Liberdade negada

Delegado André Di Rissio deve continuar na prisão, decide STF

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8 de agosto de 2006, 15h04

O delegado da Polícia Civil de São Paulo, André Di Rissio, não deve responder o processo penal por crime de formação de quadrilha em liberdade. O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, negou liminar em pedido de Habeas Corpus no domingo (6/8).

Di Rissio é investigado pela Polícia Federal na Operação 14 Bis. Ele é suspeito de participar da liberação ilegal de mercadorias na alfândega do aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP).

Os advogados do delegado recorreram ao STF contra decisão do STJ, que não revogou a prisão preventiva. Eles alegam que o Habeas Corpus ajuizado no STJ demonstrou que o caso se referia às situações extraordinárias em que a Súmula 691 não tem aplicação. A Súmula dispõe que “não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de Habeas Corpus impetrado contra decisão do Relator que, em Habeas Corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar”. No mérito, a defesa pede a confirmação da revogação da prisão preventiva.

Segundo o ministro Marco Aurélio a situação não é extraordinária para inviabilizar a aplicação da súmula 691, que impede o STF de conhecer o HC. Ele também afirmou que a prisão preventiva foi decretada para que não houvesse interferência do delegado no andamento do processo, já que existe comprovação de que Di Rissio tentou interferir, antes da sua prisão, na coleta de provas.

Decisão do STJ

O ministro Francisco Peçanha Martins, do STJ, negou anteriormente o pedido de Habeas Corpus por ser manifestamente incabível. Ele ressaltou o entendimento pacífico no sentido de que só é cabível Habeas Corpus contra liminar de instâncias anteriores em casos “excepcionalíssimos”, quando manifesta a ilegalidade ou abuso de poder, o que não seria o caso.

Para o ministro, foi correta a decisão do juiz federal que considerou bem fundamentada a ordem de prisão provisória do réu, por ter sido decretada com base em “fartas provas de materialidade e autoria, para garantia da aplicação da lei penal e por conveniência da instrução criminal”.

Leia a íntegra da decisão:

HABEAS CORPUS 89.372-4 SÃO PAULO

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

PACIENTE(S): ANDRÉ LUIZ MARTINS DI RISSIO BARBOSA

IMPETRANTE(S): ANTÔNIO CLÁUDIO MARIZ DE OLIVEIRA E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): VICE-PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DECISÃO

HABEAS CORPUS – IMPETRAÇÕES SUCESSIVAS – INDEFERIMENTO DE MEDIDA ACAUTELADORA – VERBETE Nº 691 DA SÚMULA DO SUPREMO – EXCEPCIONALIDADE NÃO VERIFICADA – LIMINAR INDEFERIDA.

1.Na inicial de folha 1 a 23, os impetrantes apontam a erronia do ato atacado, por meio do qual o pedido de concessão de medida acauteladora não restou acolhido. Asseveram a impropriedade das premissas do decreto de prisão preventiva, afirmando que o paciente foi denunciado pelo crime do artigo 288 do Código Penal e, então, ainda que assentada a culpa, existe a possibilidade de suspensão condicional do processo ou, no mínimo, de ter-se regime de cumprimento menos gravoso que os parâmetros concernentes à preventiva. Buscam demonstrar o perfil do paciente – delegado de polícia, com cursos de pós-graduação, e presidente da associação que congrega a categoria. Dizem que o relaxamento da prisão já tarda, impondo-se providência em tal sentido nesta derradeira instância, vindo-se, alfim, a deferir a ordem para confirmar-se a liminar. Juntaram os documentos de folha 25 a 200.

2.Valho-me do que tenho consignado a respeito da necessária compatibilização do Verbete nº 691 da Súmula do Supremo com a ordem jurídica constitucional:

O habeas corpus, de envergadura constitucional, não sofre qualquer peia. Desafia-o quadro a revelar constrangimento ilegal à liberdade de ir e vir do cidadão. Na pirâmide das normas jurídicas, situa-se a Carta Federal e assim há de ser observada. Conforme tenho proclamado, o Verbete nº 691 da Súmula desta Corte não pode ser levado às últimas conseqüências. Nele está contemplada implicitamente a possibilidade, em situação excepcional, de se admitir a impetração contra ato que haja resultado no indeferimento de medida acauteladora em idêntica medida – Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 84.014-1/MG, por mim relatado na Primeira Turma e cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 25 de junho de 2004. É esse o enfoque que torna o citado verbete compatível com o Diploma Maior, não cabendo extremar o que nele se contém, a ponto de se obstaculizar o próprio acesso ao Judiciário, a órgão que se mostre, dados os patamares do Judiciário, em situação superior e passível de ser alcançado na seqüência da prática de atos judiciais para a preservação de certo direito.

Ocorre que a situação não viabiliza o afastamento do verbete, concedendo-se a liminar e antecipando-se o relator, ao atuar como porta-voz do Colegiado, a este último. Houvesse apenas a alusão à possibilidade de interferência do paciente na tramitação do processo, presente a coleta de provas, e a menção à ordem pública, em termos de crimes já praticados, ter-se-ia base para o relaxamento da prisão. Acontece que o ato formalizado – e que desaguou na perda da liberdade de ir e vir do paciente – contém o registro de fatos que iniludivelmente o fundamentam, consoante dispõe o artigo 312 do Código de Processo Penal. Há, à folha 54, referência a comunicação entre certo banco e o paciente, objetivando obstaculizar o encaminhamento de extratos, e também a conversa entre o paciente e advogado de revendedora de carros sobre como deveria esta proceder na resposta a ofício de delegado de polícia que conduzia o inquérito. O paciente teria instruído a empresa para não enviar a lista de clientes requerida pela Polícia Federal. É certo que justificara o pedido a partir da óptica de que poderia ser extorquida. Mas tal justificativa se mostrou das mais ingênuas, no que alicerçada no extravagante, no excepcional, no teratológico – a ação da Polícia Federal à margem da ordem jurídica.

Em síntese, neste primeiro passo, não há como implementar a providência, sendo que a base da preventiva afasta o que articulado quanto ao regime de cumprimento da pena e à possibilidade de vir o Ministério Público a propor a suspensão do processo, o que, aliás, não ocorreu, quando da formalização da denúncia (folha 58 a 95).

3. Indefiro a liminar.

4. Estando no processo as peças indispensáveis à compreensão do tema, colham o parecer da Procuradoria Geral da República.

5.Publiquem.

Brasília, 6 de agosto de 2006.

Ministro MARCO AURÉLIO

Relator

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