Banco Santos

Leia a decisão que deu liberdade a Edemar e seu filho

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28 de dezembro de 2006, 12h23

“O cerceamento preventivo da liberdade não pode constituir um castigo àquele que sequer possuiu uma condenação definitiva contra si.” Essa foi uma das teses aplicadas pelo ministro Gilmar Mendes no julgamento do pedido de Habeas Corpus do ex-controlador do Banco Santos, Edemar Cid Ferreira e de seu filho, o economista Rodrigo Rodrigues de Cid Ferreira.

Ao determinar a expedição do alvará de soltura, o ministro afirmou que “uma execução antecipada em matéria configuraria grave atentado contra a própria idéia de dignidade humana”. Gilmar Mendes também entendeu que os argumentos genéricos de garantia da ordem pública e da ordem econômica não são motivos suficientes para justificar prisão.

O vice-presidente do Supremo também concedeu salvo-conduto para o ex-superintendente da instituição, Mário Arcângelo, e o ex-diretor Álvaro Zuchelli. A decisão foi tomada na noite desta quarta-feira (27/12).

Gilmar acolheu pedido dos advogados Arnaldo Malheiros Filho (que representa Edemar) e Alberto Zacharias Toron (advogado de Rodrigo). Os advogados contestaram decisão do Superior Tribunal de Justiça, que havia negado o mesmo pedido de liberdade.

Edemar foi novamente preso no dia 12 de dezembro, depois de ser condenado a 21 anos de prisão por crime contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Condenado pelos mesmos crimes, seu filho teve uma pena menor: 16 anos de reclusão. A sentença foi dada pelo juiz Fausto Martin de Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo.

No Supremo, os advogados defenderam o direito de seus clientes de recorrer em liberdade da decisão que os condenou. O argumento é o de que os dois sofrem constrangimento ilegal porque a sentença ainda não transitou em julgado.

No STJ, o pedido de liberdade esbarrou na mesma questão processual que os advogados pediram ao STF para não observar. A jurisprudência diz que não cabe liminar em Habeas Corpus contra decisão de outro tribunal que negou liminar, a não ser em caso de flagrante ilegalidade. A defesa pediu ao Supremo que deixasse de aplicar Súmula 691 (que proíbe liminar contra liminar). O ministro Gilmar acolheu o pedido.

Leia as decisões e, em seguida, os pedidos

MED. CAUT. EM HABEAS CORPUS 90.348-7 SÃO PAULO

PACIENTE(S): RODRIGO RODRIGUES DE CID FERREIRA

IMPETRANTE(S): ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): RELATOR DO HABEAS CORPUS Nº 72.873 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DECISÃO: Cuida-se de habeas corpus impetrado por ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTROS em favor de RODRIGO RODRIGUES DE CID FERREIRA, contra decisão do Ministro relator do HC 72.873, do Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu pedido de liminar pelos seguintes fundamentos:

“(…) Não há como dar seguimento ao pedido.

O Superior Tribunal de Justiça tem compreensão assentada no sentido de não caber habeas corpus contra decisão que denega liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade, o que não ocorre na espécie, como se verifica do teor do provimento hostilizado:

(…)

Ante o exposto, sendo manifesta a inviabilidade do writ, com base no artigo 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, indefiro liminarmente o pedido.” (fls. 23/26).


Sustentam os impetrantes, em síntese:

a) a possibilidade de afastamento da Súmula STF nº 691, quando manifesta a ilegalidade da decisão atacada (fl. 05);

b) que, no caso dos autos, o “eminente Ministro Paulo Gallotti, mesmo se tratando de hipótese de flagrante ilegalidade e afronta direta à jurisprudência deste STF, negou seguimento ao habeas corpus impetrado contra decisão denegatória de liminar emanada do egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, sob o fundamento de que não é possível o manejo do writ ‘contra decisão que denegue liminar’”.(fl. 07);

c) que os “motivos invocados pelo i. juiz de primeiro grau para impor a custódia do paciente, o qual, frise-se, permaneceu em liberdade durante todo o transcorrer das investigações e da própria ação penal, são de ordem estritamente objetiva (…) : i) magnitude da lesão; ii) arts. 7º e 9º da Lei do Crime Organizado (9.034/95); iii) garantia da ordem pública; iv) garantia da ordem econômica; v) art. 3º da Lei de Lavagem e, por fim, vi) art. 11 da Convenção da ONU contra a criminalidade organizada transnacional”; (fl. 13)

d) afronta ao princípio constitucional da isonomia, já que a co-réu, “condenado pelos mesmos delitos e à mesma pena que o paciente”, foi permitido “apelar em liberdade e, sem qualquer justificativa quanto à diferenciação, não permitiu o mesmo para o paciente”; (fl. 13);

e) que a decisão que decretou a prisão do ora paciente configura “punição antecipada” (fl. 17), violando a garantia constitucional da presunção de inocência;

f) que “o paciente aguardou todo o desenrolar da ação penal em liberdade e não lhe foi imposta a prisão preventiva”, não havendo “qualquer fato novo, que diga com a necessidade absoluta da cautela processual exigida para a imposição da prisão para apelar”; (fl. 18);

g) que a prolação da sentença seria “’o motivo suficiente e autônomo para a prisão’ (art. 5º, 1, “a”, cf. sentença, p. 12.837)” (fl. 19);

h) a presença do periculum in mora, “pelo fato de o paciente já estar privado de sua liberdade de locomoção em virtude de ordem manifestamente ilegal, recolhido no Presídio de Tremenbé (SP)”. (fl. 21);

Requerem a concessão de liminar para que “seja revogada a prisão imposta ao paciente, determinando-se a imediata expedição de alvará de soltura em seu favor, para que em liberdade aguarde o julgamento final do writ” (fl. 22).

A sentença condenatória, no tópico nominado “da vedação do apelo em liberdade” (fl. 659), está assim motivada fls. 659/672):

“Evidente que a situação processual de alguém antes do julgamento não se equipara à do condenado, ainda que por julgamento não definitivo uma vez que, na segunda hipótese, há demonstração, mesmo que não perene, da responsabilização criminal, não sendo razoável equiparar-se duas situações processuais totalmente díspares.


Ora, o artigo 594 do CPP, que veda o recurso em liberdade, ou sem prestação de fiança, salvo de primário e possuir bons antecedentes, desde que reconhecidos na sentença condenatória, permite concluir que a decisão de primeiro grau possui um significado processual porquanto estabelece um marco entre o acusado não-julgado e o condenado, ainda que por julgamento não definitivo.

Por sua vez, o princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade (art. 5º, item LVII, da CF/88) não possui vinculação alguma com os efeitos de recursos ou das decisões condenatórias no processo penal. (…).

(…)

Não existe óbice, portanto, para a prisão cautelar decorrente de uma condenação, ainda que o acusado responda a processo solto, se plenamente justificada na sentença condenatória. Entendimento contrário, diante da deficiência crônica do sistema processual brasileiro, da profusão de recursos e das armadilhas processuais existentes de que se lançam freqüentemente mão, coloca sob risco de legitimação um dos Poderes da República, o Judiciário, que acaba sendo questionado quanto a sua razão de existir (sentimento de imprestabilidade e de impunidade).

(…)

Frise-se que o artigo 7º da Lei nº 9034, de 03.05.1995 (acerca de organizações criminosas ou associações criminosas) veda a liberdade provisória, com ou sem fiança, àqueles “que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa” (…).

(…)

Intensa e efetiva participação também tiveram os acusados (…) Rodrigo Rodrigues de Cid Ferreira (…), que, de forma efetiva e eficaz, contribuíram para a prática de toda sorte de delitos já acima apontados porquanto tomavam as decisões de peso voltadas para a ilicitude enquanto participantes do Comitê informal, criado e efetivado para esse fim.

Para que a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, bem como da própria Justiça Federal, não reste comprometida, não há como afastar, ainda que de forma excepcional, o cabimento da prisão preventiva para a garantia da ordem pública.

Não se prende pela gravidade dos atos ilícitos praticados, mas pela forma e execução mencionadas nesta sentença, o que provoca, ainda nos dias atuais, grande repercussão e clamor público, fragilizando a atividade jurisdicional e a ordem pública.

Não se trata, também, de mera detenção cautelar pela simples repercussão dos fatos, mas porquanto se observou perversão, cupidez e insensibilidade moral, que, não inibiram, antes reforçaram, condutas que ainda causam indignação na opinião pública com repulsa profunda.

Por outro lado, conforme já se observou, tais condutas propiciaram prejuízo constatado de grande monta (…) acarretando danos materiais a milhares de investidores, pessoas físicas e jurídicas, a grande maioria totalmente incauta, vítima da prática de crimes diversos (financeiros ou não), inclusive contra a ordem econômica (artigo 5º, inciso II, da Lei nº 8.137, de 27.12.1990).

A magnitude da lesão, por si só, segundo o art. 31 da Lei nº 7.492/1986, justificaria, apesar do posicionamento diverso deste magistrado, a prisão cautelar. Porém, in casu, deve-se ter em conta o fato de que a atuação concertada entre os acusados citados se caracterizou como perfeita organização criminosa, que potencializou o dano causado, não somente o material, além de envolver várias pessoas nos delitos, com dimensão e repercussão a nível internacional.


O artigo 9º da supracitada Lei, que veda o apelo em liberdade, deve, pois, ser cotejado, com o artigo 31 da Lei nº 7.492/1986, e com os dispositivos do Código de Processo Penal.

(…)

O Colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu não haver direito líquido e certo de se apelar em liberdade, só porque primário e de bons antecedentes (…).

(…)

Acrescente que o dispositivo citado (artigo 7º da Lei nº 9.034/1995) veio, posteriormente, ser reforçado pela Convenção da ONU contra a Criminalidade Organizada Transnacional, adotada em Nova Iorque no ano de 2000, aprovada pelo Decreto-Legislativo nº 231, de 29.05.2003 e promulgada pelo Decreto nº 5.015, de 12.03.2004 (inteligência do artigo 11 e seus itens), como segue:

(…)

Por sua vez, o art. 3º da Lei nº 9.613/1998, consigna que:

(…)

Assim, a prisão preventiva se impõe, para a garantia das ordens pública e econômica, nos termos dos artigos 312 e 313, ambos do Código de Processo Penal, aplicando-se ainda, em complementação, o artigo 31 da Lei nº 7.492/1986, os artigos 7º e 9º, ambos da Lei nº 9.034/1995, o artigo 3º da Lei nº 9.613/1998, c.c o artigo 11 da Convenção da ONU contra a Criminalidade Organizada Transnacional.”

Preliminarmente, anoto que a jurisprudência desta Corte é no sentido da inadmissibilidade da impetração de habeas corpus, nas causas de sua competência originária, contra decisão denegatória de liminar em ação de mesma natureza articulada perante tribunal superior, antes do julgamento definitivo do writ. Nesse particular, cito os seguintes julgados: HC(QO) nº 76.347/MS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 08.05.1998; HC nº 79.238/RS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 06.08.1999; HC nº 79.776/RS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 03.03.2000; HC nº 79.775/AP, Rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, maioria, DJ de 17.03.2000; e HC nº 79.748/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, maioria, DJ de 23.06.2000.

Esse entendimento está representado na Súmula nº 691/STF, verbis: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”.

É bem verdade que o rigor na aplicação da Súmula nº 691/STF tem sido abrandado por julgados desta Corte em hipóteses excepcionais em que: a) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou b) a negativa de decisão concessiva de medida liminar pelo tribunal superior apontado como coator importe a caracterização ou a manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF. Para maiores detalhes, enumero as decisões colegiadas: HC nº 84.014/MG, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 25.06.2004; HC nº 85.185/SP, Pleno, por maioria, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 1º.09.2006; e HC nº 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, maioria, julgado em 10.10.2006; e as seguintes decisões monocráticas: HC nº 85.826/SP (MC), de minha relatoria, DJ de 03.05.2005; e HC nº 86.213/ES (MC), Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 1º.08.2005.


Para fins de apreciação do pedido de medida liminar, porém, é necessário, no caso em exame, avaliar se há ou não patente constrangimento ilegal apto a superar a aplicação da Súmula nº 691/STF e a ensejar o cabimento deste habeas corpus.

O Plenário deste Tribunal tem discutido amplamente a possibilidade de reconhecimento do direito de recorrer em liberdade, desde o julgamento da RCL nº 2.391-PR, rel. Min. Marco Aurélio.

O entendimento que está a se firmar, inclusive com o meu voto, pressupõe que eventual custódia cautelar, após a sentença condenatória e sem trânsito em julgado, somente poderá ser implementada se devidamente fundamentada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal – CPP e, sobretudo, do art. 93, IX, da Constituição Federal.

Também considero que se não pode conceber como compatível com o princípio constitucional da presunção de inocência qualquer antecipação de cumprimento da pena. Aplicação de sanção antecipada não se compadece com a inexistência de decisão condenatória transitada em julgado. Outros fundamentos há para se autorizar a prisão cautelar de alguém (vide art. 312 do Código de Processo Penal). No entanto, o cerceamento preventivo da liberdade não pode constituir um castigo àquele que sequer possui uma condenação definitiva contra si.

Parece evidente, outrossim, que uma execução antecipada em matéria penal configuraria grave atentado contra a própria idéia de dignidade humana.

Se se entender, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há compatibilizar semelhante idéia com a execução penal antecipada.

Ressaltei ainda, em meu voto na referida Reclamação 2.391-PR, que o recolhimento à prisão, quando não há uma definitiva sentença condenatória, determinada por lei, sem qualquer necessidade de fundamentação, tal como disposto no art. 9º, da Lei nº 9.034, de 1995, afronta, a um só tempo, os postulados da presunção de inocência, da dignidade humana e da proporcionalidade. Justamente porque não se trata de uma custódia cautelar, tal como prevista no art. 312, do Código de Processo Penal, que pode efetivar-se a qualquer tempo, desde que presentes os motivos dela ensejadores, o recolhimento à prisão por força legal, tal como previsto para as ações praticadas por organizações criminosas, afigura-se-me uma antecipação da pena não autorizada pelo texto constitucional.

O mesmo raciocínio aplica-se ao art. 3º, da Lei nº 9.613, de 1998. O juiz haverá de fundamentar nos requisitos previstos no art. 312, do CPP, para a prisão cautelar, se o réu não puder recorrer em liberdade, sob pena de atribuir-se caráter retributivo ao que ainda é provisório.

Assim, estou também em que o recolhimento à prisão quando ainda cabe recurso da sentença condenatória há que embasar-se em decisão judicial devidamente fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal.

Não é distinta a opinião do Ministro Peluso, tal como expressou em seu voto na mesma Reclamação nº 2.391-PR:

“Além de infringir princípios básicos de justiça – porque uma eventual reforma da decisão, em que o réu tenha sido preso, não encontra nenhuma medida no campo jurídico capaz de restaurar o estado anterior, pois se trata de privação de liberdade, e sequer a indenização de ordem pecuniária, prevista na Constituição, por erro na prisão compensa a perda da liberdade, que é o bem supremo do cidadão – é absolutamente incompatível – e aqui invoco o princípio da proporcionalidade – com o que sucede na área civil, onde uma sentença de caráter condenatório que sirva de título executivo sem o seu trânsito em julgado, não acarreta execução definitiva, por resguardo de conseqüências de ordem puramente patrimonial que podem ser revertidas. Noutras palavras: teríamos, num caso em que está em jogo a liberdade física, admitido uma execução provisória de sentença condenatória, quando o sistema não admite na área civil.”


A esse respeito e, desde então, tenho, inclusive, indeferido pedidos de medidas liminares nas circunstâncias em que: a) exista ato judicial que determine a prisão cautelar; e b) a fundamentação esteja em consonância com os pressupostos de cautelaridade, análogos, ao menos em tese, aos previstos no art. 312 do CPP.

Nesse sentido, arrolo as seguintes decisões monocráticas proferidas em sede de medida cautelar, nas quais reconheci a idoneidade da fundamentação da custódia preventiva: HC no 84.434-SP, DJ de 03.11.2004; HC no 84.983-SP, DJ de 04.11.2004; HC no 85.877-PE, DJ de 16.05.2005; e HC no 86.829-SC, DJ de 24.10.2005, todos de minha relatoria.

Verifico, porém, que a hipótese dos autos parece distinta.

Com efeito, em que pese o fato de o magistrado a quo ter referido na sentença a existência dos pressupostos autorizadores da preventiva – garantia da ordem pública e da ordem econômica –, tenho que os motivos apontados não são suficientes para ensejar a custódia cautelar do paciente.

É que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de que o clamor público, a credibilidade das instituições e a gravidade do delito, por si só, não configuram ameaça à ordem pública. Neste sentido, colaciono os seguintes precedentes: HC 82.832, Pleno, de minha relatoria, DJ 05.09.2003; HC 82.909, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 17.10.2003; HC 86.175, rel. Min. Eros Grau, DJ 10.11.2006; HC 80.379, rel. Min. Celso de Mello, DJ 25.05.2001.

No que tange ao disposto no art. 30 da Lei 7.492/86, já decidiu esta Corte que “o vulto da lesão estimada, por si só, não constitui fundamento cautelar válido” (HC 86.758, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 1º.09.2006).

Portanto, parece-me não haver, ao menos por ora, fundamentos capazes de sustentar o decreto de prisão preventiva, mormente se considerarmos que o paciente respondeu em liberdade a todo o processo penal.

Ressalvado melhor juízo quando da apreciação de mérito, constato a existência dos requisitos autorizadores da concessão da liminar pleiteada (fumus boni juris e periculum in mora).

Diante do exposto, cuidando-se de situação excepcional que justifica a não incidência da Súmula 691/STF, conheço deste habeas corpus e defiro a liminar requerida, determinando seja expedido o competente alvará de soltura em favor do paciente, salvo se por outro motivo estiver preso.

Comunique-se com urgência.

Após, colha-se manifestação da Procuradoria-Geral da República.

Publique-se.

