Dono da decisão

Conseqüências da ampliação da competência da Justiça Trabalhista

Autor

  • Luiz Salvador

    é presidente da ALAL diretor do Departamento de Saúde do Trabalhador da JUTRA assessor jurídico de entidades de trabalhadores membro integrante do corpo técnico do Diap do corpo de jurados do Tribunal Internacional de Liberdade Sindical (México) da Comissão Nacional de Relações internacionais do Conselho Federal da OAB e da comissão de juristas responsável pela elaboração de propostas de aprimoramento e modernização da legislação trabalhista instituídas pelas Portarias-MJ 840 1.787 2.522/08 e 3105/09.

15 de agosto de 2006, 7h00

Até a entrada em vigor da Emenda Constitucional 45, que ampliou significativamente a competência ampliativa da Justiça Trabalhista para processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho, o entendimento prevalente da jurisprudência era que a competência para julgar quaisquer ações envolvendo acidente do trabalho era da Justiça comum.

Não havia, como agora, após a edição da EC 45, uma definição clara de competir à Justiça do Trabalho julgar ações buscando reparação indenizatória por danos materiais e morais contra o empregador, nas hipóteses de culpa no infortúnio, mesmo por omissão no cumprimento de seu dever legal de assegurar saúde física e mental ao trabalhador, pela prevenção, e cumprimento das normas legais de segurança e proteção à saúde física e mental do trabalhador, disciplinadas pela legislação infortunística vigente, incluídas as NRs que têm força de lei.

Quanto a isso, havia conflito jurisprudencial e não pacificação de entendimento de ser competente a Justiça do Trabalho, quando figurar num pólo o empregador e no outro o trabalhador infortunado, como ocorre agora na jurisprudência nacional.

Como se depreende pelo exame do corpo do acórdão prolatado no Conflito de Competência 7.204-1 (julgado em final de junho de 2005), voltando atrás na decisão anterior e reconhecendo a competência da Justiça do Trabalho, não havia unanimidade de entendimento sobre ser ou não a Justiça do Trabalho competente para julgar ação de dano moral e material acidentária. Havia posicionamentos divergentes dentre os ministros. A maioria entendia que a competência era da Justiça comum. Mas alguns deles entendiam que a competência já era assegurada para julgar tais ações, mesmo antes da entrada em vigor da EC 45 e ainda com base no antigo artigo 114 da Constituição Federal:

“Nesse rumo de idéias, renove-se a proposição de que a nova redação do art. 114 da Lex Máxima só veio aclarar, expletivamente, a interpretação aqui perfilhada. Pois a Justiça do Trabalho, que já era competente para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação trabalhista, agora é confirmativamente competente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho (inciso VI do art. 114)”.

(STF, CONFLITO DE COMPETÊNCIA 7.204-1 MINAS GERAIS, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, decisão publicada no DJ com a data de 3/8/05).

Na verdade, são dois assuntos distintos:

– A competência da Justiça comum é para julgar ação acidentária quando no pólo passivo da relação jurídica instaurada seja contra o INSS, por conta de ser o gestor (verdadeira seguradora que é) das contribuições patronais ao SAT — Seguro Acidente do Trabalho, nos percentuais fixados pelo artigo 22 da Lei 8.212/91, inciso II (de 1º a 3º) incidente sobre a folha de pagamento, para o custeio à concessão do benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, pelo INSS.

A competência já é da Justiça do Trabalho se a ação é voltada contra empresa e ou empregador por culpa, abuso e ou omissão no cumprimento da legislação nacional que optou pela infortunística em proteção à vida, a segurança e a saúde dos trabalhadores.

Com o recente julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal que, por unanimidade, reformulando entendimento anterior, reconheceu tratar-se de competência da Justiça do Trabalho processar e julgar ações por dano moral e material decorrente de acidente de trabalho, o conflito jurisprudencial, então antes existente, perdeu seu objeto, não mais havendo razão de existir.

Antes da vigência da EC 45, a divergência sobre quem detinha competência para julgar essas ações se justificava. É que o artigo 114 da Constituição impunha limitação à competência da Justiça do Trabalho que somente estava autorizada a processar, conciliar e julgar ações de vínculo empregatício, onde havia obrigatoriedade de existência num pólo o empregador e no outro pólo o trabalhador.

