Trabalho terceirizado

Nove em dez casos de terceirização são fraudes trabalhistas

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26 de agosto de 2006, 7h00

A Justiça do Trabalho e os empregadores nunca se entenderam. Natural. Os interesses entre as partes são conflitantes pela própria natureza. Enquanto a primeira luta pela defesa dos direitos dos trabalhadores, os segundos procuram encontrar brechas dentro (ou fora) da lei para reduzir custos. Já há algum tempo, um mecanismo de redução de custos para as empresas têm deixado a Justiça Trabalhista de cabelo em pé: a terceirização.

A Justiça do Trabalho entende por terceirização de mão de obra toda a contratação de serviços e não de pessoas, como a cooperativa de serviços, profissionais liberais, representação comercial e subcontratação. Em 90% dos casos estas formas de contratação de trabalho seriam usadas para mascarar o vínculo empregatício.

“De 10 casos que chegam na Justiça do Trabalho, nove são picaretagem”, diz o juiz do Trabalho Marcos Fava, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Os números explicam o preconceito com que a Justiça trabalhista encara o fenômeno da terceirização, na análise do juiz. Provavelmente, explica também porque os empresários também torcem o nariz para o Judiciário trabalhista: se os juízes consideram 90% dos terceirizações que chegam às suas mãos fraudulentas, significa dizer que 90% destas ações são decididas a favor ao trabalhador.

A reação da Justiça do Trabalho à terceirização foi um dos temas discutidos durante seminário promovido pelo IBC Brasil em São Paulo, nos dias 22 e 23 de agosto. Os números apontados pelo juiz Marcos Fava foram corroborados pelo juiz Brasilino Santos Ramos, do TRT da 10ª Região (Distrito Federal), que se orgulha de dizer que, no tribunal onde atua, uma causa demora, em média, 120 dias para ser julgada em primeira e segunda instâncias.

Teoria e prática

O problema está na falta de adequação da lei à realidade. O trabalho não é mais, hoje em dia, o mesmo que era na década de 40, quando foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho. Ele evoluiu, as relações de trabalho mudaram, mas a legislação permanece a mesma e os juizes não a interpretám a luz da nova conjuntura. Os conflitos, então, são inevitáveis. “A terceirização não surgiu da ciência do direito, mas da ciência da economia e da administração de empresas”, reflete o juiz Brasilino Ramos.

Para os juízes, muitos dos empresários violam os direitos do trabalho por ignorância. Outros, por má fé mesmo. Nesse contexto, como imaginar uma relação amigável entre aqueles que buscam, antes de tudo, seu lucro e uma Justiça que, por definição de seus membros, foi criada para defender o trabalhador?

“A terceirização não é um problema para a Justiça, mas sim o seu uso ilícito. Não é possível o empresário reduzir o custo que tem com o trabalhador. Esse milagre é que é o problema”, diz o juiz Marcos Fava. “O Direito do Trabalho não aceita a terceirização como forma de baratear custos tirando direitos do trabalhador”, completa Brasilino Ramos.

Pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, Súmula 331, não há vínculo de emprego quando o serviço contratado se refere à atividade meio do tomador, não existe pessoalidade e nem subordinação na relação com os funcionários terceirizados. Na prática, de acordo com os juízes, essas regras não são respeitadas na maioria dos casos. O terceirizado de hoje é o empregado de ontem, só que mais barato para a empresa, dizem a uma voz os dois juízes.

Esse eterno conflito só terá fim quando os dois lados e um terceiro se dispuseram a cumprir suas funções. Ao Legislativo, adequar a lei à realidade brasileira. Às empresas, cumprir o que manda a norma. Ao Judiciário, observar e punir quem descumpre a norma, seja ele empregador ou empregado.

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