Crítica às autoridades

Ex-presidente da OAB critica presidente Lula e Fernando Henrique

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17 de abril de 2006, 19h33

Reginaldo Oscar de Castro, ex-presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, criticou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, nesta segunda-feira (17/4).O ex-presidente da OAB citou textualmente os governantes, como autoridades que se socorreram da entidade por considerá-la parceira importante na luta democrática ou contra perseguições políticas e que, após assumir o governo, a criticaram. “No Brasil, o governo (qualquer um deles) parece estar sempre em oposição ao Estado Democrático de Direito.”, alerta o ex-presidente da OAB.

Castro reafirmou as observações que apresentou ao ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, na visita que ele fez ao Conselho Federal da OAB no último dia 4. Na ocasião, Castro salientou que todas as vezes que Lula tinha, como candidato, qualquer problema com o governo estabelecido, ele procurava a solidariedade da entidade e, no entanto, “hoje, eu sei que ele dedica à Ordem uma animosidade incrível.”

Leia a íntegra das declarações do ex-presidente nacional da OAB

“Gostaria de passar ao ministro Tarso Genro a minha experiência de ex-presidente do Conselho Federal da OAB. E o que custa a todos nós que por aqui passamos, em relação aos governos com os quais convivemos. Todos, sem exceção, ministro, nos vêem, no dia seguinte à posse, como inimigos.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na minha gestão como presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (2000 a 2003), todas as vezes que tinha qualquer problema com o governo, com o Poder estabelecido na época, aonde ele ia em primeiro lugar? Ele vinha à Ordem dos Advogados. E sempre encontrou aqui não um colega de partido, mas aquele que é o presidente da Ordem, aquele que, na verdade, pretende o aperfeiçoamento das instituições jurídicas e a defesa do Estado Democrático de Direito.

No Brasil, o governo (qualquer um deles) parece estar sempre em oposição ao Estado Democrático de Direito. No início do meu mandato era acusado por ter atuado profissionalmente como advogado do então presidente Fernando Henrique Cardoso. No final do meu mandato acabei como inimigo mortal do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Pois bem, agora eu diria que isto tem que ser bem compreendido e, aproveitando a sua passagem por este cargo tão relevante, gostaria que Vossa Excelência levasse essa mensagem ao presidente Lula: A Ordem dos Advogados está, hoje, no Brasil, tentando desempenhar um papel que decorre da ausência e da falência completa da representação popular neste país.

Vossa Excelência sabe bem que os sindicatos praticamente não existem mais. Os partidos políticos são meros ambientes que servem aos políticos no momento eleitoral, escolhem os partidos simplesmente por tempo de televisão, por facilidade de ganharem suas respectivas convenções, por conveniências das coligações partidárias, mas jamais pelo programa partidário que duvido muito que qualquer deputado ou senador deste país, seja no nível que for, conheça o programa do seu partido.

Não há representação popular, pois, neste país o Congresso legisla em causa própria, ou em obediência ao governo. Não há defesa da sociedade em nenhuma esfera do Brasil.

No exterior não entendem porque a Ordem dos Advogados tem tanto poder. É fácil de explicar: Porque abandonamos os interesses corporativos e discutimos questões políticas. Eles não entendem isso porque no resto do mundo isso, pelo menos no mundo dito civilizado, isso não existe, porque eles têm a representação política e têm os órgãos sindicais que funcionam. Eles têm a pressão do eleitorado. E aqui, no Brasil, estamos nos ressentindo desse lado fundamental à existência de uma República, de uma democracia.

E a Ordem está, portanto, neste papel permanentemente, de dar voz a essa angústia do povo brasileiro, porque aqui o senhor tem representantes de todos os rincões deste país. O senhor sabe bem, de todos os partidos, de todas as classes sociais, quer dizer, não há extrato mais qualificado, no Brasil, penso eu, para dar voz a esse pensamento do povo brasileiro do que este aqui.

E os governos brasileiros nos jogam na faixa dos inimigos, permanentemente, porque acham que a Ordem deve aplaudir. A Ordem nunca aplaude ninguém. O seu silêncio já é um aplauso. Temos que criticar mesmo. Sem crítica, para que existir a Ordem? Porque nós estaríamos aqui reunidos, se viemos aqui apenas aplaudir? A Ordem tem que criticar para cumprir, como o senhor disse bem, a finalidade precípua dela que é, exatamente, defender o Estado Democrático de Direito, a justiça social, a boa aplicação das leis, o aperfeiçoamento das instituições.

Sei perfeitamente que o senhor pensa assim. Aplaudo com todas as minhas forças, a sua coragem, o seu descortino, a sua grandeza de ter vindo aqui nos visitar na sede do Conselho Federal. Talvez tenha sido a primeira vez que num momento deste uma pessoa que ocupa a posição que o senhor ocupa venha à Ordem dos Advogados estabelecer esse diálogo.

Portanto, o senhor tenha o meu aplauso. Agora, penso que é necessário que o governo entenda que a Ordem vai criticá-lo, sim, mas sempre na intenção de buscar um aperfeiçoamento, um diálogo. O presidente Lula, hoje, eu sei que dedica à Ordem uma animosidade incrível. Eu sei disso. Conheço essa realidade. E isso é injusto, porque ele teve na Ordem todo o apoio que precisou, durante a sua caminhada para a Presidência da República. É preciso que ele se lembre disto, é preciso que ele tenha na Ordem a confiança que os homens públicos do Brasil devem ter. Ninguém aqui está querendo, enfim, causar nenhum mal a quem quer que seja. Nós queremos, sim, causar um bem ao Brasil.

Muito obrigado.”

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