O conflito jurisprudencial então existente antes do advento da EC 45 prendia-se ao equivocado argumento de que a Justiça do Trabalho somente detinha competência para julgar ações entre empregados e empregadores e que, por força do disposto no artigo 109, inciso I da Constituição Federal, havia exclusão para julgar ações acidentárias, quer por parte da Justiça do Trabalho, quer da Justiça Federal. Assim, por exclusão, o entendimento era de que a competência somente podia ser da Justiça comum.

Mas com a entrada em vigor da EC 45, não há mais possibilidade de qualquer argumento que negue a competência da Justiça do Trabalho, pena de negar-se validade à decisão soberana do legislador constituinte derivado que expressamente ampliou substanciosamente a competência da Justiça do Trabalho para decidir e julgar toda e qualquer ação decorrente de uma relação de trabalho, independentemente da presença e ou não de figurar num pólo passivo da relação processual, de um lado o empregado e de outro o empregador.


Tal exigência que existia no artigo 114 antes da entrada em vigor da EC 45 quedou com a atual clareza redacional produzida na edição do novo artigo 114 da Constituição, que atribui à Justiça do Trabalho competência ampliada para processar e julgar não mais apenas ações de vínculo empregatício, mas também, extensivamente, toda e qualquer ação onde presente uma relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício. Ou seja, onde houver trabalho humano numa relação de trabalho. A nova ampliação está assim autorizada no inciso I do novo artigo 114 (EC 45):

“Artigo 114 — Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Alterado pela EC-000.045-2004):

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.

Tendo cessados os motivos da divergência de entendimento jurisprudencial, fica pacificado o entendimento de que a competência da Justiça comum é de julgar apenas as ações onde figure no pólo passivo o INSS, diante de sua responsabilidade objetiva para assegurar ao acidentado e ou do empregado que ficar incapacitado por doença ocupacional, por conta dos recursos que administra, oriundos do SAT.

Para todas as demais outras ações onde presente uma relação de trabalho, inclusive a que buscar indenização por dano material e ou moral decorrentes dos abusos e ou omissões patronais no cumprimento das medidas de segurança e saúde do trabalhador, incluindo as NRs — Normas Regulamentadoras, a competência é da Justiça do Trabalho.

Após o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do Conflito de Competência 7.204-1 Minas Gerais acima apontado, passou a perdurar uma dúvida nos operadores de Direito e aplicadores da lei, os magistrados, qual seja: em qual momento há que se entender ter tornado competente a Justiça do Trabalho para julgar as ações decorrentes de uma relação de trabalho? Se somente a partir da vigência da EC 45 e ou mesmo antes, diante do entendimento já pacificado pela Súmula 736? Mas essa dúvida também acabou recentemente de ser solucionada pelo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Conflito de Competência (CC 51712), Nº 2005⁄0104294-7, decisão assim ementada:

“EMENTA. COMPETÊNCIA. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS PATRIMONIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 45⁄2004. APLICAÇÃO IMEDIATA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA TRABALHISTA, NA LINHA DO ASSENTADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APLICAÇÃO IMEDIATA DO TEXTO CONSTITUCIONAL AOS PROCESSOS EM QUE AINDA NÃO PROFERIDA A SENTENÇA” (STJ, CC 51712 ⁄ SP, Número Registro: 2005⁄0104294-7, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, decisão publicada no DJ, com a data de 14/09/2005).

Do corpo do mesmo acórdão em comento, se extrai os contornos quanto ao momento estabelecido para se fixar a competência da Justiça do Trabalho, que é a do proferimento da sentença. Ou seja, se já proferida antes da entrada em vigor da EC 45 pela Justiça comum, desta será a competência para os demais atos, até mesmo por uma questão de economia processual:

“Nas ações de acidente de trabalho, o que define a competência ou não da Justiça do Trabalho é a sentença proferida na causa: se já foi prolatada pelo juiz de Direito por onde tramitava, a competência permanece na Justiça comum estadual, cabendo o eventual recurso à corte de segundo grau correspondente; se não foi proferida a decisão, o processo deve ser remetido desde logo à Justiça do Trabalho” (STJ, CC 51712 ⁄ SP).

“Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações de indenização por danos morais decorrentes de acidente de trabalho, desde que não prolatada sentença na Justiça comum. Precedente citado: CC 51712/SP”.

(STJ, Conflito de Competência 51675, Rel. Min. Nancy Andrighi, decisão publicada no DJ 18-08-2005).

