Cartas na mesa

PGR questiona aumento de teto do MP no Supremo

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6 de dezembro de 2006, 20h37

Já está em cheque no Supremo Tribunal Federal, a resolução aprovada nesta segunda-feira (4/12) pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que aumenta o teto dos membros dos MPs estaduais, que acumulam funções, de R$ 22,1 mil para R$ 24,5 mil. Como já havia prometido na ocasião, o procurador-geral da República, Fernando Antonio de Souza encaminhou nesta quarta-feira (6/12) ao STF, ação direta de inconstitucionalidade questionando a nova resolução.

Para o procurador-geral, a resolução da forma como está admite que o sistema federativo seja subvertido, transformando regimes jurídicos individualizados em campos uniformes, todos com enfoque num único ponto: os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal. Antonio Fernando Souza argumenta, ainda, que a nova regra, além de exceder as diretrizes constitucionais, ignora as realidades financeiras e orçamentárias locais dos estados.

De acordo com o procurador-geral da República, a resolução editada pelo CNMP distancia a figura do “teto remuneratório” da imagem dos “subsídios” que são, em si, padrão de remuneração compactados, organizados em bloco precisamente para se afastar a prática de laterais composições de vencimentos.

“A remuneração de membros e servidores do Ministério Público se vê lançada num ambiente jurídico conturbado, que admitirá a irrestrita ignorância dos limites propostos na fixação dos subsídios das categorias, a serem ultrapassados por marginal produção de vantagens, acumulações ou incorporações, supostamente alheias à rédeas normativas do artigo 37, inciso XI, da Constituição da República”, afirma o procurador-geral da República.

Com a ação no Supremo o procurador-geral da República afirma que pretende evitar o desgaste desnecessário da instituição, “tão cara aos propósitos da ordem jurídica”, no caso de imediata aplicação das regras da Resolução 15, do CNMP.

Salário de ministro

Contra todas as expectativas, o CNMP lançou a Resolução 15 alterando a Resolução 9 de sua própria autoria para equiparar o teto dos membros dos MPs estaduais ao dos ministros do Supremo.

A medida do Conselho surpreendeu porque na semana passada, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, vetou o projeto do CNMP que regulamentava a criação de cargos, instituía jeton para os conselheiros que acumulassem funções, além de regulamentar a própria atuação do conselho. A medida vetada permitiria que conselheiros do próprio CNMP recebessem remuneração acima do teto estabelecido pela Constituição.

Leia a íntegra do pedido

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, com fundamento no artigo 103, VI, da Constituição da República, vem, perante o Supremo Tribunal Federal, ajuizar AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido de medida cautelar, em face da Resolução 15, de 4 de dezembro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, que dispõe sobre a fixação teto remuneratório constitucional dos membros e servidores do Ministério Público.

2. A regulamentação impugnada possui a seguinte redação:

“RESOLUÇÃO N.º 15, DE 4 DE DEZEMBRO DE 2006.

Dá nova redação e retifica os artigos 1º e 2º da Resolução/CNMP n.º 09/2006, de 05 de junho de 2006 e ao artigo 2º da Resolução/CNMP n.º 10/2006, de 19 de junho de 2006.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, no uso de suas atribuições, tendo em vista o decidido na 11ª Sessão Ordinária de 2006;

CONSIDERANDO o disposto no ali. 37, inciso XI, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n° 41, de 19 de dezembro de 2003;

CONSIDERANDO o disposto no art. 130-A, § 2°, II, da Constituição Federal, acrescido pela Emenda Constitucional n° 45, de 8 de dezembro de 2004;

CONSIDERANDO o disposto no art. 37, § 11, da Constituição Federal, introduzido pela Emenda Constitucional n° 47, de 5 de julho de 2005;

CONSIDERANDO o disposto na Lei n° 11.144, de 26 de julho de 2005, no artigo 287 da Lei Complementar 75/93 e artigo 50, XII da Lei n° 8.625/93.

RESOLVE

Art. 1.° Ficam retificados os arts. 1° e 2° da Resolução n° 09/2006, de 05 de junho de 2006, que passam a ter a seguinte redação:

‘Art. 1° No Ministério Público da União, compreendidos o Ministério Público Federal, o do Trabalho, o Militar e o do Distrito Federal e Territórios, e no Ministério Público dos Estados o valor do teto remuneratório, nos termos do art. 37, inciso XI, da Constituição Federal, é o subsídio de Ministro do Supremo Tribunal Federal.’

‘Art. 2°No Ministério Público dos Estados, o valor do subsídio não poderá exceder a 90,25% (noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio do Ministro do Supremo Tribunal Federal.’


Art. 2.° Fica retificado o art. 2° da Resolução n° 10/2006, de 15 de junho de 2006, que passa a ter a seguinte redação:

‘Art. 2° No Ministério Público dos Estados, o valor do teto remuneratório constitucional corresponde ao subsídio do Ministro do Supremo Tribunal Federal.’