Brasília, 27 de dezembro de 2006.

Ministro Gilmar Mendes


Vice-Presidente

(RISTF, art. 37, I, c/c art. 13, VIII)

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MED. CAUT. EM HABEAS CORPUS 90.349-5 SÃO PAULO

PACIENTE(S): EDEMAR CID FERREIRA

IMPETRANTE(S): ARNALDO MALHEIROS FILHO E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): RELATOR DO HC Nº 72.926 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DECISÃO: Cuida-se de habeas corpus impetrado por ARNALDO MALHEIROS FILHO E OUTROS em favor de EDEMAR CID FERREIRA, contra decisão de Ministro relator do Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu pedido de liminar no HC 72.926, pelos seguintes fundamentos (fls. 872/876).

“(…) Não há como dar seguimento ao pedido.

O Superior Tribunal de Justiça tem compreensão assentada no sentido de não caber habeas corpus contra decisão que denega liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade, o que não ocorre na espécie, como se verifica do teor do provimento hostilizado:

(…)

Ante o exposto, sendo manifesta a inviabilidade do writ, com base no artigo 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, indefiro liminarmente o pedido.”

Sustentam os impetrantes, em síntese:

a) a possibilidade de afastamento da Súmula STF nº 691, quando manifesta a ilegalidade da decisão atacada;

b) que no caso dos autos, “assiste aos acusados o direito de apelar em liberdade” e que a decretação da prisão preventiva, em contrariedade aos precedentes desta Corte e às manifestações doutrinárias sobre o tema, “constitui vedada execução antecipada da pena, afrontando, assim, a essência de nossa Constituição e mais especificamente as garantias fundamentais da presunção da inocência e do devido processo legal, não havendo razão alguma para subsistir”; (fl. 22)

c) a inviabilidade de aplicação da Lei 9.034/95 ao presente caso, tendo em vista que “o art. 9º da referida lei é manifestamente inconstitucional” (fl. 23), questão discutida no âmbito da Reclamação 2.391 perante esta Corte, sendo o mencionado dispositivo também inaplicável à espécie, levando-se em consideração que “a intenção do legislador ao instituir o dispositivo penal em questão foi combater o crime organizado caracterizado pelo uso real ou potencial da violência física e não a prática de delitos em co-autoria ou a quadrilha tradicional, do Código Penal.”; (fl. 25)


d) a inexistência, no presente caso, de afronta à ordem pública autorizadora da custódia cautelar, considerando-se que “(…) a prisão preventiva do paciente, decretada com base na garantia da ordem pública, se deu a) porque ele já responde a outro processo criminal pela prática de crime contra o Sistema Financeiro Nacional; e b) porque os fatos tratados na ação penal causam ‘grande repercussão e clamor público’, o que abala a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional e da Justiça” (fl. 28), em face do que argumenta o impetrante que “nem um nem outro fundamento se presta à configuração de atentado à ordem pública e, conseqüentemente, pode sustentar decreto da custódia cautelar do paciente antes do trânsito em julgado da ação condenatória.”; (fl. 28)

e) que “(…) nem a magnitude da lesão, nem sua pretensa ampliação pelas ações da mencionada ‘organização criminosa’ poderiam ensejar a prisão cautelar do paciente, pois da gravidade do crime já cuida a pena a ele imposta.”; (fl. 38) Requerem a concessão de liminar para “o fim único de aguardar em liberdade o julgamento deste pedido, mediante a pronta expedição de alvará de soltura” (fl. 43).

A sentença condenatória, no tópico nominado “da vedação do apelo em liberdade” (fl. 678), está assim motivada (fls. 678-691):

““Evidente que a situação processual de alguém antes do julgamento não se equipara à do condenado, ainda que por julgamento não definitivo uma vez que, na segunda hipótese, há demonstração, mesmo que não perene, da responsabilização criminal, não sendo razoável equiparar-se duas situações processuais totalmente díspares.

Ora, o artigo 594 do CPP, que veda o recurso em liberdade, ou sem prestação de fiança, salvo de primário e possuir bons antecedentes, desde que reconhecidos na sentença condenatória, permite concluir que a decisão de primeiro grau possui um significado processual porquanto estabelece um marco entre o acusado não-julgado e o condenado, ainda que por julgamento não definitivo.

Por sua vez, o princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade (art. 5º, item LVII, da CF/88) não possui vinculação alguma com os efeitos de recursos ou das decisões condenatórias no processo penal. (…).

(…)

Não existe óbice, portanto, para a prisão cautelar decorrente de uma condenação, ainda que o acusado responda a processo solto, se plenamente justificada na sentença condenatória. Entendimento contrário, diante da deficiência crônica do sistema processual brasileiro, da profusão de recursos e das armadilhas processuais existentes de que se lançam freqüentemente mão, coloca sob risco de legitimação um dos Poderes da República, o Judiciário, que acaba sendo questionado quanto a sua razão de existir (sentimento de imprestabilidade e de impunidade).

Ora, independentemente da necessidade de se apurar a suposta veiculação pública de notícias sigilosas do feito na imprensa, confessado até mesmo perante as Cortes Federais de Justiça (T.R.F. da 3ª Região, S.T.J. e S.T.F.) por infração ao crime de Violação ao Segredo de Justiça (artigo 153, § 1º, ‘a’, do Código Penal e artigo 10 da Lei nº 9.296, de 24.07.1996) bem ainda a persistência em não revelar a real propriedade e forma de aquisição, a possível localização de obras desaparecidas, aquisição de obras falsificadas e, por fim, inovação da situação fática enquanto pendentes processos administrativos (Banco Central e Polícia Federal), diante da apresentação, apenas aos 23.05.2006, de obras ocultadas por ocasião do Seqüestro ocorrido em 2005, fato que, em princípio, denotaria a prática do delito constante no artigo 347 do Código Penal , importante mencionar que Edemar Cid Ferreira responde, juntamente com Ezequiel Edmond Nasser e outros, a diversa ação penal também perante à 6ª Vara desta Capital, sob acusação de ter contribuído para a realização de operações ilícitas em 02 de julho de 1997, com o Banco Excel Econômico S/A, por violação ao artigo 17 da Lei nº 7.492, de 16.06.1986 (autos nº 2002.61.81.001587-9, aditamento à denúncia recebido em 03 de outubro de 2002, fls. 477/489 e 482, interrogado às fls. 557/559).


Não bastasse responder desde 2002 por crime contra o Sistema Financeiro Nacional, reiterou a prática delituosa, notadamente a realização de diversos outros delitos também contra o Sistema Financeiro Nacional, além daqueles que protegem a paz pública (artigo 288, C.P.) e a ordem econômico-financeira e a administração da justiça (Lavagem de Valores) dentre outros.

Não se trata de alguém que pacificamente teria estado em sua residência e contribuído com a Justiça, como desejam fazer crer seus defensores. Ao contrário, qualquer intimação ou determinação deste juízo em relação a sua pessoa, mesmo desde o princípio deste feito quando jamais se cogitou em sua prisão cautelar, sempre passa pelo crivo de seus empregados que, somente após verificação prévia do que se trata, faz-se presente o increpado para o cumprimento das diligências, conforme reiteradamente observado pelos Oficiais de Justiça deste juízo (cf., por exemplo, última certidão de 16 de novembro deste ano de 2006 nos autos em apartado sobre Leilão dos Vinhos e Decanter apreendidos nos autos nº 2005.61.81.900396-6).

(…)

Frise-se que o artigo 7º da Lei 9.034/95, de 06.05.1995 (acerca das organizações ou associações criminosas) veda a liberdade provisória, com ou sem fiança, àqueles ‘que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa’, como é justamente a hipótese do acusado Edemar Cid Ferreira, de quem sempre partiam ou convergiam todas as espúrias decisões no seio da instituição financeira, com o necessário e valioso apoio dos co-réus ora condenados. Apenas para citar um documento, o ‘follow up’ apreendido em sua residência demonstra exaustivamente ser ele o grande idealizador da empreitada delituosa, antes e após os fatos, neste último caso, sempre com o objetivo de ludibriar as autoridades, sejam elas quais forem, quer encerrando empresas, até de ‘fachada’, quer procedendo alterações contratuais nestas, quer contatando autoridades, inclusive de Brasília etc., visando praticar o que, no campo da Lavagem de Valores, reconhece-se como fase de reciclagem ou recycling (fls. 853/858 do Apenso I, Volume VI).

(…)

Para que a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, bem como da própria Justiça Federal, não reste comprometida, não há como afastar, ainda que de forma excepcional, o cabimento da prisão preventiva para a garantia da ordem pública.

Não se prende pela gravidade dos atos ilícitos praticados, mas pela forma e execução mencionadas nesta sentença, o que provoca, ainda nos dias atuais, grande repercussão e clamor público, fragilizando a atividade jurisdicional e a ordem pública.

Não se trata, também, de mera detenção cautelar pela simples repercussão dos fatos, mas porquanto se observou perversão, cupidez e insensibilidade moral, que, não inibiram, antes reforçaram, condutas que ainda causam indignação na opinião pública com repulsa profunda.

Por outro lado, conforme já se observou, tais condutas propiciaram prejuízo constatado de grande monta (…) acarretando danos materiais a milhares de investidores, pessoas físicas e jurídicas, a grande maioria totalmente incauta, vítima da prática de crimes diversos (financeiros ou não), inclusive contra a ordem econômica (artigo 5º, inciso II, da Lei nº 8.137, de 27.12.1990).

A magnitude da lesão, por si só, segundo o art. 31 da Lei nº 7.492/1986, justificaria, apesar do posicionamento diverso deste magistrado, a prisão cautelar. Porém, in casu, deve-se ter em conta o fato de que a atuação concertada entre os acusados citados se caracterizou como perfeita organização criminosa, que potencializou o dano causado, não somente o material, além de envolver várias pessoas nos delitos, com dimensão e repercussão a nível internacional.


O artigo 9º da supracitada Lei, que veda o apelo em liberdade, deve, pois, ser cotejado, com o artigo 31 da Lei nº 7.492/1986, e com os dispositivos do Código de Processo Penal.

(…)

O Colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu não haver direito líquido e certo de se apelar em liberdade, só porque primário e de bons antecedentes (…).

(…)

Acrescente que o dispositivo citado (artigo 7º da Lei nº 9.034/1995) veio, posteriormente, ser reforçado pela Convenção da ONU contra a Criminalidade Organizada Transnacional, adotada em Nova Iorque no ano de 2000, aprovada pelo Decreto-Legislativo nº 231, de 29.05.2003 e promulgada pelo Decreto nº 5.015, de 12.03.2004 (inteligência do artigo 11 e seus itens), como segue:

(…)

Por sua vez, o art. 3º da Lei nº 9.613/1998, consigna que:

(…)

Assim, a prisão preventiva se impõe, para a garantia das ordens pública e econômica, nos termos dos artigos 312 e 313, ambos do Código de Processo Penal, aplicando-se ainda, em complementação, o artigo 31 da Lei nº 7.492/1986, os artigos 7º e 9º, ambos da Lei nº 9.034/1995, o artigo 3º da Lei nº 9.613/1998, c.c o artigo 11 da Convenção da ONU contra a Criminalidade Organizada Transnacional.”

Preliminarmente, anoto que a jurisprudência desta Corte é no sentido da inadmissibilidade da impetração de habeas corpus, nas causas de sua competência originária, contra decisão denegatória de liminar em ação de mesma natureza articulada perante tribunal superior, antes do julgamento definitivo do writ. Nesse particular, cito os seguintes julgados: HC(QO) nº 76.347/MS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 08.05.1998; HC nº 79.238/RS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 06.08.1999; HC nº 79.776/RS, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ de 03.03.2000; HC nº 79.775/AP, Rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, maioria, DJ de 17.03.2000; e HC nº 79.748/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, maioria, DJ de 23.06.2000.

Esse entendimento está representado na Súmula nº 691/STF, verbis: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”.

É bem verdade que o rigor na aplicação da Súmula nº 691/STF tem sido abrandado por julgados desta Corte em hipóteses excepcionais em que: a) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou b) a negativa de decisão concessiva de medida liminar pelo tribunal superior apontado como coator importe a caracterização ou a manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF. Para maiores detalhes, enumero as decisões colegiadas: HC nº 84.014/MG, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 25.06.2004; HC nº 85.185/SP, Pleno, por maioria, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 1º.09.2006; e HC nº 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, maioria, julgado em 10.10.2006; e as seguintes decisões monocráticas: HC nº 85.826/SP (MC), de minha relatoria, DJ de 03.05.2005; e HC nº 86.213/ES (MC), Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 1º.08.2005.


Para fins de apreciação do pedido de medida liminar, porém, é necessário, no caso em exame, avaliar se há ou não patente constrangimento ilegal apto a superar a aplicação da Súmula nº 691/STF e a ensejar o cabimento deste habeas corpus.

O Plenário deste Tribunal tem discutido amplamente a possibilidade de reconhecimento do direito de recorrer em liberdade, desde o julgamento da RCL nº 2.391-PR, rel. Min. Marco Aurélio.

O entendimento que está a se firmar, inclusive com o meu voto, pressupõe que eventual custódia cautelar, após a sentença condenatória e sem trânsito em julgado, somente poderá ser implementada se devidamente fundamentada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal – CPP e, sobretudo, do art. 93, IX, da Constituição Federal.

Também considero que se não pode conceber como compatível com o princípio constitucional da presunção de inocência qualquer antecipação de cumprimento da pena. Outros fundamentos há para se autorizar a prisão cautelar de alguém (vide art. 312 do Código de Processo Penal). No entanto, o cerceamento preventivo da liberdade não pode constituir um castigo àquele que sequer possui uma condenação definitiva contra si.

Parece evidente, outrossim, que uma execução antecipada em matéria penal configuraria grave atentado contra a própria idéia de dignidade humana.

Se se entender, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há compatibilizar semelhante idéia com a execução penal antecipada.

Ressaltei ainda, em meu voto na referida Reclamação 2.391-PR, que o recolhimento à prisão, quando não há uma definitiva sentença condenatória, determinada por lei, sem qualquer necessidade de fundamentação, tal como disposto no art. 9º, da Lei nº 9.034, de 1995, afronta, a um só tempo, os postulados da presunção de inocência, da dignidade humana e da proporcionalidade. Justamente porque não se trata de uma custódia cautelar, tal como prevista no art. 312, do Código de Processo Penal, que pode efetivar-se a qualquer tempo, desde que presentes os motivos dela ensejadores, o recolhimento à prisão por força legal, tal como previsto para as ações praticadas por organizações criminosas, afigura-se-me uma antecipação da pena não autorizada pelo texto constitucional.

O mesmo raciocínio aplica-se ao art. 3º, da Lei nº 9.613, de 1998. O juiz haverá de fundamentar nos requisitos previstos no art. 312, do CPP, para a prisão cautelar, se o réu não puder recorrer em liberdade, sob pena de atribuir-se caráter retributivo ao que ainda é provisório.

Assim, estou também em que o recolhimento à prisão quando ainda cabe recurso da sentença condenatória há que embasar-se em decisão judicial devidamente fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal.

Não é distinta a opinião do Ministro Peluso, tal como expressou em seu voto na mesma Reclamação nº 2.391-PR:

“Além de infringir princípios básicos de justiça – porque uma eventual reforma da decisão, em que o réu tenha sido preso, não encontra nenhuma medida no campo jurídico capaz de restaurar o estado anterior, pois se trata de privação de liberdade, e sequer a indenização de ordem pecuniária, prevista na Constituição, por erro na prisão compensa a perda da liberdade, que é o bem supremo do cidadão – é absolutamente incompatível – e aqui invoco o princípio da proporcionalidade – com o que sucede na área civil, onde uma sentença de caráter condenatório que sirva de título executivo sem o seu trânsito em julgado, não acarreta execução definitiva, por resguardo de conseqüências de ordem puramente patrimonial que podem ser revertidas. Noutras palavras: teríamos, num caso em que está em jogo a liberdade física, admitido uma execução provisória de sentença condenatória, quando o sistema não admite na área civil.”


A esse respeito e, desde então, tenho, inclusive, indeferido pedidos de medidas liminares nas circunstâncias em que: a) exista ato judicial que determine a prisão cautelar; e b) a fundamentação esteja em consonância com os pressupostos de cautelaridade, análogos, ao menos em tese, aos previstos no art. 312 do CPP.

Nesse sentido, arrolo as seguintes decisões monocráticas proferidas em sede de medida cautelar, nas quais reconheci a idoneidade da fundamentação da custódia preventiva: HC no 84.434-SP, DJ de 03.11.2004; HC no 84.983-SP, DJ de 04.11.2004; HC no 85.877-PE, DJ de 16.05.2005; e HC no 86.829-SC, DJ de 24.10.2005, todos de minha relatoria.

Verifico, porém, que a hipótese dos autos parece distinta.

Com efeito, em que pese o fato de o magistrado a quo ter referido na sentença a existência dos pressupostos autorizadores da preventiva – garantia da ordem pública e da ordem econômica –, tenho que os motivos apontados não são suficientes para ensejar a custódia cautelar do paciente.

É que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem se orientado no sentido de que o clamor público, a credibilidade das instituições e a gravidade do delito, por si só, não configuram ameaça à ordem pública. Neste sentido, colaciono os seguintes precedentes: HC 82.832, Pleno, de minha relatoria, DJ 05.09.2003; HC 82.909, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 17.10.2003; HC 86.175, rel. Min. Eros Grau, DJ 10.11.2006; HC 80.379, rel. Min. Celso de Mello, DJ 25.05.2001.

No que tange ao disposto no art. 30 da Lei 7.492/86, já decidiu esta Corte que “o vulto da lesão estimada, por si só, não constitui fundamento cautelar válido” (HC 86.758, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 1º.09.2006).

Portanto, parece-me não haver, ao menos por ora, fundamentos capazes de sustentar o decreto de prisão preventiva.

