Em nome da função

Agente público não responde por dano causado a terceiro

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16 de agosto de 2006, 7h00

Somente as pessoas jurídicas de direito público ou as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos é que poderão responder objetivamente pela reparação de dano a terceiro, e não o próprio agente público. O entendimento é do ministro Carlos Ayres Britto, que foi acompanhado por unanimidade pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal.

Os ministros negaram Recurso Extraordinário da Associação de Caridade da Santa Casa de Misericórdia de Assis (São Paulo), que pedia a responsabilização do ex-prefeito de Assis, José Santilli Sobrinho, pela intervenção no hospital.

Sobrinho editou o Decreto de Intervenção 2.664/93 contra o hospital e maternidade de propriedade da associação. De acordo com o recurso, o ato causou prejuízos financeiros à entidade beneficente, o que justifica a ação indenizatória, com pedido de ressarcimento de perdas e danos contra o próprio ex-prefeito.

De acordo com o hospital, o processo foi extinto sem julgamento do mérito, sob o fundamento de ilegitimidade passiva do réu. No recurso ao Supremo, a entidade alegou desrespeito ao parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal, que dispõe que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

A associação defendeu a tese de que é “permitido ao lesado mover ação de indenização diretamente contra ao agente prescindindo de responsabilizar o Estado quem lhe faça as vezes, ou contra ambos, como responsáveis solidários nos casos de dolo ou de culpa”. Sustentou que, se fundamentada causa na conduta culposa do agente político, a ação poderia ser dirigida diretamente à pessoa do ex-prefeito, independentemente da responsabilidade do município por ele até então governado.

Ao votar, o relator, ministro Carlos Ayres Britto, ressaltou que à luz do dispositivo constitucional (parágrafo 6º do artigo 37) somente as pessoas jurídicas de direito público ou as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos é que poderão responder objetivamente pela reparação de dano a terceiros. “Isto, por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes enquanto agentes públicos, e não enquanto pessoas comuns.”

Quanto à questão da ação regressiva, o relator explicou que “uma coisa é assegurar ao ente público, ou quem lhe faça as vezes, o direito de se ressarcir perante o servidor praticante de ato lesivo a outrem nos casos de dolo ou de culpa. Coisa bem diferente é querer imputar à pessoa física do próprio agente estatal de forma direta e imediata a responsabilidade civil pelo suposto dano a terceiros”.

Para Carlos Ayres Britto, se o prejuízo ocorreu em razão da função, como ocorreu no caso, não há “como extrair do parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal a responsabilidade per saltum da pessoa natural do agente. Tal responsabilidade, se cabível, dar-se-á apenas em caráter de ressarcimento ao erário, ação regressiva, portanto”.

“Ação regressiva é ação de ação de volta ou de retorno contra aquele agente que praticou ato juridicamente imputável ao Estado, mas causador de dano a terceiro. Trata-se de ação de ressarcimento, a pressupor a recuperação de um desembolso”, explicou o ministro.

De acordo com Britto, no caso dos autos, “trata-se de ato típico da administração pública, decreto de intervenção em instituição privada, dado que as ações relacionadas à saúde estão compreendidas em área de interesse que a própria Carta da República elegeu como direito de todos e dever do Estado (artigo 196)”.

O relator destacou que “o agente não representa o Estado, ele é o Estado em ação”, concluindo que quem responde perante terceiros por dano objetivamente causado “é a pessoa do Estado, é o poder público ou quem lhe faça as vezes”.

RE 327.904

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