Acidente de trabalho

Bavária é condenada por falha em equipamento de segurança

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3 de fevereiro de 2006, 12h03

Empresa que não mantém em boas condições de uso os equipamentos de segurança ou de primeiros socorros age com negligência e tem de indenizar o empregado que se acidenta no local de trabalho. O entendimento é da 6ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas, SP).

Os juízes condenaram a cervejaria Bavária a indenizar um ex-empregado que precisou dos equipamentos de primeiros socorros, mas os objetos não funcionaram. Segundo os autos, o empregado sofreu acidente que afetou olhos e boca, embora no momento utilizasse óculos protetores e luvas. Ele foi atingido por soda cáustica que veio de uma válvula de retenção na máquina que consertava.

O trabalhador teve sua capacidade de visão do olho direito reduzida em 50%, além de ter passado por um tratamento demorado e doloroso. Por isso, decidiu entrar com ação na 5ª Vara do Trabalho de Ribeirão Preto, no interior paulista. Condenada a indenizar em primeira instância, a Bavária apelou ao TRT Campinas.

“É inequívoco o dano moral suportado pelo empregado, acentuado durante o tratamento, pela incerteza da cura, sempre assombrada pela possibilidade de vir a ocorrer a total perda da visão”, considerou o relator, juiz Jorge Luiz Costa.

Para o juiz, ficou comprovada que a lesão sofrida se agravou por negligência da empresa, ao não manter em funcionamento equipamento indispensável para o primeiro atendimento de socorro. Costa manteve a indenização em R$ 20 mil, por considerar o grau da culpa e as condições financeiras da empresa, uma grande cervejaria.

Leia a decisão

PROCESSO TRT 15ª REGIÃO Nº 01878-2002-113-15-00-5

RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE: BAVÁRIA S/A

RECORRIDO: EDSON LUIS SANTORO

ORIGEM: 5ª VARA DO TRABALHO DE RIBEIRÃO PRETO

ACIDENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO.

Por força do art. 6º, IV, da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, e do art. 39, XVII, do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, a indenização por acidente de trabalho é isenta do imposto de renda, de maneira que essa isenção atinge também a indenização por danos morais, decorrente desse mesmo acidente, já que tais normas não fazem qualquer distinção entre o tipo de dano indenizado, não cabendo, portanto, ao interprete fazê-lo. Recurso parcialmente provido.

Inconformada com a r. sentença de fls. 256/263, cujo relatório adoto, e que julgou parcialmente procedente a ação, recorre a reclamada, por meio das razões de fls. 267/283, argumentando que a prova pericial realizada deve ser desconsiderada, já que preclusa a oportunidade de sua produção; que não ocorreram os fatos ensejadores do dano moral; que a indenização foi fixada com exagero; que os honorários periciais devem ser reduzidos e atribuídos ao reclamante e que são indevidos os recolhimentos fiscais e previdenciários.

Contra-razões às fls. 287/290.

É o relatório.

V O T O

Conheço do recurso, porquanto regularmente processado.

Prova pericial. Preclusão.

Argúi a reclamada a preliminar em questão, ao argumento de que o juízo de origem não poderia ter determinado a realização da prova pericial após o encerramento da instrução processual, já que tal encerramento contou com a concordância do reclamante, a quem incumbia o respectivo ônus probatório.

Engana-se, entretanto, já que a preclusão é instituto que não se aplica ao juízo, como já muito bem decidiu o C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “nas instâncias ordinárias não há preclusão para o órgão julgador enquanto não acabar o seu ofício jurisdicional na causa pela prolação da decisão definitiva” (RSTJ 64/156).

Destarte, a preliminar não merece acolhida, pois ao julgador, na condição de condutor do processo, é dado reabrir a instrução processual, caso entenda que as provas produzidas não são suficientes à formação de seu convencimento (art. 765 da CLT).

Ainda que assim não fosse, a alegação da reclamada não é verdadeira, já que quando da produção da prova, a instrução processual do processo em apenso, no qual o pleito de indenização por danos morais foi formulado, não havia ainda sido encerrada.

Rejeito, pois.

Dano moral. Valor. Retenções.

É incontroverso que o reclamante, no exercício de suas atribuições, sofreu acidente de trabalho no dia 29 de janeiro de 2002, ocasião em que, embora utilizando óculos protetores e luvas, teve seus olhos e boca atingidos por soda cáustica proveniente da válvula de retenção da máquina que consertava. Também é incontroverso que em razão de tal acidente, ele teve reduzida sua capacidade de visão do olho direito em 50%, além de ter passado por doloroso tratamento.

