Salários polpudos

Autoridades usam recurso público em benefício próprio

Autor

9 de dezembro de 2006, 6h00

Autoridades do Poder Legislativo, Ministério Público e do Judiciário querem aproveitar este final de ano para incluir no Orçamento da União verbas que aumentam seus próprios salários. Refiro-me a reajustes de vencimentos e gratificações que, se forem concedidos, irão causar um rombo bilionário aos cofres públicos, mas por outro lado deixarão deputados, senadores e membros do Judiciário, que já tiveram reajuste em 2006, com os salários ainda mais polpudos.

Todas essas despesas estão na contramão das necessidades do país, que precisa justamente cortar gastos desnecessários para, dentre outras coisas, prosseguir com os avanços na área social, objetivando uma melhor distribuição de renda.

Primeiramente, gostaria de citar o caso dos deputados federais e senadores. Nossos parlamentares estão querendo aprovar até dezembro um reajuste de mais de 90% em seus vencimentos, passando dos atuais R$ 12 mil para cerca de R$ 24 mil, com o objetivo de equiparar seus salários aos dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Não estão somados a esses valores as verbas de gabinete e outros benefícios, como passagem aérea e gastos com combustível.

Seguindo o mesmo caminho, a chefe do Judiciário, ministra Ellen Gracie, decidiu pedir ao Congresso Nacional uma remuneração maior para os membros do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), entidade responsável pela implantação do teto salarial do Judiciário.

Acintosamente, a ministra veio aos meios de comunicação dizer que o tal conselho estava se reunindo muito, duas vezes por semana, e resolveu criar uma gratificação de aproximadamente cinco mil reais para compensar tanto esforço. Conclusão: o salário dos membros do Conselho Nacional de Justiça irá ultrapassar o teto que eles mesmos estabeleceram e passará de R$ 24, 5 mil para cerca de R$ 30 mil. Como se não bastasse isso, o Conselho Nacional do Ministério Público, que também quer tirar uma lasquinha do dinheiro do povo, decidiu estudar a equiparação do teto salarial da categoria ao CNJ. Nem é preciso dizer que todos esses aumentos causarão um enorme efeito cascata em todos os tribunais, procuradorias e assembléias legislativas do país e ainda mais estragos no bolso da população.

Há ainda dois projetos de lei já aprovados no Congresso Nacional (PLs 5.845 e 6.469/2005) que concedem um reajuste de até 154% às funções de confiança do Poder Judiciário Federal e Ministério Público da União. Descontando o salário e eventuais incorporações, a gratificação de um assessor de juiz ou desembargador passará de R$ 2,9 mil para R$ 7,5 mil. No caso de um assessor não concursado, o referido cargo em comissão passará de R$ 7,7 mil para R$ 11,6 mil, desconsiderando também eventuais incorporações e adicionais.

Incluindo todos os benefícios, os salários dos assessores de ministros de tribunais, procuradores, desembargadores e juízes poderão ficar acima de R$ 25 mil. Vale ressaltar que metade dos cargos comissionados pode ser preenchida sem concurso público, incentivando o apadrinhamento político, o nepotismo, a corrupção e o assédio moral, bem como a desvalorização e desqualificação dos cargos efetivos.

É importante frisar também que no Poder Judiciário já se gasta mais de 60% da sua folha de pagamento com cargos de confiança e a distribuição de tais verbas não leva em conta critérios objetivos e democráticos, apenas a indicação por parte de autoridades que muitas vezes as utilizam para cooptar e aliciar servidores.

É fácil comprovar, após a exposição desses fatos, que princípios da administração pública, como moralidade, eficiência e impessoalidade estão sendo totalmente desprezados justamente por quem deveria zelar pelo cumprimento das leis neste país. Não há como negar que autoridades do Judiciário, do Ministério Público e do Legislativo estão utilizando recursos públicos em benefício próprio. E o que é pior, muitos sindicatos e associações de classe ignoram ou relutam em combater esses absurdos e tentam muitas vezes tirar proveito da situação para também obter alguma vantagem, escancarando o corporativismo existente em diversas categorias do funcionalismo.

Para terminar, é muito importante que entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil, a imprensa, além da sociedade civil organizada, comecem a denunciar e interferir no processo de elaboração dos orçamentos governamentais, apresentando propostas e projetos de lei para combater essas práticas nefastas do serviço público brasileiro. Ao mesmo tempo, cabe a nós, como cidadãos, cobrarmos das autoridades soluções para que o dinheiro de nossos impostos não seja utilizado de uma maneira tão mesquinha e imoral, pois bilhões de reais estão sendo gastos para manter privilégios injustificáveis, sabendo que esses recursos poderiam ser utilizados para fins mais nobres, como o atendimento das necessidades básicas da população mais carente deste país.

Uma distribuição de renda mais justa se faz também com o uso correto das verbas públicas.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!