Tropeços da urgência

Erros e acertos da conversão da MP do Bem em lei

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5 de fevereiro de 2006, 6h00

A edição de medidas provisórias extensas e multitemáticas e o processo legislativo conturbado daí decorrente, com discussão e aprovação aceleradas de propostas, favorecem a incorrência de erros. Com a Medida Provisória 252/2005 (MP do Bem), não foi diferente, uma vez que o debate parlamentar avolumou-se e tornou-se complicado, sobretudo em razão do grande número de emendas apresentadas, tendo se prolongado para além do limite de tempo permitido pela Constituição Federal, resultando na perda da eficácia da medida por decurso de prazo.

A discussão foi rapidamente transplantada para outra medida provisória em tramitação, a de número 255, resultando na aprovação urgente da chamada Lei do Bem (Lei 11.196/2005). Nessa passagem, algumas das falhas de redação da MP do Bem foram devidamente detectadas e corrigidas. Outras ainda permanecem no texto legal.

Em matéria de incentivos ao desenvolvimento de tecnologia, uma boa parte das imperfeições foi retificada.

Com relação aos incentivos do Repes, por exemplo, promoveram-se modificações essenciais no artigo 2º, eliminando-se restrições que inviabilizavam a própria aplicabilidade do benefício.

Por primeiro, esclareceu-se que podem usufruir dos benefícios do Repes tanto as empresas dedicadas às atividades de desenvolvimento de software quanto aquelas dedicadas à prestação de serviços de tecnologia da informação.

A redação da MP do Bem induzia ao entendimento de que as duas atividades deviam ser exercidas cumulativamente para permitir a utilização do benefício, pois determinava que a empresa devia exercer uma atividade “e” outra.

Embora a gramática admita a utilização da conjunção “e” com função adversativa, o legislador preferiu substituir essa partícula por “ou” para fins de eliminar a dubiedade e impor maior clareza ao texto legal.

Outro problema presente no mesmo artigo era que, na redação original, o benefício fiscal somente podia ser usufruído por empresas que estivessem sujeitas à apuração de PIS e Cofins pelo regime da não-cumulatividade. Porém, havia um claro contra-senso deste dispositivo com a regra do inciso XXV, do artigo 10, da Lei 10.833/03, que impõe o regime de cumulatividade às empresas prestadoras de serviços de informática ou de desenvolvimento de softwares. Ou seja, o Repes era inaplicável.

Com a edição da lei, a contradição foi afastada e transformada em um regime de opção fiscal. As empresas podem agora escolher entre: (i) tributação pelo regime de cumulatividade (com alíquotas menores de PIS/Cofins), ou (ii) tributação pelo regime de não-cumulatividade (com alíquotas maiores) e benefícios do Repes.

Além desses, outro melhoramento relevante foi feito no capítulo que trata dos incentivos à inovação tecnológica, notadamente no que respeita à dedutibilidade, para efeitos da apuração do lucro líquido, de dispêndios com assistência técnica, científica ou semelhante e de royalties por patentes industriais pagos a beneficiário residente ou domiciliado no exterior.

Nesse particular, a MP do Bem continha dois erros que levavam à negação da dedutibilidade de tais dispêndios. Primeiro, o artigo 17, em seu parágrafo 3º, negligenciou a referência ao artigo 50 da Lei 8.383/91, ao tratar das condições de dedutibilidade dos referidos dispêndios. Fala-se apenas da observância aos artigos 52 e 71 da Lei 4.506/64.

Ademais, o artigo 20 da MP do Bem determinava que somente poderiam ser deduzidos os pagamentos efetuados a pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no país (com exceção de pagamentos pela manutenção de patentes e marcas no exterior).

Acontece que o artigo 50 da Lei 8.383/91 é uma importante norma que compõe o conjunto de regras de dedutibilidade de despesas de aluguéis, royalties e assistência técnica, científica ou administrativa. Trata-se do dispositivo legal que permitiu e condicionou a remessa e a dedução de despesas de assistência e determinadas despesas de royalties na hipótese de pagamento da empresa brasileira em favor de sua controlada no exterior. Negar sua vigência no contexto atual seria contradizer a política econômica brasileira.

Nesse sentido, a Lei do Bem corrigiu pelo menos o artigo 20, deixando claro que a dedutibilidade de despesas com royalties e assistência técnica ou científica não está restrita aos pagamentos efetuados a pessoas residentes no país. Porém, a impropriedade do parágrafo 3º do artigo 17 continua na redação atual.

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