Ressalvado melhor juízo quando da apreciação de mérito, constato a existência dos requisitos autorizadores da concessão da liminar pleiteada (fumus boni juris e periculum in mora).

Diante do exposto, cuidando-se de situação excepcional que justifica a não incidência da Súmula 691/STF, conheço deste habeas corpus e defiro a liminar requerida, determinando seja expedido o competente alvará de soltura em favor do paciente, salvo se por outro motivo estiver preso.

Após, abra-se vista à Procuradoria-Geral da República (RI/STF, art. 192).

Comunique-se com urgência.

Publique-se.

Brasília, 27 de dezembro de 2006.

Ministro Gilmar Mendes

Vice-Presidente


(RISTF, art. 37, I, c/c art. 13, VIII)

Leia os pedidos

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO-PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

Prevenção do Min. Eros Grau (HC n.º 89.025/SP)

Paciente Preso

Os advogados Alberto Zacharias Toron, Carla Vanessa Tiozzi Huybi de Domenico e Heloisa Estellita, brasileiros, casado e solteiras, inscritos na seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil respectivamente sob os números 65.371, 146.100 e 125.447, todos com escritório na cidade de São Paulo (SP), na Av. Angélica, n.º 688, respeitosamente vêm à elevada presença de Vossa Excelência impetrar

ORDEM DE HABEAS CORPUS

COM PEDIDO LIMINAR URGENTE

em favor do economista Rodrigo Rodrigues de Cid Ferreira, brasileiro, casado, portador da Cédula de Identidade RG n.º 23.878.015-6 (SSP/SP), com endereço na cidade de São Paulo (SP) na Rua Dom Paulo Pedrosa, n.º 791, apt. 81, atualmente recolhido no Presídio de Tremembé (SP), em razão de constrangimento ilegal emanado do Exmo. Sr. Ministro Paulo Gallotti, o qual, invocando a Súmula n.º 691, deste col. STF, negou seguimento ao habeas corpus indeferindo a liminar, que almejava a revogação da prisão imposta ao paciente, decretada unicamente em razão de sentença condenatória que, sem qualquer fato novo, negou-lhe o apelo em liberdade, muito embora durante os mais de dois anos havidos entre a investigação e sentença, nunca se tenha sequer cogitado da sua prisão (Processo nº. 2004.61.81008954-9, 6ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária de São Paulo – TRF-3, HC n.º 2006.03.00.118963-3 – STJ, HC n.º 72.873).

Os impetrantes arrimam-se no disposto no artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal, e nos artigos 647 e 648, inciso I, do Código de Processo Penal e, ainda, nos relevantes motivos de fato e de direito adiante aduzidos.

Nesses termos, do processamento,

Pedem deferimento.

São Paulo, 26 de dezembro de 2006.

ALBERTO ZACHARIAS TORON

O.A.B./SP nº 65.371

CARLA VANESSA T.H. DE DOMENICO


O.A.B./SP nº 146.100

HELOISA ESTELLITA

O.A.B./SP 125.447

EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:

COLENDA 2ª TURMA (preventa em razão do HC n.º 89.025/SP):

DOUTO SUB-PROCURADOR DE JUSTIÇA:

Ementa do pedido:

1. Paciente primário, com bons antecedentes, que respondeu ao inquérito e ao processo por mais de dois anos em liberdade, comparecendo a todos os atos processuais e não se envolvendo em qualquer fato desabonador durante toda a instrução processual.

2. Sentença que impõe a prisão sem, no entanto, apontar fato novo ou motivação concreta para vedação do apelo em liberdade. Invocação retórica das expressões “garantia da ordem pública” e “credibilidade do sistema financeiro”.

3. Prisão com nítido caráter de antecipação da pena, afirmada na “comprovada participação do paciente nos fatos”. Desrespeito ao princípio da presunção de inocência e da necessidade da motivação das decisões judiciais. Constrangimento ilegal.

4. Desrespeito ao princípio da isonomia, já que outro co-réu, condenado pelas mesmas infrações e às mesmas penas não teve a prisão decretada.

5. Liminar indeferida pelo col. Tribunal Regional Federal atacada por novo habeas corpus, no qual foi indeferida a liminar e negado seguimento invocando-se o óbice da Súmula n.º 691.

5. Flagrante ilegalidade que permite o manejo de habeas corpus contra indeferimento de liminar. Precedente da 2ª Turma em habeas corpus impetrado por co-réu, no qual se afastou o óbice da Súmula n.º 691, para se conhecer do writ e revogar a prisão preventiva imposta ao co-réu do paciente (HC n.º 89.025 e 89.306). E ainda: (HC n.º 85.826, rel. Min. Gilmar Mendes DJ 03/5/05, HC n.º 87.353, rel. Gilmar Mendes, DJ 13/12/05; HC n.º 85.185, rel. Min. Cezar Peluso, DJ 1º/9/06; HC n.º 86.059, rel. Min. Celso de Mello, DJ 30/6/05; HC n.º 86.864, rel. Min. Carlos Velloso; AgR no HC n.º 85.186/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 1º/02/05; AgR no HC n.º 89.637, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 17/11/06; HC nº 87.468, rel. Min. Cezar Peluso; DJ 15/9/06).

I – DA POSSIBILIDADE DE MANEJAR HABEAS CORPUS CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU MEDIDA LIMINAR:

1. Este colendo Supremo Tribunal Federal, em recentes e reiteradas oportunidades, tem admitido, em hipótese como a dos autos, que diante de manifesta ilegalidade, conheça-se de habeas corpus contra indeferimento de liminar a despeito do teor da Súmula n.º 691 (HC n.º 85.826, rel. Min. Gilmar Mendes DJ 03/5/05, HC n.º 87.353, rel. Gilmar Mendes, DJ 13/12/05; HC n.º 85.185, rel. Min. Cézar Peluso, DJ 1º/9/06; HC n.º 86.059, rel. Min. Celso de Mello, DJ 30/6/05; HC n.º 86.864, rel. Min. Carlos Velloso; AgR no HC n.º 85.186/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 1º/02/05; AgR no HC n.º 89.637, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 17/11/06; HC nº 87.468, rel. Min. Cézar Peluso; DJ 15/9/06).


1.1. O eminente Min. Gilmar Mendes ao analisar pedido de habeas corpus contra o indeferimento da liminar em favor de Ricardo Ferreira de Souza e Silva, co-réu do paciente na mesma ação penal, não obstante tenha destacado a existência da Súmula n.º 691/STF, admitiu o seu afastamento em casos de premente necessidade, como era o caso da ilegalidade que consubstanciava a decisão que decretou a custódia cautelar (HC n.º 89.306-6, DJ 19.07.2006).

A respeito do tema veja-se a ementa do paradigmático julgado relatado pelo eminente Min. Marco Aurélio:

“A Súmula do Supremo Tribunal Federal revela, como regra, o não-cabimento do habeas contra ato de relator que, em idêntica medida, haja implicado o indeferimento de liminar. A exceção corre à conta de flagrante constrangimento ilegal que, uma vez não verificado, impede a seqüência do habeas corpus” (Rel. Min. Marco Aurélio, Ag. no HC n.º 84.014, DJ 25.06.04).

1.2. Ademais, como tem destacado o em. Min. Gilmar Mendes em inúmeras decisões monocráticas proferidas em habeas corpus manejados contra o indeferimento de liminar, “é bem verdade que o rigor na aplicação da Súmula nº 691/STF tem sido abrandado por julgados desta Corte em hipóteses excepcionais em que: a) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou b) a negativa de decisão concessiva de medida liminar pelo tribunal superior importe na caracterização ou na manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF (cf. as decisões colegiadas: HC nº 84.014/MG, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 25.06.2004; HC nº 85.185/SP, Pleno, por maioria, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 1º.09.2006; e HC nº 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, maioria, julgado em 10.10.2006; e as seguintes decisões monocráticas: HC nº 85.826/SP (MC), de minha relatoria, DJ de 03.05.2005; e HC nº 86.213/ES (MC), Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 1º.08.2005” (Min. Gilmar Mendes, HC n.º 89.794, DJ 29/11/2006).

1.3. E como assevera o eminente Min. Cezar Peluso em acórdão decorrente de julgamento realizado pelo Pleno deste colendo Supremo Tribunal Federal, do qual participou o eminente Min. Gilmar Mendes, acompanhando o voto do ilustre relator “nos casos em que a decisão do STJ, que não chega a conhecer do habeas corpus, enseja situação de indubitável ilegalidade e de confronto direto com a jurisprudência do STF, abre-se imediatamente a via para que esta Corte exerça sua precípua função de defender o regime constitucional de liberdades, tendo em vista a cessação do estado de ilegalidade e de inconstitucionalidade." (rel. Min. Cezar Peluso, HC n.º 85.185, DJ 1º/9/2006).


1.4. É exatamente o caso dos autos: o eminente Ministro Paulo Gallotti, mesmo se tratando de hipótese de flagrante ilegalidade e afronta direta à jurisprudência deste STF, negou seguimento ao habeas corpus impetrado contra a decisão denegatória de liminar emanada do egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, sob o fundamento de que não é possível o manejo do writ “contra decisão que denegue liminar” (docs. 1 e 2).

1.5. A pretexto de um preciosismo formal da e. autoridade apontada como coatora, S. Exa. permitiu que as garantias mais comezinhas conferidas ao cidadão representadas pelo princípio da não-culpabilidade, da isonomia e da fundamentação das decisões judiciais, fossem violadas. Isto sem falar, da afronta direta a larga jurisprudência desta egrégia Corte no sentido de repugnar o entendimento da d. autoridade inicialmente apontada como coatora (HC 2006.03.00.118963-3). Tal violação e ilegalidade indubitável, pela voz do eminente Min. Cezar Peluso permite que esta Casa “exerça sua precípua função de defender o regime constitucional de liberdades, tendo em vista a cessação do estado de ilegalidade e de inconstitucionalidade” (HC n.º 85.185, DJ 1º/9/2006).

1.6. O constrangimento é ainda mais gritante, levando-se em consideração que o entendimento do eminente Ministro Paulo Gallotti sobre a matéria de fundo tratada no habeas corpus, que deixou de conhecer, anda na mesma direção do que se pleiteia, como se vê das inúmeras decisões por ele mesmo relatadas: Em princípio, o réu que esteve em liberdade durante o transcorrer da ação penal tem o direito de aguardar solto o julgamento do recurso que interponha contra a sentença que o condenou(RHC 14569-SP; rel. Ministro Paulo Gallotti, 6.ª T., DJ 1º/8/06, v.u.) ou a de que “a prisão cautelar, de natureza processual, só pode ser decretada em se mostrando a absoluta necessidade de sua adoção” (HC n.º 17.208-CE, rel. p/ acórdão Ministro Paulo Gallotti, 3.ª Seção, DJ 18.02.02). Daí se conclui que se analisado o mérito do habeas corpus, possivelmente, este seria concedido e o paciente colocado em liberdade.

1.7. Eminente Ministro: a liberdade do paciente não pode esperar! Foi preso em sua residência em razão de decisão abundantemente ilegal. As férias forenses e os entraves do Judiciário lhe impõem uma longa espera. Não se lhe pode impor o cárcere porque a burocracia e a formalidade desprendida da realidade e da Justiça impedem que o direito seja analisado.

1.8. Vivemos em um Estado Democrático de Direito onde se prezam as liberdades individuais, que não podem ser suprimidas, ignoradas, apenas pela existência fria da formalidade representada pela Súmula n.º 691, cujo os efeitos – diante das inúmeras ilegalidades – já foram abrandado por esta Excelsa Corte. Com a devida venia, não se pode desprezar a ilegalidade manifesta consubstanciada no fato de o paciente se encontrar preso injustamente.

2. Se é assim, estamos diante de “flagrante ilegalidade”, hipótese excepcional que autoriza a mitigação da aplicação da Súmula n.º 691, como tem, reiteradamente, advertido este colendo Supremo Tribunal Federal.

2.1. Aliás, sobre a demonstração da manifesta ilegalidade perpetuada contra o paciente com a negativa da liminar agora hostilizada, cabe citar precedentes deste Excelso Pretório que deram interpretação diametralmente oposta a aquela externada pela d. autoridade inicialmente apontada como coatora, que corrobora o decreto de prisão mantendo a prisão do paciente decretada apenas na sentença condenatória, quando o réu respondeu a todo o processo em liberdade, mesmo ausente todos os requisitos do artigo 312, do CPP, com a invocação genérica da garantia da ordem pública e a credibilidade das instituições:


“EMENTA: AÇÃO PENAL. Sentença. Condenação. Prisão. Recurso. Apelação. Necessidade de se recolher para apelar. Inadmissibilidade. Garantia da ordem pública e gravidade do delito. Razões que não autorizam decretação de prisão preventiva, nem a condicionante recursal. Constrangimento ilegal caracterizado. HC deferido. Votos vencidos. É ilegal negar ao réu o direito de apelar em liberdade, sob fundamento de sua prisão justificar-se como garantia da ordem pública e exigência da gravidade do delito” (HC n.º 86.234, rel. para acórdão Min. Cezar Peluso, DJ 29/9/2006).

E ainda:

“EMENTA: I. Direito de apelar em liberdade: paciente primário, sem antecedentes criminais e em liberdade quando da sentença condenatória: prisão decretada com base em motivação cautelar inidônea. 1. Em relação à garantia da ordem pública, mencionou-se dado de fato que se amolda ao clamor público, que reiteradamente a jurisprudência do Tribunal tem entendido não constituir fundamento idôneo à prisão cautelar. 2. Também não constitui razão bastante para a prisão cautelar, por si só, ser o paciente policial civil. 3. Insubsistente, ademais, o fundamento da garantia da aplicação da lei penal, com base em que os réus poderiam furtar-se ao cumprimento da pena, já que a efetivação desta dependerá, pelo menos, de que, julgada e desprovida a apelação, a decisão condenatória ganhe exeqüibilidade, ainda que provisória” (HC n.º 85.684/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 21/10/2005).

No mesma sentido: liminar concedida pelo Exmo. Sr. Min. Sepúlveda Pertence no HC n.º 85.534, DJ 16/03/2005).

E, ainda, acórdão do eminente Min. Gilmar Mendes:

“Crime contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei n.º 7.492/86; Lei n.º 8.137/1990, e Lei n.º 9.613/1998, requisitos de garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica e na necessidade de se assegurar a aplicação da lei penal. Alegação de ausência dos requisitos para decretação da prisão preventiva (CPP, art. 312). Quanto à ordem pública, a jurisprudência do Tribunal se firmou no sentido de que a caracterização genérica ou a mera citação do art. 312 do CPP não são suficientes para caracterizar a ameaça à ordem pública. Precedentes: HC n.º 84.680/PA, Rel. Min. Carlos Brito, DJ de 15.04.2005; HC n.º 82.832-DF, Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 05.09.2003; HC n.º 82.770-RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 05.09.2003; HC N.º 83.943-MG, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 17.09.2004; HC nº 85.641-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 17.05.2005. Segundo o entendimento jurisprudencial do STF, a garantia da ordem econômica, por sua vez, funda-se não somente na magnitude da lesão causada, mas também na necessidade de se resguardar a credibilidade das instituições públicas. Precedentes: HC n.º 80.717-SP, Rel. para o acórdão Min. Ellen Gracie, DJ de 05.03.2004. No caso concreto, a magnitude da lesão provocada foi invocada pelo decreto prisional como elemento autônomo para fundamentar a custódia cautelar. Impossibilidade. Por fim, a necessidade de se assegurar a aplicação da lei penal não se sustenta, na medida em que, na espécie, as prisões cautelares de todos os demais co-réus já foram revogadas por excesso de prazo. Habeas Corpus deferido” (HC n.º 85.615-2/RJ, DJ 03.03.2006).


2.2. Ora, se o entendimento desse Colendo Supremo Tribunal Federal inadmite decretação de prisão decorrente da sentença condenatória quando o réu permaneceu solto durante todo o processo, sem qualquer demonstração concreta da necessidade da prisão e, tampouco, a presença dos requisitos objetivos do artigo 312, do CPP, é indiscutível que se está diante da exceção à regra: hipótese de flagrante ilegalidade.

2.3. O que não se pode é, a pretexto de um preciosismo formal, deixar-se o paciente órfão da tutela jurisdicional, permitindo-se que seja implementada decisão que desrespeita frontalmente o entendimento deste Tribunal, quando se sabe que o julgamento do mérito do habeas corpus, especialmente, em plenas férias forenses poderá durar apenas perante o colendo TRF da 3ª Região, mais de dois meses, com o paciente encarcerado.

2.4. Doutos Ministros, o caso é de urgência e a ilegalidade é manifesta, daí porque, aguarda-se seja este conhecido e processado, como medida da mais verdadeira

J U S T I Ç A!

II – DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL:

Eminente Ministro Relator, dificilmente Vossa Excelência verá caso tão patente, tão frisante, de prisão ilegal, imposta em decorrência de sentença condenatória recorrível (docs. 3 e 4), como no caso presente. Pior que isso, mesmo diante da flagrante ilegalidade, após indeferida a liminar do habeas corpus impetrado perante o e. TRF da 3ª Região, a aquele que hostilizava a decisão denegatória foi negado seguimento por despacho da d. autoridade apontada como coatora (docs. 1 e 2).

3. Deixemos de lado, por ora, a consagrada lição para casos até mais graves, segundo a qualConfigura constrangimento ilegal a prisão cautelar decretada na pronúncia, ao singelo fundamento de que o paciente possui maus antecedentes, quando ele permaneceu solto durante toda a instrução criminal, por decisão da própria Juíza, que, ao receber a denúncia, reconheceu ausentes os pressupostos legais e fáticos para a decretação da medida excepcional de constrição da liberdade antes do trânsito em julgado de sentença condenatória. Ordem deferida” (STF, rel. Min. Eros Grau, HC n.º 86.684, DJ 17.02.2006).