Procedimento a ser seguido

Por meio da Resolução 126/05, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Instrução Normativa 27, de 16/2/05 (DJU de 22/2/05), que dispõe sobre normas procedimentais aplicáveis ao processo do trabalho em decorrência da ampliação da competência da Justiça do Trabalho pela Emenda Constitucional 45, de 8/12/04 (DOU de 31/12/04), sendo que a referida instrução disciplina procedimentos como, o dos ritos (ordinário, sumaríssimo ou especial) a serem observados nas ações ajuizadas na Justiça do Trabalho; a sistemática para a interposição de recursos; a questão do pagamento de custas, de emolumentos, e de honorários advocatícios e periciais.

Assim, o procedimento uniformizado a ser adotado pela Justiça Trabalhista no exame das questões de ampliação de competência assegurada pela EC 45 deve ser o da Consolidação das Leis do Trabalho.

O artigo1º da Resolução dispõe que:


“As ações ajuizadas na Justiça do Trabalho tramitarão pelo rito ordinário ou sumaríssimo, conforme previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, excepcionando-se, apenas, as que, por disciplina legal expressa, estejam sujeitas a rito especial, tais como o Mandado de Segurança, Habeas Corpus, Habeas Data, Ação Rescisória, Ação Cautelar e Ação de Consignação em Pagamento”.

Exceptuam-se da inaplicabilidade dos ritos da Consolidação das Leis do Trabalho as demais ações que possuam “rito especial”, dentre as quais citamos o tais como o Mandado de Segurança, Habeas Corpus, Habeas Data, Ação Rescisória, Ação Cautelar e Ação de Consignação em Pagamento.

A instrução normativa em comento assegura ainda a condenação em honorários, parágrafo 3º, do artigo 3º:

“Aplicam-se quanto às custas as disposições da Consolidação das Leis do Trabalho.

Parágrafo 1º – As custas serão pagas pelo vencido, após o trânsito em julgado da decisão.

Parágrafo 2º – Na hipótese de interposição de recurso, as custas deverão ser pagas e comprovado seu recolhimento no prazo recursal (arts. 789, 789-A, 790 e 790-A da CLT).

Parágrafo 3º – Salvo nas lides decorrentes da relação de emprego, é aplicável o princípio da sucumbência recíproca, relativamente às custas (grifos nossos).

De se ponderar que apesar de ter mantido o entendimento já cristalizado de ser aplicável à Justiça do Trabalho o jus postulandi, há de que se ter em vista que, com a Carta Política de 1988, o advogado passou a ser reconhecido como indispensável à administração da Justiça, sendo que no seu ministério privado, presta serviço público e exerce função social e no processo judicial, contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público (CF, art. 133 e respectiva lei regulamentadora, nº 8.906/94), que assim dispõem:

a) CF, art. 133: “O advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

b) Lei 8.906/94, art. 2º: “O advogado é indispensável à administração da justiça. Parágrafo 1º – No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social; Parágrafo 2º – No processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público; Parágrafo 3º – No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta Lei”.

De todos sabido que o empregador não mais corre o risco de comparecer a uma audiência trabalhista sem advogado, diante da complexidade das questões que atualmente são decididas pela Justiça do Trabalho e não é justo, moral e ou mesmo admissível permitir-se que o empregado faça suas postulações em juízo trabalhista por si só, pena de ofensa à garantia constitucional que lhe assegura o direito à ampla defesa (art. 5º, LV da Constituição Federal de 1988), afirmação suprema dos anseios sociais. A assistência por advogado pode até não ser obrigatória, mas é essencial ao exercício da ampla defesa e à concretização da igualdade das partes.

Não é admissível que, mesmo após a vigência do NCCB que se adaptou à nova realidade da prevalência do social assegurada pela carta cidadã, se continue a permitir que o causador do dano não seja responsabilizado a ressarcir integralmente a parte contrária pelos gastos processuais na contratação de advogado à defesa técnica de seus direitos para que possa receber seus créditos alimentares não satisfeitos às épocas próprias.

É consabido que os trabalhadores na prática são obrigados a arcar com o pagamento dos honorários contratuais estabelecidos para custear seu advogado, o que lhe causa um evidente prejuízo, ficando o seu ex-empregador sem qualquer responsabilidade em ressarci-lo, numa manifesta injustiça, o que resulta em recebimento pelo empregado de apenas parte do que lhe era devido. Assente em direito de que quem causa prejuízo a outrem deve ressarcir integralmente a parte contrária, à luz do que dispõe o parágrafo único do artigo 404, conforme artigos 389, 402 do Código Civil.

