Direito de preso

Cabe ao Estado garantir presença de réu preso em audiência

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18 de dezembro de 2006, 20h58

O Supremo Tribunal Federal concedeu, de ofício, Habeas Corpus para assegurar a Luiz Fernando da Costa, o “Fernandinho Beira-Mar” o direito de estar presente em todos os atos processuais e exercer seu direito de defesa. Sua ida à audiência havia sido impedida pela Justiça, que alegou razões de segurança pública.

A defesa de Beira-Mar requereu Habeas Corpus no Supremo, contra ato do Superior Tribunal de Justiça que negou liminar para que ele comparecesse à audiência de instrução e julgamento do processo-crime a que responde na 5ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Pediu também a nulidade absoluta dos atos processuais e cerceamento de defesa pela ausência do réu nas audiências em que foi acusado.

Não obstante a Súmula 691/STF [não compete ao Supremo conhecer de HC impetrado contra decisão de relator que, em Habeas Corpus requerido a tribunal superior, indefere liminar], o relator, ministro Celso de Mello, deferiu liminar em 12 de setembro de 2005 para suspender a audiência, até que o Supremo julgasse o mérito.

Neste intervalo de tempo o Tribunal Regional Federal da 2ª Região indeferiu Hábeas Corpus e confirmou a decisão do juiz de primeira instância que havia impedido a presença de Beira Mar na audiência, alegando razões de segurança pública em vista da periculosidade do réu.

Para o relator, ministro Celso de Mello, o STF tem afastado a Súmula 691 nos casos em que evidencia uma situação de absoluto constrangimento ilegal ou divergência em face da jurisprudência do Supremo. O ministro sustentou que “a impetração suscita tema impregnado do mais alto relevo jurídico-constitucional” a justificar o afastamento da Súmula 691.

Direito de defesa

Em relação ao mérito, o ministro revelou que “o caso em exame põe em evidência uma controvérsia do mais alto relevo constitucional, que consiste no reconhecimento de que assiste ao réu preso, sob pena de nulidade absoluta, o direito de comparecer, mediante requisição do Poder Judiciário, à audiência de instrução processual em que serão inquiridas testemunhas em geral, notadamente aquelas arroladas pelo Ministério Público”.

Celso de Mello sustentou que o acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar os atos processuais, “notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução do processo penal, que se realiza sempre sob a égide do contraditório, sendo irrelevante para esse efeito, as alegações do poder público (incluído o Poder Judiciário) concernentes à dificuldade ou à inconveniência de proceder à remoção de acusados presos a outros pontos do estado ou do País”.

Para Celso de Mello alegações de mera conveniência administrativa “não podem ter precedência sobre as exigências de cumprimento e respeito ao que determina a Constituição”.

O ministro disse que seu entendimento está “fundado na natureza dialógica do processo penal acusatório, impregnado de caráter essencialmente democrático, de que o direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do réu, de outro, traduzem prerrogativas jurídicas que derivam da garantia constitucional do due process of law [devido processo legal]”.

O ministro defendeu anda a possibilidade de o próprio acusado intervir direta e pessoalmente na realização dos atos processuais, que constitui a autodefesa que se desdobra em direito de audiência e direito de presença. Para ele, “tem o acusado direito de ser ouvido e de falar durante os atos processuais, bem como o direito de assistir à realização desses atos, sendo dever do Estado facilitar seu exercício”.

O direito de presença do réu na audiência de instrução penal, especialmente quando preso, também encontra sua legitimidade em convenções internacionais, “que proclamam a essencialidade dessa franquia processual que compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, que ampara qualquer acusado na persecução penal”, continuou o relator.

Ao concluir, o ministro Celso de Mello declarou que, devido à magnitude do tema constitucional da presente impetração, impõe-se a concessão, de ofício, do Habeas Corpus, “seja para impedir que se desrespeite uma garantia constitucional, seja para evitar eventual declaração de nulidade do processo penal instaurado”.

Seu voto, acompanhado por unanimidade pela 2ª Turma, assegurou ao réu o direito de presença, após prévia requisição à autoridade competente, em todos os atos de instrução no âmbito do processo a que se refere, além de ter invalidado qualquer audiência que tenha sido realizada sem a sua presença pessoal.

HC 86634

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