3.1. Ou ainda: “O art. 594 do Código de Processo Penal não implica o recolhimento compulsório do apelante. Ao contrário, cuida de modalidade de prisão cautelar, razão por que deve ser interpretado em conjunto com o art. 312 do mesmo diploma. 2. A sentença condenatória, no que tange à prisão do paciente, funda-se na gravidade abstrata do crime por que foi ele condenado. 3. Ordem concedida, para que o paciente aguarde o julgamento da apelação em liberdade” (STF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, HC n.º 89.087, DJ 06/08/2004).

3.2. No mesmo sentido:

“EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO EM LIBERDADE. INOCORRÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O art. 594 do Código de Processo Penal não estabelece hipótese de prisão compulsória ou de execução provisória da sanção imposta, mas sim de prisão preventiva. 2. Antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, a custódia do paciente somente pode ser decretada quando tiver índole cautelar, ou seja, quando presentes os requisitos e pressupostos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. 3. Ordem concedida, para garantir que o paciente apele em liberdade, porque inexiste fundamentação cautelar para sua prisão” (rel. Min. Joaquim Barbosa, HC n.º 83.892, DJ 23/04/2004).


3.3. No caso deste writ, em matéria de constrangimento ilegal, há algo tão ou mais gritante do que a própria ausência de cautelaridade na imposição da prisão processual.

4. Os motivos invocados pelo i. juiz de primeiro grau para impor a custódia do paciente o qual, frise-se, permaneceu em liberdade durante todo o transcorrer das investigações e da própria ação penal, são de ordem estritamente objetiva e vêm bem sumariados pela autoridade inicialmente apontada como coatora: i) magnitude da lesão; ii) arts. 7º e 9º da Lei do Crime Organizado (9.034/95); iii) garantia da ordem pública; iv) garantia da ordem econômica; v) art. 3º da Lei de Lavagem e, por fim, vi) art. 11 da Convenção da ONU contra a criminalidade organizada transnacional (doc. 2).

4.1. Independentemente do desacerto dos fundamentos para a imposição da prisão ante tempus, mais adiante examinados, é inconcebível que sendo estes de ordem objetiva, uns condenados tenham tido o direito de apelar em liberdade, enquanto outros não. Vejamos o caso do co-réu André Pizzelli Ramos: embora tenha sido condenado pelos mesmos delitos e à mesma pena que o paciente (fls. 12.858 – doc. 3), o magistrado inicialmente apontado como coator permitiu-lhe apelar em liberdade e, sem qualquer justificativa quanto à diferenciação, não permitiu o mesmo para o paciente.

4.2. Se é verdade que na r. sentença o MM. juiz de primeiro grau em relação ao pai do paciente (Edemar) e a seu primo (Ricardo) chega a declinar a existência de outra ação penal a que eles respondem, em relação ao paciente não há nada. Ora, é de se perguntar: por que acusados que têm a mesma situação (mesmos crimes e penas idênticas) foram tratados desigualmente? Afinal, por que a Lei do Crime Organizado pode servir para vedar o apelo em liberdade de uns e de outros não? E, da mesma forma, que dizer do invocado art. 11 da Convenção da ONU? Por fim, como se pode dizer que réus em situações processuais idênticas possam contribuir com as suas prisões provisórias para a credibilidade do sistema financeiro ou a manutenção da ordem pública e, concomitante, a liberdade dos outros não atente contra tais sistemas?

4.3. Para as evidentes iniqüidades apontadas sequer há explicação na r. sentença. Esta se limitou, singelamente, a proclamar a liberdade de alguns para apelar (cf. fls. 12.860). Portanto, só resta concluir que estamos diante de algo monstruoso, teratológico, isto é, que violenta de forma afrontosa uma garantia fundamental do Estado de Direito: o tratamento isonômico dos réus no mesmo processo e que estejam nas mesmas condições.

4.4. O artigo 5º, caput, da Constituição Federal, na tradição das Cartas anteriores, quando reafirma a igualdade de todos perante a lei, impõe a rejeição de tratamento diferenciado para situações semelhantes.

4.5. Sobre o ditame constitucional, debruçando-se ainda sobre o texto da anterior Constituição, o insigne Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, leciona que o princípio da isonomia jurídica:

"É também um princípio de interpretação. O juiz deverá dar sempre à lei o entendimento que não crie privilégio de espécie alguma" ("Curso de direito constitucional", SP, ed. Saraiva, 7ª ed., 1978, p. 268).


4.6. Bem por isso, o eminente Prof. Celso Antonio Bandeira De Mello, citando Kelsen, afirma:

"Colocar (o problema) da igualdade perante a lei é colocar simplesmente que os órgãos de aplicação do direito não têm o direito de tomar em consideração senão as distinções feitas nas próprias leis a aplicar” ("O conteúdo jurídico do princípio da igualdade", SP, ed. Rev. dos Tribunais, 1978, p. 14 em nota de rodapé, nº 2).

4.7. Discorrendo sobre o "sentido da cláusula da igualdade", ressalva o eminente Ministro Celso de Mello o seguinte:

"O tratamento discriminatório só se legitima juridicamente: a) em função de expressa disposição constitucional; ou b) em virtude de pressupostos lógicos e objetivos, que justifiquem, racionalmente, a desequiparação operada" ("Constituição Federal Anotada", SP, ed. Saraiva, 1984, p. 324).

4.8. Na espécie, por mais que se procure um critério lógico de desequiparação, não se consegue compreender o porquê réus, que foram condenados pelos mesmos crimes e com as mesmas penas, foram tratados de maneira tão desigual.

4.9. Em caso análogo, a e. Sexta Turma do colendo Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, já decidiu:

“Já há muito tempo que o ordenamento jurídico brasileiro consagrou princípios como o da igualdade de todos perante a lei, que não permite se tratem igualmente situações desiguais ou desigualmente situações iguais.

(…)

Na espécie, o tratamento conferido aos réus atenta contra o princípio da igualdade, ademais, o paciente – citado e interrogado – está ciente da audiência de instrução criminal, bem como fez prova de vínculo com o distrito da culpa e de ter atividade profissional regular” (HC n.º 46.410/SP, rel. Min. Nilson Naves, DJ 13.03.2006).

5. Portanto, eminente Ministro Relator, do que até agora foi exposto, fica patente o absurdo, data venia, que representa, em matéria de prisão antecipada, a cautela de uns para fins extra-processuais (v.g., ordem pública, credibilidade do sistema financeiro etc.) e a concomitante liberdade de outros. A conclusão a que se pode chegar é só uma: tanto a prisão para apelar não é necessária, que um co-réu em situação idêntica pode ficar em liberdade sem que a ordem pública, a credibilidade do sistema financeiro ou a Convenção da ONU ficassem arranhadas

5.1. Daí que, com a devida venia, não é como o nobre Desembargador inicialmente coator disse, isto é, que a hipótese retratada representa uma das interpretações possíveis que o juiz de primeiro grau adotou. Aqui não! Não o permite a Constituição: se não houver diferenciações descritas e demonstradas, o tratamento deve ser igual entre os acusados; não sendo, há inegável, insanável, monstruoso, constrangimento ilegal.

Há mais.


5.2. Se a magnitude da lesão ___ que o d. juiz de primeiro grau diz não acolher isoladamente ___ é invocada na r. sentença para legitimar a cautela processual, é de se perguntar, considerando-se que a imputação constante da denúncia não foi alterada, por que somente após a prolação do édito condenatório é que disso se cogitou? A resposta é simples, explica-o o em. sentenciante: “evidente que a situação processual de alguém antes do julgamento não se equipara a do condenado, ainda que por julgamento não definitivo, uma vez que, na segunda hipótese, há demonstração, “mesmo que não perene, da responsabilização criminal…” (f. 12.836).

5.3. Sim, para o MM. juiz de primeiro grau, a certeza provisória que a sentença recorrível consubstancia, marca a diferença que permite a prisão processual. Em outros termos, embora haja um disfarce, uma roupagem, de cautelaridade, o que há, na verdade, é punição antecipada. Não é por acaso que o culto juiz vai buscar na lei e na doutrina estrangeira os fundamentos para mitigar a garantia constitucional da presunção de inocência. Não é à toa que o d. sentenciante invoca a Convenção Européia dos Direitos do Homem, é o “motivo suficiente e autônomo para a prisão” (art. 5º, 1, “a”, cf. na sentença, fls. 12.837 ou p. 627, de acordo com a numeração na parte inferior). Goste-se ou não, este não é o padrão adotado pela Constituição tupiniquim de 1988.

5.3.1. É que, como este Supremo Tribunal Federal vêm insistentemente advertindo “Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado, ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário” (HC 80.719, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, DJ 28/9/01).

5.4. Daí, ínsita-se, a consolidada jurisprudência do E. STJ no sentido de que “a condenação, por si só, não é bastante para afetar o exercício do direito de liberdade. Ademais, nenhuma prisão se justifica sem a evidência da necessidade. Caso contrário, retornar-se-á ao período de nossa legislação, de a natureza da infração penal justificar o recolhimento do acusado” (HC 5085, rel. Min. Cernicchiaro; DJ 3/3/97). Idem, entre muitos outros julgados: HC 19711, rel. Min. Carvalhido, DJ 19/12/02).

5.5. Ora bem, o que há no caso desta impetração é que, ao se invocar a prolação da r. sentença como situação nova, busca-se aí, mecanicamente, o suporte para a prisão antecipada. A não ser assim, por que a tardia lembrança de que “o artigo 7º da Lei n.º 9.034, de 03.05.1995 (acerca de organizações ou associações criminosas) veda a liberdade provisória” (f. 12842)? De fato, se o paciente aguardou todo o desenrolar da ação penal em liberdade e não lhe foi imposta a prisão preventiva, aliás, nem sequer cogitada em relação a si, qual a razão de ser para sua lembrança agora? Uma só: castigo antecipado, numa inadmissível confusão entre a prisão penal (carcer ad poenam) e a prisão cautelar.

5.6. Observa-se que a “intensa e efetiva participação” na suposta prática dos ilícitos referida na sentença (f. 12.842) é tema de mérito, relativo à imputação em si e não traduz qualquer fato novo, que diga com a necessidade absoluta da cautela processual exigida para a imposição da prisão para apelar.


5.7. Se a jurisprudência pacificou que a prolação da sentença, por si só, não é fenômeno suficiente para a imposição do gravame cautelar, máxime quando o acusado esteve em liberdade durante todo o transcorrer da ação penal e, no caso, do inquérito também, resta concluir que a orientação perfilhada pelo culto juiz de primeiro grau, longe de ser, como acreditou o preclaro Desembargador Federal, inicialmente apontado como coator, uma interpretação possível, que “não se mostra desarrazoada” (doc. 2), é, em verdade, frontalmente contrária à garantia constitucional e à orientação jurisprudencial solidamente firmada e sem qualquer discrepância. Nessa medida, a decisão atacada, também sob este prisma, revela-se teratológica.

5.8. Por fim, retomemos agora os ensinamentos da d. autoridade apontada como coatora segundo os quais “Em princípio, o réu que esteve em liberdade durante o transcorrer da ação penal tem o direito de aguardar solto o julgamento do recurso que interponha contra a sentença que o condenou(RHC 14569-SP; Relator Ministro Paulo Gallotti, 6.ª Turma, j. 12/4/2005, DJ 1º/8/06, p. 545, votação unânime) ou a de que “a prisão cautelar, de natureza processual, só pode ser decretada em se mostrando a absoluta necessidade de sua adoção” (HC n.º 17.208-CE, Relator p/ acórdão Ministro Paulo Gallotti, 3.ª Seção, j. 12/09/01, DJ 18.02.02 p. 229).

5.9. Ora, no caso vertente, qual o fato novo trazido pela r. sentença de modo a impedir o apelo do paciente em liberdade? Nenhum! Rectius: sua “intensa e efetiva participação” na prática dos ilícitos que reputou ocorridos! Ocorre que isso, por si só, e por mais que o d. magistrado tenha firmado seu convencimento, não pode validar a imposição da prisão que há de ter natureza cautelar. Mas se a cautela, com o perdão da insistência, nunca se fez necessária, por que só agora? A resposta é uma só: a prolação da sentença que, como referiu MM. Juiz ao citar a Convenção Européia dos Direitos do Homem, é o “motivo suficiente e autônomo para a prisão” (art. 5º, 1, “a”, cf. na sentença, p. 12.837). Há, como se percebe, um círculo viçoso do qual não se escapa: a sentença é o motivo bastante.

6. Repelindo a possibilidade de a sentença condenatória, por si só, legitimar a prisão ante tempus, a colenda Quinta Turma do egrégio Superior Tribunal de Justiça, em brilhante acórdão relatado pelo eminente Ministro Gilson Dipp, advertiu:

“O magistrado entendeu necessária a prisão para apelar como forma de garantir à ordem pública, a fim de acautelar o meio social e evitar a reprodução de outros delitos semelhantes, e também como forma de assegurar a aplicação da lei penal, diante da presença de antecedentes criminais e pelo fato do réu não possuir residência fixa e não ter ocupação lícita.

O Tribunal a quo acrescentou a repercussão do delito no meio social como motivo suficiente para a custódia.

Entretanto, tais aspectos, afastados de quaisquer fatos concretos que não a própria prática delitiva não servem para respaldar a prisão, notadamente por se tratar de réu que respondeu ao processo em liberdade e que compareceu espontaneamente a todos os atos processuais.

Ademais, conclusões vagas e abstratas a respeito do que poderá vir a fazer caso permaneça solto, sem vínculo com situação fática concreta, efetivamente existente, consistem meras probabilidades e suposições, motivo pelo qual não podem respaldar a vedação ao apelo em liberdade(HC n.º 54.685/SP, DJ 4/9/06 ).


7. Eminente Ministro,

1. Se outro acusado, apenado de forma idêntica pelos mesmos crimes, não teve o direito de apelar em liberdade cerceado, e isto não afeta a ordem pública, a credibilidade das instituições financeiras, ou qualquer outra coisa, e, tampouco, foram invocadas razões de ordem pessoal para justificar a prisão do paciente, é porque esta, além de afrontar a garantia da isonomia, é gritantemente desnecessária, injusta e ilegal. Verdadeiramente teratológica.

2. Se, como se viu, a sentença é tomada como fundamento “suficiente e autônomo para a prisão”, é manifesto o seu desalinho com a interpretação pretoriana e a garantia constitucional da presunção de inocência; isto revela-se grosseiramente ofensivo ao primado da liberdade (regra) sobre o da prisão (exceção)

3. Se o paciente ficou em liberdade durante todo o tempo (inquérito e processo), nunca sequer se cogitando da sua prisão cautelar e não há fato novo indicado para legitimá-la, a não ser, insista-se, a própria prolação da sentença, é porque sua ilegalidade é manifesta.

7.1. Nessa conformidade, contando com os doutos suprimentos de Vossa Excelência, aguarda-se o conhecimento deste writ e a concessão da ordem para que o paciente possa aguardar em liberdade o julgamento da apelação como medida da melhor

J U S T I Ç A!

III – Do pedido de liminar

8. Além de o fumus boni iuris presente em toda a argumentação acima exposta, especialmente na lição jurisprudencial trazida à colação e no fato de o paciente ter respondido a toda a ação penal que durou mais de dois anos em liberdade, sem nunca ter se cogitado da sua prisão preventiva; o periculum in mora é patente pelo fato de o paciente já estar privado de sua liberdade de locomoção em virtude de ordem manifestamente ilegal, recolhido no Presídio de Tremembé (SP), onde se encontra com presos de alta periculosidade e privado de sua família e atividades laborativas.

8.1. Veja Vossa Excelência, que a concessão da liminar não trará qualquer prejuízo ao processo penal que já se encontra em fase de apelação (doc. 4), sendo o paciente residente em São Paulo tendo sido preso em sua residência, o que implica dizer que, caso a colenda Turma Julgadora ao final denegue esta ordem, o paciente poderá ser encontrado no mesmo local. Não há qualquer indicativo que faça supor que o paciente se evadirá, tanto que nunca se invocou tal fundamento para prendê-lo.

8.2. Como já decidiu o eminente Min. Celso De Mello:

“A medida liminar, no processo penal de habeas corpus, tem o caráter de providência cautelar. Desempenha importante função instrumental, pois destina-se a garantir – pela preservação cautelar da liberdade de locomoção física do indivíduo – a eficácia da decisão a ser ulteriormente proferida quando do julgamento definitivo do writ constitucional” (RTJ 147/962).

8.3. Assim, em caráter liminar, requer-se seja revogada a prisão imposta ao paciente, determinando-se a imediata expedição de alvará de soltura em seu favor, para que em liberdade aguarde o julgamento final do writ, como medida de JUSTIÇA !


IV – Do pedido final

9. Ao final, requerem os impetrantes seja conhecido e deferido o writ reconhecendo o direito de o paciente apelar em liberdade, com o que Vossas Excelências estarão, uma vez mais, distribuindo JUSTIÇA!

São Paulo, 26 de dezembro de 2006.

ALBERTO ZACHARIAS TORON

O.A.B./SP nº 65.371

CARLA VANESSA T.H. DE DOMENICO

O.A.B./SP nº 146.100

HELOISA ESTELLITA

O.A.B./SP 125.447

EXMO. SR. MINISTRO PRESIDENTE

DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

URGENTE

Réu Preso

Relator prevento

(item 4 – pág 39)

Pedido de liminar

(item 5 – pág. 42)

Os advogados ARNALDO MALHEIROS FILHO, FLÁVIA RAHAL e DANIELLA MEGGIOLARO, inscritos respecti­vamente na Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo sob os ns. 28.454, 118.584 e 172.750, com escritório no endereço abaixo impresso, vêm à pre­sença de V. Exa., com funda­mento nos arts. 5º, nº LXVIII, da Consti­tuição da República e 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar

“HABEAS CORPUS”

em favor de EDEMAR CID FERREIRA, qualificado nos documentos anexos, que so­fre constrangimento ilegal imposto pelo E. Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu o processamento do Habeas Corpus nº 72.926/SP impetrado contra decisão liminar do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região (HC nº 2006.03.00118965-7) mantendo deci­são manifestamente ilegal proferida pelo MM. Juiz Federal da 6ª Vara Criminal de São Paulo que, de forma arbitrária e inconstitucional, determinou sua prisão em razão de sentença condenatória ainda não transitada em julgado (doc. nº 1), impedindo-o de apelar em liberdade nos autos do processo nº 2004.61.81.008954-9, tudo como a seguir se expõe.


