Até o CNMP

Marco Aurélio suspende resolução do CNMP sobre promoção

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7 de dezembro de 2006, 16h09

Está suspensa a Resolução 21/05 do Conselho Nacional do Ministério Público que fixou critérios para o voto aberto e fundamentado nas promoções e remoções por merecimento dos membros dos Ministérios Públicos da União e dos estados. A decisão é do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, e vale até o julgamento do pedido de Mandado de Segurança.

O ministro não entra no mérito da questão e justifica a concessão da liminar diante da iminência de reunião do Conselho Superior do Ministério Publico Federal onde seriam analisadas as promoções contestadas.

O mandado foi ajuizado por um grupo de procuradores, que alegaram que o CNMP estava extrapolando da sua competência ao propor uma resolução sobre o funcionamento do Ministério Público, quando o procedimento só poderia ser adotado por meio de lei complementar.

Outro argumento foi o de que o CNMP “extrapolou os comandos constitucionais”, porque criou regras para o “autogoverno do Ministério Público Federal, matéria da competência privativa daquele órgão da administração superior da Instituição, do qual os impetrantes são conselheiros-titulares”.

Por último, o grupo de procuradores afirmou que a CNMP invadiu a competência do Poder Judiciário, por desconstituir ato normativo editado pelo Conselho Superior do Ministério Público, “de cuja elaboração o Conselho Nacional não participou, ressalvando-se que a sua competência se restringe à revisão ou desconstituição de atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos estados”.

O ministro Marco Aurélio acolheu o pedido de liminar. A decisão vale até o julgamento do mérito do Mandado de Segurança.

MS 26.264

Leia a decisão e o pedido de Mandado de Segurança:

Decisão

Mandado de segurança — Liminar — Relevância das causas de pedir e Riscos de manter-se com plena eficácia o ato atacado.

1- Este mandado de segurança versa a autonomia administrativa do Ministério Público, ante a Resolução nº 2, de 2005, do Conselho Nacional do Ministério Público.

Surge, à primeira visão, a seriedade jurídica da articulação constante de inicial, presente a Constituição Federal que a todos indistintamente submete e a Lei Complementar nº 75/93.

No dia de amanhã, haverá sessão do Conselho Superior do Ministério Publico Federal, estando na parte promoções por merecimento.

Impõe-se, até o julgamento da impetrante, providência suspensiva do ato impugnado, no que fixados critérios da avaliação e de desempate considerado o no merecimento.

2- Defiro a medida acauteladora na extensão pleiteada — item A da fl. 28

3- Dêem conhecimento ao Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público encaminhando-lhe cópia da inicial e desta decisão.

4- Publique

Brasília, 4 de dezembro de 2006.


Leia o pedido de Mandado de Segurança

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

DELZA CURVELLO ROCHA, MARIA ELIANE MENEZES DE FARIAS, MARIA CAETANA CINTRA SANTOS e ALCIDES MARTINS, qualificados nos respectivos instrumentos de procuração, em anexo (Doc. 1 a 4), – e representados pelo Bel. RICARDO LUIZ DE ALBUQUERQUE MEIRA, OAB-BA: 12.628, infrafirmado, com endereço profissional na Av. Tancredo Neves, 274, CEI, Bl. B, sala 116, Bairro Caminho das Árvores, em Salvador-BA. (Doc.5) – todos Subprocuradores-Gerais da República e Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal, com endereço funcional na SAF Sul, Quadra 4, Conjunto C, Bloco A, salas, respectivamente nos 506, 204, 501, 302, em Brasília-DF, CEP: 70.050-900, vêm, com fundamento no art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e nas disposições da Lei nº 1.553/51, perante Vossa Excelência impetrar o presente MANDADO DE SEGURANÇA, COM PEDIDO LIMINAR, contra ato do CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, representado pelo seu Presidente, o Procurador-Geral da República, Doutor Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, com endereço na SAF Sul, Quadra 4, Conjunto C, Bloco A, sala C-14, Brasília-DF, CEP: 70.050-900, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:

I – DOS FATOS

1.1. O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) editou a Resolução nº 2, de 21 de novembro de 2005 (Doc.6), disciplinando os critérios objetivos e o voto aberto e fundamentado nas promoções e remoções por merecimento de membros do Ministério Público da União e dos Estados.

1.2. A referida Resolução nº 2/2005, ato administrativo de natureza normativa, no entender do CNMP, editada no uso das atribuições que lhe teriam sido conferidas pelo art. 130-A, § 2º, incisos I (expedir atos regulamentares) e II (apreciar a legalidade de atos administrativos) da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 45, tem o seguinte teor :

RESOLUÇÃO Nº 2, de 21 de novembro de 2005.

Dispõe sobre os critérios objetivos e o voto aberto e fundamentado nas promoções e remoções por merecimento de membros dos Ministérios Públicos da União e dos Estados.

O Conselho Nacional do Ministério Público, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 130-A, § 2º, I e II, da Constituição Federal, e pelo seu Regimento Interno,

RESOLVE:

Art. 1º. As promoções e remoções por merecimento de membros do Ministério Público da União e dos Estados serão realizadas em sessão pública, em votação nominal, aberta e fundamentada.

Art. 2º. O merecimento será apurado e aferido conforme o desempenho e por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício das atribuições e pela freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento.

Parágrafo único. É obrigatória a promoção do membro do Ministério Público que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de merecimento.

Art. 3º. No prazo de 120 (cento e vinte) dias, os Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos deverão editar atos administrativos, disciplinando a valoração objetiva dos critérios, para efeito de promoção e remoção por merecimento dos membros do Ministério Público da União e dos Estados,

considerando:

I – o desempenho, produtividade e presteza nas manifestações processuais;

II – o número de vezes em que já tenha participado de listas;

III – a freqüência e o aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento, atribuindo-se respectiva gradação, observados, para efeito de participação nesses cursos, critérios de isonomia e razoabilidade, respeitado sempre o interesse público.

Parágrafo único. No prazo referido no caput, os Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos deverão enviar ao Conselho Nacional do Ministério Público cópia dos respectivos atos administrativos.

Art. 4º. Durante o prazo referido no artigo anterior e até que sejam editados os respectivos atos, os membros dos Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos que participarem dos procedimentos de votação para promoção por merecimento deverão fundamentar, detalhadamente, suas indicações, apontando os critérios valorativos que os levaram à escolha.

Parágrafo único. Inexistindo especificação de critérios valorativos que permitam diferenciar os membros do Ministério Público inscritos, deverão ser indicados os de maior antigüidade na entrância ou no cargo.

Art. 5º. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 21 de novembro de 2005.

ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA

PRESIDENTE

1.3. O art. 3º, da Resolução nº 2, dispõe que “no prazo de 120 dias” de sua edição, os Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos deveriam adaptar suas normas internas, editando “atos administrativos, disciplinando a valoração objetiva dos critérios, para efeito de promoção e remoção por merecimento” dos seus membros, considerando os critérios ali estabelecidos, bem como, editados esses atos administrativos deveriam ser submetidos àquele Conselho Nacional, mediante o envio de cópia (parágrafo único, do art. 3º).

1.4. No âmbito do Ministério Público Federal, foi encaminhado ao Procurador-Geral da República, Presidente do Conselho Superior do Ministério Público Federal, ofício no sentido de que fossem tomadas as “providências cabíveis”, conforme se constata de Ofício Circular nº 003/2006-SG, de 23 de fevereiro de 2006, assinado pelo Exmo. Sr. Secretário-Geral do CNMP, Dr. Alexandre Espinosa Bravo Barbosa (Doc. 7).

1.5. O referido expediente, por determinação do Procurador-Geral da República, também Presidente do Conselho Superior do Ministério Público Federal, foi submetido à distribuição, tendo sido sorteada para relatar o Processo CSMPF nº 1.00.001.000018/2006-40, a Conselheira Maria Caetana Cintra Santos.

1.5.1. Em cumprimento do regular processo legislativo adotado pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal, a Relatora elaborou um Anteprojeto de Resolução que recebeu o nº 9 (Doc. 8), submetendo-o ao conhecimento da classe, a fim de oportunizar a apresentação de emendas.

1.5.2. Em seguida, o respectivo Projeto foi apreciado pelo Eg. Conselho Superior do Ministério Público Federal, que, após as discussões e destaques o aprovou por unanimidade, em 20 de junho de 2006, sendo, então, editada a anexa RESOLUÇÃO Nº 86 (Doc. 9).

