Consentimento e liberdade

Desconfiança política alimenta litigiosidade tributária

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9 de agosto de 2006, 10h36

O secretário da Receita Federal pode virar estátua. Para tanto, basta que ele resolva os problemas de desinformação entre a Receita e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e racionalize a emissão da CND, a famigerada Certidão Negativa de Débitos que qualquer empresário precisa para fazer sua empresa funcionar. A afirmação da advogada tributarista Misabel Derzi arrancou aplausos e gargalhadas da platéia do X Congresso Nacional de Direito Tributário, que começou na noite de terça-feira (8/7) em Belo Horizonte.

O Congresso, que comemora o 40º Aniversário do Código Tributário Nacional e o 10º da Associação Brasileira de Direito Tributário, tem como tema central “Liberdade e Consentimento no Direito Tributário”. Até sexta-feira (11/8) especialistas dissertarão para a platéia de cera de 500 profissionais da área tributária as tensas relações entre quem tem por obrigação cobrar imposto e quem tem de pagar, mas não gosta.

Ao fazer a proposta de virar estátua ao secretário da Receita, que dividia a mesa com ela, a professora da Universidade Federal de Minas Gerais discorria sobre “Litigiosidade, evasão e soluções contemporâneas”. Misabel elogiava o esforço de modernização e o alto grau de informatização conseguido pela Receita, mas que nada disso era muito significativo para quem se vê diante da contingência de tirar uma reles CND. “Somos obrigados a entrar com 20 ou 30 Mandados de Segurança. Eu, como advogada, não quero ganhar dinheiro assim”.

Misabel demonstrou como a alta judicialização das questões tributárias é conseqüência, em primeiro lugar, da falta de confiança dos contribuintes no processo político. Esta desconfiança começa no próprio processo legislativo, onde Medidas Provisórias viram leis sem a mínima discussão. Passa pelos escândalos e denúncias que, segundo ela, mesmo que sejam falsas, já fizeram um estrago nas convicções democráticas dos cidadãos. “Há um claro questionamento do sistema republicano e do sistema de representação”, diz ela. “O cidadão deixa de pagar imposto não só porque não gosta , mas pela desconfiança que sente na administração pública”.

Outro fator a contribuir para a desconfiança seria a instabilidade jurídica e jurisprudencial. No primeiro caso, Misabel se referiu ao que chamou de circularidade do direito. O Legislativo faz leis tributárias que o Judiciário considera inconstitucional, mas o Fisco não se conforma com a perda de arrecadação e insiste em fazer aprovar novas leis similares às anteriores que, por isso mesmo, serão novamente declaradas inconstitucionais.

No segundo caso, lembrou que no Brasil existe o princípio da não retroatividade da Lei, mas não existe o principio da não retroatividade da jurisprudência. “Claro que a doutrina pode ser mudada, mas ela só pode ser mudada para a frente”.

Este contexto de instabilidade tributária acaba gerando situações de injustiça: “Neste quadro, o contribuinte privado sonega e os estados promovem a guerra fiscal, que é a criação de exceções e privilégios privados com dinheiro público”.

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