1. breve resumo dos fatos

Como é de conhecimento público, o paciente, ex-controlador do Banco Santos S/A, responde a ação penal movida pelo Ministério Público Federal para apurar fatos supostamente criminosos que teriam levado à intervenção do Banco Central naquela instituição financeira (doc. nº 2).

Tirante período em que sofreu constrangimento ilegal sanado pela Su­prema Corte, o paciente respondeu ao processo em liberdade, comparecendo a todos os atos processuais a que convocado, atendendo a todas as intimações que lhe foram dirigidas, tudo em absoluto respeito ao MM. Juiz de 1º grau e ao Poder Judiciário. Apesar disso, o paciente sofreu injusta e ilegal prisão preventiva. Re­gistre-se que, até mesmo nessa ocasião, ele continuou, como sempre esteve – à disposição da Justiça, tanto que foi preso em sua residência, sem apresentar qualquer embaraço ao cumprimento do mandado de prisão.

A arbitrariedade daquela custódia cautelar evidenciava-se pela inexistência de qualquer dos requisitos do art. 312 do CPP, motivo pelo qual o decreto de pri­são foi fulminado por esse Supremo Tribunal Federal no último dia 22 de agosto, em decisão liminar coletiva proferida nos autos do Habeas Corpus nº 89.025/SP (superando o óbice da Súmula 691 dessa Colenda Corte), que entendeu não existir nenhum motivo justificador de prisão antes da condenação (doc. nº 3).

Pois bem. Na manhã do último dia 12 o paciente foi surpreendido com a notícia de que havia sido condenado à altíssima pena de 21 anos de reclusão pela prática dos delitos previstos “no art. 288 do Código Penal, no art. 4º, caput, da Lei nº 7.492/86 (sendo absorvidos por este os tipos previstos no art. 5º, inciso. II, da Lei nº 8.137/90, e nos arts. 6º, 10, 11 e 17, da Lei nº 7.492/86), arts. 20 e 22, parágrafo único, primeira figura da Lei nº 7.492/86, em concurso material, final­mente, por infração ao art. 1º, ns. VI e VII, da Lei nº 9.613/98, cc. o seu § 4º e com a Lei nº 9.034/95”. Juntamente com a notícia de sua condenação veio tam­bém a de que deveria se recolher preso, o que foi imediatamente cumprido pelos Agentes Federais que, como de costume, encontraram-no em sua residência.

Segundo o eminente prolator da r. sentença – que chegou a invocar o fato de estar possuído de sentimentos melancólicos (“de imprestabilidade e de impu­nidade” – fls. 12.838 do doc. nº 1) – o paciente não tem direito de apelar em liberdade porque:

i) “o princípio da presunção da inocência ou da não-culpabilidade não possui vinculação alguma com os efeitos de recursos ou das decisões condenatórias no processo penal” (fls. 12.836 do doc. nº 1);

ii) o art. 9º da Lei nº 9.034/95 “veda o apelo em liberdade” (fls. 12.844 do doc. nº 1);

iii) a liberdade do paciente afronta a ordem pública e a “credibilidade do Poder Judiciário”, uma vez que os fatos pelos quais foi condenado cau¬sam grande repercussão pública (?) e ele já responde a outro processo criminal, sem decisão de primeiro grau; e

iv) as condutas atribuídas a ele “propiciaram prejuízo constatado de grande monta” (fls. 12.843 do doc. nº 1), o que caracterizaria suposta “magnitude da lesão”.

Ocorre que, diferentemente do que assentou o D. Juízo monocrático, o paciente não pode ser preso antes do trânsito em julgado da sentença condenató¬ria. Tal medida configura inaceitável execução antecipada da pena, conforme pacificamente têm assentado as altas Cortes brasileiras, especialmente esse Pretório Excelso, a cuja jurisprudência o ínclito sentenciante se mantém alheio.


Contra essa arbitrária decisão, o paciente impetrou habeas corpus ao E. Tribunal Regional Federal, com pedido de liminar para sua pronta libertação (doc. nº 4). Para seu espanto, o eminente Desembargador Relator negou a liminar, mantendo a custódia cautelar do paciente (doc. nº 5).

Em razão disso, foi impetrado novo habeas corpus com pedido de liminar ao Superior Tribunal de Justiça (doc. nº 6), que indeferiu seu processamento com fundamento na Súmula 691 dessa Colenda Corte (doc. nº 7). Consta da r. decisão atacada que:

“Não há como dar seguimento ao pedido.

“O Superior Tribunal de Justiça tem compreensão no sen­tido de não caber habeas corpus contra decisão que denega liminar, a não ser que demonstrada flagrante ilegalidade, o que não ocorre na espécie (…)

“Ante o exposto, sendo manifesta a inviabilidade do writ, com base no art. 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, indefiro liminarmente o pedido.”

Acontece que, o conhecimento de habeas corpus, em circunstâncias como as que ora se discutem, é perfeitamente possível, conforme tem decidido fre­qüentemente esse Pretório Excelso, inclusive em relação ao próprio paciente, quando revogada sua prisão preventiva anteriormente decretada. A ilegalidade dessa nova prisão é, da mesma forma, evidente, saltando aos olhos de quem se detém por alguns segundos na leitura da decisão combatida.

2. O VERBETE 691 DA SÚMULA Desse SUPREMO TRIBUNAL:

O cabimento do presente pedido de HABEAS CORPUS

Ao Supremo Tribunal Federal, como guardião das liberdades fundamentais asseguradas pela Constituição, cabe adotar soluções que, traduzindo as especificidades de cada caso concreto, visem a reparar as ilegalidades perpetradas por decisões que, em estrito respeito a normas processuais, acabem criando estados de desvalor constitucional

Ministro Gilmar Mendes[1]

Inicialmente, é preciso destacar que o pleito que se vai adiante deduzir passa pela atenuação dos rigores dos termos da Súmula nº 691 – “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, inde­fere liminar” –, o que é plenamente possível, conforme já decidiu o Pleno dessa Co­lenda Corte ao revogar, por exemplo, a prisão preventiva do paciente nos autos do HC nº 89.025/SP!

Esse Supremo Tribunal Federal, aliás, em decisão de grande repercussão envolvendo o ex-Prefeito Paulo Maluf, foi categórico quanto a essa possibilidade:


“Constitucional. Penal. Processual Penal. Habeas Corpus. Prisão preventiva decretada por conveniência da instrução criminal. Liminar indeferida pelo relator, no STJ. Súmula 691-STF.

“Pedido trazido à apreciação do Plenário, tendo em consideração a existência da Súmula 691-STF.

“Liminar indeferida pelo Relator, no STJ. A Súmula 691-STF, que não admite habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em HC requerido a Tribunal Superior, indefere liminar, admite, entretanto, abranda­mento: diante de flagrante violação à liberdade de locomo­ção, não pode a Corte Suprema, guardiã-maior da Consti­tuição, guardiã-maior, portanto, dos direitos e garantias constitucionais, quedar-se inerte.

“Precedente do STF: HC 85.185/SP, Ministro Cezar Peluso, Plenário, 10.8.2005. Exame de precedentes da Súmula 691-STF.

“(…)

“Paciente com residência no distrito da culpa, onde tem profissão certa; não há notícia de que haja procrastinado a instrução ou o julgamento, tendo se apresentado à prisão imediatamente após a decretação desta. A prisão preven­tiva, principalmente a esta altura, constitui ilegalidade flagrante.

“Liminar deferida”[2].

Não é demais destacar, ainda, o entendimento manifestado pelo Min. Gilmar Mendes que, em decisão monocrática, destaca os critérios que permitem a superação da Súmula referida:

“(…) Registre-se, por oportuno, que a jurisprudência desta Corte é no sentido da inadmissibilidade de habeas corpus, nas causas de sua competência originária, contra decisão denegatória de liminar em ação de mesma natureza articu­lada perante tribunal superior, antes do julgamento defini­tivo do writ (cf. HC no 79.776-PR, Primeira Turma, unâ­nime, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 18.02.2000; HC no 76.347-MS, Primeira Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 05.12.1997; HC no 79.238-RS, Primeira Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 06.08.1999; HC no 79.748-RJ, Segunda Turma, por maio­ria, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 23.06.2000; e HC no 79.775-AP, Primeira Turma, unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 17.03.2000). Esse entendimento restou con­solidado na Súmula nº 691, verbis: ‘Não compete ao Su­premo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impe­trado contra decisão do Relator que, em habeas corpus re­querido a tribunal superior, indefere a liminar’. Entretanto o rigor na aplicação da Súmula nº 691/STF tem sido abrandado nas hipóteses em que: i) seja premente a neces­sidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou ii) a negativa de deci­são concessiva de medida liminar pelo tribunal supe­rior importe na caracterização ou na manutenção de situa­ção que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF (nesse sentido: HC no 84.014-MG, Primeira Turma, unâ­nime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 25.06.2004; HC no 85.185-SP, Pleno, por maioria, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 10.08.2005; e HC no 85.826-SP, de minha relatoria, DJ de 03.05.2005).(…)”[3]


O ato coator, com o devido acatamento, é daqueles que autoriza a não aplicação do verbete nº 691, uma vez que viola frontalmente o ordenamento jurí­dico. Afinal, a manutenção de um decreto de prisão preventiva sem a presença de nenhum de seus requisitos autorizadores e, pior, determinado nos autos de um processo ao qual o paciente respondeu em liberdade, cuja sentença condenatória ainda não se tornou definitiva, torna, nas palavras do Min. Gilmar Mendes, “premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal”.

Como melhor se verá em item próprio, o paciente sempre esteve à disposi­ção da Jus­tiça, comparecendo a todos os atos processuais para os quais foi convo­cado, não apresentando qualquer resistência ao cumprimento de intimações ou de qualquer forma obstruindo o bom andamento dos feitos em trâmite na 6ª Vara Federal Criminal. Ao contrário. Muitas vezes o paciente chegou a se antecipar às intimações judiciais. A determinação de sua custódia cautelar, nos termos em que se deu, configura inconstitucional antecipação de pena, abominada pela atual Jurisprudência pátria, especialmente desse E. Tribunal.

Dessa forma, sendo inegável que sofre o paciente constrangimento evi­dente e afronta efetiva ao seu direito constitucional de ir e vir, o habeas corpus é o meio adequado para saná-lo, razão pela qual a Súmula 691 deve deixar de ser aplicada ao caso.

É importante salientar, como bem afirmou o Ministro Marco Aurélio em decisão liminar recente (HC 88.598/SP, DJU 15.5.2006, p. 31), que “o verbete” da Súmula mencionada “não pode ser levado às últimas conseqüências”, sob pena de obstaculizar o “acesso ao Judiciário”. Isso porque, conforme ainda ressaltado pelo ilustre Ministro, o “fetichismo da forma” não deve se sobrepor às garantias individuais previstas na Constituição da República. Nesse sentido, é o que se observa do seguinte despacho:

“Em síntese, concretizado ato de constrição à margem do arcabouço normativo e havendo a quem recorrer, surge com extravagância maior o apego à forma, à ausência de atuação do Estado-juiz para aguardar-se o desfecho final do processo revelador de habeas corpus na origem. É que, enquanto isso, permanece o paciente submetido à ilegali­dade e isso ocorre para simplesmente homenagear-se eventual fetichismo da forma. Não é o fato de ter ficado vencido quando da aprovação do verbete que me leva a as­sim perceber, mas os ditames maiores da Lei Fundamental da República, que está no ápice da pirâmide das normas ju­rídicas e a todos, indistintamente, submete. É que o con­vencimento sobre o habeas corpus continua o mesmo: en­quanto houver órgão competente para apreciá-lo, órgão ju­dicante situado em patamar superior àquele que tenha pra­ticado o ato tido como à margem da ordem jurídica, não se pode simplesmente fechar as portas de acesso à parte pre­judicada. Somente assim é possível harmonizar o Verbete nº 691 da Súmula do Supremo com a Lei Fundamental”.

Outras decisões desse Pretório Excelso reforçam o entendimento de que, em casos de patente ilegalidade, a Súmula em questão deve excepcionalmente deixar de ser aplicada:

“A Súmula do Supremo revela, como regra, o não-cabi­mento do habeas contra ato de relator que, em idêntica medida, haja implicado o indeferimento de liminar.

“A exceção corre à conta de flagrante constrangimento ilegal.


“Prisão provisória – Investigação – Inviabilidade. Não se há de proceder a prisão provisória com a única finalidade de realizar investigações, não cabendo presumir o excep­cional, ou seja, que, em liberdade, possível envolvido difi­cultará a atuação da polícia. Prisão provisória. A repercus­são do crime no âmbito da sociedade, por si só, não respalda a prisão provisória[4].

“Competência criminal. Habeas corpus. Impetração contra decisão de ministro relator do Superior Tribunal de Justiça. Indeferimento de liminar em habeas corpus, sem funda­mentação. Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal. Co­nhecimento admitido no caso, com atenuação do alcance do enunciado da súmula. Precedentes. O enunciado da sú­mula 691 do Supremo não o impede de, tal seja a hipótese, conhecer de habeas corpus contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido ao Superior Tribunal de Justiça, indefere pedido de liminar.

“Ação penal. Prisão preventiva. Decreto fundado na neces­sidade de restabelecimento da ordem pública, abalada pela gravidade do crime. Exigência do clamor público. Inad­missibilidade. Razão que não autoriza a prisão cautelar. Precedentes. Interpretação do art. 366, caput, do CPP. É ilegal o decreto de prisão preventiva baseado no clamor público para restabelecimento da ordem social abalada pela gravidade do fato.

“Ação penal. Prisão preventiva. Decreto fundado também na necessidade de identificação dos co-réus e de prevenção de reincidência. Inadmissibilidade. Razões que, não autori­zando a prisão cautelar, guardam contornos de antecipação de pena. Precedentes. Interpretação do art. 366, caput, do CPP. HC concedido, com extensão da ordem aos co-réus. É ilegal o decreto de prisão preventiva baseado na necessidade de identificação dos co-réus e de prevenção de reincidência”[5].

De acordo com tais decisões, portanto, sempre que houver manifesto e ir­reparável atentado à liberdade de alguém, é possível deixar de aplicar os enuncia­dos da Súmula em questão, pois não há formalismo que possa justificar a ilegali­dade de um decreto de prisão preventiva. O pedido aqui formulado está a merecer o mesmo tratamento, consoante se vai a seguir demonstrar.

3. O direito de apelar em liberdade

“É ilegal negar ao réu o direito de apelar em liberdade, sob fundamento de sua prisão justificar-se como garantia da ordem pública e exigência da gravidade do delito”[6].

Como se sabe, assiste aos acusados em processo criminal o direito de ape­lar em liberdade, ex vi dos arts. 5º, LV, LVII e LXI, da Constituição e 594 do CPP. O decreto de prisão ora atacado, além de contrariar maciça jurisprudência, reforça os reiterados protestos do paciente quanto à parcialidade do Juiz de 1º grau.


3.1. A impossibilidade de execução antecipada de sentença condenatória

Funda-se a r. sentença nos seguintes argumentos:

“… o princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade (art. 5º, item LVIII da CF/1988) não possui vinculação alguma com os efeitos de recursos ou das deci­sões condenatórias no processo penal. A interpretação ex­tremada do preceito constitucional vedaria qualquer outra e se consagraria, por mais incongruente que fosse, no sentido de que o acusado não pudesse ser privado de seus bens ou de sua liberdade antes do trânsito em julgado, incompati­bilizando os institutos de seqüestro de bens e o da prisão cautelar.

“O princípio (não culpabilidade ou inocência), entretanto, refere-se à questão meritória, ou seja, para a responsabili­zação criminal a regra tem aplicação a favor do acusado, não obstaculizando EM CERTAS HIPÓTESES os efeitos decorrentes de uma sentença ou de recursos pro­cessuais, desde que devidamente justificadas, não tendo, pois, aplicação automática.

(…)

“Não existe óbice, portanto, para a prisão cautelar decor­rente de uma condenação, ainda que o acusado res­ponda ao processo solto, se plenamente justificada na sentença condenatória”.

Para demonstrar o despautério desse entendimento, cabe lembrar o que decide essa Suprema Corte a tal respeito, especialmente, de ordens de prisão expedidas antes do trânsito em julgado de sentença condenatória:

“Princípio da não culpabilidade – Razão de ser – Alcance. “O princípio da não-culpabilidade – inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal – decorre da ordem natural das coisas, sobrepondo-se, em termos de valores, ao pragma­tismo, a presunções, tendo em conta pronunciamento judicial passível de modificação na via recursal.

“Pena – Cumprimento – Decreto condenatório – Ausência de imutabilidade – Recurso – Efeito. A relação entre o princípio da não culpabilidade e o recurso sem efeito sus­pensivo, presente a execução da pena, é de dependência, superpondo-se a garantia de natureza constitucional à disciplina processual comum relativa aos efeitos do recurso.

“Pena – Execução – Premissa. Condição inafastável à exe­cução da pena, sempre de contorno definitivo, é a preclu­são, na via da recorribilidade, do decreto condenatório. Vale dizer, sem título judicial condenatório coberto pela coisa julgada formal e material, descabe dar início à execu­ção da pena, pouco importando tenha o recurso apenas o efeito devolutivo”[7].

“Sentença condenatória. Pena privativa de liberdade. Substituição por pena restritiva de direito. Decisão impugnada mediante agravo de instrumento, pendente de julgamento. Execução provisória. Inadmissibilidade. Ilegalidade caracterizada. Ofensa ao art. 5º, LVII, da CF, e ao art. 147 da LEP. HC deferido. Precedentes. Pena restritiva de direitos só pode ser executada após o trânsito em julgado da sentença que a impôs”[8].


