Bem de família

STF decide: bem de família de fiador pode ser penhorado

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8 de fevereiro de 2006, 19h25

O Supremo Tribunal Federal firmou, nesta quarta-feira (8/2), entendimento de que não há impedimento para a penhora de bens de família de fiadores nos contratos de locação. A decisão foi tomada por maioria no julgamento de um recurso extraordinário. O voto vencedor foi o do relator da matéria, ministro Cezar Peluso.

A discussão havia sido iniciada no STF com uma decisão do ministro, já aposentado, Carlos Velloso. Em maio, Velloso, em decisão monocrática em outro recurso extraordinário firmou entendimento no sentido contrário da decisão hoje proferida. Para ele, não teria sido recepcionado pelo Constituição da República o inciso VII, do artigo 3° da Lei 8.009/90, que trata da impenhorabilidade do bem de família. O dispositivo exclui da proteção dada pela lei os fiadores em contratos locatícios.

A definição do bem de família está presente no artigo 1.712 do Código Civil. “O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família”.

O ministro Cezar Peluso divergiu da posição adotada quanto ao tema exposto. “Não me parece sólida a alegação de que a penhora do bem de família do recorrente violaria o disposto no art. 6º da Constituição da República. (…) A regra constitucional enuncia direito social, que, não obstante suscetível de qualificar-se como direito subjetivo, enquanto compõe o espaço existencial da pessoa humana independentemente de sua jsuticiabilidade e exeqüebilidade imediatas”, sua dimensão objetiva supõe provisão legal de prestação aos cidadãos, donde entrar na classe dos chamados “direitos a prestações, dependentes da atividade mediadora dos poderes públicos”, apontou o relator.

O relator entendeu que a Constituição não repugna que o direito social à moradia possa ser implementado por uma norma jurídica que estimule ou favoreça o incremento da oferta de imóveis para fins de locação habitacional, “mediante previsão de reforço das garantias contratuais dos locadores”.

Nesse sentido, Peluso lembrou que o direito à moradia não está restrito apenas aos proprietários. Então, caso se acabasse com a penhora do bem de família do fiador, acabaria se restringindo as formas de garantia nos contratos locatícios. Assim sendo, muitos dos que não têm imóveis e vêem no fiador a única possibilidade de garantia para a locação ficariam sem chances de alugar.

“Castrar essa técnica legislativa, que não pré-exclui ações estatais concorrentes doutra ordem, romperia o equilíbrio do mercado, despertando exigência sistemática de garantias mais custosas para as locações residenciais, com conseqüente desfalque do campo de abrangência do próprio direito constitucional à garantia”, disse Peluso.

A divergência foi iniciada pelo ministro Eros Grau. Ele invocou o princípio da dignidade da pessoa humana e o da isonomia para sustentar sua tese. Citou ainda o precedente criado no voto do ministro Carlos Velloso.

Para Eros Grau, a isonomia seria ferida caso um locador, para manter uma poupança com o intuito de comprar uma casa própria, deixasse de pagar os aluguéis, recaindo o ônus sobre o fiador.

“A impenhorabilidade do imóvel residencial é instrumento da proteção do indivíduo e sua família, quanto a necessidades materiais, de sorte a prover sua subsistência. A propriedade, quando exista, consiste em um direito individual e cumpre função individual. Como tal, é garantida pela generalidade das constituições do nosso tempo. A essa propriedade, aliás, não é imputável função social. Apenas os abusos cometidos no seu exercício encontram limitação adequada nas disposições que implementam o chamado poder de polícia”, disse Eros Grau.

Durante os debates, foi invocado pelo ministro Gilmar Mendes o princípio da autonomia da autodeterminação das pessoas. “Um princípio que integra o próprio direito de personalidade”. Para Mendes, trata-se de um princípio que, por tão elementar, sequer aparece no texto constitucional.

Por sua vez, o ministro Celso de Mello tocou na discussão sobre a submissão das relações de caráter privado aos comandos constitucionais. No entanto, apesar de ter votado com a divergência, foi voto vencido, ao lado de Carlos Britto e Eros Grau.

Processos RE 407.688-8 e RE 407.688

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