Contrato internacional

Empregado transferido decide onde entra com ação trabalhista

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15 de fevereiro de 2006, 13h10

A Justiça do Trabalho brasileira é competente para julgar ação de trabalhador que começou a atividade profissional no Brasil e depois foi transferido para o exterior. O entendimento é da 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP).

Descontente com decisão de primeira instância que entendeu pela incompetência da Justiça do Trabalho para julgar a causa, o trabalhador recorreu ao TRT de Campinas. Alegou que prestou serviços à empresa Pemstar Indústria Eletromecânica e Eletroeletrônica, no Brasil, antes de ser transferido para o México.

Para o trabalhador, não tem sentido que os pedidos de reconhecimento do vínculo de emprego, recolhimentos de FGTS e de INSS sejam analisados pela justiça de Guadalajara, no México, como decidido pela vara trabalhista.

O relator do recurso, juiz Luiz Roberto Nunes, explicou que houve um único contrato de trabalho, primeiramente cumprido no Brasil, com posterior transferência para o México. “Em que pese o entendimento do juízo trabalhista de 1ª instância, entendo que a Justiça brasileira é competente para conhecer e julgar o litígio, conforme o artigo 651 da CLT”, fundamentou Nunes.

O juiz esclareceu que mesmo ao empregado transferido, compete a ele decidir em que local entrar com a ação: onde já trabalhou ou onde trabalha.

O relator ainda esclareceu que, como os pedidos de fundo de garantia e contribuições previdenciárias estão previstos na legislação brasileira, é mais um motivo para que a reclamação seja julgada pela Justiça do Trabalho do Brasil, conforme previsto na Lei de Introdução ao Código Civil. Por isso, ele reconheceu a competência da Justiça do Trabalho do Brasil e determinou o retorno dos autos à vara de origem, para que o recurso seja julgado.

1090-2004-122-15-00-1 ROPS

Leia a íntegra da decisão

ACÓRDÃO

RECURSO ORDINÁRIO

EM PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO

Processo TRT 15ª Região nº 01090-2004-122-15-00-1

Origem: VARA DO TRABALHO DE SUMARÉ – SP

Recorrente: MARCIO PAVAGEAU

Recorrido: PEMSTAR INDÚSTRIA ELETROMECÂNICA E ELETROELETRÔNICA LTDA.

COMPETÊNCIA TERRITORIAL. CONTRATAÇÃO NO BRASIL. EMPREGADO TRANSFERIDO PARA OUTRO PAÍS.

Em se tratando de um único contrato, em um primeiro momento cumprido no Brasil, com posterior transferência para outro país, a Justiça Laboral brasileira é competente para conhecer e julgar do litígio, ante a exegese que se extrai do artigo 651 da CLT e de seu parágrafo 3º.

RELATÓRIO

O reclamante, às fls. 244/248, pugna pela reforma da sentença de fls. 231/232 que acolheu a preliminar de incompetência e extinguiu o feito, sem julgamento do mérito. Insiste na competência da Justiça do Trabalho Brasileira para dirimir o conflito de interesses, em vista da natureza dos pedidos formulados (reconhecimento do vínculo e conseqüente anotação do contrato em CTPS; recolhimentos de FGTS e contribuições previdenciárias). Invoca legislação, doutrina e jurisprudência em amparo à sua tese.

Foram apresentadas contra-razões pela reclamada, às fls. 253/257.

O processo não foi remetido à D. Procuradoria (artigo 110 do Regimento Interno deste E. TRT e Provimento nº 01/05 da CGJT/TST).

É o breve relatório.

VOTO

Conheço do recurso ordinário, porquanto tempestivo, estando regular a representação processual (fls. 11). Custas recolhidas, às fls. 249.

Competência

Insiste o autor na competência da Justiça do Trabalho Brasileira para dirimir o conflito de interesses, em vista da natureza dos pedidos formulados (reconhecimento do vínculo e conseqüente anotação do contrato em CTPS; recolhimentos de FGTS e contribuições previdenciárias).