Em decisão recente, a 2ª Turma dessa Colenda Corte concedeu ordem de habeas corpus garantindo ao acusado o direito de aguardar em liberdade o trân­sito em julgado de decisão condenatória pendente de recurso extraordinário. É o que se observa do Informativo nº 452, referente aos últimos dias 11 a 15 de dezembro:

A Turma, por maioria, deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STM que, ao negar provimento à apela­ção da defesa, determinara a expedição de mandado de pri­são contra o paciente, apesar de pendente recurso de natu­reza extraordinária. Considerou-se inexistir, em face da Constituição, possibilidade de execução de sentença penal condenatória sem o seu trânsito em julgado. Asseverou-se que a execução provisória de sentença recorrível seria in­compatível não apenas com o princípio da não-culpabilidade. Ter-se-ia, efetivamente, a inadmissibilidade de se executar qualquer sentença privativa de liberdade antes que ela esteja definitivamente consolidada. Ademais, entendeu-se que, proferida a sentença penal condenatória, nada obsta a decretação de custódia do réu, desde que demonstrada a cautelaridade (CPP, art. 312)”[9].

Nesse mesmo diapasão, o eminente Ministro Gilmar Mendes concedeu medida liminar garantindo a permanência em liberdade ao acusado que, tendo respondido solto ao processo, teve sua condenação confirmada em apelação com a imediata expedição de mandado de prisão, conforme se vê da notícia publicada no site desse E. Tribunal no último dia 20 de dezembro:

“O ministro Gilmar Mendes deferiu um pedido de liminar no Habeas Corpus (HC) 90229, impetrado em favor do médico A.P.C. contra decisão do Superior Tribunal de Jus­tiça (STJ), que concedeu parcialmente o pedido para que o réu permanecesse em liberdade apenas até o julgamento de Embargos Declaratórios opostos pela defesa do acusado no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG).

“O Ministério Público Estadual denunciou o médico como co-autor do crime de homicídio qualificado por, suposta­mente, ter participado de ‘pega’ com o condutor de outro automóvel, provocando acidente que resultou na morte de cinco pessoas, em Minas Gerais. A.P.C. foi condenado pelo TJ-MG à pena de 12 anos e nove meses de reclusão pela prática dos homicídios, agravado por que uma delas era pessoa idosa.

“O Tribunal do Júri, ao anunciar a sentença, concedeu-lhe o direito de apelar em liberdade. A decisão foi tomada por ter o réu permanecido solto durante todo o processo, sem haver necessidade de prisão provisória, antes do trânsito em julgado da condenação. Mas o tribunal recomendou que fosse expedida guia para execução penal e o mandado de prisão. O Ministério Público Estadual não recorreu da sentença. A defesa interpôs recurso de apelação junto ao TJ-MG, que negou provimento ao pedido e manteve a con­denação de primeira instância, sendo expedido o mandado de prisão.

“Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus junto ao STJ pedindo o direito do réu aguardar em liberdade o jul­gamento dos recursos ordinários e extraordinários possí­veis e o trânsito em julgado da condenação, tendo a liminar deferida parcialmente.


“Em sua decisão, o ministro Gilmar Mendes deferiu o pedido de medida liminar, assegurando ao réu o direito de permanecer em liberdade até a apreciação do mérito do HC impetrado junto ao STJ. E no caso de o paciente já se en­contrar preso em decorrência da sentença original, deverá ser posto imediatamente em liberdade. Determinou ainda a expedição de salvo-conduto para o acusado”[10].

O próprio magistrado de 1º grau não ignora o despautério de sua afirmação de que o princípio da presunção de inocência “não possui vinculação alguma com os efeitos de recursos”, tanto assim que – como se amparassem a ilegalidade per­petrada! – traz à colação decisões que na verdade consagram o direito de apelar em liberdade, e.g.:

“Essa regra [art. 393, nº I, do CPP], no entanto, à luz da disciplina constitucional da liberdade, vem sendo mitigada pela moderna jurisprudência pátria, que, reiteradamente, à luz, por certo, do reconhecimento implícito da presunção relativa da necessidade da constrição cautelar, tem afir­mado que, se o réu respondeu solto a todo o processo da ação penal, assim deve permanecer mesmo após o édito condenatório, ressalvadas as hipóteses de presença dos pressupostos e motivos da custódia cautelar (art. 312 do CPP), suficientemente demonstrados pelo magistrado sentenciante”.[11]

“O art. 594 do CPP não implica o recolhimento compulsó­rio do apelante. Ao contrário, cuida de modalidade de pri­são cautelar, razão porque deve ser interpretado em conjunto com o art. 312 do mesmo diploma.”[12]

Rogério Lauria Tucci trata com primor do tema:

“Deve ser abordado, por derradeiro, na análise da garantia da legalidade da execução penal, o generalizado equívoco pretoriano determinante de execução provisória de julgamento condenatório recorrível, ou recorrido.

“Com efeito, como já procuramos evidenciar, em prece­dentes de prisão (certamente de caráter, meramente, processual) do condenado, pelos simples fato da condena­ção, estabelecida em ato decisório de mérito su­jeito a re­curso, a par de aberrar do sistema executivo vigo­rante em nosso ordenamento jurídico, afronta a preceitua­ção contida no inc. LVII do art. 5.º da CF, segundo o qual ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em jul­gado de sen­tença penal condenatória’.

“Expressa, de maneira clarificada, esse transcrito manda­mento constitucional, na esteira de globalizado entendi­mento, o direito do cidadão, envolvido numa persecução penal, à não-consideração prévia de sua culpabilidade, isto é, de não poder ser tido como culpado até que coberto pela coisa julgada decisum condenatório.

“Dentre os autores citados, sobrelevando a essência desse direito, de cunho universal, enfatiza Sabatini que: ‘O im­putado é sempre, e só, imputado, para o fim de desen­vol­vimento do processo. Então, não é considerado nem ino­cente, nem culpado. E se, todavia, no Direito moderno, se precisa o que significa, e o que deva significar, a expres­são ‘ser imputado’, deve concluir-se que as normas proces­suais não são destinadas a tutelar uma apriorística presun­ção de inocência, mas a contemplar a complexidade de es­copos a que tende a instauração e o desenvolvimento do processo, especialmente nas relações decorrentes da pes­soal e concreta situação do imputado no curso do procedimento’.


E prossegue:

“Ora, isso significa que o acusado, como tal, somente po­derá ter sua prisão provisória decretada quando esta as­suma natureza cautelar, ou seja, nos casos de prisão em flagrante, de prisão temporária, ou de prisão preventiva.

“Ao revés, proferido ato decisório, passível de enfrenta­mento por um dos recursos em lei previstos – apelação, recurso especial, recurso extraordinário –, mesmo que estes devam ser recebidos apenas no efeito devolutivo, impõe-se, para segregação prévia do condenado, a especificação, no decisum, simultaneamente com a condenação, do de­creto de prisão preventiva, com supedâneo nos pressupos­tos (prova da existência do crime e indício suficiente de autoria) e num dos possíveis requisitos (garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, aplicação da lei penal) estatuídos no art. 312 do CPP.

“A não ser assim, a ordem de prisão, tipicamente proces­sual, apresentar-se-á, induvidosamente, equivocada, con­sistindo em constrangimento ilegal à liberdade de locomo­ção do condenado.

“Ademais, e como, igualmente, cediço, delineia-se de todo inadmissível a ‘regulamentação’ de lei por simples provi­mento, emanado de outro Poder que não o Legislativo, es­pecialmente, quando, em situação ora analisada, ele afronta, não somente os dispositivos legais, cuja aplicação pretende disciplinar, mas também, e precipuamente, o sis­tema que eles integram.

“Nesse derradeiro enfoque, não constituirá, de nenhum modo, demasia a relembrança de que a Lei 7.210, de 11.07.1984, ao regulamentar a execução de ato decisório condenatório, contempla, tão-somente, aquele que, preclu­sos os prazos para os respectivos recursos, tenha transitado em julgado.

“Tanto isso é certo que o parágrafo único do art. 2.º, excogitando de execução provisória, alude, com exação, a preso provisório, ao qual são concedidos os mesmos di­reitos e determinados os mesmos deveres do preso definitivamente condenado.

“Além do que, como visto, esse mencionado diploma legal estabeleceu um, único, pressuposto (à evidência, jurídico) da execução penal, qual seja o título executivo consubstan­ciado em ato decisório de mérito condenatório, coberto pela coisa julgada; expressando o conjunto dos arts. 105, 107, 171 e 172 que ninguém poderá ser recolhido em esta­belecimento prisional, ou internado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, sem a respectiva guia, expedida pela autoridade judiciária competente, após o trânsito em julgado de sentença ou acórdão impositivo de pena privativa de liberdade ou de medida de segurança.

“Asserindo, nessa mesma linha orientativa, ser a ‘impro­priamente denominada ‘execução provisória’, instituto, di­versamente do que se passa no cível, inexistente no sistema processual penal’, aduz Sidnei Agostinho Beneti, que sua admissão revela-se ‘de absoluta incongruência nesse sistema, porque não há como admitir, sem infringência a direitos fundamentais do acusado, principalmente a pre­sunção de inocência e a garantia da aplicação jurisdicional da pena com observância do devido processo legal, que su­porte ele, o acusado, a execução penal enquanto não decla­rada judicialmente a certeza de que cometeu ele a infração penal, o que só ocorre com o trânsito em julgado da sentença condenatória’”[13].


Ada Pelegrini grinover, por sua vez, atesta a impossibilidade de se pensar de outra forma depois da promulgação de nossa Carta Constitucional:

“Estabelece o art. 27, § 2.º, da Lei 8.038/90 que os recursos extraordinário e especial serão recebidos no efeito devolutivo, não sendo previsto, portanto, o suspensivo.

“Mais claramente, dispõe o art. 637 CPP: ‘O recurso extra­ordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença’.

“Com base nesse último texto, a jurisprudência do STF era incisiva, admitindo a execução da pena privativa de liberdade (RT 568/383-384), ainda com relação ao réu ao qual fora admitido apelar solto (RTJ 82/129), e também a realização de novo julgamento pelo júri enquanto não de­cidido recurso extraordinário interposto contra acórdão que anulara o julgamento anterior (RT 534/451).

“Entretanto, a questão não pode mais ser considerada pací­fica, diante do texto constitucional de 1988, que adotou, como princípio fundamental do ordenamento, a regra se­gundo a qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (art. 5.º, inc. LVII).

“Não parece razoável, à luz da disposição constitucional, que se possa falar em execução, definitiva ou provisória, do julgado penal ainda não definitivo, no tocante à aplica­ção da pena, especialmente em face das intromissões que o denominado tratamento penitenciário estabelece nas esfe­ras mais íntimas da personalidade do sujeito. Aliás, a pró­pria Lei de Execução Penal (n. 7.210/84) só prevê a expe­dição da guia de recolhimento para a execução transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liber­dade (art. 105). E também o art. 160, do mesmo diploma, estabelece que a audiência admonitória do sursis só é reali­zada depois de transitada em julgado a sentença condenatória”[14].

Não é diferente o entendimento de Antônio magalhães Gomes Filho:

“No caso do texto brasileiro de 1988, embora sem aceitar quaisquer limitações da aplicação do preceito na matéria probatória, é forçoso reconhecer que até pela redação adotada pelo constituinte – ‘ninguém será considerado…’ – a ênfase é dada especialmente à condição de não -culpabilidade do cidadão colocado diante do poder puni­tivo estatal, vedadas portanto quaisquer formas de trata­mento que impliquem equiparação à situação oposta.

“A vedação a qualquer forma de identificação do suspeito, indiciado ou acusado à condição de culpado constitui, sem dúvida, o aspecto mais saliente da disposição constitucio­nal do art. 5º, inc. LVII, na medida em que reafirma a dig­nidade da pessoa humana como premissa fundamental da atividade repressiva do Estado.


“Embora não se possa esperar que a simples enunciação formal do preceito traduza modificação imediata e substancial no comportamento da sociedade – e mesmo dos atores jurídicos – em face daqueles que se vêem envolvi­dos com o aparato judiciário-criminal, não é possível des­conhecer que a Constituição instituiu uma verdadeira ga­rantia de tratamento do acusado como inocente até o trânsito em julgado de sentença condenatória”[15].

Luís Fernando C. de Barros Vidal também é taxativo:

“Culpa reconhecida por decisão judicial e trânsito em jul­gado são requisitos elementares e indispensáveis para a li­mitação da liberdade do indivíduo com fundamento na vi­olação da lei penal (o que não se confunde com a prisão cautelar).

Essa é a conseqüência material do princípio constitucional de presunção de inocência estabelecido no art. 5º, inc. LVII, da Carta Magna”[16].

O que se nota, portanto, é que a prisão do paciente constitui vedada execu­ção antecipada da pena, afrontando, assim, a essência de nossa Constituição e mais especificamente as garantias fundamentais da presunção da inocência e do devido processo legal, não havendo razão alguma para subsistir.

3.2. A inexistência de crime organizado e a impossibilidade de aplicação do art. 9º da Lei nº 9.034/95 ao caso

Sem se basear em elemento concreto algum, sem imputar ou descrever fato (o réu se defende dos fatos, não da capitulação, diz copiosa jurisprudência), a de­núncia oferecida contra o paciente, afirma em seu tópico final que ele e os demais denunciados teriam infringido também a Lei nº 9.034/95. Não se sabe o porquê da inclusão desse diploma legal, mas, analisando-se o decreto de prisão atacado, chega-se à conclusão de que isso se deu apenas e tão-somente para tentar impedir o paciente de apelar em liberdade.

Assentou o D. Juízo da 6ª Vara Criminal Federal que “o artigo 7º da Lei nº 9.034, de 03.05.1995 (acerca de organizações ou associações criminosas), veda a liberdade provisória, com ou sem fiança, àqueles ‘que tenham tido intensa e efe­tiva participação na organização criminosa’, como é justamente a hipótese do acusado Edemar Cid Ferreira, de quem sempre partiam ou convergiam todas as espúrias decisões no seio da instituição financeira”. Segundo ressalta ainda a r. sentença condenatória:

“In casu, deve-se ter em conta o fato de que a atuação con­certada entre os acusados citados se caracterizou como per­feita organização criminosa, que potencializou o dano cau­sado, não somente o material, além de envolver várias pes­soas nos delitos, com dimensão e repercussão a nível inter­nacional.


“O art. 9º da supracitada Lei, que veda o apelo em liber­dade, deve, pois, ser cotejado com o artigo 31 da Lei nº 7.492/1986, e com os dispositivos do Código de Processo Penal” (fls. 12.844 – doc. nº 1).

Ocorre que, o art. 9º da lei referida é manifestamente inconstitucional, como aponta a doutrina:

“Na medida em que o legislador, neste art. 9º, quis impor, segundo critérios seus, a prisão cautelar decorrente de sentença de primeiro grau, é evidente que extrapolou seus limites. Aí reside um fundamento para a tese de sua in­constitucionalidade. O outro está em que não pode haver prisão cautelar sem fundamentação específica (inc. LXI) da autoridade judiciária competente. Também é inconstitucio­nal tal dispositivo porque continua atrelando a prisão ao di­reito de apelar (…) O art. 9º, por isso, ao exigir o ‘imposto’ da prisão como requisito de admissibilidade do recurso, está violando o princípio do devido processo legal. Viola também, evidentemente, o princípio da ampla defesa e do contraditório (inc. LV)” [17].

Essa matéria, aliás, já é objeto de discussão nos autos da Reclamação nº 2.391/PR em trâmite nessa Suprema Corte (cf. doc. nº 7). No caso em questão, o Ministro Cézar Peluso propôs a concessão de habeas corpus de ofício ao re­clamante determinando “a expedição de alvará de soltura” em razão justamente da inconstitucionalidade do art. 9º da Lei nº 9.034/95, no que foi acompanhado pelos Ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Gilmar Mendes, tendo pedido vista a Ministra Ellen Gracie.

Independentemente, no entanto, da manifesta inconstitucionalidade de tal dispositivo, o fato é que não se pode falar na aplicação da Lei nº 9.034/95 ao caso presente e, mesmo que pudesse, não seria a hipótese de se cogitar da proibição imposta em seu art. 9º, como a seguir se demonstra.

Com efeito. Muito embora na Lei nº 9.034/95 não haja a definição ex­pressa do que seja uma “organização criminosa”, resta claro que seu objetivo é a repressão aos grupos de atividades ilícitas que impõem à sociedade intimidação e desassossego. É o que esclarece Guaracy Mingardi, em estudo sobre o tema, ao conceituar a figura do “crime organizado tradicional”:

“Grupo de pessoas voltadas para atividades ilícitas e clan­des­tinas que possui uma hierarquia própria e capaz de pla­neja­mento empresarial, que compreende a divisão do tra­balho e o planejamento de lucros. Suas atividades se ba­seiam no uso da violência e intimidação, tendo como fonte de lucros a venda de mercadorias ou serviços ilícitos, no que é protegido por setores do Estado. Tem como caracte­rísticas distintas de qualquer outro grupo criminoso um sistema de clientela, a imposição da lei do silêncio aos membros ou pessoas próxi­mas e o controle pela força de determinada porção de território[18].


Assim, ainda que o paciente e demais denunciados tivessem, de fato, for­mado uma organização criminosa – o que aqui se menciona apenas ad argumentandum – não se pode admitir que eles tenham se valido de alguma “violência” ou “controle pela força de porção de território”! Ou de se utilizarem de “intimidação” a seus “membros ou pessoas próximas”! Ou de comercializarem mercado­rias proibidas! Ora, que orga­nização criminosa é essa que não possui nenhuma de suas características clássicas?

