Trabalho ininterrupto

Judiciário não pode tirar férias coletivas, reafirma STF

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6 de dezembro de 2006, 15h17

As férias coletivas no Judiciário estão proibidas. Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (6/12) que o fato de o Conselho Nacional de Justiça revogar a resolução que reafirmava a proibição não significa o retorno da permissão das férias coletivas.

“Não tem o Conselho Nacional de Justiça ou qualquer outro órgão, do Judiciário ou de qualquer outro poder, competência para tolerar, admitir ou considerar aceitável prática de inconstitucionalidade”, afirmou a ministra Cármen Lúcia, relatora da matéria, em seu voto. De acordo com a ministra, “as regras legais que estabeleciam que os magistrados gozariam de férias coletivas perderam seu fundamento de validade quando da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004”.

Com esse entendimento, os ministros concederam medida cautelar para suspender a resolução do CNJ e o ato do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que determinou a obrigação de os juízes tirarem férias em janeiro e julho. A medida atende a pedido do procurador-geral da República Antonio Fernando Souza. A ministra Ellen Gracie, presidente do STF e do CNJ, não estava presente ao julgamento.

Cármen Lúcia explicou que o fato de o CNJ ter revogado a resolução que reafirmava a proibição das férias coletivas “importa em fazer supor, erroneamente, aos órgãos judiciais que seria admissível providência no sentido contrário ao quanto disposto na norma do inc. XII do art. 93 da Constituição” — o dispositivo que determina que a atividade dos tribunais será ininterrupta. Assim, decidiu acolher o pedido de procurador.

A ministra ressaltou que não é o fato de determinada norma ser inconveniente que seja ela desrespeitada. Ou seja, se as férias coletivas são melhores para juízes e advogados, se que mude a Constituição pela vias legais. Não se pode é ignorar um claro mandamento constitucional.

“O advento de uma norma jurídica a inovar o sistema pode demonstrar, em sua aplicação, inconvenientes e condições indesejáveis que impõem a sua mudança. Mas eventuais inconvenientes que se demonstrem não são razões suficientes para se deixar de cumprir a norma jurídica enquanto ela estiver em vigor, menos ainda quando se cuidar de norma constitucional”, afirmou Cármen Lúcia.

Com a decisão, ao menos quatros estados — além do Distrito Federal — que haviam determinado o retorno das férias coletivas terão de voltar atrás: Minas Gerais, Paraná, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Rio de Janeiro e São paulo mantiveram funcionamento ininterrupto apesar da decisão do CNJ.

Hora de refletir

Recentes atos do CNJ foram criticados durante a sessão de julgamento. O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a ação da PGR é uma boa oportunidade para o Supremo rever a natureza e os limites do CNJ. “O Conselho tem natureza eminentemente administrativa, e não legislativa. O CNJ não pode inovar em matéria legislativa e tomar decisões de caráter jurisdicional”, afirmou. Lewandowski também afirmou que o Conselho não pode expedir resolução com força de lei. Ou, o que é pior, com força constitucional.

De acordo com Lewandowski, o Conselho vem adotando procedimentos de caráter jurisdicional e deu como exemplo recente liminar concedida para garantir vaga em tribunal para uma juíza do trabalho. Na mesma esteira, o ministro criticou as liminares concedidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público — que recentemente sustou a posse de procuradores.


Carlos Ayres Britto também afirmou que se trata de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade "emblemática" e acentunou que o CNJ não pode inibir ou atenuar norma, não pode criar ou restringir direitos. A linha critica em relação aos atos do Conselho fez parte do voto de todos os ministros.

A provocação coube ao ministro Marco Aurélio: “Veja só que ironia, o CNJ nos dando trabalho”. O ministro aproveitou e fez menção ao seu protesto contra um corte de R$ 18 milhões no orçamento do Tribunal Superior Eleitoral, determinado pelo CNJ.

Leia o voto da ministra Cármen

MED CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.823 – 1 DISTRITO FEDERAL

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

REQUERENTE(S): PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

REQUERIDO(A/S): TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

REQUERIDO(A/S): CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

R E L A T Ó R I O

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA – (Relatora):

1. O Procurador-Geral da República ajuíza a presente ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, “em face do Ato Regimental n. 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e da Resolução n. 24, de 24 de outubro de 2006, editada pelo Conselho Nacional de Justiça. (fls. 02)

Os atos normativos questionados dispõem sobre as férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, nos termos seguintes:

“RESOLUÇÃO Nº 24, DE 24 DE OUTUBRO DE 2006.

