Equilíbrio das relações

Código de defesa do contribuinte aumentaria eficácia tributária

Autores

  • Roberto Carlos dos Santos

    é técnico da Receita Federal.

  • Leandro Tripodi

    é doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) mestrando em Administração Pública e especialista em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) professor de Direito Tributário do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e analista tributário da Receita Federal do Brasil.

23 de abril de 2006, 7h00

É fácil constatar, analisando superficialmente a história, o quanto as idéias verdadeiramente inovadoras, em qualquer ramo do conhecimento, costumam ser vítimas de temores, resistências e preconceitos. Por mais geniais que possam ser, seus criadores geralmente não escapam à descrença.

Olhando especificamente para o Direito, lembramos as pesadas críticas que atingiram o Código de Defesa do Consumidor, não só enquanto tramitava como projeto de lei, mas também durante a fase de sua implantação prática. Hoje, é consagrado perante especialistas e a opinião pública.

Com a apresentação ao Senado, em 1999, do Projeto de Lei Complementar 646, o senador Jorge Bornhausen (PFL-SC) propôs, ao Congresso Nacional e à sociedade brasileira, a aprovação de um código de direitos e garantias do cidadão no âmbito de suas relações tributárias com o Estado (o chamado Código de Defesa do Contribuinte). Certamente, pode-se enxergá-lo, dentro de seu campo de aplicação, como de inspiração análoga à do Código de Defesa do Consumidor.

Porém, os avançados ideais do texto, concebido por um grupo de juristas de inquestionável reputação acadêmica, não foram bem recebidos, embora a iniciativa já contasse com similares na Espanha e nos Estados Unidos, países em que a legislação que protege o contribuinte foi codificada, e em outros nos quais leis esparsas perseguem o mesmo objetivo, incluindo a França, a Austrália e o Canadá.

Hoje, é impossível não defender que a promulgação de um código de defesa do contribuinte, em virtude de sua própria essência e de seus objetivos, impulsionaria um aumento da eficiência da máquina administrativa, respondendo à atual carência de maior agilidade. Além dos benefícios, tais avanços trariam maiores responsabilidades para gestores e servidores públicos.

Embora não declarados, supõe-se que foram temores relacionados ao aumento das exigências de desempenho que acarretaram a ojeriza corporativa ao projeto. Um movimento composto por entidades representativas de servidores da área procurou barrar o andamento daquele, por meio de expedientes pautados pela ausência de tecnicidade e de isenção na abordagem ao assunto.

A alegação de que o projeto de lei propiciaria brechas para a postergação e a evasão do cumprimento de obrigações tributárias foi acompanhada de alcunhas pejorativas. Ora, se tais críticas fossem respaldadas no bom-senso e em argumentos técnico-científicos, não haveria razão para se defender o arquivamento da proposta. Bastaria discutir alternativas de redação para que o texto melhor pudesse ser aplicado e interpretado, o que incluiria a definição de deveres do contribuinte.

De fato, ao lado do resguardo dos direitos e garantias do contribuinte, deve estar a preocupação com a integridade do sistema tributário, uma vez que sua fragilização não implica aumento da liberdade individual, mas, ao contrário, tende a acentuar a carga de impostos sobre todos.

Como requisito essencial para o sucesso do código, por outro lado, as estruturas administrativas devem ser corretamente adequadas à nova realidade. Caso contrário, criar-se-ia espaço para o uso político das medidas de responsabilização funcional contidas no texto.

Por meio do debate desapaixonado e técnico, o texto do projeto de lei complementar apresentado pelo senador Bornhausen pode adquirir contornos mais consensuais para todos os interessados em sua discussão. Isso, certamente, viabilizará os apoios necessários à sua aprovação. Não há outro caminho a ser perseguido se o que se deseja é respeitar as exigências do processo democrático inerente ao Estado de Direito, e os que se negarem a assim proceder correm o risco de darem mãos com os inquisidores de Galileu Galilei.

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