de forma a permitir a concorrência salutar e igualitária com todos os demais participantes deste seleto grupo especial geral. Pelo mesmo motivo, aparente desvio para deixar de cumprir a decisão ou impor norma nova às vésperas do pleito, com vista a prejudicar a preparação da autora GAVIÕES DA FIEL, ficam suspensas as alterações recentemente realizadas com vista à utilização do símbolo de clubes, permanecendo em vigor o anterior dispositivo, que até mesmo prevê limitação de uso, mas sem proibir, no entanto, símbolo relacionado ao pavilhão da escola ou relacionado com o enredo, fixando a mesma multa à ré, para cada um dos atos que visem dificultar ou impedir o cumprimento deste direito que fora assegurado à autora. Int.

3. Ante o exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido, mantendo a tutela antecipada anteriormente concedida, suspendendo os efeitos da deliberação da LIGA que afastou a autora do desfile do Grupo Especial Geral, para o fim de garantir à autora GREMIO GAVIÕES DA FIEL TORCIDA o direito de participar daquele grupo e do respectivo desfile do Carnaval de 2006 nos dias que lhe são próprios. Por força do princípio da sucumbência, CONDENO a ré a suportar as custas e despesas do processo, além de honorários advocatícios ao procurador da autora, que fixo, observando os parâmetros do parágrafo quarto do artigo 20, do Código de Processo Civil, em R$ 10.000,00. P.R.I. – preparo no valor de R$ 202,61 – porte de remessa no valor de R$ 71,12

3.- Por último, recebo a petição de fls. 805/806 como embargos de declaração, unicamente para “DECLARAR nulo o negócio jurídico mencionado”, que decorreria do próprio reconhecimento do abuso de direito e da suspensão dos efeitos (todos mencionados anteriormente na sentença). P.R.I., certificando-se no registro anterior. Sentença registrada às fls. 156/157, do livro nº 432, sob o nº 113/06.

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