Revoga o disposto no art. 2º da Resolução nº 3 do Conselho Nacional de Justiça.

RESOLVE:

Art. 1º Revogar o art. 2º da Resolução nº 3, de 16 de agosto de 2005.”

O art. 2º da Resolução n. 3/2005, revogada, por sua vez, dispõe:


“O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, tendo em vista o decidido em Sessão de 16.8.2005, e com base no disposto no inciso II do § 4º do art. 103-B da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional nº 45, de 8.12.2004, publicada no Diário Oficial da União de 31.12.2004,

RESOLVE:

Art. 2º Cientificar os Tribunais que serão inadmissíveis quaisquer justificativas relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição.”

ATO REGIMENTAL Nº 005, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2006.

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS, no uso de suas atribuições legais,

Considerando que o Conselho Nacional de Justiça, pela Resolução nº 24, de 24 de outubro de 2006, revogou o artigo 2º da Resolução nº 3, de 16 de agosto de 2005, que, na interpretação então dada pelo Conselho ao artigo 93, XII, da Constituição Federal, extinguira as férias coletivas dos membros do Tribunal e dos juízes a ele vinculados;

Considerando que, até a entrada em vigor do Estatuto da Magistratura, previsto no artigo 93 da Constituição Federal, encontra-se em vigor o § 1º do artigo 66 da Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 202-3/Bahia, julgada em 5 de setembro de 1996;

Considerando a necessidade de assegurar mais eficiente e pronta prestação jurisdicional;

Considerando, por fim, o decidido em sessão extraordinária realizada no dia 10 de novembro de 2006,

RESOLVE assim disciplinar as férias dos magistrados da Justiça do Distrito Federal relativas ao ano de 2007:

Art. 1º. Os membros do Tribunal de Justiça e os juízes de primeiro grau gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007.

§ 1º. Para assegurar a continuidade da atividade jurisdicional em primeiro e segundo grau, nos períodos de 20 de dezembro de 2006 a 31 de janeiro de 2007 e de 2 a 31 de julho de 2007: a) o Presidente do Tribunal estabelecerá, em ato próprio, a escala dos membros do Conselho da Magistratura que, individualmente, despacharão e decidirão os pedidos liminares e as medidas que reclamem urgência, inclusive as de que cuidam os artigos 173 e 174 do Código de Processo Civil, as relativas aos processos criminais com réus presos ou ameaçados de prisão e as atinentes a crianças e adolescentes, praticando os atos processuais necessários; b) o Corregedor da Justiça do Distrito Federal estabelecerá, em ato próprio, a escala e a localização dos juízes de direito que despacharão e decidirão os pedidos liminares e as medidas que reclamem urgência, inclusive as de que cuidam os artigos 173 e 174 do Código de Processo Civil, as relativas aos processos criminais com réus presos ou ameaçados de prisão, as atinentes a crianças e adolescentes e as referentes ao sistema dos juizados especiais, praticando os atos processuais necessários, inclusive realização de audiências.


§ 2º. Os membros do Conselho da Magistratura e juízes de direito escalados na forma do § 1º deste artigo gozarão os períodos de férias trabalhados em datas diversas, a serem concedidas pelo Vice-Presidente do Tribunal.

§ 3º. Os membros do Tribunal e os juízes de direito com férias individuais já deferidas para períodos diversos dos estabelecidos no caput do artigo 1º poderão mantê-las, para tanto fazendo comunicação escrita ao Vice-Presidente do Tribunal até o dia 30 de novembro de 2006. Na falta tempestiva desta comunicação, entrarão de férias conforme o caput do artigo 1º.

Art. 2º. Nos períodos de 20 de dezembro de 2006 a 31 de janeiro de 2007 e de 2 a 31 de julho de 2007, excetuadas disposições legais em contrário, ficam suspensos os prazos processuais.