1.6. Pelo art. 2º, incisos I a IV, da Resolução nº 86 , foram fixados os critérios objetivos para a promoção por merecimento referidos na Emenda Constitucional nº 45 e ora constantes do art. 93, II, alínea c/CF, e na Lei Complementar nº 75/93, art. 57, I, alínea e, VII, c.c. art. 200 (Lei Orgânica do Ministério Público da União), tendo sido aproveitadas, inclusive, em parte, sugestões estabelecidas na Resolução nº 2 do CNMP.

1.7. Após editar, o Conselho Superior, a Resolução nº 86, o Procurador-Geral da República expediu o Ofício nº 279/2006/CSMPF, de 14 de agosto de 2006 (Doc.10) , encaminhando o seu texto ao Conselho Nacional do Ministério Público, onde foi recepcionado pelo Exmo. Sr. Secretário-Geral, agora o Dr. José Adonis Callou de Araújo Sá, cuja cópia desse ato normativo já vinha sendo reclamada por parte daquele Conselho Nacional, desde abril de 2006 (CF. Ofício/CNMP/SG Nº 219/2006) (Doc.11).

1.8. No Conselho Nacional, o referido expediente deu origem ao Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58, em que foi Relator o Cons. Luiz Carlos Lopes Madeira, que o incluiu na pauta da 8ª Sessão Ordinária de 04.09.2006, restando consignado no andamento desse procedimento o seguinte resultado parcial (Doc. 12):

“Após o voto do Relator, pela procedência parcial do procedimento de controle administrativo, para, alterando o artigo 7º da Resolução CSMPF nº 86/2006, indicar como fator de desempate o voto do presidente, conforme estabelecido na Lei Complementar nº 75/93, e não o critério da antiguidade, no que foi acompanhado pelos Conselheiros Ricardo Mandarino, Ernando Uchôa Lima, Francisco Maurício de Albuquerque e Alberto Cascais, pediu vista a Conselheira Janice Ascari. Aguardam os demais”.

1.9. Em sessão de 02.10.2006, apreciando o voto da Cons. Janice Ascari, o Conselho Nacional do Ministério Público, “por unanimidade, nos termos do voto do Relator, com as observações do voto-vista, decidiu pela alteração da Resolução do CSMPF quanto ao critério de desempate. Lavrará o acórdão a Cons. Janice Ascari”.

1.10. Assim, por unanimidade de votos, o Conselho Nacional do Ministério Público decidiu, nos autos do Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58 alterar a Resolução nº 86, do Conselho Superior do MPF, não só para impor avaliação negativa dos currículos dos candidatos à promoção por merecimento, no que se refere aos critérios relativos “à eficiência, à produtividade, à presteza e à dedicação no desempenho de suas funções”, infringindo as normas dos arts. 93, II, alínea c/CF; 57, I, alínea e, VII c.c. 200/LC 75/93; e art. 2º, I, da Resolução nº 86/CSMPF, tendo, ainda, em especial, fixadooutro critério a ser observado, no caso de empate na constituição da lista tríplice de promoção por merecimento, desconsiderando-se a antigüidade para se atribuir ao Procurador-Geral da República o poder de desempatar o certame.” (Doc. 13) (O negrito não consta do original, assim também o sublinhado).

1.11. Referida decisão mereceu a ementa abaixo transcrita, publicada no Diário de Justiça de 23.10.06, seção 1, página 566 (Doc. 14), seguida do voto condutor.

“EMENTA

Procedimento de Controle Administrativo. Verificação de Cumprimento da Resolução CNMP n° 02/2005.

Normas gerais que estabelecem critérios para avaliação do merecimento, para fins de promoção e remoção estabelecidas, no caso em exame, na Lei Orgânica Nacional do MPU – Lei Complementar n° 75/93.

Normas internas que não discrepam das diretrizes gerais fixadas por este Conselho Nacional, a não ser nos pontos destacados no acórdão.

Alteração do critério de desempate, para adequação ao que dispõe a LC 75/93.”

II DO ATO IMPUGNADO, DA TEMPESTIVIDADE

E DO OBJETO DO WRIT

2.1. O ato impugnado, consubstanciado na decisão administrativa emanada da indigitada autoridade coatora, o Conselho Nacional do Ministério Público, nos autos do Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58, cuja deliberação se iniciou na sessão de 02.10.2006, posteriormente consolidada em acórdão publicado no Diário de Justiça de 23.10.2006, (Seção 1, pág. 566) – (Docs. 12/14), portanto a menos de 120 dias da data de hoje, violou direito líqüido e certo dos impetrantes, na qualidade de membros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal, pois:

a) invadiu e usurpou a competência da Constituição Federal de 1988, quando inovou a ordem jurídica, para se sobrepor à Carta Magna, que remeteu a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público (art. 128, §5º CF/88) à Lei Complementar, que, por sua vez, fixou a competência do Conselho Superior do Ministério Público Federal, junto ao qual os impetrantes exercem a função pública de Conselheiros, para estabelecer os critérios objetivos, bem como para elaborar a lista tríplice, a ser encaminhada à Chefia da Instituição, para fins de promoção por merecimento na carreira, conforme estabelece o seu art. 57, verbis:

“I – exercer o poder normativo no âmbito do Ministério Público Federal, observados os princípios desta Lei Complementar, especialmente para elaborar e aprovar:

(…)

e) os critérios de promoção por merecimento, na carreira,

(…)

VII – elaborar a lista tríplice destinada à promoção por merecimento;

(…)”

violando, ainda os arts. 200 e 202, § 4º, da Lei Complementar 75/93;

b) extrapolou os comandos constitucionais inseridos na primeira parte dos incisos I e II, do § 2º, do art. 130-A, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, ao submeter a seu controle administrativo, ato normativo emanado do Conselho Superior do Ministério Público Federal, revendo, ao seu talante, o conteúdo da Resolução CSMPF nº 86, imiscuindo-se, dessa forma, em matéria que refoge ao âmbito de sua competência regulamentadora, de sua função de controle de atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, atingindo o autogoverno do Ministério Público Federal, matéria da competência privativa daquele órgão da administração superior da Instituição, do qual os impetrantes são Conselheiros-titulares;

c) invadiu competência privativa do Poder Judiciário, desconstituindo, em parte, ato normativo editado pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal, do qual os impetrantes são Conselheiros-titulares, e de cuja elaboração o Conselho Nacional não participou, ressalvando-se que a sua competência se restringe à revisão ou desconstituição de atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados;

d) desrespeitou, às escâncaras, determinação que lhe foi imposta pelo § 2º, do art. 130-A da Constituição, de “ zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público”.

2.2. O ato impugnado é ato normativo de efeito concreto, porque dirigido a impor aos impetrantes a observância das regras que o Conselho Nacional estabeleceu ( a) critério de desempate pelo voto do Presidente e b) avaliação negativa de desempenho, produtividade e presteza nas manifestações processuais dos candidatos à promoção por merecimento), e encontra-se fundamentado indevidamente em poder regulamentar e de controle (consoante se vê do preâmbulo da Resolução nº 2/CNMP e do Ofício/CNMP/SG Nº 219/2006 expedido com base no art. 3º, da Resolução nº 2/CNMP), que, nessa matéria, como adiante se verá, o Conselho Nacional do Ministério Público não ostenta, atentando, assim, contra a competência legal e administrativa do Conselho Superior do Ministério Público Federal, bem como afrontando o exercício das funções do cargo de Conselheiro-titular, materializado na Resolução nº 86/CSMPF.

2.3. Assim, o objeto deste mandamus é a obtenção de provimento jurisdicional que assegure aos impetrantes, Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal, o exercício de suas funções sem interferências, em especial, nas promoções por merecimento, preservando a competência legal e administrativa do Conselho Superior do Ministério Público Federal, anulando o ato impugnado e declarando, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da Resolução CNMP 02.

III – DA LEGITIMIDADE ATIVA DOS IMPETRANTES

3.1. Na doutrina de Humberto Theodoro Jr., “a legitimação ativa caberá ao titular do interesse afirmado na pretensão” (in,Curso de Direito Processual Civil”, Ed. Forense, 2000, Vol. I, p.51).

3.2. O Supremo Tribunal Federal já decidiu pela legitimidade de os titulares de funções públicas para a impetração de mandado de segurança, visando assegurar o pleno exercício de suas funções, direito-dever, como se vê do julgado no MS 21239/DF, Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – TRIBUNAL PLENO – DJ 23-04-1993, pp. 06920:

“Ementa:

I. MANDADO DE SEGURANÇA: LEGITIMAÇÃO ATIVA DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA PARA IMPUGNAR ATOS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA QUE ENTENDE PRATICADOS COM USURPAÇÃO DE SUA PRÓPRIA COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL E OFENSIVOS DA AUTONOMIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO: ANÁLISE DOUTRINÁRIA E REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA.

