Toddy com canudinho

RedeTV! deve indenizar câmera exibido em cenas eróticas

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16 de agosto de 2006, 17h33

O moço é evangélico, casado e bem comportado. Mas em função de sua profissão de operador de câmera de televisão, acabou se transformando em uma espécie de astro pornô involuntário. Em vez de fazer inveja nos amigos depois de aparecer na televisão contracenando com mulheres seminuas, no programa Noite Afora, apresentado pela ex-modelo Monique Evans na Rede TV!, Alexandre Peixoto dos Santos preferiu mover uma ação contra a emissora por danos morais. E ganhou uma indenização de R$ 5 mil.

Embora não fosse sua função, o câmera conta que era frequentemente chamado para servir de modelo para as brincadeiras eróticas, ao lado de mulheres em trajes sumários na cama onde Monique apresentava o programa.

As brincadeiras de Monique foram consideradas constrangedoras por Toddynho, o apelido com o qual Peixoto era conhecido. Ele alegou também que a exposição acabou interferindo no relacionamento com sua mulher, também evangélica, que não gostou nada de ver o marido em rede nacional de TV naquela situação.

Não bastasse isso, ele conta que a apresentadora costumava explicar o sentido de seu apelido, Toddynho : “Ele é marronzinho e tem um canudinho pequenininho”, dizia com a malícia que caracterizava o programa.

Em sua defesa, a emissora de televisão argumentou que o câmera já tinha o apelido antes mesmo de começar a participar do programa e que nunca se mostrou incomodado com isso. Claro, o apelido não é auto-explicativo.

Mesmo assim, por maioria de votos, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) considerou que houve sim constrangimento público, daí a necessidade de indenização por danos morais. Tanto o pedido da RedeTV para descaracterizar o dano moral como o de Toddynho para aumentar o valor foram negados pelo tribunal.

A emissora ainda terá de pagar para o ex-funcionário férias devidas e horas extras, além de multa pelo atraso do pagamento das verbas rescisórias e por litigância de má-fé, por retardar o pagamento das verbas.

Leia a íntegra da decisão

Proc. n.º 20050334730 (00563.2004.201.02.00-1)

1ª Vara do Trabalho de Barueri

Recorrentes: TV Ômega Ltda e Alexandre Peixoto dos Santos

Recorridos: ambos

EMENTA

Dano moral. Caracterização.

Ficou evidenciado que o autor passou por constrangimento público ao participar do programa de televisão, em que era exposto a piadas, inclusive de natureza sexual.

RELATÓRIO

Interpõe recurso ordinário TV Ômega Ltda afirmando que a multa do artigo 18 do CPC caracterizará bis in idem. São indevidas horas extras, férias, indenização por dano moral, depósitos fundiários. Não devem ser expedidos ofícios. Deve ser dado provimento ao recurso para modificar a sentença.

Contra-razões de fls. 257/62.

Apresenta recurso ordinário Alexandre Peixoto dos Santos afirmando que o valor da indenização dos danos morais tem de ser aumentado para 100 salários mínimos. Faz jus a equiparação salarial. Deve ser dado provimento ao recurso para modificar a sentença.

Contra-razões de fls. 238/47. É o relatório.

Não conheço do recurso do autor no ponto em que o apelo “seja extensivo a todo e qualquer pronunciamento que lhe tenha sido adverso no julgado de fls.”, por nada devolver ao segundo grau, por falta de razões específicas.

II- CONHECIMENTO

Os recursos são tempestivos. Houve pagamento das custas e do depósito recursal, na forma legal (fls. 228/32). Conheço dos recursos por estarem presentes os requisitos legais.

Não conheço do documento de fls. 215 juntado com as contra-razões, pois deveria ter sido juntado com a defesa.

III- FUNDAMENTAÇÃO

VOTO

A- Recurso da empresa

1. Multa

A multa prevista no parágrafo 8.º do artigo 477 da CLT é decorrente do atraso no pagamento das verbas rescisórias.

A multa decorrente da aplicação do artigo 18 do CPC foi estabelecida em razão de litigância de má-fé. A multa foi aplicada em razão de que a empresa usa o processo para retardar o pagamento das verbas rescisórias, nos termos dos incisos III e V do artigo 17 do CPC.

Não há bis in idem.