Em assim sendo, é inequívoco o dano moral suportado por ele, acentuado durante o tratamento, pela incerteza da cura, sempre assombrada pela possibilidade de vir a ocorrer a total perda da visão.

Resta saber, portanto, se a reclamada agiu com culpa, para a eclosão do evento.

Segundo a inicial, no local do acidente, a reclamada mantinha o equipamento de nome “lava-olhos”, que se destinava à limpeza dos olhos com uma profusão excessiva de água, capaz de eliminar os efeitos de eventuais produtos químicos que pudessem atingir tal região. Ainda, segundo essa mesma peça, tal equipamento se apresentava, naquela data, sem possibilidade de uso, fato que obrigou o reclamante a se utilizar de lavatório comum, que não se mostrou hábil para a lavagem esperada nesses tipos de acidente.

A defesa negou os fatos, alegando que o “equipamento em comento, sempre esteve em plenas condições de uso” (fl. 28).

Entretanto, ante o disposto no art. 335, do Código de Processo Civil, é de se presumir que o equipamento em questão, que realmente seria decisivo para evitar a lesão descrita na inicial, conforme revelou o laudo pericial de fls. 210/219 (vide resposta ao quesito 8, de fl. 215), não estava mesmo em funcionamento, pois não se pode crer que, estando ele em perfeito estado, o reclamante não o tivesse utilizado, já que a primeira reação de qualquer pessoa, num acidente como o noticiado, é lavar imediatamente os olhos.

Assim, é de se presumir que o reclamante tentou lavar os olhos e que não conseguiu, como alegado, porque o equipamento chamado “lava-olhos” não estava em funcionamento, o que acabou provocando ou, no mínimo, agravando a lesão em seus olhos.

Diante da presunção favorável ao reclamante, cabia à reclamada ter demonstrado que o equipamento aludido estava em pleno funcionamento por ocasião do acidente, o que não ocorreu, pois, quando da perícia, ele já havia sido removido para a unidade de Jacareí, o que impossibilitou sua análise. E a prova oral, por seu turno, nada esclareceu a respeito.

Em suma, ante a presunção reportada, que constitui meio de prova (art. 212, IV, do CC), o reclamante conseguiu demonstrar que a lesão somente ocorreu ou se agravou, por culpa da reclamada, na modalidade negligência, ao não ter ela mantido, em regular funcionamento, equipamento imprescindível para o primeiro atendimento de socorro de acidentes como o que o vitimou.

Diante disso e diante do fato de que o dano e o nexo causal são incontroversos, correto o juízo de origem ao ter, com base no art. 159 do Código Civil de 1916, vigente por ocasião dos fatos, reconhecido a culpa e a responsabilidade da reclamada, pelos danos oriundos do acidente.

A indenização, por seu turno, foi fixada de forma bastante equilibrada, em R$ 20.000,00, em se considerando a gravidade da lesão, o grau da culpa e as condições financeiras da reclamada, uma grande cervejaria.

Mantenho, pois.

Honorários periciais.

Nos termos da Súmula 236, do C. TST, é da reclamada, ante sua sucumbência, o ônus de arcar com os honorários periciais, que foram fixados com extrema moderação, em R$ 700,00 (fl. 261).

Recolhimentos previdenciários e do imposto de renda.

Dada a natureza da única parcela deferida, indenização por danos morais, não há incidência de contribuição previdenciária sobre ela (art. 21, I, da Lei nº 8.212/91).

E por se tratar de indenização decorrente de acidente de trabalho, o valor respectivo é isento do imposto de renda, por força do art. 6º, IV, da Lei nº 7.713/88 e do art. 39, XVII, do Decreto nº 3000/99.

Nem se argumente que a isenção abrangeria apenas a indenização por danos materiais, uma vez que as normas em questão não fazem qualquer distinção a respeito, não cabendo, portanto, ao interprete fazê-lo.

Provejo, pois, para reconhecer a não-incidência da contribuição previdenciária e a isenção do imposto de renda retido na fonte, sobre a indenização deferida.

C O N C L U S Ã O

Posto isso, decide este relator conhecer do recurso, rejeitar a preliminar argüida e, no mérito, dar-lhe parcial provimento, para reconhecer a não incidência da contribuição previdenciária e isenção do imposto de renda retido na fonte, sobre a indenização deferida, mantendo, no mais, a r. decisão de origem, nos termos da fundamentação.

Para fins recursais, mantém-se o valor arbitrado em primeira instância.

Jorge Luiz Costa

Juiz Relator

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