1. A legitimidade ad causam no mandado de segurança pressupõe que o Impetrante se afirme titular de um direito subjetivo próprio, violado ou ameaçado por ato de autoridade; no entanto, segundo assentado pela doutrina mais autorizada (Cf. Jellinek, Malberg, Duguit, Dabin, Santi Romano), entre os direitos públicos subjetivos, incluem-se os chamados direitos-função, que tem por objeto a posse e o exercício da função pública pelo titular que a detenha, em toda a extensão das competências e prerrogativas que a substantivem: incensurável, pois, a jurisprudência brasileira, quando reconhece a legitimação do titular de uma função pública para requerer segurança contra ato do detentor de outra, tendente a obstar ou usurpar o exercício da integralidade de seus poderes ou competências: a solução negativa importaria em “subtrair da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.

2. A JURISPRUDÊNCIA – COM AMPLO RESPALDO DOUTRINÁRIO (V.G., VICTOR NUNES, MEIRELLES, BUZAID) – TEM RECONHECIDO A CAPACIDADE OU "PERSONALIDADE JUDICIÁRIA" DE ÓRGÃOS COLETIVOS NÃO PERSONALIZADOS E A PROPRIEDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA PARA A DEFESA DO EXERCÍCIO DE SUAS COMPETÊNCIAS E DO GOZO DE SUAS PRERROGATIVAS.

3. Não obstante despido de personalidade jurídica, porque é órgão ou complexo de órgãos estatais, a capacidade ou personalidade judiciária do Ministério lhe é inerente – porque instrumento essencial de sua atuação – e não se pode dissolver na personalidade jurídica do Estado, tanto que a ele freqüentemente se contrapõe em juízo; se para a defesa de suas atribuições finalísticas, os Tribunais têm assentado o cabimento do mandado de segurança, este igualmente deve ser posto a serviço da salvaguarda dos predicados da autonomia e da independência do Ministério Público, que constituem, na Constituição, meios necessários ao bom desempenho de suas funções institucionais.

4. Legitimação do Procurador-Geral da República e admissibilidade do mandado de segurança reconhecidas, no caso, por unanimidade de votos. II. Ministério Público da União: Nulidade da nomeação, em comissão, pelo Presidente da República, de Procurador-Geral da Justiça do Trabalho.

(…)

9. Pela mesma razão de nulidade da nomeação do litisconsorte passivo do MS 21.239 e impetrante do MS 21.243, também é de reputar-se nula a nomeação do seu antecessor, no cargo do litisconsorte ativo, no MS 21.239 e passivo, no MS 21.243, donde a impossibilidade de deferir a primeira impetração, no ponto em que se insurge contra o ato que o exonerou.

10. Deferimento parcial do MS 21.239, impetrado pelo Procurador-Geral da República, para declarar nula a nomeação do litisconsorte passivo, julgando-se prejudicado, em conseqüência, o MS 21.243, requerido pelo último”.

(Aqui sublinhado)

3.3. Em outro acórdão dessa Suprema Corte, na AO 232/PE, em que foi Relator o Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ 20-04-2001 PP-00105, restou reafirmado que:

“4. Não faz muito, no MS 21.239, 5.6.91, de que fui relator, na ementa, consignei (RTJ 147/104):

“A legitimidade ad causam no mandado de segurança pressupõe que o impetrante se afirme titular de um direito subjetivo próprio, violado ou ameaçado por ato de autoridade; no entanto, segundo assentado pela doutrina mais autorizada (cf. Jellinek, Malberg, Duguit, Dabin, Santi Romano), entre os direitos públicos subjetivos, incluem-se os chamados direitos-função, que têm por objeto a posse e o exercício da função pública pelo titular que a detenha, em toda a extensão das competências e prerrogativas que a substantivem: incensurável, pois, a jurisprudência brasileira, quando reconhece a legitimação do titular de uma função pública para requerer segurança contra ato de detentor de outra, tendente a obstar ou usurpar o exercício da integralidade de seus poderes ou competências: a solução negativa importaria em “subtrair da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.”

5. Essa doutrina serve, no caso, de um lado, para tornar induvidosa a legitimação ativa dos impetrantes, que reivindicam o que lhes parece constituir direitos-função de que são titulares e cujo exercício o ato coator lhes subtrai.

6. Por outro lado, serve ele, no caso, para situar os autores do ato questionado – que os afirma titulares únicos das mesmas atribuições -, como interessados na sua manutenção, que vale, nas circunstâncias, pela preservação dos poderes ou direitos-função, que sustentam exclusivamente seus, ao passo que os impetrantes querem participar do seu exercício.”

3.4. Os impetrantes são Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal – formado por 10 (dez) membros, certidões anexas – e, no exercício das suas funções institucionais, têm o dever de zelar: a) pela competência estabelecida na Lei Complementar nº 75/93, art. 57, I, e, e VII, arts. 200 e 202, § 4º; b) pela autoridade de suas decisões e deliberações, no presente caso materializada na Resolução 86/CSMPF, arts. 2º, I, e 7º, parágrafo único, primeira parte, ora afrontada pelo ato impugnado; c) pela própria independência funcional no exercício de tais cargos do Parquet Federal, como representantes dos membros da classe que os elegeram em processo eleitoral democrático e legítimo; d) pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público Federal (art. 127, § 1º, in fine, II/CF), incumbindo-lhes, portanto, defender o próprio Conselho Superior, e, em conseqüência, a Instituição, contra usurpações e ingerências indevidas, inclusive do recém-criado Conselho Nacional do Ministério Público.

3.5. Por isso é que impetram o presente mandado de segurança, visando obstar a invasão da competência normativa do Conselho Superior do Ministério Público Federal, resgatando, conseqüentemente, o pleno exercício da função institucional que lhes compete, em toda a extensão das competências e prerrogativas que a substantivem, consoante será adiante demonstrado.

3.6. O gravame sofrido pelos impetrantes resulta de que o ato impugnado suprime as competências estabelecidas pela Lei Complementar nº 75/93, em favor dos Conselheiros do Conselho Superior do MPF, impedindo-os de exercerem os direitos subjetivos próprios de membros daquele Colegiado, cuja atuação há de ser assegurada em toda a plenitude, pois dentre as atribuições atinentes à função da qual são titulares (art. 57, da Lei Orgânica do Ministério Público da União) – entre elas a normativa, no âmbito do Ministério Público Federal – encontra-se também a de elaborar a lista tríplice para as promoções por merecimento, dos membros da instituição, pelos critérios objetivos estabelecidos em sua competência legal.

IV – DA LEGITIMIDADE PASSIVA DO IMPETRADO

4.1. No dizer de HUMBERTO THEODORO JR.: “legitimados ao processo são os sujeitos da lide, isto é, os titulares dos interesses em conflito”, e a legitimação passiva caberá “ao titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão” (in, “Curso de Direito Processual Civil, Ed. Forense, 2000, Vol. I, p.51).

4.2. A legitimidade passiva do Conselho Nacional do Ministério Público, representado por seu eminente Presidente, o Exmo. Senhor Procurador-Geral da República, para figurar na lide como autoridade coatora, fica evidente uma vez que o ato impugnado emanou daquele Órgão Colegiado, nos autos do Processo de controle administrativo nº 0.00.000.000435/2006-58/CNMP (sessões dos dias 04.09.2006 e 02.10.2006), que alterou o parágrafo único, do artigo 7º, da Resolução nº 86 do Conselho Superior do Ministério Público Federal, invadindo sua competência normativa, impondo, ainda, aos seus Conselheiros que apreciem, mediante avaliação negativa, o desempenho, a produtividade e a presteza nas manifestações processuais dos candidatos à promoção por merecimento.

4.3. O provimento jurisdicional, ora pleiteado a esse Excelso Supremo Tribunal Federal, projetará, assim, conseqüências que deverão ser suportadas pelo Conselho Nacional do Ministério Público, em face do referido processo administrativo.

V – DO INTERESSE PROCESSUAL DOS IMPETRANTES

5.1. Explica VICENTE GRECO FILHO que o interesse processual é “a necessidade de se socorrer ao Judiciário para a obtenção do resultado pretendido (…) é uma relação de necessidade e uma relação de adequação, porque é inútil a provocação da tutela jurisdicional se ela, em tese, não for apta a produzir a correção da lesão argüida na inicial” (in, “Direito Processual Civil Brasileiro”, Saraiva, 2000, p. 81). Em suma, o provimento jurisdicional deve trazer uma “utilidade prática”.