Art. 3.° A presente resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.”

3. As previsões, nessa forma alterada1, passam a admitir que os ganhos pecuniários dos membros do Ministério Público dos Estados ultrapassem a limitação percentual (90,25%) dos subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Distanciam a figura do “teto remuneratório” da imagem dos “subsídios”, estabelecendo que são estes que se atrelam à percentagem; qualquer acréscimo pecuniário, somado aos ganhos com os subsídios de membro do Ministério Público, poderia então alcançar o teto nacional, consubstanciado na remuneração dos ministros do STF.

4. Dentro desse prisma, os subsídios – modalidade de remuneração, formulada precisamente para que fosse emprestada maior racionalidade ao sistema, por servir de parâmetro de ganhos global de classes relevantes do serviço público – tornam-se escrituração sem eficácia.

5. Noutro aspecto, deixa-se o balizamento particular e localizado de cada uma das unidades da Federação, proporcionado pela delimitação dos subsídios estaduais aos ganhos dos desembargadores dos respectivos Tribunais de Justiça, para, de outro lado, optar-se, em dissonância ao que é determinado pela Constituição da República, pela limitação uniforme, centrada nos subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Essa percepção, além de exceder as diretrizes constitucionais, ignora as realidades financeiras e orçamentárias localizadas.

6. A resolução, como editada, sugere que os subsídios estipulados aos membros do Ministério Público estaduais não constituem balizamento algum. A regra veiculada pelo inciso XI do art. 37 da Lei Fundamental teria o papel singelo de promover limites desse instituto remuneratório. Ocorre, contudo, que os subsídios, por sua intrínseca natureza, são, em si, padrão de remuneração compactados, organizados em bloco precisamente para se afastar a prática de laterais composições de vencimentos. Formam, integral e oportunamente, a inteira dimensão dos ganhos dos membros do Ministério Público2.

7. A pretensão, vinda com as EC 19/1998 e 41/2003, é a de afastar a formulação complexa de padrões e modelos de remuneração, a ser empreendida, de outro lado, por configuração tipicamente unitária. Nesses moldes, o sistema ganha racionalidade, admitindo que previsões administrativas e financeiras sejam melhor avaliadas pelo Poder Público. Ao se ter a antecipada previsão das regras que regem a vida funcional dos servidores públicos, livre de intervenções pontuais ou momentâneas, a imagem das instituições é fortalecida.

8. Todo esse arcabouço valorativo se perde com as previsões da Resolução 15, do CNMP. A remuneração de membros e servidores do Ministério Público se vê lançada num ambiente jurídico conturbado, que admitirá a irrestrita ignorância dos limites propostos na fixação dos subsídios das categorias, a serem ultrapassados por marginal produção de vantagens, acumulações ou incorporações, supostamente alheias à rédeas normativas do art. 37, XI, da Constituição da República.

9. Essa visão, como visto, defronta-se com o ideal encampado pela ordem constitucional, a partir da EC 19/1998, no que foi ainda complementada pela EC 41/2003.

10. Os subsídios representam, não só, o valor em bloco da remuneração dos membros do Ministério Público como, ainda, constituem valiosa baliza, a servir de teto remuneratório. Tome-se o comando do art. 39, § 4º, da CRF/88, em sua parte final – ao remeter o conceito de subsídios ao veiculado no inciso XI do art. 37 –, como sinalização dessa idéia3. Sem a percepção integral do instituto, seus propósitos se perdem. Nessa ordem de idéias, ao se mirar os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal como uniforme limitação de pagamento a todos os integrantes das variadas carreiras dos inúmeros Ministérios Públicos estaduais estar-se-ia, ao mesmo tempo, editando previsão que não encontra lastro na ordem constitucional instalada. Pelo contrário, essa leitura atrita diretamente com dispositivos de magnitude, que, desde logo, cuidam de apontar quais são os tetos específicos de cada uma dessas carreiras.

11. Valioso argumentar que a Constituição da República tem o cuidado de estabelecer tetos de remuneração estaduais4. É a leitura absoluta do inciso XI do art. 37, em que se estipulam os padrões dos governadores e dos desembargadores, específicos ao caso presente, como parâmetro. O parágrafo 12 desse mesmo art. 37, em complementação a tal perspectiva, tem o cuidado de admitir a alteração do paradigma, que passaria a ser, a critério de cada Estado, os subsídios dos desembargadores do respectivo tribunal de Justiça. A previsão estipula que esse será o limite único do funcionalismo local. Os subsídios dos desembargadores estão estabelecidos, de maneira expressa, em percentual ao que seja fixado aos ministros do Supremo Tribunal Federal, em patamar que não ultrapasse 90,25%.