Art. 3º. Este ato regimental entra em vigor na data de sua publicação, ficando suspensas, durante sua vigência, as normas, resoluções e atos regimentais que com ele conflitem, inclusive a Resolução nº 6, de 06 de setembro de 2005.

Desembargador LÉCIO RESENDE DA SILVA

Presidente

2. O nobre Procurador-Geral da República sustenta que as normas questionadas afrontam, flagrantemente, a Constituição pois “a Resolução 24 deu sinal aos órgãos do Poder Judiciário de que as férias coletivas estariam restauradas. Produto dessa corrente, editou-se o Ato Regimental n. 5, de 10 de novembro de 2006, pelo TJDFT, que restabeleceu a prática das férias, a serem obrigatoriamente gozadas pelos magistrados nos meses de janeiro e julho. … A norma procedimental ditada no dispositivo constitucional (art. 93, XII), que vaticina ser ‘a atividade jurisdicional … ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízes e tribunais de segundo grau…’, teve sua eficácia nítida e frontalmente esvaziada pela mencionada Resolução 24, do CNJ, e, em seqüência, pelo Ato Regimental n. 5, do TJDFT.” (fls. 06)

Requer o Procurador-Geral da República seja deferida “medida cautelar, com eficácia ex nunc, nos termos previstos no art. 10 da Lei n. 9.868/99 e no artigo 170, §§ 1º e 3º do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal” (fls. 08) para suspender os efeitos do Ato Regimental n. 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e da Resolução n. 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, por ofensa aos arts. 93, inc. XII e 103-B, da Constituição da República.

No mérito, pede seja julgada procedente a presente ação para se declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados.

Nos termos do § 3º do art. 10 da Lei n. 9.868/99, considerando-se a urgência que o caso impõe, por cuidarem as normas questionadas de férias coletivas dos magistrados, cujo período próximo de fruição se daria a partir de 2 de janeiro de 2007 – com todas as providências antecipatórias que teriam de ser adotadas pelos juízos e tribunais se aquelas prevalecerem – e, ainda, pela necessidade de se dotar de segurança jurídica os profissionais que compõem a comunidade jurídica além dos magistrados, tais como os advogados e membros do Ministério Público, e, principalmente, os jurisdicionados, adotei a providência de deixar de determinar a audiência prévia das autoridades das quais emanaram os atos aqui impugnados em razão da excepcionalidade da situação.

Em 1º de dezembro de 2006, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil requereu a sua admissão, na presente ação, como amicus curiae, o que deferi, para que se possa dar a sua atuação em momento oportuno.


É o relatório, do qual deverão ser extraídas cópias para encaminhamento aos eminentes Senhores Ministros deste Supremo Tribunal (art. 87, inc. I, do RISTF).

V O T O

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA – (Relatora):

DO OBJETO DA AÇÃO

1. A presente ação tem como objeto atos infralegais consubstanciados no Ato Regimental n. 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e na Resolução n. 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, que cuidam, a) o primeiro, do regime de férias dos membros daquele Tribunal e dos juízes a ele vinculados, após a revogação do art. 2º da Resolução n. 3/2005 pela Resolução n. 24, do Conselho Nacional de Justiça. Naquele ato se definiu que os magistrados indicados “gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007”; b) o segundo, da revogação do mencionado art. 2º da Resolução n. 3, de 16 de agosto de 2005, que possibilitou a prática daquele primeiro.

A resolução n. 24, de 24 de outubro de 2006 e as férias coletivas de magistrados

2. A Resolução n. 24/2006 do Conselho Nacional de Justiça foi expedida pela digna Presidente do Conselho Nacional de Justiça, Ministra Ellen Gracie, a qual “no uso de suas atribuições conferidas pela Constituição Federal, especialmente o que dispõe o inciso I, § 4º, de seu artigo 103-B, e tendo em vista o decidido na Sessão do dia 24 de outubro de 2006…Resolve: art. 1º – Revogar o art. 2º da Resolução n. 3, de 16 de agosto de 2005.”

3. O art. 2º da Resolução n. 3/2005 determinava:

Art. 2º – Cientificar os Tribunais que serão inadmissíveis quaisquer justificativas, relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição;”.