5.2. Diante dessas premissas, constata-se a nítida necessidade dos impetrantes de pleitear junto ao Supremo Tribunal Federal uma decisão judicial que restabeleça a ordem jurídica (art. 127, caput, da Constituição Federal), desobstruindo, pela via mandamental, o obstáculo criado ilegal e inconstitucionalmente pelo Conselho Nacional do Ministério Público e que impede a todos os membros do Conselho Superior do Ministério Público Federal, entre eles os impetrantes, de exercerem as competências inerentes às funções das quais são legítimos titulares, pedindo vênia para repetir, em toda a extensão das competências e prerrogativas que a substantivem.

VI – DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

6.1. No que diz respeito à competência específica para o conhecimento e julgamento da presente ação mandamental, cabe destacar que, após a Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, o artigo 102, da Constituição Federal passou a ter a seguinte redação:

“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I – processar e julgar, originariamente:

(…)

r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público;”.

(Aqui destacado)

6.2. Portanto, esse Excelso Pretório possui plena competência para conhecer e decidir acerca da presente impetração.

VII – DO DIREITO LÍQÜIDO E CERTO

7.1. Direito líquido e certo é aquele provado de plano e que está apto a ser exercitado imediatamente pelo seu titular.

7.2. O direito líqüido e certo vindicado pelos impetrantes emerge da qualidade que detêm de Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal de, com fundamento no art. 57, I, e, e VII/LC 75/93, elaborar e aprovar a lista tríplice e os critérios de promoção por merecimento dos membros na carreira.

7.3. Dessa forma, flagrante a restrição indevida das suas funções institucionais, por força de invasão de competência levada a cabo pelo Conselho Nacional do Ministério Público, com a edição do ato impugnado, que alterou, inclusive, os arts. 2º, I, e 7º, parágrafo único, primeira parte, da Resolução nº 86/CSMPF, violando, além dos dispositivos já mencionados, as normas dos arts. 5º, II, LIII, LIV, 93, II, c; 128, § 5º, 129, § 4º/CF, sendo certo, ainda, que a prova pré-constituída está materializada nos elementos normativos referenciados nos tópicos adiante detalhados.

A – DA AUTONOMIA ADMINISTRATIVA

7.4. HELY LOPES MEIRELLES, em parecer publicado na Revista Justitia, 123: 185 e 186, dilucida a expressão “autonomia administrativa”:

Autonomia administrativa é a faculdade de gestão dos negócios da entidade ou órgão, segundo as normas legais que o regem, editadas pela entidade estatal competente. Não se confunde com autonomia política, que é prerrogativa de editar suas próprias normas e aplicá-las na sua organização e nas suas atividades, segundo os preceitos constitucionais e as leis superiores que instituem a entidade e delimitam a sua atuação. Por isso mesmo, a autonomia política só é concedida às entidades estatais – União, Estados-membros e Municípios – ao passo que a autonomia administrativa pode ser atribuída a qualquer órgão ou entidade, que em razão de seus objetivos deva gerir com mais liberdade os seus negócios, ficando apenas vinculado (não subordinado) ao poder que o instituiu.”

7.5. Nesse sentido, o Min. NÉRI DA SILVEIRA, na ADI-MC nº 1.905-7/RS, proferiu o histórico voto abaixo transcrito:

“ O SENHOR MINISTRO NÉRI DA SILVEIRA – Sr. Presidente.

A norma do art. 99 da Constituição, dispõe que:

“Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada a autonomia administrativa e financeira.”

Essa norma representa uma inovação no sistema de 1988 e, mais do que isso, uma nova dimensão da independência do Poder Judiciário.

Com a Constituição do Império, tínhamos a primeira dimensão, que continua até hoje, ou seja, a independência do magistrado para decidir de acordo com a sua consciência e com a lei, não se sujeitando a nenhum outro Poder, a nenhum outro império. Esse foi o primeiro traço da independência. Mas o Poder Judiciário do Império não era independente, segundo a concepção que se tem hoje de independência, em que o Poder Judiciário pode controlar atos dos outros Poderes e os seus próprios, declarando-os inválidos e inconstitucionais. Essa dimensão só surgiu com a implantação da República, que adotou o sistema americano e definiu-o na Constituição de 1891.

A terceira dimensão, resultou de uma longa campanha do Poder Judiciário no sentido de adquirir o que chamamos de autonomia administrativa e financeira. Essa autonomia administrativa não significa, apenas, confirmar o que está no art. 96, I, alíneas “a” e “b”, da Constituição, porque isso já existia desde a República, quer dizer, de gerir a sua própria secretaria, os seus próprios serviços, nomear os servidores de sua secretaria, adotar essas providências efetivas, por exemplo, quanto à sua administração, os tribunais elegem os seus presidentes. Isso faz parte, também, da autonomia administrativa, mas quando a Constituição de 1988, no art. 99, quis assegurar ao Poder Judiciário autonomia administrativa, fê-lo , exatamente, para conferir a esse Poder competência para dispor, pensar, planejar a respeito dos seus próprios serviços, negócios. Fica vencida aquela fase do tempo em que o Poder Judiciário somente se queixava que os outros Poderes não lhe davam recursos, condições de desenvolver os seus serviços. Os cartórios não podiam se ampliar; as comarcas não podiam ter mais juízes, porque o Poder Executivo não encaminhava projeto de criação de cargos. A Constituição quis propiciar ao Poder Judiciário, com independência, gerir seus negócios, dispor sobre seus próprios serviços, não, a seu modo, a seu talante, ou arbitrariamente, mas de acordo com a lei, como os outros dois Poderes, não dependendo, para todos os assuntos, da iniciativa do Poder Executivo, como ocorria no regime anterior, em que, por exemplo, a criação de cargos, a ampliação do número de cargos dependia, sempre de iniciativa, no âmbito federal, do Presidente da República; no âmbito dos Estados, do Governador. A Constituição quis introduzir, precisamente, essa dimensão. Sempre entendi tal dispositivo com esta amplitude: que o Poder Judiciário pense a respeito de si mesmo, isto é, as administrações dos tribunais, cada um em sua área de jurisdição, possam prover a respeito da modernização dos serviços, adotar aquelas técnicas e tudo aquilo que mais convém a uma boa prestação do serviço, que é público, essencial à Nação.

O controle de qualidade, a verificação de tudo que mais convenha a uma boa prestação da Justiça, é evidente que está dentro da competência do Poder Judiciário dispor. Não é possível, entretanto, entender-se que, vigentes essas normas, caiba o Poder Executivo encaminhar um projeto de lei submetendo os serviços judiciários a um controle de qualidade, de verificação por parte de um Órgão, de uma Secretaria do Poder Executivo, inclusive com conseqüências que a própria lei prevê. Isso, evidentemente, fica fora dos limites traçados pela Constituição quanto a essa terceira dimensão da independência do Poder Judiciário.” (Aqui destacado)

BA AUTONOMIA ADMINISTRATIVA

DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

7.6. A Constituição de 1988, no art. 127, § 1º, assegura ao Ministério Público a independência funcional (que diz respeito à atuação do membro do Ministério Público) e a autonomia funcional e administrativa (que se refere à própria instituição), quando dispõe, em seu § 2º que:

“§ 2º. Ao Ministério Público é assegurada autonomia funcional e administrativa, podendo, observado o disposto no art. 169, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de carreira; a lei disporá sobre sua organização e funcionamento.”

7.7. Para que seja assegurada essa autonomia funcional e administrativa, a Constituição Federal de 1988 incumbiu ao Procurador-Geral da República elaborar as estruturas e a organização das instituições que se encontram vinculadas ao Ministério Público da União, autorizando-o a encaminhar, ao Congresso Nacional, o respectivo Projeto de Lei Complementar – Lei Orgânica do Ministério Público da União – quando dispôs no § 5º, do artigo 128:

§ 5º. Leis Complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público , observadas, relativamente a seus membros:

(…)

7.8. Já no texto da Mensagem nº 02, de 31 de março de 1989 (Doc.15), o então Procurador-Geral da República, hoje MINISTRO JOSÉ PAULO SEPÚLVEDA PERTENCE, acentuou, entre outros aspectos, que

“… da outorga de sua autonomia administrativa à plenitude das garantias de independência asseguradas aos seus membros; da enumeração e da significativa ampliação de suas funções institucionais e de seus instrumentos de atuação à definição de estatuto inovador de sua chefia, tudo testemunha o reconhecimento constituinte sobre a tarefa política fundamental que lhe foi reservada na construção da democracia. O Ministério Público da União, em particular, desvinculado do seu compromisso original com a representação judicial do erário e a defesa dos atos governamentais, que o prendiam necessariamente aos laços de confiança do Executivo, está agora cercado de contrafortes de independência e autonomia, que o credenciam ao efetivo desempenho de uma magistratura ativa de defesa impessoal da ordem jurídica democrática, dos interesses coletivos e nos direitos da cidadania.