2. Horas extras

As testemunhas Edson e Fernando declararam que em dois dias semanais o autor trabalhava 12 horas e nos demais dias 8 horas. Não houve divergência de horários.

A duração semanal do trabalho do autor era de 36 horas. Ele trabalhava 56 horas semanais. Tem direito às 20 horas extras deferidas na sentença.

Reexame de prova não é matéria de contradição para efeito de embargos de declaração.

São devidas as horas extras e reflexos.

3. Férias

Da defesa de fls. 115/6 não há impugnação específica quanto ao fato de que o autor não gozou as férias de 2000/01. Assim, são devidas.


Não foi dito às fls. 222 onde está o documento que demonstra a concessão das férias. Isso deveria ser demonstrado por meio do cartão de ponto.

4. Dano moral

O reclamante alega na inicial que era chamado pela apresentadora Monique Evans de “Todinho” ou “Nescalzinho”. Em algumas oportunidades foi dito pela apresentadora que “é porque ele é marronzinho e tem um canudinho pequenininho”.

O autor tinha de sentar na cama, onde eram realizadas as entrevistas, para servir de modelo a apresentações de objetos e técnicas sexuais.

As brincadeiras, nas quais moças seminuas o utilizavam como modelo para “brincadeiras eróticas”, geraram uma grave crise no seu casamento. Sua esposa não estava contente com a exposição do seu marido na televisão.

Informa que é evangélico.

O autor declarou em depoimento pessoal que passou a se apresentar como “Todinho”.

A testemunha Edson (fls. 108) afirmou que o autor tinha o apelido de “Todinho” antes de participar das gravações do programa “Noite Afora”. O autor não se mostrava incomodado em ser chamado por tal apelido.

A testemunha Francisco declarou que o autor não se incomodava em ser chamado de “Todinho”.

A empresa não contestou especificamente a postulação contida na inicial no sentido de que autor passou por constrangimento público, inclusive de que a apresentadora afirmou que ele “é marronzinho e tem um canudinho pequenininho”.

Não há documento nos autos demonstrando a autorização para a participação no programa.

Em razão do constrangimento público, não contestado pela empresa, é devida a indenização por dano moral.

5. FGTS

Não há prova nos autos de que o FGTS tenha sido depositado.

Prova dos depósitos do FGTS é feita pelo empregador, por se tratar de fato extintivo do direito do autor (art. 333, II, do CPC). Isso não foi feito. Mantenho a sentença.

6. Ofícios

O juiz do trabalho pode expedir ofícios, se constatar que houve violação a preceitos legais trabalhistas, para que a DRT tome as providências que entender cabíveis. O juiz não deixa de ser um funcionário público federal lato sensu (art. 631 da CLT). A comunicação pode ser feita tanto pelo funcionário público, como pelo representante legal de associação sindical, como, por exemplo, seu diretor. A expedição de ofício decorre da existência da relação de emprego, nos termos do artigo 114 da Constituição. No mesmo sentido a orientação da jurisprudência:

A expedição de ofício à DRT decorre do artigo 631 da CLT, pois o juiz do trabalho não deixa de ser um funcionário público lato sensu. Foi verificada a insalubridade. Logo, deve ser oficiado àquele órgão para apurar a multa administrativa, em razão de que esta o juiz do trabalho não tem competência para impor à ré. (TRT 2ª R, 3ª T, RO 029341745, Ac 02970474993, Rel. Sergio Pinto Martins, DOE SP 23.9.97, p. 100).

A expedição de ofícios é matéria de ordem pública, não necessitando inclusive de pedido. Verificada irregularidade o juiz expede ofício (art. 631 da CLT). Não se pode falar em decisão extra petita. No mesmo sentido o entendimento do TST:

Agravo de Instrumento em Recurso de Revista. Expedição de ofícios. Providência de cunho administrativo. Violação dos arts. 128 e 460 do CPC não configurada. Desprovimento. A expedição de ofícios aos órgãos competentes em matéria de fiscalização da legislação trabalhista trata-se de providência de cunho administrativo, tomada pelo juiz em cumprimento de dever funcional, nos termos do art. 631 da CLT, não se sujeita ao princípio dispositivo. Logo, a determinação judicial para que os órgãos responsáveis adotem as medidas cabíveis, embora não requerida pela parte, não implica extrapolamento dos limites da lide, em afronta ao disposto nos arts. 128 e 460 do CPC. Agravo conhecido e desprovido. (TST, 1ª T., Ag RR 77.591/03.7-2ª R, j. 10.8.2005, Rel. Juiz Altino Pedroso dos Santos, DJU 1 2.9.2005, p. 768).