É evidente que a intenção do legislador ao instituir o dispositivo penal em questão foi combater o crime organizado caracterizado pelo uso real ou potencial de violência física e não a prática de delitos em co-autoria ou a quadrilha tradi­cional, do Código Penal. Assim, o simples fato de se atribuir aos denunciados a prática do crime descrito no art. 288 do Código Penal não autoriza a dedução de que eles fazem parte de uma “organização crimi­nosa” para os fins da Lei acima mencionada. É o que afirmam Luiz Flávio Gomes e Raul Cervini:

“O conceito de organização criminosa é muito mais amplo e mais sofisticado que o de quadrilha ou bando; criminolo­gicamente são inconfundíveis e seria um crasso equívoco igualá-los; a lei ora enfocada, por sua vez, nasceu para controlar a organização criminosa, não o simples delito de bando ou quadrilha; a ratio legis, portanto, tem como ob­jetivo algo muito mais complexo que este último delito”[19].

É incrível, mas para o magistrado de 1º grau, o peticionário e demais acu­sados devem receber tratamento idêntico ao conferido, por exemplo, aos trafi­cantes de entorpe­centes de extrema periculosi­dade ou aos membros do conhecido e temido “Pri­meiro Comando da Capital – PCC”, o que, com todo respeito, é uma verdadeira ignomínia, que só serve para desmoralizar a repressão devida ao verdadeiro crime organizado, como o desses exemplos.

Resta claro, portanto, que a imputação não só da “organização criminosa”, mas também da própria formação de quadrilha não passa de uma artimanha criada para constranger o paciente e os demais co-réus, dificultando sua defesa, que a Constituição quer ampla.

Ainda que não seja razoável admitir que o inconstitucional art. 9º da refe­rida Lei possa ser utilizado contra si, especialmente diante do que decidiu esse Su­premo Tribunal Federal no HC 89.025/SP-MC (ou seja, que não havia funda­mento válido algum para sua prisão processual), os impetrantes querem deixar articulados os motivos da inaplicabilidade do dispositivo legal mencionado, da mesma forma que também não pode ser aplicado ao caso o art. 7º dessa mesma lei, especialmente neste momento processual.

3.3. Ausência de afronta à ordem pública

Afirma o D. Juízo da 6ª Vara Criminal Federal que “não existe óbice” “para a prisão cautelar decorrente de uma condenação, ainda que o acusado res­ponda ao processo solto, se plenamente justificada na sentença condenatória” (fls. 12.837 do doc. nº 1). E prossegue:

“Entendimento contrário, diante da deficiência crônica do sistema processual brasileiro, da profusão de recursos e das armadilhas processuais existentes de que se lançam fre­qüentemente mão, coloca sob risco de legitimação um dos Poderes da República, o Judiciário, que acaba sendo ques­tionado quanto a sua razão de existir (sentimento de imprestabilidade e de impunidade).


“(…)

“(…) importante mencionar que Edemar Cid Ferreira res­ponde, juntamente com Ezequiel Edmond Nasser e outros, a diversa ação penal também perante a 6ª Vara desta Capi­tal, sob a acusação de ter contribuído para a realização de operações ilícitas, em 2 de julho de 1997, com o Banco Excel Econômico S/A, por violação ao art. 17 da Lei nº 7.492/86 (autos nº 2002.61.81.001587-9) [feito não julgado nem mesmo em primeiro grau!].

“Não bastasse responder desde 2002 por crime contra o Sistema Financeiro Nacional, reiterou a prática delituosa [?], notadamente a realização de diversos outros delitos contra o Sistema Financeiro Nacional, além daqueles que prote­gem a paz pública (art. 288, CP) e a ordem econômica-financeira e a administração da justiça (Lavagem de Valores) dentre outros” – fls. 12.837/12.839 do doc. nº 1.

Segundo ainda o MM. Juiz de 1º grau:

“Para que a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, bem como da própria Justiça Federal, não reste compro­metida, não há como afastar, ainda que de forma excepcional, o cabimento da prisão preventiva para a garantia da ordem pública.

“Não se prende pela gravidade dos atos ilícitos praticados, mas pela forma e execução mencionadas nesta Sentença, o que provoca, ainda nos dias atuais, grande repercussão e clamor público, fragilizando a atividade jurisdicional e a ordem pública.”

“Não se trata, também, de mera detenção cautelar pela simples repercussão dos fatos, mas porquanto se observou perversão, cupidez e insensibilidade moral, que, não inibi­ram, antes reforçaram, condutas que ainda causam indignação na opinião pública com repulsa profunda”. – fls. 12.843 do doc. nº 1, negritos do original.

Vê-se, portanto, que a prisão preventiva do paciente, decretada com base na garantia da ordem pública, se deu a) porque ele já responde a outro processo criminal pela prática de crime contra o Sistema Financeiro Nacional; e b) porque os fatos tratados na ação penal causam “grande repercussão e clamor público”, o que abala a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional e da Justiça.

Ocorre que nem um nem outro fundamento se presta à configuração de atentado à ordem pública e, conseqüentemente, pode sustentar decreto da custódia cautelar do paciente antes do trânsito em julgado da decisão condenatória.

Com efeito, a simples existência de uma outra ação penal proposta contra o paciente, que apura fatos anteriores aos questionados nos autos e que ainda não resultou em condenação nem mesmo em 1º grau, não pode servir de supedâneo à determinação de tão drástica medida, sob pena de violação ao já mencionado princípio da presunção de não culpabilidade.

A esse respeito, aliás, é o posicionamento desse Supremo Tribunal Federal:

“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que ‘não podem repercutir contra o réu situa­ções jurídico-processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível do Poder Judiciário, especialmente naquelas hipóteses de inexistência de título penal condenatório definitivamente constituído’.


“(…)

“Ordem concedida”[20].

Tampouco se sustenta a afirmação de que a custódia cautelar do paci­ente, como garantia da ordem pública, deve ser decretada para assegurar “a credibili­dade do Sistema Financeiro Nacional” e da “própria Justiça Federal” (fls. 12.843 do doc. nº 1).

É que, longe de se prestar a encobrir juízos de valor ou servir de vala co­mum para fundamentar prisões sem justa causa, o conceito de ordem pública há de vir relacionado como medida de defesa social. Para tanto, pressu­põe a finali­dade de prevenção social, baseada na aferição da periculosidade real daquele que está sendo processado.

Analisando-se o feito em questão, o que se observa é que faltam forças a esse suposto fundamento, pois o único elemento que dos autos se extrai é que o paciente não causa estorvo algum à ordem pública, tem endereço fixo e reside no distrito da culpa, no mesmo lugar onde foi sempre intimado e no qual se cumpri­ram as duas ordens de prisão contra ele ilegalmente expedidas pelo MM. Juiz de 1º grau.

Aqui cabe um parêntese: É absurda, com todo respeito ao D. Juízo monocrático, a afirmação de que o paciente “não se trata de alguém que pacifi­camente teria estado em sua residência e contribuído com a Justiça”, já que “qualquer intimação ou determinação” em relação a sua pessoa, “sempre passa pelo crivo de seus empregados que, somente após verificação prévia do que se trata, faz-se presente o increpado para cumprimento das diligências” (fls. 12.839 do doc. nº 1). Note-se que nenhuma vez o “increpado” [sic] deixou de “fazer-se presente para cumprimento de diligências”! E desde quando ter empregados e contar com seus préstimos para atender às pessoas que chegam a sua casa consti­tui obstrução à Justiça? Ora, por um acaso o ilustre magistrado recebe pessoas em seu gabinete sem que estas passem antes pelo “crivo” da Secretaria da 6ª Vara Criminal Federal? É evidente que não, e nem por isso S. Exa. pode ser questio­nado quanto à sua indiscutível acessibilidade ou lhaneza. O mesmo ocorre em relação ao paciente que, muito embora tenha se servido de seus funcionários para atender às visitas dos agentes públicos, nunca se recusou a recebê-los, sem causar qualquer embaraço à Justiça. O que importa, portanto, é que as diligências sempre foram realizadas, o paciente sempre se apresentou e as intimações foram sempre atendidas. Os mandados de prisão, igualmente, foram imediatamente cumpridos, sem qualquer óbice.

Mas voltando à arbitrariedade do decreto de prisão, o que se pode dela no­tar é que o D. Juízo de 1º grau invoca a nefanda e inconstitucional exempla­ri­dade, desrespeitando, assim, direitos fundamentais do paciente em troca da “satisfação” que se pensa dever à sociedade. Mesmo em terras e tempos mais sombrios, Manzini já repudiava invocações desse tipo:

“La custodia preventiva, pertanto, no ha quello scopo de exemplarità, che è próprio esclusivamente della pena. È as­surdo ammettere che la detenzione preventiva venga ordi­nata per servire d’esempio, perchè ad essa è soggetto l’imputato, cioè una persona che ancora non si sa se sia o non sia colpevole (art. 27 Costituzione). Per la stessa ragione, sarebe erroneo ritenere che la detta custodia abbia il fine di dare soddisfazione al pubblico senso di giustizia, per il quale è sufficiente che si proceda contro l’imputato. In pra­tica, tuttavia, l’ Autorità giudiziaria si ispira talvolta a codesto falso criterio, quasi che la gistizia fosse serva della politica, o, peggio, della demagogia[21].


Tal entendimento, aliás, se harmoniza com o posicionamento desse Supremo Tribunal Federal:

“Prisão preventiva. Invocação da garantia da ordem pública. Ausência de fato concreto que a justifique.

“Prisão preventiva. Fundamentação inidônea atinente à gravidade do crime e à necessidade de acautelar a credibilidade da Justiça. Precedentes”[22].

“Prisão preventiva. Fundamentação inidônea. Firme a ju­risprudência do Supremo Tribunal no sentido de que, de regra, não há falar em conveniência da instrução criminal se esta já se encerrou (HC 81.148, 1ª T., 25.9.01, Pertence) – nem invocar a garantia da ordem pública, para não se comprometer a ‘imagem de instituições, em especial o Poder Judiciário’. Precedentes”[23].

“O clamor social e a credibilidade das instituições, por si sós, não autorizam a conclusão de que a garantia da ordem pública está ameaçada, a ponto de legitimar a manutenção da prisão cautelar do paciente enquanto aguarda novo julgamento pelo Tribunal do Júri.

“A prisão processual, pela excepcionalidade que a caracte­riza, pressupõe inequívoca demonstração da base empírica que justifique a sua necessidade, não bastando apenas alu­dir-se a qualquer das previsões do art. 312 do Código de Processo Penal.”[24].

E, não custa repetir, no HC 89.025-MC essa Colenda Corte deci­diu que não se fazem presentes os requisitos do art. 312 do CPP em relação ao paciente Edemar Cid Ferreira.

A prisão cautelar não se presta a satisfazer os anseios vingativos de quem quer que seja, não devendo substituir o devido processo legal, com o desprezo aos di­reitos e garantias individuais do acusado. É, pois, imprescindível para a sua de­cretação “‘que as circunstâncias revelem a procedência do juízo formulado’ e que a neces­sidade de custódia se aponte com segurança, ou seja, ‘com a indicação de dados dos quais se possa deduzir legitimamente a necessidade da medida’”[25]. Nesse sentido é a precisa lição de Antonio Magalhães Gomes Filho:

“À ordem pública relacionam-se todas aquelas finalidades do encarceramento provisório que não se enquadram nas exigências de caráter cautelar propriamente ditas, mas constituem formas de privação de liberdade adotadas como medidas de defesa social; fala-se então em ‘exemplari­dade’, no sentido de imediata reação ao delito, que teria como efeito satisfazer o sentimento de justiça da socie­dade; ou, ainda, em prevenção especial, assim entendida a necessidade de se evitar novos crimes; uma primeira infra­ção pode revelar que o acusado é acentuadamente propenso a práticas delituosas ou, ainda, indicar a possível ocorrên­cia de outras, relacionadas à supressão de provas ou dirigidas contra a própria pessoa da acusado.”[26]


Acrescenta, a seguir que esse critério se traduz em “um recurso retórico do legislador, utilizado com o objetivo de superar a rigidez tipificadora da dogmática jurídica, e que implica a ruptura dos padrões de unidade e hierarquia inerentes aos princípios da constitucionalidade, da legalidade e da certeza jurídica[27].

Nem mesmo a “grande repercussão” dos fatos em discussão e o chamado clamor público supostamente causado por eles podem dar ensejo à restrição pro­visória da liberdade do acusado. Preliminarmente, não se pode deixar de apontar o exagero das afirmações: O Banco Santos S/A não tinha carteira de pessoas físicas e sua clientela se compunha de cerca de 700 contas, apenas, tituladas por empresas e fundações; por isso o “público” não exarou nenhum “clamor”, havendo repercussão devida à projeção adquirida pelo paciente no mundo das artes, não pelos fatos em si.

Mas o principal a notar é que a jurisprudência desse Pretório Excelso é absolutamente pacífica sobre a imprestabilidade desse tipo de argumento, como se pode observar dos seguintes julgados:

“Prisão preventiva. Clamor público. A repercussão do crime na sociedade do distrito da culpa, variável segundo a sensibilidade daqueles que a integram, não compõe a defi­nição de ordem pública a ser preservada mediante a pre­ventiva. A História retrata a que podem levar as paixões exacerbadas, o abandono da razão[28].

“Necessidade de preservação da ordem pública. É insufici­ente o argumento de que esse requisito satisfaz-se com a simples assertiva de clamor público em razão da hediondez do fato delituoso e da sua repercussão na comunidade, im­pondo-se a medida constritiva de liberdade sob pena de restar abalada a credibilidade do Poder Judiciário”[29].

“Prisão preventiva: À falta da demonstração em concreto do periculum libertatis do acusado, nem a gravidade abs­trata do crime imputado, ainda que qualificado de hedi­ondo, nem a reprovabilidade do fato, nem o conseqüente clamor público constituem motivos idôneos à prisão pre­ventiva: traduzem sim mal disfarçada nostalgia da extinta prisão preventiva obrigatória.”[30]

Ação penal. Prisão preventiva. Decreto fundado na neces­sidade de restabelecimento da ordem pública, abalada pela gravidade do crime. Exigência do clamor público. Inad­missibilidade. Razão que não autoriza a prisão cautelar. Precedentes. Interpretação do art. 366, caput, do CPP. É ilegal o decreto de prisão preventiva baseado no clamor público para restabelecimento da ordem social abalada pela gravidade do fato.


“(…)

“Razões que, não autorizando a prisão cautelar, guardam contornos de antecipação de pena. Precedentes. Interpretação do art. 366, caput, do CPP.”[31].

A privação da liberdade de quem não foi condenado definitivamente é me­dida excepcional, aceitável, talvez, em casos nos quais ela se mostre absoluta­mente necessária, o que, definitivamente, não é a situação do presente feito. Trata-se a custódia cautelar, afinal, de “meio para se buscar a incriminação, sobre o direito de liber­dade, com previ­são indeterminada das causas da antecipação da execução penal, constitui uma outra característica deste ‘direito criminal’ extre­mamente vingativo. Este para­digma (que infelizmente não está de todo sepultado), envergonha as pessoas que possuem um mínimo de consciência humana”[32].

Nas palavras de Roberto Delmanto Júnior,

“…a prisão provisória assume aspectos de justiça sumária. É providência cômoda e, pela celeridade com que é decre­tável, traz à comunidade, como salientado, sensação de efi­cácia do sistema penal, de resposta jurisdicional rápida e severa, uma vez que a prisão é, antes de tudo, a maior den­tre as várias humilhações que o processo penal pode impor a uma pessoa”[33].

Há uma inversão de valores que agride o Estado Democrático de Direito em casos nos quais a necessidade da medida cautelar é substituída por “mal disfarçada nostalgia da extinta prisão preventiva obrigatória”[34], ou da vedação absoluta do apelo em liberdade.

Esse Supremo Tribunal Federal já proclamou o despropósito que é a ordem de prisão sem julgamento definitivo contra cidadão arraigado no meio social, primário e de bons antecedentes (doc. nº 8) e que comparece com regularidade aos atos processuais, como é o caso do paciente:

“Prisão preventiva – Premissas. A prisão preventiva não prescinde da observância das normas que lhe são específi­cas. Pressupõe a garantia da ordem pública, consideradas a conveniência da instrução criminal, ou de assegurar-se campo propício à aplicação da lei, a previsão para o crime para o crime de pena de reclusão ou de detenção, quando apurado que o agente é vadio ou havendo dúvida sobre identidade, não forneça ou não indique elementos para es­clarecê-la, ou tenha, ainda, sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvada a hi­pótese de reabilitação. Mostra-se insubsistente a prisão preventiva quando o agente vinha acorrendo ao Judiciário, para os atos processuais pertinentes, é casado, pai de qua­tro filhos, residente e domiciliado em local certo há vários anos, tendo profissão, sendo primário e contando com vida pregressa imaculada.”[35]


A desnecessidade, a inviabilidade e a injustiça da decisão ora atacada fo­ram demonstradas de forma clara e palpável, documentada à farta nos próprios autos, confirmando o constrangimento que se impõe ao paciente. A verdade é que seu encarceramento é um mal sem proveito a quem quer que seja.

3.4. A inconseqüente “magnitude da lesão”

Dentre os pretensos fundamentos que sustentam a prisão do paciente está a “magnitude da lesão”. Convém, neste ponto, transcrever as razões da r. sentença condenatória:

“Por outro lado, conforme já se observou, tais condutas propiciaram prejuízo constatado de grande monta, ou seja, R$ 2.987.519.000,00 (dois bilhões, novecentos e oitenta e sete milhões, quinhentos e setenta e três mil reais) que, considerado o ativo de R$ 696.647.000,00, resultou no passivo a descoberto de R$ 2.235.802.000,00 (atualizado em 27.07.2005, Relatório Final da Comissão de Inquérito do Banco Central, fls. 4214/4559), acarretando danos ma­teriais a milhares de investidores, pessoas físicas e jurídi­cas, a grande maioria totalmente incauta, vítima da prática de crimes diversos (financeiros ou não), inclusive contra a ordem econômica (artigo 5º, inciso II, da Lei n.º 8.137, de 27.12.1990).

