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Deficiência não associada ao trabalho não dá indenização

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1 de fevereiro de 2006, 11h48

Empresa não tem o dever de indenizar trabalhador quando a doença diagnosticada não se originou durante o contrato de trabalho. O entendimento é da 2ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP).

O funcionário da empresa Duratex pediu indenização por danos materiais e morais por apresentar deficiência auditiva, alegando que a doença foi adquirida durante o contrato de trabalho. Também sustentou que a empresa não fornecia equipamentos de proteção individual adequados para reduzir o ruído a que estava exposto.

Ainda afirmou que como não foi submetido a exame demissional, só descobriu sua deficiência quando fez exame admissional em outra empresa.

Para se defender, a Duratex disse que a deficiência auditiva existia antes do trabalhador começar a trabalhar e que não ocorreu alteração durante o contrato de trabalho. Segundo a empresa, o INSS considerou a perda audiométrica como uma alteração leve, não incapacitante e que não impedia o empregado de atuar nas mesmas funções, ainda que em ambientes ruidosos.

A ação foi ajuizada na Vara Cível de Jundiaí, mas de acordo com a Emenda Constitucional 45 de 2004, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho, os autos do processo foram encaminhados à 1ª Vara Trabalhista de Jundiaí que condenou a empresa. Então, a Duratex recorreu ao TRT.

O juiz Eduardo Benedito de Oliveira entendeu que foi comprovado, ao contrário do informado pelo trabalhador, a utilização dos equipamentos de proteção individual desde o início do contrato.

Segundo Zanella, os documentos comprovaram também que exames de saúde eram feitos regularmente, constando trauma acústico leve bilateral, mas que não incapacitava o funcionário para o serviço. De acordo com a prova oral, a perda auditiva não chegou a ser significativa, tanto que as testemunhas não sabem se o trabalhador ouve direito, a ponto de conversarem normalmente com ele.

“Após a dispensa, o empregado ainda trabalhou em outra empresa, por quase dois anos, sem qualquer dificuldade ou apontamento de redução em sua capacidade de trabalhar”, fundamentou Zanella, que deu provimento ao recurso para julgar improcedente a ação e absolver a empresa de qualquer condenação.

Processo 00995-2005-002-15-00-2 RO

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ORDINÁRIO

PROCESSO Nº: 00995-2005-002-15-00-2 – 2ª CÂMARA

RECORRENTE: DURATEX S.A.

RECORRIDO: BENEDITO IZIDÓRIO DA SILVA

ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE JUNDIAÍ

DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMPETÊNCIA. INDENIZAÇÃO.

De acordo com o preconizado no inciso VI do artigo 114 da Constituição da República, incluído pela EC 45/04, a Justiça do Trabalho é competente para apreciar o pedido de indenização por danos materiais e morais quando os atos praticados são decorrentes da relação de emprego, devendo ser, todavia, indeferida a pretensão se os prejuízos patrimoniais não decorreram de ato praticado pelo empregador e se a parte não sofreu constrangimento, humilhação ou danos que ultrapassem o campo meramente patrimonial.

Inconformada com a r. sentença às fls. 580-583, da lavra do MM Juiz Marco Aurélio Stradiotto de Moraes Ribeiro Sampaio, da 3ª Vara Cível de Jundiaí, que julgou procedentes os pedidos, recorre a ora Reclamada (fls. 592-617).

Requer, em síntese, o afastamento ou a redução das indenizações por danos materiais e morais.

Contra-razões às fls. 623-631.

A apelação foi submetida a julgamento em 16.02.05, determinando a 10ª Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil a remessa dos autos a este Tribunal, por decorrência do inciso VI do art. 114 da Constituição da República com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional 45/04.

O feito não foi encaminhado ao Ministério Público do Trabalho, em face do art. 111 do Regimento Interno deste E. TRT/15ª Região.

Relatados.

V O T O

Conheço o apelo, atendidas as exigências legais.

MÉRITO

Trata-se de ação de indenização ajuizada na Justiça Comum, em 19.05.99, pretendendo o Autor o ressarcimento de danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho advindo da prestação de serviços como segundo ajudante de operador, no período de 04.07.89 a 01.12.94, ressaltando-se que, por observância à legislação civil, não foi cogitada a prescrição.

