Falha no serviço

Alergia provocada por negligência médica gera indenização

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7 de fevereiro de 2006, 12h02

Paciente que tem alergia provocada por negligência médica sofre dano moral e deve ser reparado por isso. O entendimento é da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Rio Grande do Sul, que rejeitou recurso do Hospital Mãe de Deus, de Porto Alegre.

Os juízes mantiveram decisão que determinou o pagamento de indenização de R$ 3 mil por danos morais e R$ 49 por prejuízos materiais a um paciente submetido a cirurgia para retirar um cisto. Segundo os autos, depois da alta hospitalar, ele passou a sentir desconforto nas nádegas e constatou a existência de uma alergia na região, causada pela permanência de iodo. Pediu indenização por má prestação de serviços.

Segundo a relatora do caso, juíza Maria José Schmitt Sant’Anna, a responsabilidade civil do hospital é de ordem objetiva, conforme os termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Para ela, não cabe investigar a culpa de seus representantes, mas se o serviço prestado foi defeituoso ou não.

“O dano moral, na hipótese, mostra-se devido em decorrência do sofrimento e abalo psíquico experimentado pela paciente”, concluiu a juíza, mantendo a sentença de primeira instância.

Leia a íntegra da decisão

AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE HOSPITALAR. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. VIDEOLAPAROSCOPIA. APLICAÇÃO DE IODO. ERITEMA NAS NÁDEGAS.

A responsabilidade civil do hospital é de ordem objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, não cabendo investigar a culpa de seus prepostos, mas se o serviço prestado pelo Hospital foi defeituoso ou não. A configuração dos elementos nexo causal e dano geram o dever de indenizar. No caso concreto, o procedimento cirúrgico realizado na autora não ocorreu com a devida cautela, porquanto a mesma após ter tido alta, permaneceu com solução de iodo em suas nádegas, ocasionando-lhe desconforto que, em seguida, tornou-se um eritema, em decorrência do lapso temporal com que a mesma permaneceu com a substância em contato com a pele. O dano moral, na hipótese, mostra-se devido em decorrência do sofrimento e abalo psíquico experimentado pela paciente. Sentença mantida

RECURSO IMPROVIDO.

Recurso Inominado: Segunda Turma Recursal Cível

Nº 71000827337: Comarca de Porto Alegre

AESC – HOSPITAL MAE DE DEUS: RECORRENTE

NORIS TERESINHA NASCIMENTO: RECORRIDO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Juízes de Direito integrantes da Segunda Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Dra. Mylene Maria Michel (Presidente) e Dr. Eduardo Kraemer.

Porto Alegre, 18 de janeiro de 2006.

DRA. MARIA JOSÉ SCHMITT SANT ANNA,

Relatora.

RELATÓRIO

I – Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais. Narra a autora que houve falha na prestação do serviço, porquanto se submeteu a procedimento cirúrgico, videolaparoscopia, e, após sua alta hospitalar, em 24.03.2005, passou a sentir um desconforto em sua nádegas e constatou a existência de um eritema na região pela utilização de iodo. Pediu ressarcimento pelo abalo sofrido em decorrência da má prestação dos serviços.

Seguiu-se sentença de parcial procedência do pedido, com condenação de R$ 49,42 a título de ressarcimento dos prejuízos materiais sofridos e, ainda, ao pagamento da quantia de R$ 3.000,00, a título de indenização por danos morais.

Em recurso tempestivo, a empresa demandada reiterou os argumentos da contestação, postulando a reforma da sentença.

Houve contra-razões.

VOTOS

Dra. Maria José Schmitt Sant anna (RELATORA)

II – A sentença merece ser confirmada por seus próprios fundamentos, o que se faz na forma do disposto no art. 46, da Lei nº 9.099/95 que assim estabelece: O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.

Acresço.

De início, cumpre ressaltar que a responsabilidade civil do hospital é de ordem objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. À vista disso, não cabe aqui investigar acerca da culpa dos prepostos da requerida, mas se o serviço prestado pelo Hospital foi defeituoso ou não. Nesse passo, a configuração dos elementos nexo causal e dano geram o dever de indenizar.

Na dicção de Sérgio Cavalieri Filho (1)“os estabelecimentos hospitalares são fornecedores de serviços e, como tais, respondem objetivamente pelos danos causados aos seus pacientes. Esta responsabilidade, como se constata da leitura do próprio texto legal, tem por fundamento o fato gerador do serviço, que, fornecido ao mercado, vem dar causa a um acidente de consumo. O serviço é defeituoso quando, diz o artigo § 1º do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, não oferece a segurança necessária que o consumidor do produto pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais o modo do seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se espera e a época em que foi fornecido

Conforme se extrai do contexto probatório dos autos, no dia 23.03.2005, a autora foi submetida a procedimento cirúrgico, uma videolaparoscopia, a qual consistiu na retirada de um cisto.

A autora atribuiu a responsabilidade ao Hospital, em decorrência de ter sofrido uma alergia, com um eritema nas nádegas, pela aplicação de iodo, quando da realização do procedimento, para assepsia da região a ser operada, fato este incontroverso, ao Hospital-réu, ao passo que o recorrente alegou a utilização da referida substância, referido, apenas, tratar-se de um “ato médico” e não de um “ato hospitalar”.

O depoimento da preposta da requerida, dá conta da utilização do iodo e os respectivos danos que tal substância pode ocasionar:

“No caso da autora foi utilizado a substância iodo aquoso, somente não utilizada essa substância quando o paciente diz ser alérgico a tal substância. Que aquoso significa a base de água. Que o contato prolongado da referida substância pode causar danos à pele, é raro mas pode causar.”

Diante disso, resta frágil a tese da recorrente.

Assim, reputo defeituosa a prestação do serviço do hospital-recorrente, ao mesmo tempo em que não vislumbro a ocorrência das excludentes do art. 14, § 3º do CDC, cuja prova competia ao réu.

Assim, mostra-se devida a indenização por dano moral.

Não há que se perder de vista que a função preponderante da reparação por dano moral é ressarcitória, devendo guardar correspondência com a gravidade do prejuízo, a fim de compensar a vítima pela lesão efetivamente sofrida. Em outras palavras, a indenização deve guardar razoável proporcionalidade com o dano vivenciado pelo ofendido, à vista das peculiaridades do caso concreto.(2)

É de ser admitido ainda, na apreciação do valor, o caráter expiatório da reparação moral, como diminuição imposta ao patrimônio do réu, pela indenização paga ao ofendido.

Assim, considerando a existência do dano e que a verba fixada a título de reparação de dano moral mostra-se adequada ao caso, tenho que a sentença mereça ser mantida.

III – Pelo exposto, VOTO pelo improvimento do recurso e condenação do recorrente ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95.

Dr. Eduardo Kraemer – De acordo.

Dra. Mylene Maria Michel (PRESIDENTE) – De acordo.

Juízo de Origem: 2.JUIZADO ESPECIAL CIVEL PORTO ALEGRE – Comarca de Porto Alegre

Notas de rodapé

(1) Programa de Responsabilidade Civil, 4ª edição, Malheiros, São Paulo, 2003, p.380.

(2) Sanseverino, Paulo de Tarso Vieira, Responsabilidade civil no código do consumidor e a defesa do fornecedor, São Paulo: Saraiva, p. 231.

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