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Supremo discute extradição de pessoa inimputável

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16 de fevereiro de 2006, 6h00

O Supremo Tribunal Federal deu um passo, nesta quarta-feira (15/2), que poderá levar a corte a rever seu posicionamento quanto à extradição de inimputáveis. Ao julgar o pedido para entregar o italiano Corso Domenico Pantaleo ao seu país, os ministros decidiram converter em diligência — incidente de insanidade mental — um agravo de instrumento com o objetivo de submeter Pantaleo a uma perícia, a fim de detectar se ele é ou não inimputável.

O entendimento atual do Supremo foi firmado no julgamento da extradição 553, cujo relator foi o ministro Octavio Gallotti. O acórdão tem a seguinte ementa: “Dúvida fundada sobre a sanidade mental da Extraditanda não constitui motivo do indeferimento do pedido, nem da conversão do julgamento em diligencia, tampouco da instauração de incidente, com vistas a declaração de inimputabilidade”. A possibilidade de diligência já foi superada no julgamento de hoje. Resta saber se a inimputabilidade representará obstáculo para a entrega do extraditando ao seu país.

Durante os debates, o plenário ficou dividido. O italiano foi defendido pelo defensor público-geral da União, Eduardo Flores Vieira, que fez sua primeira sustentação oral no Supremo, como titular do cargo.

“(…) O caso em apreço cuida-se apenas de medida de segurança, que não se confunde com pena de prisão, e com ela não tem condições de se deferir extradição, pois falta um dos requisitos da Lei e do Tratado Internacional, que é a existência de ‘sentença final de privação de liberdade’, pois não se extradita ninguém para cumprir medida de segurança ou restritiva de direitos”, alegou Flores Vieira. Ele lembrou ainda que, antes de ser concedida a extradição, houve um agravo de instrumento no qual se requeria o incidente de insanidade mental.

O procurador-geral da República, Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, posicionou-se a favor da extradição. Para ele, ao contrário do que afirmava o defensor-geral, a documentação necessária ao pedido do governo italiano, com conteúdo satisfatório, estava nos autos.

O PGR foi o primeiro a citar a extradição 553 para conceder o pedido. Seu entendimento é de que a inimputabilidade não retira o caráter criminoso da conduta. Além disso, sua avaliação deve ficar a cargo do governo requerente.

Em seu relatório, o ministro Joaquim Barbosa seguiu caminho idêntico. Lembrou da internação de Pantaleo em dezembro de 1994 em um hospital psiquiátrico, pelo prazo de 3 anos e onze meses.

Segundo o réu, ele teria vindo para o Brasil em razão de ameaças de morte. Mas Joaquim Barbosa seguiu a tese de que, no caso, a culpabilidade não influenciaria na tipicidade.

Para que se entenda, a teoria penal define que o crime, sob o aspecto analítico, é fato típico e antijuríco – e haveria ainda a aferição da culpabilidade, como pressuposto de cumprimento da pena.

Grosso modo, o fato típico é aquele descrito no código penal ou em leis penais, um modelo que descreve as condutas humanas consideradas criminosas pela legislação de um país. O fato antijurídico é aquele contrário à lei. Por fim, a culpabilidade diz se o autor deverá sofrer, nas palavras de Fernando Capez, um “juízo de reprovação pelo crime que cometeu”.

Mas, ressaltou o ministro Celso de Mello que a imputabilidade é pressuposto da culpabilidade. Ou seja, alguns agentes, em razão da sua condição, não podem ser imputados quando de condutas criminosas — não se configurando, assim, a situação de criminalidade. É o caso dos menores e daqueles que, em razão de suas condições mentais, não têm consciência dos delitos que cometem. Celso de Mello citou decisão da Suprema Corte norte-americana que, no início da década, considerou inconstitucional a execução de inimputáveis (menores).

O ministro Pertence citou precedentes do Supremo nos quais o tribunal não concedeu a extradição de inimputáveis. No caso, porém, tratava-se de menores de idade cujos pedidos de seus países não foram concedidos.

O ministro Marco Aurélio, que votara antes de Celso de Mello, deu provimento ao agravo para a realização do incidente de insanidade mental. O ministro apelou aos pares no sentindo de avaliarem bem a decisão de extraditar uma pessoa cuja debilidade mental já havia sido comprovada em sentença de uma corte de seu país.

Evoluindo a partir da questão levantada por Marco Aurélio, Celso de Mello sugeriu a conversão do agravo de instrumento em diligência — que seria a realização da perícia no réu. A partir daí, a análise dos ministros poderá mudar o entendimento do Supremo.

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