Afirmou o Autor que, durante a consecução do contrato, não lhe foram fornecidos EPI´s adequados e suficientes para reduzir ou neutralizar o ruído a que estava exposto e que, a cada seis meses realizava exames; no entanto, não se submeteu a exame demissional, vindo a descobrir a sua deficiência auditiva somente quando realizou exame admissional em sua nova empregadora.

Por tais fundamentos e considerando a sua dificuldade em obter emprego digno, postulou a reparação do dano, com requerimento de pensão vitalícia, nos termos do então vigente Código Civil, arts. 159, 1538 e 1539.

A Ré, em sua defesa, alegou que a deficiência auditiva do trabalhador antecedia a sua admissão, que esta não foi alterada no decorrer do contrato de trabalho e que o INSS considerou a perda audiométrica em questão como uma alteração leve, não-incapacitante, não-indenizável e que não restringia o seu portador de atuar nas mesmas funções, mesmo em ambientes ruidosos, se usuário de EPI´s.

Estabelecidas tais premissas, depreende-se dos documentos juntados à inicial, às fls. 11-12, referem-se a acidentes de trabalho que afastaram o trabalhador de suas funções no período de 23.07.92 a 28.07.92 (5 dias) e de 16.02.93 a 28.02.93 (12 dias) que, segundo consignado à fl. 49 vº, decorreram de contusão no terceiro dedo da mão direita (primeiro período) e no punho esquerdo (segundo período), inexistindo qualquer documento comprobatório de afastamento por problemas auditivos.

Ademais, os documentos às fls. 53-54 comprovam que, ao contrário do informado pelo Recorrente, os equipamentos de proteção individual foram fornecidos desde o início do contrato. Da mesma forma, os documentos às fls. 57-66 demonstram que os exames de saúde eram realizados regularmente, mencionando-se, especificamente, o atestado à fl. 61, datado de 21.09.92, que relata que o trabalhador apresentava trauma acústico leve bilateral, que não o incapacitava para o serviço, desde que utilizasse protetor acústico quando exposto a ruído.

Importante consignar também o documento à fl. 13, atinente ao exame audiométrico admissional, realizado em 14.06.96, pela subseqüente empregadora – Passarin – que relata o rebaixamento neuro-sensorial bilateral de grau moderado, porém, sem impedimento à contratação, uma vez que o Autor ali trabalhou no período de 24.06.96 a 13.05.98, como anotado em sua CTPS (fl. 10).

Acrescento que, de acordo com o relatório da prova pericial (fl. 124), o Autor teria afirmado ao perito que, encaminhado por uma advogada ao INSS “em 06 de janeiro de 1999, com abertura de CAT, para avaliação da perda auditiva, passando por perícia médica, mas não foi concedido nenhum benefício acidentário, não recebendo nenhum benefício acidentário e/ou previdenciário em razão dos problemas de audição, até a presente data, não estando também aposentado por tempo de serviço.”

A referida informação encontra-se comprovada pelos documentos emitidos pelo INSS, juntados às fls. 165-166.

É importante registrar, ainda, que a perícia foi realizada em 17.03.00, ou seja, pouco mais de um ano após a conclusão do Órgão Previdenciário no sentido de inexistência de qualquer moléstia que justificasse a concessão de benefício legal e, não obstante o longo tempo decorrido entre a dispensa do trabalhador e a realização da perícia, foi constatada que a perda auditiva do trabalhador, em ambos os ouvidos, era de 4,34%, abaixo do limite previsto de 9% no item 1 do anexo 1 da NR 7 (fl. 130).

Não obstante, o perito concluiu que, apesar dos demais fatores, ligados à “susceptibilidade individual, a idade, o sexo, e a exposição ao ruído não ocupacional (…), levados em consideração no agravamento da lesão auditiva, não sendo o tempo de exposição ao ruído, fato isolado para a caracterização do nexo etiológico” (fl. 146), a “severa perda auditiva em ambos os ouvidos, irreparável e permanente, gerando em perda da capacidade física e laboral”, causou ao Autor “prejuízos materiais e danos de ordem moral” (fl. 148).