As perdas e danos dizem respeito ao ressarcimento do credor da obrigação exigida em juízo. No Código Civil de 2002, o ressarcimento à parte envolve o reembolso das custas e honorários de advogado que despendeu. Não se trata de honorários advocatícios sucumbenciais (que pertencem ao advogado), mas sim aos honorários contratuais despendidos pelo autor que se viu obrigada a constituir advogado para compelir o inadimplente à satisfação das perdas e danos decorrentes da obrigação.

A indenização deve ser integral, não sendo lógico deferir-se o pagamento ao credor de forma parcial. Com efeito, nenhum profissional trabalha de forma gratuita, onde evidentemente enquadra-se o advogado.


Assim há que se ampliar o que dispõe o parágrafo 3º, do artigo 3º, da Instrução Normativa 27, para assegurar ao trabalhador que não seja responsabilizado pelo pagamento das despesas com advogado para receber créditos alimentares não satisfeitos nas épocas próprias a que não deu causa, pena de se continuar validando o enriquecimento sem causa por parte do causador do dano.

Responsabilidade objetiva

O legislador brasileiro adotou a infortunística que obriga o empregador a prover o campo de trabalho de plenas condições quanto à segurança, prevenção de acidentes, salubridade e condições mínimas de higiene e conforto, respondendo o empregador, qualquer que seja o grau de sua culpa, pelos danos que ocasionar o seu descuido e ou omissão no cumprimento de seu dever legal:

“A Constituição da República de 1988, no seu inciso XXVIII do artigo 7º, avançou no separar, total e definitivamente, o regime da infortunística do regime da responsabilidade civil, de tal forma que o custeio do seguro de acidente de trabalho permaneceu no âmbito da exclusiva responsabilidade do empregador (o INSS não pode mais retirar recursos do caixa geral para a indenização acidentária) e a responsabilidade civil passou totalmente para o regime do Código Civil, de forma que o empregador, qualquer que seja o grau de culpa, terá de suportar o dever de reparação civil segundo as regras do Direito Comum”

(TRT3ª Reg, RO 01635-2004-092-03-00-8, Rel. EMÍLIA FACCHINI, Sexta Turma, decisão publicada no DJ em data de 20/01/2005).

Deve-se ter em vista que a previsão contida no artigo 7º, XXVIII, da Constituição dispõe claramente que o seguro social contra acidentes do trabalho não exclui a indenização civil devida pelo empregador, quando incorrer em dolo ou culpa. Este entendimento também já se encontra pacificado inclusive pela Súmula 329 do STF, que assim dispõe: “a indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador”.

Apenas a ausência de culpa do empregador é que o livra de ser responsabilizado à indenização pelos infortúnios laborais e de responder perante o INSS à devida reparação previdenciária pela ação de regresso autorizada pelo artigo 120 da Lei 8.213/91:

“Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis”.

A não observância no cumprimento das normas protetivas à saúde do trabalhador disciplinadas pelos artigos 154 a 200 da CLT, incluídas as Normas Regulamentadoras acarreta ao empregador a responsabilidade por indenizar o trabalhador prejudicado por todos os danos morais, materiais e estéticos e à extensão do dano.

A jurisprudência mais conseqüente tem acompanhado a boa doutrina no sentido de concluir que, em se tratando de acidente de trabalho, a indenização autorizada pelo comando constitucional, artigo 7º, inciso XXVIII, trafega pela teoria do risco e não da culpa, como conclui Antonio Carlos F. Chedid Junior em seu artigo intitulado “Responsabilidade Civil Trabalhista – Abordagem Crítica no Acidente Laboral”, publicado pela Editora LTR– 68-11/1351/1358

O TRT da 3ª Região, já em 23 de fevereiro de 2002, publicou no DJ o RO 1569/01, adotando esse posicionamento mais consentâneo com a doutrina mais avançada:

“EMENTA: ACIDENTE DE TRABALHO INDENIZAÇÃO RESPONSABILIDADE OBJETIVA. Em se tratando de acidente de trabalho, a indenização expressamente ressalvada pela Constituição da República de 1988 (art. 7º, inciso XXVIII), trafega pela teoria do risco, e não da culpa. A responsabilidade objetiva impõe o dever geral de não causar dano a outrem que, prejudicado, fica isento do ônus de provar tenha procedido com dolo ou culpa, bastando a demonstração do dano e da relação direta de causalidade entre os objetivos empresariais e o evento danoso, para fazer jus ao pleito reparatório”

(TRT-3ª Reg. RO 15369/01, Rel. Juíza Lucilde D’Ajuda Lyra de Almeida, quarta turma, decisão publicada no DJ em 23/2/02).

