Crise de identidade

Supremo começa delinear papel de conselhos nacionais

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12 de dezembro de 2006, 6h00

Na semana passada, mais do que nunca, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público foram alvos de críticas generalizadas e de derrotas no Judiciário. Criados pela Emenda Constitucional 45 (Reforma do Judiciário) e em funcionamento há mais de um ano, os conselhos continuam sendo questionados e mal falados por parte da magistratura, advocacia e membros do MP.

Agora, a crítica veio do Supremo Tribunal Federal em decisão unânime que declarou a inconstitucionalidade de resolução do CNJ que tentava restabelecer as férias coletivas no Judiciário. No julgamento, que durou cerca de duas horas, os ministros do Supremo aproveitaram para refletir e criticar diversas medidas implementadas recentemente por ambos os conselhos. Os conselhos, que têm natureza eminentemente administrativa, foram acusados de legislar, de desrespeitar a Constituição e de tomar decisões de caráter jurisdicional, o que lhes é vetado.

Enquanto o céu desaba sobre os Conselhos, seus integrantes encaram as críticas numa boa e avaliam a constante contestação de suas atuações como bomba de crescimento.

O conselheiro do CNJ, Douglas Rodrigues, acredita que a recente decisão do Supremo que derrubou a resolução sobre as férias coletivas é importante pois delineia os limites das competências do Conselho. Mesmo não se mostrando muito incomodado com as críticas e a decisão do Supremo, Rodrigues rebateu algumas acusações.

Segundo ele, por exemplo, o procedimento que é observado no controle de legalidade, onde está inserida a concessão de liminares pelo CNJ, está previsto na Constituição, na Lei 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo), além de ter previsão no regimento interno do Conselho.

Ele defende também que o CNJ vem editando regulamentos em matérias sujeitas a sua competência, padronizando condutas no âmbito dos tribunais do país, respeitando na medida possível a autonomia dos tribunais com base no inciso 1º parágrafo 4º do artigo 103-B da Constituição.

O dispositivo diz que compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes além de zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências. No âmbito administrativo tribunais não estavam acostumados a este controle, afirma o conselheiro, justificando as críticas.

Rodrigues lembra de outros dois julgamentos no Supremo envolvendo o CNJ onde, segundo ele, a Corte afirmou que a criação do Conselho não apresenta nenhum vício constitucional, não quebra o pacto federativo e não rompe a autonomia dos tribunais.

Um desses julgamentos foi o da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3.367) da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que contestava a criação do conselho, como órgão independente para fiscalizar e propor políticas públicas para o Poder Judiciário. Na ocasião, por maioria, o plenário do Supremo declarou como improcedente a ADI impetrada em dezembro de 2004, antes mesmo do Conselho começar a funcionar.

O outro julgamento citado é o da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 12), também impetrada pela AMB. A ação discutia a constitucionalidade da Resolução nº 7/2005 do CNJ que reafirmava a proibição do nepotismo no Poder Judiciário.

A resolução mais famosa e polêmica do Conselho — que proibiu a nomeação de parentes até o terceiro grau, cônjuges e companheiros de juízes e de servidores para cargos de direção e assessoramento do Poder Judiciário — foi declarada constitucional por 9 votos a um no plenário do Supremo. Para o conselheiro Douglas Rodrigues, neste julgamento, o STF reconheceu que o Conselho detém o poder normativo primário.

A busca processual no site do Supremo Tribunal Federal aponta que já existem mais de 10 ações contestando atos dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público.

O número não assusta a procuradora regional da República e conselheira do Conselho Nacional do Ministério Público, Janice Ascari. “Nos partimos do pressuposto de que fazemos o melhor dentro das nossas atribuições, e o Conselho, como qualquer ação do MP está sujeito ao crivo de um tribunal”, afirma.

Para Janice Ascari, as recentes contestações do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, são absolutamente normais e legítimas. Na semana passada, o chefe da Procuradoria-Geral da República encaminhou ao Supremo Ação Direta de Inconstitucionalidade contra resolução do CNMP que equiparou o teto dos membros do MP nos estados que acumulem funções com o teto máximo estabelecido pela Constituição aos ministros do STF.

“As pessoas sempre reagem ao novo e muitas são refratárias a mudanças recusando-se a aceitar modelos inovadores, principalmente quando isso pode significar submeter-se a um controle até então inexistente ou pífio. Os segmentos mais elevados das carreiras do Judiciário e do MP não estavam acostumados a ter seus atos administrativos questionados, revisados e até mesmo anulados”, afirma Janice Ascari.

Em tempo, a conselheira do CNMP votou contra a nova resolução para elevar o teto. O risco, segundo um ministro de alta corte de Justiça, é que, com suas vaciladas, os Conselhos acabem dando razão ou munição aos seus inimigos.

“Os Conselhos podem cometer erros? Claro, pois são órgãos colegiados, de nítida diversidade pessoal e profissional. As decisões dos Conselhos só podem ser revistas pelo STF que, como colegiado, está sujeito, também, a tomar decisões que podem ser equivocadas e, igualmente, sofrer críticas da comunidade jurídica. Se os Conselhos em algum momento agiram fora de suas competências, ou se decidiram contra a CF, o tempo e o STF dirão”, conclui a procuradora.

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