7.9. Acentuou Sua Excelência que, embora a Constituição Federal tenha unificado, sob uma mesma chefia, os seus diferentes ramos – Ministérios Públicos Federal, do Trabalho, Militar e do Distrito Federal e Territórios – o projeto manteve a particularidade de cada um quanto ao exercício da função jurisdicional do Estado, preservando-lhes a autonomia funcional, assim também agindo em relação à administrativa, quando estruturou seus órgãos com a participação dos integrantes de cada uma das carreiras do Ministério Público da União na gestão dessas instituições,

“…valorizada mediante a repartição de competência tradicionalmente atribuída ao Procurador-Geral da República com os órgãos colegiados, sobretudo os conselhos superiores e as câmaras de coordenação e revisão.”(Cf. Mensagem nº 2 de 31 de março de 1989, retro citada).

7.10. A Lei Complementar nº 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União) foi editada imediatamente após a Lei nº 8.625/93, de 12/02/93 (Lei do Ministério Público dos Estados), que veio dispor sobre normas gerais para a organização do parquet estadual, sendo complementada, em cada Estado da Federação, por Leis Orgânicas específicas, de iniciativa dos Procuradores-Gerais de Justiça, tal como ordenou o comando constitucional.

7.11. A autonomia funcional e administrativa do Ministério Público tem como fonte primária a Carta Magna, quer na esfera federal, quer na estadual, fincada na Lei Maior e em ordenamento jurídico sólido, que entregou o poder de regulamentar essas Instituições – a competência normativa-institucional – aos órgãos internos, integrantes da organização superior de cada uma delas, dentro dos limites impostos pela Constituição e pelas Leis Orgânicas dos Ministérios Públicos Estaduais respectivos.

7.12. Aliás, a autonomia funcional e administrativa se constitui em “contraforte que credencia, juntamente com a independência funcional, o Ministério Público,ao efetivo desempenho de uma magistratura ativa de defesa impessoal da ordem jurídica democrática, dos interesses coletivos e nos direitos da cidadania, consoante referido na Mensagem nº 02/89.

7.13. Tanto é que, recentemente, ao editar a Emenda Constitucional nº 45/2004, criando o Conselho Nacional do Ministério Público, o constituinte derivado outorgou a esse novel Órgão, a tarefa de

zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público”, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências”. (Art. 130-A, § 2º, I da EC 45/2004).

C – O EXERCÍCIO DO PODER NORMATIVO PELO CSMPF

E A EDIÇÃO DA RESOLUÇÃO Nº 86/2006

7.14. O Conselho Superior do Ministério Público Federal, ao editar a Resolução CSMPF nº 86, agiu no exercício da sua competência normativa outorgada pela Lei Complementar nº 75/93, bem assim no âmbito da autonomia administrativa de que se encontra investido por força dos arts. 127 e 128, § 5º/CF para gerir, sem interferências, os assuntos referentes aos interesses institucionais, conforme dispõe em seu art. 57, in verbis:

“ Art. 57 – Compete ao Conselho Superior do Ministério Público Federal:

I – exercer o poder normativo no âmbito do Ministério Público Federal, observados os princípios desta Lei Complementar, especialmente para elaborar e aprovar: (…)

e) os critérios de promoção por merecimento, na carreira; (…)

VII – elaborar a lista tríplice destinada à promoção por merecimento;”

7.15. As competências fixadas pela Lei Complementar nº 75/93 e atribuídas ao Conselho Superior do Ministério Público correspondem às matérias previstas no art. 127, § 2º, c.c. com o § 3º, do art. 129; art. 128, § 5º, bem como no art. 93, em virtude do comando impresso no § 4º, do art. 129, todos da Constituição Federal, com as modificações ocorridas pela edição da EC 45/2004, tratando-se, portanto, de competência normativa derivada do texto constitucional, na forma do disposto em Lei Complementar específica.

7.16. Como órgão da Administração Superior da Instituição (art. 43, inc. III da LC 75/93), o Conselho Superior do Ministério Público Federal, ao editar a Resolução CSMPF nº 86/2006, atuou nos exatos limites de sua competência, ajustando a norma anterior (Resolução CSMPF nº 03) aos novos preceitos inseridos pela Emenda Constitucional nº 45/2004 na Constituição Federal de 1988, procurando, ainda, solucionar questões outras, de ordem prática, que afloraram, com o tempo, como a derivada do fato de o Procurador-Geral da República, Presidente do Conselho Superior, contribuir com o seu voto, desde a primeira votação, quando da elaboração da lista tríplice para a promoção por merecimento.

7.17. O cômputo do voto do Procurador-Geral da República, na elaboração da lista tríplice, tem origem em disposição regimental de ordem geral, conforme dispõe o art. 1º do Regimento Interno do CSMPF, verbis:

“Art. 1º – O Conselho Superior instalará os seus trabalhos estando presente a maioria absoluta de seus membros e, salvo disposição em contrário (LC nº 75, art. 57, § 2º), deliberará por maioria simples de votos, prevalecendo, em caso de empate, o voto do Presidente, exceto em matéria de sanções, caso em que prevalecerá a solução mais favorável ao acusado.”

7.18. Assim é que, o Conselho Superior do Ministério Público Federal, constituído de 10 (dez) membros, vê-se, muitas vezes, quando da elaboração de listas tríplices, na circunstância de fazer uso de critério de desempate, a fim de permitir que se chegue aos nomes dos membros do Ministério Público Federal que irão integrá-las.

7.19. Pelo critério geral instituído na Lei Orgânica – art. 56, § 1º, da Lei Complementar nº 75/93 – o desempate será dirimido pelo voto do Procurador-Geral da República – critério, aliás, que é invariavelmente utilizado para o desempate em matéria administrativa.

7.20. Entretanto, o Conselho Superior já enfrentou a seguinte situação, retratada claramente no Doc. 16: em procedimento de votação para a constituição de lista tríplice, visando promoção por merecimento, o Procurador-Geral votou, como todos os demais Conselheiros, indicando três nomes para compor a lista (nesse momento ocorreu a primeira manifestação de vontade do PGR na formação da lista); houve empate em relação a cinco nomes escolhidos, empate esse que foi dirimido pela prevalência dos nomes indicados pelo Procurador-Geral da República (segunda manifestação de vontade do Procurador Geral da República); com esse “desempate”, o Procurador-Geral da República acabou por definir a lista tríplice; para, em seguida, exercendo, pela terceira vez a sua vontade, escolher, dos três nomes constantes da lista tríplice por ele mesmo definida, o nome do Procurador Regional da República que entendeu deveria ser promovido.

7.21. A promoção por merecimento, assim realizada, tornou-se, na realidade, ato potestativo da vontade unilateral do Chefe da Instituição, desvirtuado, por completo, da forma colegiada de elaboração da lista e da própria natureza do ato de provimento de cargo da carreira, objeto de regramento constitucional e infraconstitucional, restando, flagrantemente, violados os princípios republicanos e afastados os critérios objetivos que deveriam e devem nortear a promoção por merecimento.

7.22. Diante dessa situação teratológica já vivenciada no Conselho Superior do Ministério Público Federal e para preservar exatamente os princípios inscritos no art. 37, da Constituição – em especial os da impessoalidade e da moralidade dos atos da administração –, optou o Conselho Superior do Ministério Público Federal, quando da elaboração da Resolução 86/2006, por escolher, no caso de elaboração de listas tríplices, como critério de desempate, a realização de escrutínios sucessivos, até o máximo de três, quando então, a persistir o empate, este será dirimido seguindo as regras da antigüidade.

7.23. Frise-se que esse critério objetivo é utilizado por vários Tribunais Regionais Federais para o desempate em lista tríplice, e pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, regido também pela Lei Complementar nº 75/93, não se admitindo, pois, que, somente no âmbito do Ministério Público Federal, possa ocorrer diferentemente, prestigiando a escolha subjetiva, ao talante exclusivo do Procurador Geral da República, afastado o Colegiado da função privativa de formar a referida lista e abandonando os critérios objetivos que devem nortear o certame, sem preferências ou discriminação de quem quer que seja, sob pena de vulneração do art. 5º, caput, c.c. art. 37/CF.

7.24. Observe-se que a Resolução nº 86 do CSMPF foi editada por decisão unânime, contando, inclusive, com o voto favorável do próprio Procurador-Geral da República, o que permite afirmar que, em face do objetivo primeiro a ser atendido (princípio da impessoalidade da atuação administrativa), o Conselho Superior se valeu da autonomia administrativa que o informa, e elaborou regra própria para esse caso específico de desempate, exatamente para não se afastar do referido princípio.