Considerando que a contratação foi realizada nos Estados Unidos, tendo o autor prestado inicialmente serviços no Brasil (de julho de 2000 a abril de 2001), com posterior transferência para o México, onde ativou-se até o seu desligamento (06.10.2003), a sentença recorrida concluiu que “a presente ação deveria ter sido aforada no último local da prestação dos serviços, ou seja, em Guadalajara, no México”. Salientou a decisão de origem, ainda, que o autor teria ingressado com ação naquela jurisdição, a qual resultou em composição amigável, inclusive com a outorga de quitação expressa em relação a todas as empresas do Grupo Pemstar, consoante demonstram os documentos acostados aos autos.

Como o processo foi extinto sem a apreciação do mérito, resta inoportuna a invocação da Orientação Jurisprudencial nº 232 da SDI-1 do c. TST, que dispõe acerca da incidência de FGTS sobre as parcelas de natureza salarial pagas a empregado que presta serviços no exterior.

Cinge-se a discussão apenas à competência da Justiça Laboral Brasileira para apreciar as questões postas em Juízo.

De início, cabe ressaltar que houve um único contrato, em um primeiro momento cumprido no Brasil, com posterior transferência para o México – os documentos traduzidos às fls. 12/14 e fls. 17/20, consistentes em propostas de contratação e promoção, são indenes de dúvidas nesse aspecto. A rigor, também não se pode concluir que a contratação deu-se nos Estados Unidos, pois o documento de fls. 213/220 (contrato social da PENSTAR BRASIL LTDA.), em seu capítulo V, CLÁUSULA 5ª, parágrafo 1º, é que efetivamente delega os poderes de gerência ao autor, ratificando a proposta de contratação.

Em que pese o entendimento esposado na origem, entendo que a Justiça brasileira é competente para conhecer e julgar do litígio, ante os termos do artigo 651 do Texto Consolidado.

Não se pode olvidar que no processo civil, a regra da competência territorial é o domicílio do réu (art. 94, CPC), enquanto no processo do trabalho, fixou-se como regra o local da prestação de serviços, onde normalmente reside o trabalhador. Note-se que o caput não prevê a hipótese de transferência, somente ventilada no parágrafo 2º, sendo certo que o texto legal não se refere em nenhum momento à última localidade trabalhada.

Oportuno ainda destacar o quanto disposto no parágrafo 3o do artigo 651 da CLT, que, apesar de se referir à hipótese de atividades eventuais ou nômades, garante a tais empregados a faculdade de aforar reclamatórias nas localidades onde prestou serviços. Assim, entendo que compete ao empregado transferido propor reclamação trabalhista em qualquer localidade onde tenha trabalhado.

Este também já foi o entendimento proclamado pelo C.TST, como segue:

Conjugando-se o disposto no art. 651 da CLT e no seu parágrafo 3º, conclui-se que a transferência definitiva do empregado para localidade diversa daquela em que ocorreu a celebração do contrato faculta-lhe a opção pelo foro da celebração do contrato, sob pena de a transferência, além dos transtornos que lhe pode acarretar, poder constituir instrumento de cerceio do direito de ação após a rescisão contratual. (TST, CC. 241.495/95.9, Manoel Mendes de Freiras, Ac. SBDI-2 565/96 – in COMENTÁRIOS À CLT, Valentin Carrion, Editora Saraiva, 30ª edição, 2005, p. 506).

No caso sob exame, existe ainda uma particularidade: o reclamante está postulando parcelas com respaldo na legislação pátria – FGTS e contribuições previdenciárias – o que atrai a incidência do quanto disposto nos artigos 12 da LICC (“É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver que ser cumprida a obrigação.”) e 88 do CPC (“É competente a autoridade judiciária brasileira quando: I- o réu, qualquer que seja sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II- no Brasil tiver que ser cumprida a obrigação; III- a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil”)

Quanto ao fato de a empresa estar domiciliada no Brasil, oportuno trazer à baila o teor do parágrafo único do artigo 88 do CPC, segundo o qual para o fim do disposto no nº I (supratranscrito) “reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal”, como no caso vertente.

Dou provimento ao recurso, para reconhecer a competência da Justiça do Trabalho do Brasil para apreciar a lide e determinar o retorno dos autos à MM. Vara de origem, para que aprecie as demais matérias, como entender de direito.

Do exposto, decido conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para reconhecer a competência da Justiça do Trabalho do Brasil e determinar o retorno dos autos à MM. Vara de origem, para que aprecie as demais matérias, como entender de direito.

LUIZ ROBERTO NUNES

Juiz Relator

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