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Celular não dá remuneração por sobreaviso, decide TRT-SP

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17 de fevereiro de 2006, 13h04

O uso de celular fornecido pelo empregador não obriga o trabalhador a ficar dentro de sua casa, à disposição da empresa. Contudo, a utilização do meio de comunicação pela internet, como o Messenger (serviço de bate-papo online), pode dar direito ao pagamento do sobreaviso previsto na Consolidação das Leis do Trabalho.

O entendimento é da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) e foi aplicado no julgamento do Recurso Ordinário da Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo. Os juízes livraram a empresa de pagar a um ex-empregado o sobreaviso.

“Entendo, data máxima vênia, que à exceção da internet por meio de programas de comunicação tal como videoconferência ou Messenger, qualquer outro meio de comunicação para fins de caracterização de ‘horas de sobreaviso’ é imprestável, eis que nenhum deles efetivamente cerceia ou é fator impeditivo da liberdade de locomoção prevista pelo artigo 244 da CLT”, decidiu a relatora do recurso, juíza Lilian Lygia Ortega Mazzeu.

A primeira instância condenou a Eletropaulo a pagar a um ex-empregado o adicional previsto no artigo 244, parágrafo 2º, da CLT, por obrigar o eletriciário a ficar com o telefone celular, fora da jornada de trabalho, podendo ser convocado pela empresa a qualquer momento.

A lei considera de sobreaviso “o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. (…) As horas de ‘sobreaviso’, para todos os efeitos, serão contadas à razão de um terço do salário normal”.

Para a juíza Lilian Lygia Ortega Mazzeu, “o artigo 244, que trata do assunto, foi editado especificamente aos ferroviários, tendo sido aplicado por analogia a outras categorias funcionais”.

“A época de sua redação, não existiam como meios de comunicação equipamentos que hoje fazem parte de nosso dia-a-dia, sendo corriqueiro e acessível o seu uso a qualquer pessoa independente de condição financeira”, explicou.

“Com a telefonia móvel, fixa e todos os outros meios de comunicação, o empregado pode ser encontrado a qualquer tempo, em qualquer lugar, independente deste estar ou não em sua casa, podendo ou não estar quer seja no convívio com sua família em momento de lazer ou mesmo laborando para outro empregador ou dispondo de seu tempo como melhor lhe aprouver”, observou a juíza.

Leia a íntegra da decisão

Processo TRT/SP No 02105200100602852 (20050823625)

Recurso Ordinário –

Recorrente: ELETROPAULO METROPOLITANA ELETRICIDADE DE SÃO PAULO SA

Recorrido: CARLOS CAMILO DE SOUZA

Origem: 6ª Vara do Trabalho de São Paulo

“EMENTA: SOBREAVISO- Não reconhecido :Prevê o artigo 244 parágrafo 2o da CLT o pagamento de sobreaviso àqueles que permanecessem aguardando em casa o chamado da empresa.Com a telefonia móvel, fixa e todos os outros meios de comunicação, o empregado pode ser encontrado a qualquer tempo, em qualquer lugar, independente deste estar ou não em sua casa, podendo ou não estar quer seja no convívio com sua família em momento de lazer ou mesmo laborando para outro empregador ou dispondo de seu tempo como melhor lhe aprouver. Entendo ” data máxima vênia” que à exceção da internet por meio de programas de comunicação tal como ” vídeo conferência” ou “messenger”, qualquer outro meio de comunicação para fins de caracterização de “horas de sobreaviso” é imprestável, eis que nenhum deles efetivamente cerceia ou é fator impeditivo da liberdade de locomoção prevista pelo artigo 244 da CLT”

Vistos, etc…

Trata-se de recurso ordinário, interposto pela reclamada, da r. sentença de fls. 764/768, proferida pela Exma Juíza PATRICIA ESTEVES DA SILVA, que julgou PROCEDENTE EM PARTE a reclamação trabalhista, cujo relatório adoto.

Razões do recurso ordinário, a fls. 779/791, argüindo preliminarmente a prescrição bienal da função acessória e, no mérito pedindo a reforma da decisão no que tange às diferenças de horas extras e reflexos, intervalo de refeição e descanso, sobreaviso e compensação.

Recurso subscrito por advogado com procuração nos autos.

Custas e depósito recursal recolhidos a fls. 795/796.

Regularmente notificado, o reclamante não apresentou contra-razões.

É o relatório.

VOTO

I – CONHECIMENTO

Conheço do apelo, posto que obedecidas as formalidades legais.