D – A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004 E

A COMPETÊNCIA DOS CONSELHOS DE CONTROLE

7.25. A Emenda Constitucional nº 45/2004, ao inserir no texto constitucional, os artigos 92, I-A, 103-B e 130-A, com seus incisos e parágrafos, instituiu os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério Público, ambos órgãos administrativos de controle, respectivamente, no âmbito do Poder Judiciário e do Ministério Público.

7.26. Assim é que, da mesma forma que dispõe do art. 103-B, em seu § 4º, o § 2º do art. 130-A da Constituição deixa expresso que compete ao Conselho Nacional do Ministério Público … “o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros”, cabendo-lhe

“I – zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências.

II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los, ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas”.

7.27. Os comandos constitucionais, inseridos na primeira parte dos incisos I e II, do § 2º, do art. 130-A da EC nº45/2004 (“zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público” e “zelar pela observância do art. 37”), referem-se à forma a ser observada no exercício de suas competências, pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Essas competências devem ser exercidas observando o zelo, o cuidado pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, em consonância com os princípios consagrados no art. 37, do texto constitucional.

7.28. Desse modo, pede-se vênia para ressaltar o já explicitado pelo eminente Min. CEZAR PELUSO, em seu alentado voto na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.367-1/DF, quando esse Colendo Supremo Tribunal Federal deu interpretação à idêntica competência normativa outorgada ao Conselho Nacional de Justiça:

“ … Por outro lado, a competência do Conselho para expedir atos regulamentares destina-se, por definição mesma de regulamento heterônomo, a fixar diretrizes para a execução dos seus próprios atos, praticados nos limites, de seus poderes constitucionais, como consta, aliás, do art. 103-B, § 4º, I, onde se lê:no âmbito de sua competência’. A mesma coisa é de dizer-se a respeito do poder de iniciativa de propostas ao Congresso Nacional (art. 103-B, § 4º, inc. VII).”

E mais adiante:

“Como já referi, são duas, em suma, as ordens de atribuições conferidas ao Conselho pela Emenda Constitucional nº 45/2004: (a) o controle da atividade administrativa e financeira do Judiciário, e (b) o controle ético-disciplinar de seus membros.

A primeira não atinge o autogoverno do Judiciário. Da totalidade das competência privativas dos tribunais, objeto do disposto no art. 96 da Constituição da República, nenhuma lhes foi castrada a esses órgãos, que continuarão a exercê-las todas com plenitude e exclusividade, elaborando os regimentos internos, elegendo os corpos diretivos, organizando as secretarias e serviços auxiliares, concedendo licenças, férias e outros afastamentos a seus membros, provendo os cargos de juiz de carreira, assim como os necessários à administração da justiça, etc, sem terem perdido o poder de elaborar e encaminhar as respectivas propostas orçamentárias ...”.

7.29. Assim, a expressão contida no inciso I, do § 2º, do art. 130-A, in verbis… podendo expedir atos regulamentares no âmbito de sua competência, ou recomendar providências”, deixa patente que esse poder lhe foi dedicado para que pudesse “… fixar diretrizes para a execução dos seus próprios atos, praticados nos limites, de seus poderes constitucionais, aliás,no âmbito de sua competência, não podendo atingir o autogoverno do Ministério Público, e, conseqüentemente, a autonomia funcional e administrativa de seus órgãos, que deverão continuar a exercer suas competências, em especial a normativa, com exclusividade.

7.30. Quando a Emenda Constitucional nº 45/2004 pretendeu entregar ao Conselho Nacional de Justiça o poder normativo para que disciplinasse, até a edição do Estatuto da Magistratura, o seu funcionamento, bem como definisse as atribuições do Ministro-Corregedor, cuidou de dispor de forma expressa, como se vê da norma contida no § 2º, do art. 5º:

Até que entre em vigor o Estatuto da Magistratura, o Conselho Nacional de Justiça, mediante resolução, disciplinará o seu funcionamento e definirá as atribuições do Ministro-Corregedor.”

7.31. A Emenda Constitucional nº 45/2004 não reservou idêntico dispositivo ao Conselho Nacional do Ministério Público, tendo em vista que tanto o Ministério Público da União, como cada um dos congêneres nos Estados, já possuem seus estatutos editados por meio de Leis Complementares específicas, em consonância com o texto do art. 128, § 5º, da nova ordem constitucional, inaugurada em outubro de 1988.

7.32. Ora, esse Colendo Supremo Tribunal Federal, embora reconhecendo a natureza de órgão de controle interno do Conselho Nacional de Justiça (Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.367-1 DF), “conduzido pelo próprio Judiciário, conquanto democratizado na composição por meio da participação minoritária de representantes das áreas profissionais afins”, deixa extreme de dúvida que das duas “ordens de atribuições”, a esse Conselho conferidas – (a) o controle da atividade administrativa e financeira do Judiciário e (b) o controle ético-disciplinar de seus membros,

a primeira não atinge o autogoverno do Judiciário e que a “ totalidade das competências privativas dos tribunais, objeto do disposto no art. 96 da Constituição da República, nenhuma lhes foi castrada a esses órgãos, que continuarão a exercê-las todas com plenitude e exclusividade…”

e que

a competência do Conselho para expedir atos regulamentares destina-se, por definição mesma de regulamento heterônomo, a fixar diretrizes para a execução dos seus próprios atos, praticados nos limites, de seus poderes constitucionais, como consta, aliás, do art. 103-B, § 4º, I, onde se lê:no âmbito de sua competência”. ( ADI nº 3.367-1/DF – voto condutor – Min. CEZAR PELUSO)

7.33 Portanto, com muito mais intensidade, há de se concluir que as competências do Conselho Nacional do Ministério Público, não poderão atingir o autogoverno dos Ministérios Públicos, quer da União, quer dos Estados, sob pena de configurar flagrante invasão na autonomia administrativa dessas Instituições e dos órgãos que as compõem.

E – A ATUAÇÃO INCONSTITUCIONAL E ILEGAL

DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

7.34. A competência constitucional e legal do Conselho Superior do Ministério Público Federal foi invadida pelo Conselho Nacional do Ministério Público, já na edição da Resolução CNMP nº 2, disciplinando os critérios objetivos e o voto aberto e fundamentado nas promoções e remoções por merecimento de membros do Ministério Público da União e dos Estados.

7.35. A aludida Resolução CNMP nº 2 fora expedida, no entender de seus editores, no uso das atribuições que lhes teriam sido conferidas pelo art. 130-A, § 2º, incisos I (expedir atos regulamentares) e II (apreciar a legalidade de atos administrativos), da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 45 , conforme consta do preâmbulo de referido ato normativo.

7.36. Entretanto, com ela, editou o Conselho Nacional ato estranho ao âmbito de sua competência, que se restringe a “… fixar diretrizes para a execução dos seus próprios atos, praticados nos limites, de seus poderes constitucionais”, não podendo atingir a estatura de ato normativo destinado a normatizar matérias que envolvam o autogoverno do Ministério Público.

7.37. Cumpre observar, ainda, que pelo texto da Resolução nº 02, passa o impetrado a empregar a expressão “ato administrativo” para indicar os atos normativos emanados dos Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos, atraindo esses atos (normativos) ao alcance dos poderes elencados no inciso II, do § 2º do art. 130-A, introduzido na Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 45, sendo, portanto, passíveis de serem “desconstituídos” e “revistos” por aquele Colegiado. Com isso, quando a Resolução é emanada do Conselho Nacional, referido colegiado reconhece sua natureza de ato normativo. Entretanto, tratando-se de Resolução editada pelos Conselhos Superiores do Ministério Público, o Conselho Nacional afirma a sua natureza de ato administrativo, e não normativo, para que, seus poderes de revisão e desconstituição possam alcançá-los.

7.38. Porém, quando o constituinte derivado quis se referir à competência do impetrado em torno de atos administrativos (“… apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los, ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas”), vinculou-a à atuação administrativa e financeira dos membros e órgãos das Instituições, referindo-se, assim, a atos administrativos stricto sensu, de efeitos concretos, submetidos inclusive ao crivo dos respectivos Tribunais de Contas.

7.39. Admitindo-se, apenas por argumentar, que se encontrariam sujeitos à ação controladora ou revisora do impetrado os atos administrativos lato sensu – nessa expressão incluídos todos os atos administrativos praticados pelos membros ou órgãos do Ministério Público -, seria forçoso reconhecer, embora teratológico, que o Conselho Nacional estaria autorizado a rever atos administrativos outros, dentre eles aqueles que expressam o entendimento dos membros do Ministério Público em processos judiciais ou procedimentos administrativos vinculados à atividade fim (os chamados atos administrativos de opinião), ou mesmo o pedido de arquivamento de inquérito, ato administrativo por excelência, tanto que, se rejeitado pelo Juízo, a sua revisão é realizada pela chefia da Instituição (art. 28 do Código de Processo Penal), e não pelo Poder Judiciário, a quem é dirigido.