4. O art. 93, inciso XII, da Constituição da República, modificado pela Emenda Constitucional n. 45, de 31 de dezembro de 2004, preceitua:

Art. 93 – Lei Complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

XII – a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão permanente;”.

5. A norma do art. 2º da Resolução n. 3/2005 repetiu, pois, a regra proibitiva de férias coletivas de juízes e tribunais de segundo grau, estabelecida na norma constitucional. Nada mais.

6. Havia, contudo, é certo, uma justificativa para a sua expedição. A Emenda Constitucional n. 45, pela qual se introduziu a norma proibitiva no sistema, foi promulgada em 8 de dezembro de 2004, na iminência das férias coletivas dos magistrados, o que era tradicional. As férias do período de janeiro de 2005 estavam preparadas, os serviços e servidores devidamente organizados para a sua fruição, pelo que não se poderia dar imediato cumprimento àquela norma constitucional sem o devido planejamento.


Pela renitência de alguns órgãos e servidores em dar atendimento ao quanto determinado constitucionalmente, com a apresentação de justificativas que arredaram a aplicação da norma também em julho de 2005, a saber, seis meses após o início de vigência da regra proibitiva de férias coletivas, o Conselho Nacional de Justiça expediu a Resolução n. 3, de 16 de agosto daquele ano.

Seu art. 1º dá bem a razão de ser da norma que poderia parecer desnecessária à primeira vista. Resolveu, então, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça:

“Art. 1º Acolher as justificativas apresentadas pelos Tribunais que mantiveram as férias coletivas marcadas para julho de 2005, uma vez que demonstrada a transitória força maior.”

Na seqüência da acolhida das justificativas, entretanto, cientificou, naquela data, o Presidente do Conselho serem “inadmissíveis quaisquer justificativas relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição.”

Assim, a razão de ser daquela norma do Conselho Nacional de Justiça (art. 2º da Resolução n. 3/2005) estava na recalcitrância de alguns órgãos do Poder Judiciário em dar cumprimento à norma constitucional proibitiva de férias coletivas, a qual, pelo seu conteúdo mesmo, de vedar determinado comportamento ou providência, é auto-aplicável.

O que se teve, pois, com a norma expedida pelo Conselho Nacional de Justiça, na Resolução n. 3/2005, foi, de uma parte, a aceita ção das justificativas quanto ao não cumprimento imediato da nova regra constitucional até julho de 2005, e de outro lado, dar ciência a todos os tribunais da não admissão de qualquer nova justificativa que se pretendesse apresentar quanto ao não cumprimento da Constituição da República.

7. Assim, a revogação do art. 2º da Resolução n. 3, de 2005, pelo art. 1º da Resolução n. 24, de 2006, agora posta em questão, não teria conseqüências jurídicas substanciais, porque não teria – como é óbvio – o alcance de revogar a norma constitucional proibitiva das férias coletivas.

Dá-se, entretanto, que aquela revogação importa em fazer supor, erroneamente, aos órgãos judiciais que seria admissível providência no sentido contrário ao quanto disposto na norma do inc. XII do art. 93 da Constituição.

Não tem, entretanto, o Conselho Nacional de Justiça ou qualquer outro órgão, do Judiciário ou de qualquer outro poder, competência para tolerar, admitir ou considerar aceitável prática de inconstitucionalidade.

8. Pela norma constitucional estabelecida no art. 93, inc. XII, os magistrados, incluídos os integrantes de tribunais de segundo grau, continuam titularizando direito individual a férias anuais remuneradas. Não estatui a Constituição a duração das férias dos integrantes do Poder Judiciário, o que se dá por lei complementar.

Todavia, as regras legais, que estabeleciam que os magistrados gozariam de férias coletivas, perderam seu fundamento de validade quando da promulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004.

Nem poderia ser diferente, uma vez que a norma constitucional plasmou novo paradigma para a matéria, contra a qual nada pode prevalecer.

9. Daí o art. 2º da Resolução n. 3/2005, que, ao dar ciência aos Tribunais de serem “inadmissíveis quaisquer justificativas relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição”, apenas releva a impossibilidade de ser admitida transigência a descumprimento da norma constitucional em referência por parte do Conselho Nacional de Justiça.