II – FUNDAMENTAÇÃO

PRELIMINAR

DA PRESCRIÇÃO BIENAL DA FUNÇÃO ACESSÓRIA

Alega a recorrente que tendo sido suprimida em 1999 a verba pleiteada, por ato único do empregador, a lesão ao direito ocorreu em tal data, sendo certo que o prazo prescricional passou a correr da data da supressão, estando prescrito o direito do autor pleitear a referida função acessória.


Assim, requer seja acolhida a prescrição bienal.

Razão não assiste à recorrente, tendo em vista que o reclamante foi dispensado em 02.05.2001, e nos termos do art. 7º, XXIX:

“art. 7º ..

XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato”.

Assim, não há que se falar em prescrição bienal da função acessória.

Rejeito a preliminar argüida.

MÉRITO

DAS HORAS EXTRAS

Insurge-se a reclamada contra a r. sentença de piso argüindo que nas ocasiões em que o reclamante prorrogou sua jornada diária, sempre as horas suplementares foram quitadas com o acréscimo pertinente, ou concedidos descansos compensatórios sem que houvesse prejuízo ao recorrido.

Quanto aos reflexos, alega que não pode incidir adicional sobre adicional, principalmente sobre os de verbas indenizatórias, como adicional por tempo de serviço, gratificação de função, complemento de função, adicional de turno, função acessória e integração na função acessória.

Aduz que as horas extras laboradas sempre tiveram os reflexos nos pagamentos dos DSR’s, férias e respectiva gratificação, gratificação natalina e outros títulos de direito.

Assim, pleiteia a reforma da r. sentença de origem.

Em sua peça vestibular o reclamante alegou que sua jornada contratual era de segunda a sexta-feira das 8:30 às 17:00 horas, porém que o mesmo entrava todos os dias às 7:00 horas, prorrogando sua jornada até às 20:00 horas, quatro vezes por semana, usufruindo de 30 minutos de intervalo para refeição e repouso.

A reclamada nega o labor extraordinário.

Em audiência de instrução o reclamante ratifica os termos de sua petição inicial, enquanto a reclamada, ratifica o mesmo, porém diz que o intervalo intrajornada é de 1:30 horas e não de uma hora como consta na contestação.

A testemunha do reclamante confirmou o horário declinado na exordial, afirmando que o controle sempre foi efetuado através de cartão de ponto.

A testemunha da reclamada afirmou que o horário foi controlado até 2001 através de cartões de ponto, e que não havia controle no setor do reclamante.

A reclamada junta aos autos relatório mensal de marcação, porém não estão presentes todos os controles referentes ao período imprescrito, e mesmo nos que se apresentam não constam todos os dias laborados pelo reclamante.

Ora, ao negar o trabalho extraordinário, a reclamada atraiu para si o ônus de provar o alegado, nos termos do art. 333, II do CPC, e deste ônus não se desvencilhou, e, dessa forma, correta a r. sentença de piso.

Nego, portanto, provimento ao apelo no particular.

DO INTERVALO PARA REFEIÇÃO E DESCANSO

Aduz a recorrente que merece reforma a r. sentença do Juízo ‘a quo’ neste ponto, eis que restou comprovado que o reclamante usufruía de tal horário para refeição e descanso.

Que, se este não for o entendimento, que seria devida ao recorrido, somente o adicional de 50% sobre o restante do intervalo não usufruído , não devendo o mesmo refletir sobre verbas outras, eis que meramente de caráter indenizatório.

O reclamante alegou em inicial e em depoimento pessoal ter usufruído de somente trinta minutos de intervalo para refeição e repouso.

A reclamada em contestação alega que o reclamante usufruía de uma hora de intervalo intrajornada. Já em depoimento pessoal afirmou que este intervalo era de uma hora e meia, sendo que sua testemunha disse que era de uma hora.

Tendo em vista a falta dos controles de ponto, e a contradição entre contestações e os depoimentos prestados em audiência, tem-se como correto o intervalo alegado pelo reclamante em sua peça inicial, pelo que correta a r. sentença de piso.

Nego, portanto, provimento ao apelo no particular.

DO SOBREAVISO

Requer a recorrente a reforma da r. sentença para que seja excluído da condenação as horas de sobre aviso, conforme Orientação Jurisprudencial 49 da SDI-1, do C. TST.

O artigo 244 que trata do assunto foi editado especificamente aos ferroviários, tendo sido aplicado por analogia a outras categorias funcionais.