7.40. O próprio Conselho Nacional já vem reconhecendo que sua competência não alcança essas categorias de atos administrativos, por se encontrarem sobre o abrigo das garantias constitucionais, vinculadas aos membros da Instituição. Com isso, reconhece que o texto constitucional ao utilizar-se da expressão “atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los, ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas”, refere-se à sua acepção estrita, e não ampla.

7.41. Assim, ao editar a Resolução CNMP nº 02/2006, o Conselho Nacional, além de invadir atribuições legais do Conselho Superior do Ministério Público Federal, fixadas no art. 57, inc. I, letra “e”, da Lei Complementar nº 75/93, deliberou sobre matéria que refoge totalmente à sua competência, atingindo frontalmente a autonomia administrativa da Instituição, a competência normativa dos órgãos da Administração Superior do Ministério Público e invadiu direito subjetivo próprio dos Conselheiros-titulares, entre os quais os impetrantes.

7.42. Da mesma forma, o impetrado, ao exigir fosse submetida a seu crivo revisor a Resolução CSMPF nº 86/2006 (e todas as Resoluções relativas a essas matérias, editadas pelos Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos da União e dos Estados), e ao implementar essa determinação nos autos do Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58 comportou-se como se fora órgão revisor dos atos normativos editados pelos Conselhos Superiores, como se todos esses órgãos da administração superior do Ministério Público tivessem seus atos normativos a ele submetidos.

7.43. Ora, os atos normativos só podem ser desconstituídos, (a) administrativamente, pela mesma autoridade ou órgão que o editou, ou (b) judicialmente, isto é, pelo Poder Judiciário, se ilegais ou inconstitucionais. No caso, não ocorre a primeira hipótese, pois o impetrado não editou a Resolução CSMPF 86/2006, não podendo, pois, desconstituí-la; e, quanto à segunda hipótese, sem dúvida alguma o referido Conselho Nacional não ostenta as competências de órgão do Poder Judiciário, para exercer jurisdição sobre a matéria. É certo ainda que, nesse caso, sequer o Poder Judiciário teria competência para, além de desconstituir o ato, declarando-lhe a ilegalidade ou inconstitucionalidade, se substituir à Administração, impondo outro texto ao declarado ilegal ou inconstitucional, como aliás, agiu o Conselho Nacional.

7.44. Assim, fincado em interpretação distorcida do texto constitucional, ao Editar a Resolução CNMP nº 02/2006, e ao manifestar-se no Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58, o Conselho Nacional, além invadir atribuições legais do Conselho Superior do Ministério Público Federal, fixadas no art. 57, inc. I, letra “e”, e VII, da Lei Complementar nº 75/93, deliberou sobre matérias que refogem totalmente à sua competência.

7.45. Tais procedimentos ferem frontalmente o texto constitucional, no momento em que invadem competências e afrontam a autonomia administrativa, no caso, do Ministério Público Federal, a competência normativa da sua Administração Superior, extrapolando sua própria competência, prevista expressamente no art. 130-B, I e II, ambos da Constituição Federal.

7.46. Recentemente, ao abordar a competência normativa do Conselho Nacional de Justiça, e ao fazer a distinção do poder normativo relativo à matéria que lhe é própria e a sua atuação fora dessa área específica, assim se manifestou o Ministro Gilmar Mendes, em voto oferecido nos autos da ADC nº 12 – Relator Ministro Carlos Brito:

“ … o CNJ, na matéria que lhe é própria, é funcionalmente primus inter pares, pois atua nacionalmente e em caráter vinculativo para os Tribunais do país, podendo (e devendo) estes atuar, no exercício daquela competência disciplinar e correcional, sempre que assim autorizado pelo CNJ ou que não seja incompatível com as suas normas, orientações, decisões e determinações.

………………………………………………………………………………………………………….

Contudo, é igualmente óbvio que o CNJ, na sua atuação, está vinculado, ademais das normas constitucionais e (procedimentalmente) às suas próprias regras de funcionamento, aos conceitos jurídicos previamente estabelecidos na legislação (em sentido formal e estrito) de âmbito nacional, como ocorre, primeiramente, com a Lei Orgânica da Magistratura (art. 93 da CF, ou até o seu advento a Lei Complementar nº 35), e ainda, exemplificativamente e tendo em vista a singularidade da controvérsia aqui analisada, com as regras do Código Civil (Lei nº 10.406/02) relativas à caracterização do parentesco (sangüíneo ou civil) – exemplos similares, no âmbito das competências constitucionais do CNJ, poderia ocorrer com a Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93) ou com a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000)”

(Voto do Min. Gilmar Mendes – ADC 12 – STF)

7.47. Por oportuno, cabe ressaltar que a Lei Complementar nº 75/93, Lei Orgânica do Ministério Público da União, tem como fonte primária a Constituição Federal, possui a natureza de lei de âmbito nacional (uma vez que aplicável a todos os membros das carreiras que contempla, em todo o território brasileiro); é lei nacional posterior à promulgação da Constituição de 1988, e por isso editada em conformidade com os princípios republicanos que devem reger o ordenamento jurídico nacional. Assim, ao ingressar no ordenamento jurídico nacional, o impetrado encontrou o Ministério Público da União com as competências normativas já atribuídas a cada um dos Conselhos Superiores.

7.48. Por conseguinte, ao pretender sejam submetidas a seu crivo revisor as resoluções editadas pelos Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos da União e dos Estados, e ao rever a Resolução CSMPF nº 86/2006, no bojo do Processo de Controle Administrativo0.00.000.000435/2006-58, atuou, o impetrado, em torno de matéria que não se encontra no âmbito de sua competência normativa, invadindo atribuições específicas do Conselho Superior do Ministério Público Federal, conturbando a ordem jurídica existente.

7.49. Nesse cenário, o impetrado empalmou poderes que se sobrepõem aos do próprio Poder Judiciário, tendo em vista que, apenas ao Judiciário, a Constituição Federal autoriza a declarar a ilegalidade e/ou inconstitucionalidade dos atos normativos – quando pretende o Conselho Nacional do Ministério Público, além de deter competência para realizar essa declaração, deter o poder de se substituir à Administração Superior dos Ministérios Públicos da União e dos Estados.

F – A IMPOSIÇÃO PELO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO AO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DE CONDUTAS INCONSTITUCIONAIS E ILEGAIS

7.50. O ato impugnado, ao se substituir à Administração Superior do Ministério Público Federal, impôs aos Membros do Conselho Superior da Instituição, entre os quais os impetrantes, a prática de ato que fere frontalmente os princípios inscritos no artigo 37 da Constituição Federal, tendo em vista que, adotando-se o critério de desempate pelo voto do Procurador-Geral, como já se viu acima, o ato de promoção por merecimento, ao invés de nortear-se pelas normas constitucionais, passará a ser ato potestativo da vontade unilateral do Chefe da Instituição.

7.51. Além disso, o ato impugnado, ao ordenar que para a promoção por merecimento, quanto ao critério objetivo previsto no artigo 2º, I, da Resolução nº 86/CSMPF – “apuração do desempenho, produtividade e presteza nas manifestações processuais” – deverá o Conselho Superior do Ministério Público Federal levar em conta “apenas a avaliação negativa”, infringiu o artigo 93, II, alíneas “c” e “d”, c/c o artigo 129, § 4º, da Constituição Federal; o artigo 57, I, alínea “e”, e o artigo 200 da Lei Complementar nº 75/93, impondo aos impetrantes a prática de atos inconstitucionais e ilegais, uma vez que se admite a emissão de juízo negativo de merecimento na expressa situação do art. 93, II, “d” /CF (caso de recusa do mais antigo, na promoção por antigüidade), até porque referido comando constitucional estabelece os critérios objetivos para a promoção por merecimento, destacando-se, ali, os itens desempenho, produtividade, presteza e o aproveitamento em cursos oficiais, como indispensáveis para a aferição do mérito de cada concorrente, não cabendo, pois, interpretação extensiva ou aplicação analógica para alcançar outros fatos da vida.

7.52. Aliás, a contrario sensu, o Conselho Nacional de Justiça, em sua Resolução nº 6, determina que seja procedida a avaliação positiva dos candidatos, tudo isso para evitar que esses sejam preteridos pelos áulicos do poder, ou seus apaniguados que estejam fora da função institucional, como sói acontecer, quando adotados outros critérios subjetivos ou heterodoxos.

