Eleições 2006

Candidatos da comunidade jurídica querem melhores leis

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14 de agosto de 2006, 13h56

É notória a baixa qualidade formal das leis produzidas em todas as esferas legislativas do país. Mesmo sem entrar no mérito do conteúdo, propor e aprovar leis inconstitucionais, assim como apresentar projetos de leis em matérias sobre as quais não têm competência é quase a regra dos nobres parlamentares.

As eleições vêm aí e uma turma de representantes da comunidade jurídica se candidatou para cargos legislativos, tanto na esfera federal como na estadual. Entre os candidatos a uma vaga na Câmara dos Deputados ligados à comunidade jurídica figuram o ex-juiz federal Flávio Dino (PCdoB-MA), o advogado fluminense Nehemias Gueiros (PFL-RJ), o ex-secretário de Justiça Hédio Silva Junior (PFL-SP) e o procurador de Justiça Fernando Capez.

Vêm se juntar a gente como a ex-juiza Denise Frossard (-RJ), o advogado José Eduardo Martins Cardozo (PT-SP), o ex-procurador-geral de Justiça Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), o ex-promotor de Justiça, Luiz Antonio Fleury Filho (PTB-SP) e o procurador do Estado, Michel Temer (PMDB-SP).

A eles, em caso de eleição ou reeleição, caberá tentar reverter o quadro de anti-juricidade legislativa apontado em levantamento feito pela Consultor Jurídico em 2004. A pesquisa analisou a decisão de mais de 2.200 Ações Diretas de Inconstitucionalide julgadas pelo Supremo Tribunal Federal. O resultado é estarrecedor: 82% das leis municipais, 51% das estaduais e 19% das federais foram julgadas inconstitucionais. Não que todas as demais fossem consideradas boas leis. Descontadas outras irregularidades jurídicas na confecção das leis, apenas 21% das leis federais e 10% das estaduais foram mantidas em vigor. E nenhuma muncipal.

O que fazer para impedir a aprovação desse tipo de lei? A ConJur escutou alguns dos candidatos da comunidade jurídica às Eleições de 2006 para saber o que eles pensam sobre o assunto e, se eleitos, o que pretendem fazer para combater essa prática.

Flávio Dino

Candidato a deputado federal pelo PC do B-MA., Flávio Dino foi juiz federal por mais de dez anos até pedir exoneração do cargo para concorrer às eleições. Dino também já foi presidente da Ajufe — Associação dos Juízes Federais do Brasil, entre 2000 e 2002.

Assessor da presidência do STF na presidência do ministro Nélson Jobim, Flávio Dino teve uma atuação importante tanto na aprovação da reforma do Judiciário (EC 45) quanto na implantação do Conselho Nacional de Justiça, o órgão controle externo do Judiciário.

Com a experiência acumulada na magistratura, defende um diálogo mais intenso entre o Judiciário e o Legislativo. “Muitas dessas declarações de inconstitucionalidade decorrem da ausência de conversa”, concluiu. O candidato diz que deve haver um controle prévio dos textos das leis, à luz de decisões jurisprudenciais já consolidadas.

Como candidato, pretende trabalhar para concluir a reforma processual, iniciada com o Pacto de Estado entre os chefes dos três poderes, em 2004. Pretende também elaborar o novo estatuto da Magistratura, como determinou a Emenda Constitucional 45, da reforma do Judiciário. Dino declarou que vai lançar um olhar especial à legislação penal. “É essencial uma rediscussão acerca dos contornos dos vários tipos de prescrição, por exemplo, porque são regras incompatíveis com a realidade do Judiciário brasileiro.”

Nehemias Gueiros Júnior

Candidato a deputado federal pelo PFL-RJ, o advogado Nehemias Gueiros, especialista na área de Propriedade Intelectual e tecnologia da informação, tem confiança em que a eleição de advogados, juízes e profissionais do Direito para o parlamento pode contribuir para melhorar a qualidade das leis.

“Esse altíssimo índice de inconstitucionalidade das leis brasileiras, nas esferas federal, estadual e municipal, emperra a governabilidade do país e engarrafa o Judiciário com processos que poderiam tratar de assuntos mais importantes. O descuido com a boa técnica legislativa passa a sensação de incompetência administrativa para a sociedade em geral.”

Nehemias acredita que não é apenas o legislativo que padece pela falta de bons profissionais do direito. Para ele, é necessário prestar mais atenção à advocacia, que entende estar carente de profissionais talentosos e competentes.