10. A revogação do art. 2º da Resolução n. 3/2005 pelo Conselho Nacional de Justiça, conduz à suposição – reitere-se, equivocada – de que esse órgão admitiria justificativas relativas a férias coletivas dos magistrados, em confronto exemplar com o ditame constitucional vigente há praticamente dois anos (a se completar em dois dias).

11. Nos consideranda apostos na Resolução em causa, a eminente Ministra Ellen Gracie afirma que atende o quanto decidido na sessão do dia 24 de outubro de 2006.

A ata daquela sessão noticia que “aberta a sessão, a Presidente do Conselho, Ministra Ellen Gracie, deu ciência ao Plenário de manifestações recebidas do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça, do Fórum Permanente de Corregedores-Gerais da Justiça Federal, de Presidentes de Tribunais Regionais Federais e da Ordem dos Advogados do Brasil no sentido de que a suspensão das férias coletivas tem causado graves prejuízos à prestação jurisdicional nos Juízos e Tribunais de 2º grau, comprometendo os princípios constitucionais da celeridade e da eficiência, causando o desmantelamento dos órgãos julgadores, gerando dificuldades para manter a continuidade da jurisprudência, causando forte comprometimento orçamentário da Justiça Federal além de acarretar a perda de produtividade nos julgamentos de primeiro grau e comprometer o interesse de inúmeros advogados que estão sendo prejudicados pelo critério vigente e reclamam satisfatória revisão. Em seguida, a Presidente do Conselho, Ministra Ellen Gracie, face às diversas manifestações recebidas, propôs a alteração da Resolução n. 3 deste Conselho, com a revogação de seu art. 2º. Dada a palavra ao Excelentíssimo Senhor Procurador Geral da República, este não se opôs à referida revogação, desde que se mantenha a prestação jurisdicional ininterrupta, como determina a Constituição Federal. Não tendo havido divergência, restou aprovada, por unanimidade, a Resolução n. 24…”.

12. A motivação do ato exarado pela eminente Presidente do Conselho Nacional de Justiça explicita razões aceitáveis, a serem submetidas ao Congresso Nacional, a fim de que ali se verifique a possibilidade e a conveniência de modificação do quanto introduzido no texto constitucional, na forma do art. 93, inc. XII, pela Emenda Constitucional n. 45/2004.

Mas aquelas não são razões bastantes, menos ainda autorizativas para se admitir descumprimento de norma constitucional. Nem se dá, ali, base que afaste a divergência que ressai – pelo menos numa análise preliminar – entre as normas decorrentes do quanto contido na Resolução e o quanto disposto na norma-paradigma constitucionalmente posta.

13. O advento de uma norma jurídica a inovar o sistema pode demonstrar, em sua aplicação, inconvenientes e condições indesejáveis que impõem a sua mudança. Mas eventuais inconvenientes que se demonstrem não são razões suficientes para se deixar de cumprir a norma jurídica enquanto ela estiver em vigor, menos ainda quando se cuidar de norma constitucional.

Tanto significaria renunciar ao princípio da juridicidade, que há de prevalecer quanto aos agentes públicos, dentre os quais os magistrados, para que se mantenha o Estado de Direito.

O caminho jurídico único para se alterar a Constituição do Brasil está estabelecido, expressa e restritivamente, em seu texto mesmo, estatuindo-se, em seu art. 60, as regras da atuação da competência constituinte reformadora.

Decisão estabelecendo que se admitirá descumprimento da norma constitucional por outra, de categoria infralegal, é deixar de observar não apenas aquela regra, mas o sistema constitucional por completo, que não tolera imposição de providências contrárias ao quanto nela estatuído.

14. Ademais, a proibição de férias coletivas dos magistrados – a ser repensada pelo constituinte reformador se tanto ele assim entender e deliberar – configura forma de dar eficácia ao princípio da ininterruptabilidade da jurisdição.


É certo que há outras formas para se assegurar aquele princípio, mas somente a própria Constituição poderá afastar o óbice por ela posto, expressamente, a que o legislador ou os órgãos judiciais pudessem eleger diferentes alternativas para se dar cumprimento ao princípio.

Enquanto vigorar a norma, pelo menos em exame cautelar, cumpre fazer prevalecer a proibição de férias coletivas de juízes e membros dos tribunais de segundo grau, suspendendo-se a eficácia de atos que ponham em risco a efetividade daquela vedação constitucional.