VIII – A INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO Nº 02/2005 E

DA DECISÃO DO CNMP NOS AUTOS DO PROCESSO

Nº 0.00.000.000435/2006-58

8.1. Embora reconheçam, os impetrantes, que não detêm legitimidade ativa para, via controle concentrado de constitucionalidade, questionar a constitucionalidade da Resolução CNMP nº 02/2006, ora atacada, a autoridade que a expediu torna-se legítima para figurar no pólo passivo da via mandamental, cabendo, entretanto, levantar, em incidenter tantum também a inconstitucionalidade desse ato, na forma da jurisprudência dessa Eg. Corte.

8.2. Ressalta a flagrante inconstitucionalidade formal da questionada Resolução, em face da incompetência do Conselho Nacional do Ministério Público para editá-la, porquanto está fora de suas atribuições definidas no art. 130-A, da Carta Magna, que lhe reservou poder normativo apenas para … “ fixar diretrizes para a execução dos seus próprios atos, praticados nos limites, de seus poderes constitucionais”, “ no âmbito de sua competência.

8.3. Em verdadeira usurpação de poderes, violou, ainda, o Conselho Nacional do Ministério Público, o § 2º do arts. 128, quando invadiu às atribuições do Conselho Superior do Ministério Público Federal e dos Conselhos Superiores congêneres, e editou a Resolução CNMP 02/2005, regulamentando matéria reservada à competência normativa desses Órgãos da Administração Superior dos diversos ramos do Ministério Público, ofendendo a autonomia administrativa dessas instituições e em conseqüência dos seus órgãos normativos, tendo em vista que tanto o Ministério Público da União, como cada um dos congêneres nos Estados, já possuem seus estatutos editados por meio de Leis Complementares específicas, em consonância com o texto do art. 128, § 5º, da nova ordem constitucional, inaugurada em outubro de 1988.

IX – DA NECESSIDADE DA MEDIDA LIMINAR

9.1. Sendo pacífico o entendimento dessa Corte Superior derredor do cabimento de mandando de segurança para conjurar o ato ilegal ou o abuso de poder, decorrentes de ato administrativo de efeitos concretos, cabível é a impetração do presente writ of mandamus.

9.2. O atendimento do primeiro requisito para a concessão da liminar encontra-se nas expressas normas contidas na Constituição Federal de 1988, na Lei Complementar nº 75/93 e na Resolução nº 86/CSMPF, na doutrina e na jurisprudência dessa Suprema Corte transcritos em linhas pretéritas, nas quais os impetrantes demonstraram a existência da fumaça do bom direito, seguindo anexa a prova pré-constituída.

9.3. Dispõe o art. 199, § 1º, da Lei Complementar nº 75/93, que trinta (30) dias após a abertura da vaga a ser preenchida, deverá se realizar a sessão do Conselho Superior do Ministério Público para a formação de lista tríplice e provimento do respectivo cargo pela via da promoção. No caso ora tratado, encontram-se para serem preenchidas 3 (três) vagas: uma vaga de Procurador Regional da República, decorrente da aposentaroria da Dra. Thaís Graef, a ser preenchida por merecimento, e duas vagas de Subprocurador-Geral da República, a primeira decorrente do falecimento da Dra. Armanda Soares Figueiredo, que deverá ser preenchida por merecimento, e a decorrente da aposentadoria do Dr. Benedito Izidro, a ser preenchida pelo critério da antigüidade. Tratando-se de vagas abertas há mais de 30 dias (Doc. 17), o seu preenchimento foi incluído em pauta na sessão convocada para o dia 05/12/2006, às 9:00 horas, consoante se vê da anexa pauta.

9.4. O segundo requisito, o perigo da demora na prestação jurisdicional, justifica a liminar pretendida, pois se não for concedida, os impetrantes, Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal, ao deliberarem, nessa sessão sobre a formação da lista tríplice para a promoção por merecimento, ficarão submetidos ao inválido ato impugnado do CNMP que impôs o afastamento do “juízo positivo de merecimento” quanto ao critério objetivo de que tratam os arts. 93, II, c, 129, § 4º/CF, c.c. art. 57, I, e/LC 75/93 e 2º, da Resolução nº 86/CSMPF (desempenho, produtividade e presteza no exercício da função), para, esdruxulamente, conferi-lo “apenas avaliação negativa”. Portanto, a prevalecer tal situação, ter-se-á verdadeiro desprestígio e desestímulo ao membro do parquet que, no exercício da função ministerial, imprime qualidade técnica nos seus trabalhos, cultiva a produtividade e cumpre os prazos processuais.

9.5. Além disso, os impetrantes terão que se submeter ao voto de desempate do Presidente do Colegiado, transformando um ato que deveria ser definido pelo Colegiado, em ato solitário da Chefia da Instituição, que, a seu talante, preencherá vagas destinadas a prestigiar o merecimento, contrariando, assim, não só os princípios inscritos no art. 37, como o critério objetivo de que tratam os arts. 93, II, c, 129, § 4º/CF, c.c. art. 57, I, e/LC 75/93 e 2º, da Resolução nº 86/CSMPF.

9.6. Se não forem sustados os efeitos do ato impugnado, além da capitis deminutio decorrente da invasão de competência, do malferimento do direitos subjetivo próprio dos impetrantes em exercer suas funções de Conselheiros-titulares do Conselho Superior do Ministério Público Federal em toda a extensão das competências e prerrogativas que a substantivem, e da nítida invasão da autonomia funcional e administrativa do Ministério Público Federal, por certo serão ajuizadas outras ações, por parte dos candidatos prejudicados, atacando o resultado das promoções por merecimento, o ato impugnado e a Resolução CNMP nº 02, gerando instabilidade institucional e insegurança jurídica, tudo de molde a contribuir para emperrar a atividade ministerial e em via de conseqüência a máquina judiciária.

XI – DOS PEDIDOS

Ante o exposto:

A – Tendo em vista as promoções por merecimento a serem realizadas na sessão do Conselho Superior do Ministério Público Federal marcada para o dia 05/12/2006, requerem a concessão de liminar para suspender a determinação contida no ato impugnado de que os impetrantes confiram “apenas avaliação negativa” aos candidatos quanto ao critério objetivo de desempenho, produtividade e presteza no exercício da função, possibilitando o cumprimento às normas dos arts. 93, II, c, 129, § 4º/CF; art. 57, I, e e VII, da LC 75/93, que impõem avaliação positiva de merecimento, bem como suspender a determinação de que seja observado o voto do Presidente do Colegiado como critério de desempate, em homenagem ao art. 37 da CF, assegurando, assim, aos impetrantes o exercício do direito-função de que se encontram investidos em sua total plenitude, até o julgamento final deste mandado de segurança;

A.1. requerem a intimação da autoridade coatora (CNMP), na pessoa do seu Presidente, o Procurador-Geral da República, para dar cumprimento à liminar e prestar as informações no prazo legal;

A2. ainda quanto à liminar, que seja dada ciência da decisão ao Conselho Superior do Ministério Público Federal;

A.3. requerem que, em seguida seja dada vista ao Ministério Público Federal para oferecimento do respectivo parecer;

B. No mérito, requerem, seja concedida a segurança para anular a deliberação do CNMP no Processo de Controle Administrativo nº 0.00.000.000435/2006-58 e assegurar aos impetrantes o exercício, em toda a extensão de suas competências, do direito-função de que se encontram investidos, em homenagem à autonomia funcional e administrativa do CSMPF, quanto à possibilidade de estabelecer suas normas sobre promoções por merecimento e elaboração das listas tríplices, adstritos que estão aos termos dos arts. 128, § 5º/CF; 57, I, e, e VII da Lei Complementar nº 75/93.

B1. requerem, também no mérito, seja declarada, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da Resolução CNMP 02, em face da inexistência de relação jurídica que os obrigue a se submeterem aos comandos emanados do indigitado ato coator; e

C. Requerem a intimação do Exmº Sr. Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, com endereço na SAF Sul, Quadra 4, Conjunto C, Bloco A , sala 501, Brasília -DF, CEP: 70.050-900, por si e na qualidade de Presidente e representante legal do Conselho Superior do Ministério Público Federal, para, querendo, integrar a lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário, tendo em vista que eventual julgado acolhendo o mandamus projetará efeitos na esfera do seu patrimônio jurídico.

D. Declara, sob as penas da Lei, serem autênticas as peças anexas que compõem a prova pré-constituída, dando à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

P. deferimento.

Brasília-DF, 1º de dezembro de 2006.

RICARDO LUIZ DE ALBUQUERQUE MEIRA

OAB-BA: 12.628

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