B- Recurso do autor

1. Indenização por dano moral

Previa o artigo 1.553 do Código Civil de 1916 que a forma de fixação da indenização por dano moral era por arbitramento.

O Código Civil de 2002 não tem um artigo exatamente igual, mas a idéia continua sendo a mesma. O juiz irá fixar a indenização por arbitramento. Ao fixar a indenização, o juiz deve-se ater à questão, às influências que isso proporcionou ao lesado, arbitrando-a de maneira eqüitativa, prudente, razoável e não abusiva, atentando-se para a capacidade de pagar do que causou a situação, de modo a compensar a dor sofrida pelo lesionado e inibir a prática de outras situações semelhantes.

O parágrafo único do artigo 953 do Código Civil dispõe que se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do casos. É a fixação por eqüidade. A justiça do caso concreto, segundo Aristóteles.


O juiz deve levar em conta os seguintes elementos para fixar a indenização: a- situação financeira dos litigantes; b- discernimento do ofensor sobre a gravidade do fato; c- grau de cultura do ofensor; d- estabelecer punição pedagógica, visando evitar a reincidência no ato.

Assim, deve-se usar da razoabilidade na fixação da indenização, da lógica do razoável de que nos fala Recasen Siches e também da proporcionalidade.

A indenização tem objetivos pedagógicos, de evitar que o réu incorra no mesmo ato novamente. Visa desestimular ou inibir situações semelhantes.

Como afirma Valdir Florindo: o montante da indenização deve traduzir-se em advertência ao lesante e à sociedade, de que comportamentos dessa ordem não se tolerará.

Leciona Carlos Alberto Bittar que “a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante. Coaduna-se essa postura, ademais, coma própria índole da teoria em debate, possibilitando que se realize com maior ênfase, a sua função inibidora, ou indutora de comportamentos. Com efeito, o peso do ônus financeiro é, em um mundo em que cintilam interesses econômicos, a resposta pecuniária mais adequada a lesionamentos de ordem moral”.

A jurisprudência mostra que

“…. A indenização a ser arbitrada deverá ser, nem tão grande que se converta em enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva, como se extrai da lição escorreita de Caio Mário Pereira da Silva” (TRT 3ª R., 2ª T., RO 21719/99, Rel. Juiz Wanderson A da Silva, DJ MG 21.6.2000, p. 17, TDT 07/00, p. 53).

A indenização por dano moral não pode, porém, ser fundamento para o enriquecimento do lesado, mas apenas compensador ou reparador do dano causado. Não pode também ser fundamento para arruinar financeiramente o réu, que deixará de pagar a indenização.

É vedada a vinculação da indenização ao salário mínimo (art. 7.º, IV da Constituição). Assim, não se pode fixar o valor em salários mínimos.

O valor fixado é razoável em razão do aspecto pedagógico que a punição precisa ter. Mantenho.

2. Equiparação salarial

O depoimento pessoal do autor mostra que ele operava câmera fixa, internamente. O paradigma fazia imagens em movimento, externamente.

É o que também se depreende do depoimento pessoal do preposto.

Não desenvolviam as mesmas funções.

São indevidas as diferenças salariais e reflexos.

A jurisprudência mencionada no recurso não vincula o julgador, nem representa fundamento para embargos de declaração. Não precisa ser analisada, pois a análise é das razões do recurso e não do teor de acórdãos. As razões do recurso foram analisadas.

Atentem as partes para a previsão do parágrafo único do artigo 538 do CPC e artigos 17 e 18 do CPC, não cabendo embargos de declaração para rever fatos e provas e a própria decisão.

IV- DISPOSITIVO

Pelo exposto, conheço dos recursos, por atendidos os pressupostos legais, e, no mérito, nego provimento a ambos os apelos. Fica mantido o valor arbitrado para efeito do cálculo das custas. É o meu voto.

Sergio Pinto Martins

Juiz Relator

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