Ainda recentemente, o mesmo tribunal, mantendo esse mesmo entendimento, reafirmou:

“(…) não importa se o reclamante trabalhava também com treinamento das equipes sobre segurança do trabalho e que ele fizesse distribuição dos Epis revisores, uma vez que a responsabilidade da empresa é objetiva no sentido de observar as normas de saúde e proteção do trabalhador”.

(TRT-3ª Região, RO 00520-2004-028-03-00-3, Sétima Turma, Rel. Luiz Ronan Neves Koury, decisão publicada no DJ em data de 20.01.05).

Prescrição aplicável

Agora que o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de cabe à Justiça do Trabalho julgar as ações por dano moral e material acidentário contra descumpridor das normas de segurança e saúde do trabalhador, questão tormentosa para os operadores do Direito e para os magistrados, aplicadores da morna, é a relativa a qual prescrição aplicar-se.


Os posicionamentos são os mais divergentes. Mas há uma diretriz que todos deveremos estar atentos, ou seja, o de que a prescrição apesar de ser considerada “um mal necessário” em prol do atendimento de um interesse maior da sociedade, que é o da “paz social”, há que se adotar um norte, no sentido de que sua interpretação há que ser restritiva e não prejudicial ao trabalhador, beneficiando o descumpridor da norma, mormente a que regula o direito à vida, à segurança e saúde do trabalhador.

Comungamos do entendimento de que a indenização por dano moral, material e estético resultante do descumprimento da legislação que exige do empregador respeito e cumprimento às medidas de segurança e proteção à saúde do trabalhador não se tratam de crédito trabalhista propriamente dito. Examinando esta questão, o próprio Supremo Tribunal Federal já concluiu que a questão é de Direito Civil e apenas a competência para decidir e julgar é da Justiça do Trabalho em razão de decorrer de uma relação de emprego:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO CIVIL. DEMANDA SOBRE ACIDENTE DE TRABALHO. COMPETÊNCIA. ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO. 1. Esta Suprema Corte tem assentado não importar, para a fixação da competência da Justiça do Trabalho, que o deslinde da controvérsia dependa de questões de direito civil, bastando que o pedido esteja lastreado na relação de emprego (CJ 6.959, rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 134/96). 2. Constatada, não obstante, a hipótese de acidente de trabalho, atrai-se a regra do art. 109, I da Carta Federal, que retira da Justiça Federal e passa para a Justiça dos Estados e do Distrito Federal a competência para o julgamento das ações sobre esse tema, independentemente de terem no pólo passivo o Instituto Nacional do Seguro Social INSS ou o empregador. 3. Recurso extraordinário conhecido e improvido”. (DJU 24.10.2003 – Rel. Sepúlveda Pertence).

Com a EC 45, a questão continua a mesma. Apenas que agora a Justiça do Trabalho tem competência alargada para decidir sobre quaisquer ações decorrentes de uma relação de trabalho.

Não obstante isso, diversas correntes de pensamento se digladiam. Para uns, a prescrição é a bienária prevista no artigo 7º da CF, que assim dispõe:

“São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social” (artigo 7º, caput, que não tutela o retrocesso social).

“Ação, quanto a créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho (Inciso XXIX).”

Para alguns outros, a prescrição aplicável é a do novo Código Civil, artigo 206, que, no inciso V, trata da questão pertinente à pretensão de reparação civil.

Ainda há uma outra corrente que defende a imprescritibilidade, tendo-se em vista que os direitos relativos ao direito à vida, à segurança e à saúde do trabalhador se integram dentre os direitos humanos protegidos pelos princípios enunciados pelo disposto no artigo 4º da carta cidadã, que dispõe que a República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios, dentre os quais o da prevalência dos direitos humanos (CF, artigo 4º, inciso II).

Compartilhamos da corrente de que tais direitos são imprescritíveis eis que se tratam de direito de ordem pública e em defesa da prevalência da vida. Mesmo que não seja esse o entendimento, ainda assim, a prescrição há de ser a do Direito Civil, vintenária, devendo receber tratamento isonômico ao entendimento que já foi pacificado quanto ao FGTS, cuja prescrição é a do direito civil, a trintenária.

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