12. Num ambiente jurídico dessas dimensões, manter regras que permitam tomar como padrão a integral retribuição ditada para os membros da Corte Suprema é idéia que enfraquece a força normativa da Lei Fundamental. Subtraiu-se a norma que prevê a instituição de tetos remuneratórios estaduais, conturbando os campos normativo e constitucional próprios da matéria.

13. Ao permitir o estabelecimento de limite de remuneração, para membros e servidores dos Ministérios Públicos Estaduais, nos padrões previstos para os ministro do STF, a Resolução 15, do CNMP, contorna o conteúdo normativo delineado pelo inciso XI, pelo § 12 do art. 37, e pelo § 4º do art. 39, todos da Constituição da República.

14. Dá-se a volta, ainda, em princípios de máxima estatura, que consubstanciam opções estruturais de nosso modelo de Estado; a resolução, como constituída, admite que o sistema federativo seja subvertido, transformando regimes jurídicos individualizados em campos uniformes, todos com enfoque num único ponto – os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal. A autonomia dos Estados é atingida pela resolução, que desconsidera realidades particulares, fazendo com que todas as carreiras estaduais estejam pautadas em teto remuneratório padrão. Essa percepção não se harmoniza com nosso modelo federativo, tão bem retratado nas regras ditadas nos inciso XI e § 12 do art. 37 da Lei Maior, em regras que, precisamente, destacam a singularidade da cada unidade federada.

15. Em desfecho, e pelas razões apresentadas, é de se pleitear a declaração de inconstitucionalidade do integral conteúdo da Resolução 15, de 4 de dezembro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, por violação aos arts. 37, XI, § 12, e 39, § 4º, da Lei Fundamental.

16. Assim, demonstrada a inconstitucionalidade dos dispositivos ora impugnados, o que consubstancia o fumus boni iuris das alegações expendidas, vislumbra-se também o periculum in mora, pois o risco de imediata implantação dessa política é evidente. Ao se conferir qualquer eficácia à Resolução 15, do CNMP, põe-se em perigo a instituição dos tetos de remuneração das carreiras de todos os Ministérios Públicos estaduais. A ultrapassagem da baliza constitucional, que se reporta aos subsídios dos desembargadores, fixados, no máximo, em 90,25% dos subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal, causará imediato vilipêndio ao erário. Noutro prisma, coloca-se em estado de ameaça a imagem dessas instituições perante a sociedade, por estarem a subverter modelo constitucional recentemente implementado.

17. Um dos sérios danos que se tem pretensão de evitar é o desgaste desnecessário da instituição, tão cara aos propósitos da ordem jurídica, em caso de imediata aplicação das regras da Resolução 15, do CNMP. A viabilidade do processo de controle concentrado, nessa específica hipótese, demanda acelerado exame do pedido de provimento cautelar, sem o qual o proveito pretendido com o ajuizamento desta ação direta poderá se perder, em detrimento da supremacia e da força normativa da Constituição.

18. Dessa forma, presentes os requisitos exigidos à concessão da medida cautelar, nos termos previstos no art. 10 da Lei n.º 9.868/99 e no artigo 170, §§ 1º e 3º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, pleiteia a suspensão ad cautelam da Resolução 15, de 4 de dezembro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, por ofensa aos arts. 37, XI, § 12, e 39, § 4º, da Constituição da República.

19. Requer, por fim, que, colhidas as informações necessárias e ouvido o Advogado-Geral da União, seja determinada a abertura de vista dos autos à Procuradoria Geral da República para manifestação, pedindo que, ao final, sejam julgados procedentes os pedidos formulados.

Pede deferimento.

Brasília, 6 de dezembro de 2006.

ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA

PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

AMC

1 O texto original da Resolução 9 do CNMP trazia a inscrição “teto” no local em que foi agora mencionado “subsídios”, junto ao art. 2º. A redação anterior era a seguinte: “Art. 2º No Ministério Público dos Estados, o valor do teto remuneratório constitucional corresponde a 90,25% (noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio do Ministro do Supremo Tribunal Federal”. A Resolução 10 referia, originalmente, o seguinte: “Art. 2º No Ministério Público dos Estados, o valor do teto remuneratório constitucional corresponde a 90,25% (noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio do Ministro do Supremo Tribunal Federal.”

2 É dessa redação o dispositivo constitucional: “Art. 37 (…) XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;”

3 “Art. 39 (…) § 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.”

4 Leio em JOSÉ AFONSO DA SILVA: “…o subsídio é fixado em parcela única, ‘vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI’. A remissão a esses dois incisos do art. 37 significa que (…) (c) fica sujeito ao teto que corresponde: (c.1) no âmbito federal, ao subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (…); (c.2) nos Estados e Distrito Federal, ao subsídio do Governador, no âmbito do Poder Executivo; ao subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, incluindo nesse limite os membros do Ministério Público, os Procuradores e os Defensores Públicos…” (in Curso de Direito Constitucional Positivo. 27.ed., São Paulo, Malheiros, 2006, p. 683.)

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