Ocorre entretanto que à época de sua redação, não existiam como meios de comunicação equipamentos que hoje fazem parte de nosso dia a dia, sendo corriqueiro e acessível o seu uso a qualquer pessoa independente de condição financeira, como por exemplo o telefone celular (pré ou pós-pago), Pager, bip e de forma mais dispendiosa a internet com seus inúmeros programas de comunicação “on line” (vídeo conferência, messenger, etc).

Desta forma, encontra hoje o legislador a necessidade de adequar o artigo supra à realidade em que vivemos.


Prevê o artigo 244 parágrafo 2o da CLT o pagamento de sobreaviso àqueles que permanecessem aguardando em casa o chamado da empresa.

“Art. 244 – As estradas de ferro poderão ter empregados extra numerário de sobreaviso e de prontidão, para executarem serviços imprevistos ou para substituições de outros empregados que faltem à escala organizada. (Redação dada pela Lei nº 3.970 , de 13-10-61, DOU 16-10-61, que foi revogada e depois restaurada pelo Decreto-lei n.º 5 , de 04-04-66, DOU 05-04-66)

§ 1º -…

§ 2º – Considera-se de “sobreaviso” o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de “sobreaviso” será, no máximo, de 24 (vinte e quatro) horas. As horas de “sobreaviso”, para todos os efeitos, serão contadas à razão de 1/3 (um terço) do salário normal. (Redação dada pela Lei nº 3.970 , de 13-10-61, DOU 16-10-61, que foi revogada e depois restaurada pelo Decreto-lei n.º 5 , de 04-04-66, DOU 05-04-66)”

Considerando-se que à época da redação do artigo supra a telefonia fixa era privilégio de poucas pessoas, realmente se fazia necessário que o obreiro aguardasse sem a possibilidade de sair de sua casa, o chamamento da empregadora.

Com a telefonia móvel, fixa e todos os outros meios de comunicação, o empregado pode ser encontrado a qualquer tempo, em qualquer lugar, independente deste estar ou não em sua casa, podendo ou não estar quer seja no convívio com sua família em momento de lazer ou mesmo laborando para outro empregador ou dispondo de seu tempo como melhor lhe aprouver.

Entendo “data máxima vênia” que à exceção da internet por meio de programas de comunicação tal como “vídeo conferência” ou “messenger”, qualquer outro meio de comunicação para fins de caracterização de “horas de sobreaviso” é imprestável, eis que nenhum deles efetivamente cerceia ou é fator impeditivo da liberdade de locomoção prevista pelo artigo 244 da CLT.

O próprio TST reconheceu que o uso de “bip” – que hoje já se modernizou – não caracteriza o sobre aviso, exatamente pelos motivos exposto supra.

“49 – Horas extras. Uso do BIP. Não caracterizado “o sobreaviso”. (Inserida em 01.02.1995. Nova redação – Res. 129/2005, DJ. 20.04.2005)

O uso do aparelho BIP pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço “”.

A situação atual conforme exposto é totalmente diferente da época da redação do dispositivo legal, beneficiando a empresa – que com todos os meios a seu favor conta com o funcionário, pode chamá-lo quando for necessário sem a necessidade de que este permaneça dentro de casa- caracterizando o sobreaviso, e complicando a situação do obreiro que dificilmente consegue demonstrar que estava realmente em sua residência aguardando o chamado de sua empregadora.

Como conseqüência lógica, entendo que o sobreaviso, nos termos previsto no artigo 244 CLT cada vez mais encontrará dificuldade em sua caracterização.

Em assim sendo, impõe-se a reforma da decisão de origem, eis que não restou provado que o autor efetivamente aguardava em sua residência a convocação da ré, excluindo da condenação o pagamento das horas de sobreaviso.

DA COMPENSAÇÃO

Pleiteia a recorrente, que se mantida a condenação, seja reformada a sentença no que se refere à compensação, devendo ser considerados os valores pagos a título da transação, nos termos do art. 158 do CPC.

A indenização paga pela adesão ao Plano de Demissão Voluntária refere-se exclusivamente à garantia de emprego, possuindo natureza jurídica diversa das pleiteadas no presente processo, descabendo, portanto, qualquer compensação além daquelas já deferidas de outros títulos.

Nego, portanto, provimento ao apelo no particular.

III – DISPOSITIVO

Isto posto, conheço do recurso, rejeito a preliminar argüida e, no mérito, dou provimento parcial ao recurso da reclamada, para excluir da condenação o pagamento das horas de sobreaviso, mantendo os demais tópicos da r. sentença de primeiro grau pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Fica mantido o valor da condenação para efeitos de alçada.

É o meu voto.

Lilian Lygia Ortega Mazzeu

Juíza Relatora

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