15. A Resolução n. 24/2006, do Egrégio Conselho Nacional de Justiça, é questionado na presente ação também em face do art. 103-B, § 4º, da Constituição da República (norma igualmente introduzida pela Emenda Constitucional n. 45/2004).

16. Dispõe aquela norma:

“Art. 103 – B – …

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I – zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

III – receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;

IV – representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade;

V – rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano;

VI – elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

VII – elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa.”

Órgão de controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, não se nota, pelo menos em análise preliminar para decisão sobre o pedido de medida cautelar, o embasamento para expedir normas sobre o direito dos magistrados, menos ainda para se admitir como providência legítima o gozo de férias coletivas daqueles agentes públicos.

17. Assim, também este fundamento apresentado pelo Procurador-Geral da República há de ser, cautelarmente, tido por aceitável para o deferimento da medida cautelar requerida.


O Ato Regimental n. 25, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

18. Como acima transcrito, as normas do Ato Regimental n. 25/2006, do Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios dispõem, exata e repetidamente, sobre férias coletivas dos membros daquele digno órgão e dos juízes a ele vinculados. São os termos literais do art. 1º daquela Resolução: “Os membros do Tribunal de Justiça e os juízes de primeiro grau gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007.”

Como se cuidam d”os membros do Tribunal … e os juízes de primeiro grau” a fruir, coletivamente, as férias, tem-se por inequívoco que aquele ato restabeleceu as férias coletivas dos magistrados, em afronta modelar ao disposto no art. 93, inc. XII, da Constituição da República.

19. Nem se põem em questão, ainda uma vez, as conveniências e as inconveniências administrativas daquela vedação para os membros do Poder Judiciário e para os demais profissionais da comunidade jurídica, conforme antes se acentuou.

Mas não há conveniência administrativa que possa prevalecer contra texto literal da Constituição.

20. Como guarda da Constituição (art. 102, caput) ao Supremo Tribunal compete tão somente o julgamento – enfatize-se, ainda aqui, em fase preliminar para a apreciação da medida cautelar requerida na ação – da validade constitucional de norma de hierarquia inferior, a que se chega pelo cotejo entre a norma-paradigma e a outra, impugnada como inválida.

No caso ora apreciado, pelo menos em primeiro exame, sustenta-se a alegação de estarem os atos normativos questionados eivados do vício de inconstitucionalidade.

DA MEDIDA CAUTELAR

21. O requerimento de medida cautelar (art. 102, inc. I, alínea p, da Constituição) aponta elementos consistentes a demonstrar a possibilidade de haver riscos para a eficácia da decisão que, ao final, vier a ser proferida nesta ação direta, se não houver a suspensão imediata dos efeitos das normas questionadas.

Afirma o Procurador-Geral da República que “os reflexos dessas decisões sobre todo o âmbito do Judiciário são evidentes. Avizinha-se o encerramento do ano de 2006, e com ele a aplicação imediata da resolução do TJDFT, assim como a adoção dos termos da manifestação do CNJ por outros tribunais, a expandir o quadro de inconstitucionalidade. A informação de que os trabalhos forenses serão, ou não, interrompidos demanda, para resguardo da segurança jurídica, imediata consolidação. A declaração de inconstitucionalidade pode, inclusive, ver-se prejudicada no que se refere ao mês de janeiro, considerando que o ato regimental do TJDFT demarca dois períodos específicos (janeiro e julho de 2007).” (fls. 08)

22. Pelo exposto, Senhores Ministros,

voto no sentido de deferir a medida cautelar na forma requerida pelo eminente Procurador-Geral da República, para se suspender, a partir de agora, a eficácia dos dispositivos do Ato Regimental n. 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e da Resolução n. 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, mantendo-se a observância estrita do quanto disposto no art. 93, inc. XII, da Constituição da República.

23. Na oportunidade processual própria, serão colhidas informações do Conselho Nacional de Justiça (art. 170 do R.I.S.T.F.) bem como manifestações do Advogado Geral da União e da Procuradoria Geral da República (art. 103, §§ e 3° da Constituição do Brasil).

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