O MM. Juiz sentenciante, por seu turno, observou que o momento social de desemprego, “em que a oferta de mão de obra permite ao empregador exigir, e bastante, características de peferição (leia-se perfeição) de saúde de seu novo empregado” e que presente o “dano físico (…) tem-se como certo que será o autor prejudicado na busca de emprego, em especial, repita-se em momentos como o presente, no qual o empregador pode exigir do modo já mencionado” (fl. 582).

Entretanto, de acordo com a prova oral (fls.585-589), a perda auditiva do Recorrido não chega a ser significativa, no sentido de que as suas próprias testemunhas afirmam que não sabem se ele ouve direito mas que “conversam com ele normalmente”.

Assim, considerando toda a narrativa acima, reputo ausentes os fundamentos legais a ensejar a indenização por danos materiais, consistente em pensão mensal até os 65 anos de idade do Autor, à base do salário atual de um segundo ajudante de operador, pois não se pode olvidar que o momento social por que passa o País atinge a todos os trabalhadores e não somente aqueles acometidos de perda auditiva. Ademais, esse “momento” não foi ocasionado pela empregadora.

Não bastassem tais fatos, o Autor, após a sua dispensa, trabalhou em outra empresa, por quase dois anos, sem qualquer dificuldade ou apontamento de redução em sua capacidade laborativa.

Ressalto que sequer foi informado se o trabalhador auferia adicional de insalubridade e tampouco houve a demonstração de existência de irregularidades no ambiente profissional, eventualmente relatados pela CIPA.

Por tais fundamentos, acolho o apelo para excluir a indenização por danos materiais.

Quanto ao danos morais, concluiu o ilustre magistrado que “não se pode negar que querendo e precisando trabalhar, sendo barrado em eventuais audiometrias, sofre o autor também aumento na sua sensação de inutilidade laboral e social. Nesse sentido e tendo em vista a presente condenação, no sentido material feita para tirar do autor qualquer necessidade de procura de emprego da mesma forma que tiraria a sua manutenção como ajudante de operador, reputo como bastante a condenação em danos morais na monta de 30 salários mínimos.” (fl. 582).

Em que pese a tais fundamentos, é importante assinalar que o único exame a que se submeteu o Autor, após a dispensa da Ré, resultou em emprego, não havendo qualquer outra demonstração de que não esteja conseguindo trabalhar por reprovação em exames admissionais de saúde.

Conforme os ensinamentos de Marcus Vinícius Lobregat, in “Dano Moral nas Relações Individuais do Trabalho”, Ed. LTr, pág. 115, “a obrigação de indenizar nasce toda vez que o patrimônio moral – quer do empregado, quer do empregador – reste desrespeitado e/ou agredido; toda vez que se verificar ofensa ou lesão à dignidade, ou qualquer outro valor íntimo, de qualquer das partes do contrato de trabalho, havendo inequívoca relação de causa e efeito entre o ato ilícito (ação ou omissão) e o dano experimentado (não destacado no original).

Na hipótese dos autos, encontra-se ausente a “relação de causalidade” entre a ação/omissão da Ré e os mencionados distúrbios psicológicos apresentados pelo trabalhador.

Isso porque é “decisivo que haja evidência bastante da relação de causalidade entre a conduta do empregador ou de seus prepostos e o dano sofrido pelo empregado. A relação de causa e efeito não é, evidentemente jurídica, mas de caráter fático.” (“Curso de Direito do Trabalho”, Mauricio Godinho Delgado, 2ª edição, Ed. LTr, pág. 613).

Assim, acolho o apelo para excluir a indenização por danos morais.

Pelo exposto, decido conhecer e dar provimento ao Apelo para julgar improcedentes os pedidos, nos termos da fundamentação. Custas em reversão, isentas, em face do deferimento da gratuidade da justiça.

EDUARDO BENEDITO DE OLIVEIRA ZANELLA

JUIZ RELATOR

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