“A magnitude da lesão, por si só, segundo o artigo 31 da Lei n.º 7.492/1986, justificaria, apesar do posicionamento diverso deste magistrado, a prisão cautelar. Porém, in casu, deve-se ter em contra o fato de que a atuação concertada entre os acusados citados se caracterizou como perfeita or­ganização criminosa, que potencializou o dano causado, não somente o material, além de envolver várias pessoas nos delitos, com dimensão e repercussão a nível [sic] internacional” (fls. 12.843/12.844, doc. nº 1).

Se a determinação contida no art. 31 da Lei nº 7.492/86[36] não é aplicável no entender do próprio magistrado de 1º grau, por que raios tal circunstância foi mencionada? Por óbvio, a r. decisão atacada estabeleceu uma ligação entre os valores alegadamente perdidos pelos investidores do Banco Santos e a suposta voracidade de sua diretoria, de modo a caracterizar a imaginada organização criminosa ou, na expressão da moda, a grande orcrim:

“O artigo 9º da supracitada Lei, que veda o apelo em liberdade, deve, pois, ser cotejado com o artigo 31 de Lei nº 7.492/1986 e com os dispositivos do Código de Processo Penal” – fls. 12.844 do doc. nº 1.

A despeito da inexistência de organização criminosa alguma (como já tra­tado em item próprio), é fundamental destacar que, ainda que esta existisse – o que se levanta apenas para argumentar – não há razões para crer que sua atuação teria potencializado “o dano causado”. É acaciano, mas um bilhão continua a ser um bilhão com ou sem organização criminosa!!

Não é este o momento nem o foro para demonstrar que o passivo a desco­berto está muito longe daquele estimado pelo Banco Central, mas não podem os impetrantes subtrair ao conhecimento da Suprema Corte que uma série de deci­sões judiciais cíveis estão reduzindo substancialmente esses números. Eles, de fato, impressionam, mas não é demais lembrar que o paciente foi processado e condenado em razão da gestão de uma instituição financeira e não de uma qui­tanda. Um banco evidentemente cuida de grandes somas e se o Banco Central considerou necessária a intervenção que embasou a ação penal instaurada contra toda a direção do Banco Santos, é porque os valores envolvidos e o prejuízo então estimado eram altos. Curioso seria, E. Tribunal, se a gestão em debate, inquinada de fraudulenta, tivesse movimentado ninharias, tutaméias…


Acontece que, nem a magnitude da lesão, nem sua pretensa ampliação pe­las ações da mencionada “organização criminosa” poderiam ensejar a prisão cautelar do paciente, pois da gravidade do crime já cuida a pena a ele imposta.

Essa E. Corte assim já decidiu:

“Prisão preventiva. Excepcionalidade. Ante o princípio constitucional da não-culpabilidade, a custódia acautela­dora há de ser tomada como exceção, cumprindo interpre­tar os preceitos que a regem de forma estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em risco os cidadãos, especialmente aqueles prontos a colabo­rarem com o Estado na elucidação de crime. Prisão pre­ventiva. Lei nº 9034/95. Magnitude da lesão. Meio social. Credibilidade do Judiciário. A magnitude da lesão é ele­mento do tipo penal, sendo neutra para efeito de segrega­ção preventiva. O clamor social, na maioria das vezes a envolver visão apaixonada, não serve ao respaldo da cus­tódia precária e efêmera, o mesmo devendo ser dito quanto ao prestígio do Judiciário, a quem incumbe, independen­temente de fatores atécnicos, da capa do processo, da re­percussão do crime, guardar a mais absoluta eqüidistância, decidindo à luz da ordem jurídica”[37].

Trecho do voto condutor merece destaque:

“O autor da decretação empolgou as normas da Lei nº 9.034/95 e aludiu à magnitude da ação criminosa, à abran­gência nacional e ‘à reação do meio ambiente em relação à prática delituosa, para o fim de acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão social’ (folha 265). Deu-se de­finição toda própria ao conceito de ordem pública, exa­cer­bando o sentido da expressão. No caso, as imputações ocorridas não são de molde a concluir pelo risco em rela­ção à ordem pública. Aliás, a essa altura, ante a persecução criminal, já não se pode cogitar de entrosamento suficiente ao êxito da atividade criminosa. O clamor público e a cre­dibilidade da justiça possuem características subjetivas que assim não se ajustam aos termos excepcionais autorizado­res da prisão preventiva. A paz social, para utilizar o en­quadramento de Tourinho Filho, não se faz abalada pelo contrabando das citadas mercadorias, mormente tendo em conta a atividade policial inibitória. Concedo a ordem para tornar insubsistente a prisão do paciente”(grifamos).

Outro precedente dessa Suprema Corte merece destaque:

“’A magnitude da lesão é elemento do tipo penal, sendo neutra para efeito de segregação preventiva.’ (Precedente)”[38]

No caso dos autos, o paciente é acusado do cometimento de diversos deli­tos, todos eles relacionados às atividades financeiras do banco e, por conta disso, foi condenado ao cumprimento de 21 anos de reclusão, pena excessivamente alta para quem é primário e possui bons antecedentes. A quantidade de pena e o re­gime para seu cumprimento relacionam-se à suposta lesão, não a custódia caute­lar. A execução prematura da pena configura ato de arbitrariedade, posto que não estão presentes quaisquer dos requisitos autorizadores da prisão preventiva.


Além disso, é imperioso esclarecer que o art. 59 do Código Penal estabe­lece que, dentre as circunstâncias que enumera, as “conseqüências do crime” se­rão levadas em consideração pelo magistrado para fixar a pena-base. Utilizar es­ses mesmos fatos para antecipar a aplicação de pena imposta em decisão não pas­sada em julgado configura inegável bis in idem com a qual não há de compactuar essa Colenda Corte.

4. A PREVENÇÃO DO MINISTRO EROS GRAU

No último dia 15 de agosto a Colenda 2ª Turma desse E. Tribunal deu pro­vimento a agravo regimental interposto contra a decisão do eminente Relator, Ministro Joaquim Barbosa que negara seguimento ao pedido, para conhecer do já mencionado habeas corpus nº 89.025/SP impetrado em favor do paciente, vencido o Relator, tudo nos termos do voto do Min. Eros Grau.

Prosseguindo no julgamento, a Turma, depois de já ter conhecido do habeas corpus e computado os votos dos Mins. Joaquim Barbosa, Relator, denegando o pedido de liminar e Eros Grau, deferindo-o, decidiu, por maioria, conceder liminar para que o paciente respondesse ao processo em liberdade, deixando-se de aplicar ao caso, como já dito, o verbete da Súmula 691 dessa Colenda Corte, em decisão finalizada na sessão do dia 22 seguinte.

Em razão disso, o Min. Eros Grau foi designado para lavrar o acór­dão e, de acordo com o que dispõe o art. 38, II, do Regimento Interno dessa Casa[39], deve passar a funcionar como Relator do feito mencionado.

Pois bem. Estabelece o caput do art. 69 do Regimento Interno que:

O conhecimento do mandado de segurança, do habeas corpus e do recurso civil ou criminal torna preventa a competência do Relator, para todos os recursos posteriores, tanta na ação quanto na execução, referentes ao mesmo processo” – grifamos.

Por sua vez, o § 2º do mesmo diploma ressalta que:

“Vencido o Relator, a prevenção referir-se-á ao Ministro designado para lavrar o acórdão”.

Assim, considerando que no habeas corpus anteriormente impetrado em favor do paciente o ilustre Relator sorteado restou vencido quanto ao conheci­mento, transferiu-se sua função para o eminente Min. Eros Grau. Portanto, é evidente que o presente writ – que se refere à mesma ação penal movida contra Edemar Cid Ferreira na 6ª Vara Criminal Federal – deve ser distribuído por prevenção a esse Ministro.

É certo que o mérito do habeas corpus nº 89.025/SP ainda está pendente de apreciação pela 2ª Turma dessa Suprema Corte. No entanto, deve-se registrar que o que firma a prevenção nessa Corte é o mero conhecimento “do mandado de segurança, do habeas corpus e do recurso civil ou criminal”, como prevê textualmente o já mencionado art. 69 do Regimento Interno dessa Casa. Ora, tendo o agravo regimental sido provido para conhecer do habeas corpus nº 89.025/SP, torna-se preventa a competência do Relator designado para lavrar o acórdão em todos os feitos relacionados à ação penal pela qual o paciente foi condenado em 1ª instância.


Em situação bastante semelhante à presente, o eminente Min. Marco Aurélio, “para que a Corte firme entendimento”, submeteu ao Plenário questão de ordem no HC nº 83.795/MT. Ali decidiu-se, por votação unânime, que se fir­mara a competência do Min. Joaquim Barbosa, tendo em vista que em proce­dimento anterior, o então Ministro Relator havia restado vencido, assumindo suas funções o prolator do voto que abriu a divergência. Do voto do Min. Marco Aurélio, acolhido sem discrepância nessa questão de ordem, extrai-se o seguinte trecho:

“Deu-se a impetração do segundo habeas, apreciado pela Primeira Turma. Ao relatá-lo, fiquei vencido (…)

“O que importa, para dirimirmos a questão de ordem quanto à prevenção, é o fato de o relator haver ficado ven­cido no julgamento desse segundo habeas corpus, fato que, consoante a prática do Tribunal, gerou a distribuição por prevenção da medida em mesa não ao relator da anterior – a teor do disposto no artigo 69 do Regimento Interno –, mas ao redator do acórdão alusivo ao julgamento desse segundo habeas corpus, ministro Joaquim Barbosa, que acatou a distribuição”[40].

Diante do exposto, é a presente para requerer a distribuição dos autos ao Min. Eros Grau, relator prevento do presente habeas corpus.

5. PEDIDO DE LIMINAR

Primário e possuidor de bons antecedentes, o paciente submeteu-se ao curso da ação penal sem causar qualquer tumulto, não raro antecipando-se a inti­mações, atendendo às determinações judiciais na medida em que permitia a defesa de seus direitos.

Encontra-se agora submetido a uma medida extrema, grave e de conse­qüências irreparáveis, sem possibilidade de recorrer em liberdade da injusta sen­tença que o condenou a mais de 20 anos de prisão, o que afronta os princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, já que esta decisão ainda não se tornou definitiva.

Cada dia que tiver que passar na prisão será u’a marca indelével gravada em sua vida. Disso decorre com clareza gritante o periculum in mora.

O fumus boni juris deflui das garantias fundamentais mencionadas e se concretiza nas decisões dessa Egrégia Suprema Corte sobre a inconstitucionalidade da execução antecipada da pena.

Diante disso, requerem os impetrantes a concessão de medida liminar para o fim único de aguardar em liberdade o julgamento deste pedido, mediante a pronta expedição de alvará de soltura.

6. CONCLUSÃO

“Pisão preventiva – Excepcionalidade.

Em virtude do princípio constitucional da não-culpabilidade, a custódia acauteladora há de ser tomada como exceção. Deve-se interpretar os preceitos que a regem de forma estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em risco os cidadãos.


“(…)

“A prisão preventiva há de fazer-se alicerçada em dados concretos, descabendo, a partir de capacidade intuitiva, implementá-la consideradas suposições.

“Prisão preventiva – Núcleos da tipologia –Impropriedade. Elementos próprios à tipologia, bem como as circunstâncias da prática delituosa, não são suficientes a respaldar a prisão preventiva, sob pena de, em última análise, antecipar-se o cumprimento de pena ainda não imposta.

“Prisão preventiva – Preservação da ordem pública. O bem a ser protegido a tal título há de situar-se não no passado, mas no futuro, sendo que aquele diz respeito à pretensão punitiva do Estado.

“Prisão preventiva – Crime de repercussão na imprensa – Impropriedade da fundamentação. O fato de o delito provocar grande repercussão nos veículos de comunicação não conduz à prisão preventiva do acusado, estando o prestígio do Judiciário não na dependência da punição a ferro e fogo, mas na atuação harmônica com a ordem jurídica, respeitados os princípios jurídicos basilares da República”[41].

Diante de tudo o que foi demonstrado torna-se evidente o constrangimento ilegal imposto ao paciente pelo MM. Juiz da 6ª Vara Criminal Federal, mantido pelo E. Tribunal a quo, uma vez que não é admissível em um Estado Democrático de Direito o cumprimento de sanção criminal – especialmente pena restritiva de liberdade – antes do trânsito em julgado de uma decisão condenatória. Assim, a não aplicação da Súmula 691 dessa Colenda Corte é perfeitamente possível.

Por essas razões, aguarda o paciente seja concedida a presente ordem de habeas corpus para cassar definitivamente o decreto de prisão preventiva atacado, a fim de que possa responder em liberdade à ação penal contra ele proposta até o seu término.

Pedem deferimento.

Brasília, 26 de dezembro de 2006.

ARNALDO MALHEIROS FILHO

OAB/SP 28.454

FLÁVIA RAHAL

OAB/SP 118.584

DANIELLA MEGGIOLARO


[1]. Trecho de decisão concessiva de liminar proferida nos autos do HC 88.162/MS, DJU 29.3.2006, p. 6.

[2]. STF, HC 86.864/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, Pleno, j. 20.10.2005.


[3]. HC 88.131/MG, DJU 20.4.2006, p. 39, destacamos.

[4]. STF, HC 86.375/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 17.2.2006, p. 59.

[5]. STF, HC 87.468, Rel. Min. Cezar Peluso, DJU 15.9.2006, p. 45.

[6]. STF, HC 86.234/RJ, ReL. Min. Eros Grau, Rel. p/ acórdão Min. Cézar Peluso, DJU 29.9.2006, p. 47.

[7]. STF, HC 85.209/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 5.5.2006, p. 18.

[8]. STF, HC 88.413/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, DJU 9.6.2006, p. 19.

[9]. STF, HC 88.174/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Rel. p/ acórdão Min. Eros Grau, j. 12/12/2006.

[10]. http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/ultimas/ler.asp?CODIGO=218827&tip=UN.

[11] . STJ, HC 38.158/PR, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, citado pela sentença condenatória a fls. 12.840/1, da qual reproduziu-se o destaque.

[12] . STF, HC 84.104/DR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, citado pela decisão condenatória a fls. 12.842.


[13]. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro, RT, São Paulo, 2004, 2ª ed., p. 279/283, grifos da transcrição.

[14]. Ada Pellegrini Grinover et alii, Recursos no Processo Penal, RT, São Paulo, 2005, 4ª ed., p. 303/304, grifos do original.

[15]. Significados da Presunção de Inocência in Direito Penal Especial, Processo Penal e Direitos Fundamentais, coordenação de José de Faria Costa e Marco Antonio Marques da Silva, Quartier Latin do Brasil, São Paulo, 2006, p. 326.

[16]. Efeitos suspensivos dos recursos constitucionais, Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 1, n. 3, julho-setembro, 1993, p. 180/181.

[17]. Luiz Flávio Gomes e Raul Cervini, Crime Organizado – Enfoques Criminológico, Jurídico (Lei nº 9.034/95) e Político-Criminal, RT, São Paulo, 1995, p. 151.

[18]. O Estado e o Crime Organizado, IBCCrim/5, São Paulo, p. 82/83 – grifamos.

[19]. Luiz Flávio Gomes e Raul Cervini, ob. cit., p. 77.

[20]. STF, HC 86.620/PE, Rel. Min. Eros Grau, DJU 17.2.2006, p. 59.

[21]. Vicenzo Manzini. Trattato di Diritto Processuale Penale Italiano, 6ª ed.,Vol. II, Torinese, Torino, 1970, p. 674/675 (grifamos).

[22]. STF, HC 84.884/ES, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 4.2.2005, p. 27.


[23]. STF, HC 84.778/MS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 4.3.2005, p. 23 – grifamos.

[24]. STF, HC 84.662/BA, Rel. Min. Eros Grau, DJU 22.10.2004, p. 17.

[25] . Roberto Delmanto Júnior, As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. Renovar, Rio de Janeiro, 2001, p. 170/171.

[26]. Apud Roberto Delmanto Júnior, As modalidades cit., p. 180/181.

[27] . Ibidem.

[28]. STF HC 83.493/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 17.9.2004, p. 78 – grifamos.

[29]. STF HC 82.446/MG, Rel. Min. Maurício Correa, DJU 10.12.2002, p. 48.

[30]. STF, RHC 79.200/BA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 13.8.1999, p. 9 – grifamos.

[31]. STF, HC 87.468, Rel. Min. Cezar Peluso, DJU 15.9.2006, p. 45.

[32] . Nereu José Giacomolli, “Para que serve o processo penal ?”, Boletim do IBCCrim nº 94, Setembro de 2000, p. 5.

[33] . As modalidades de prisão …, ob. cit., p. 11.


[34] . STF, RHC 79.200/BA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 13.8.1999, p. 9.

[35]. STF, RHC 71.354/PI, Rel. Min. Marco Aurélio, LEX JSTF 197/318, grifamos.

[36]. “Nos crimes previstos nesta Lei e punidos com pena de reclusão, o réu não poderá prestar fiança, nem apelar antes de ser recolhido à prisão, ainda que primário e de bons antecedentes se estiver configurada situação que autoriza a prisão preventiva”. Provavelmente o magistrado quis se referir ao art. 30: “Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, a prisão preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta lei poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada”.

[37]. STF, HC 82.909/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 17.10.2003, p. 21.

[38]. STF, HC 86.620/PE, Rel. Min. Eros Grau, DJU 17.2.2006, p. 59. No mesmo sentido, STF, HC 85.519/PR, Rel. Min. Eros Grau, DJU 17.3.2006, p. 16.

[39]. “O Relator é substituído pelo Ministro designado para lavrar acórdão, quando vencido no julgamento”.

[40]. DJU 6.8.2004, p. 41.

[41] . HC 83.728/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 23.4.2004, p. 25.

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