O principal foco da sua candidatura está ligado à sua área de atuação profissional, que é a tecnologia da informação: “A inclusão digital é ferramenta fundamental para a educação e o desenvolvimento de qualquer país”.

Hédio Silva Júnior

O advogado e ex-secretário de Justiça de São Paulo Hédio Silva Junior tem larga militância na área de direitos humanos e de defesa das minorias. Foi secretário de Justiça, coordenou a Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP.

O ex-secretário acredita que o problema da qualidade das leis é mais político-administrativo do que propriamente legislativo: “Muitas vezes o legislativo opera, lamentavelmente, para agradar o poder executivo ou para agradar a opinião pública. Antes temos que pensar até que ponto a lei vai ser útil ou terá efetividade para resolver as questões sociais.”

Hédio diz que é preciso destacar e valorizar a função da advocacia, do Ministério Público e das demais carreiras jurídicas. Ele afirma que a OAB tem de punir com extremo rigor os advogados que violam os princípios éticos da profissão. Mas, destaca que os outros advogados não podem ser desvalorizados pela atitude dos que se envolvem com o crime. Ele também vai destinar atenção à ampliação do acesso à Justiça.

Romualdo Galvão Dias

Candidato a deputado federal pelo PSDB paulista, Galvão dias trabalha há 20 anos como assessor jurídico de vereadores, deputados, prefeitos e secretários. Durante oito anos foi membro do Conselho Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, além de ter presidido a 4ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da entidade. Aos 40 anos, é a sua primeira candidatura a cargo público.

O advogado-candidato aposta no “ciberativismo” para impedir a aprovação de leis mal-feitas. Ele diz que a idéia é fazer um levantamento dos projetos de lei que interessam à classe e manter as entidades permanentemente informadas sobre o seu andamento, através de e-mail, “para que elas exerçam pressão sobre o Congresso”.

Segundo ele, muitas vezes são promulgadas leis sem que os interessados sejam chamados para a discussão. “Dependendo do momento jurídico acaba-se aprovando leis que são cinonstitucionais. Temos de ter coragem de votar contra esses projetos.” Se eleito, Galvão Dias diz que vai lutar pelo advogado, que segundo ele, está sendo tratado como empecilho para se fazer justiça, quando na verdade ele é quem pode proporcioná-la ao cidadão.

Regis Fernandes de Oliveira

O candidato à vaga de deputado federal pelo PSC-SP, Regis de Oliveira é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, professor titular da Universidade de São Paulo e sócio do escritório Regis de Oliveira, Corigliano e Beneti Advogados.

Também já foi deputado por dois anos. Na Câmara, fez parte da Comissão de Constituição e Justiça, o foro no parlamento a quem cabe controlar a adequação técnica e legal dos projetos de lei antes de sua discussão pelo plenário. Ele entende que os integrantes da CCJ devem fazer um filtro rigoroso para evitar a aprovação desse tipo de lei. Ele lembra que “o projeto de lei não pode ser considerado inconstitucional antes de ser aprovado, mas o texto pode ser rejeitado”.

Em campanha, o candidato diz que é preciso reequilibrar e estabelecer com exatidão as competências dos municípios, estados e da União. Para isso, pretende propor uma Emenda Constitucional que altere o pacto federativo, por entender que existe uma dominação do âmbito federal sobre estados e municípios. “Cria uma deturpação federativa.”

Fernando Capez

O promotor de Justiça e candidato a deputado estadual pelo PSDB acredita que um dos principais falhas de técnica legislativa ocorre por que os parlamentares desconhecem os limites de sua competência. “Com objetivos demagógicos, os candidatos prometem o que não podem cumprir e depois, como deputados, tentam atender essas promessas por meios de leis de competência municipal ou federal.”

Capez entende que cabe à Comissão de Constituição e Justiça barrar a tramitação de projetos com conteúdo fora da competência do poder legislativo em cada uma de suas esferas. O promotor defende que os parlamentares tenham o conhecimento jurídico necessário, ou disponham de assessoria especializada, para propor leis com propriedade.

Se eleito, diz que pretende especializar as delegacias. Entre outras, uma para combate à pirataria e outra para flagrantes.“Com isso, os delegados terão mais tempo para fazer investigações”, explica. Capez também quer regulamentar o que chamou de Lei de Metas Sociais, a exemplo do que já se faz em matéria tributária com a Lei de Metas Fiscais. O candidato afirma que é preciso impor metas para colocar as crianças na escola, oferecer atividades esportivas, que são “tão importantes quanto os impostos”.

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