Aposentadoria parlamentar

Parlamentar cassado não pode ser compensado com aposentadoria

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17 de abril de 2006, 18h50

No fim de 2005, o Tribunal de Contas da União manifestou seu entendimento sobre a representação formulada pelo Ministério Público Especial, questionando possíveis irregularidades na concessão de aposentadorias, à custa do erário público, a parlamentares que, supostamente, praticaram atos incompatíveis com a ética e moralidade públicas.

O Ministério Público, junto àquela alta corte de contas, afirma que as condutas praticadas pelos parlamentares implicados indicam que estes, independentemente do cumprimento das exigências legais extrínsecas, não fazem jus a qualquer espécie de aposentadoria custeada pelos cofres públicos. Assim, conclui que a negativa da concessão de aposentadoria a parlamentares cassados e a anulação das que já tenham sido concedidas representariam a aplicação de medidas retributivas em resposta ao não atendimento de prescrições constitucionais, entre elas, as guiadas pelos princípios da moralidade e da legalidade.

A passagem à inatividade remunerada daqueles que perdem o seu mandato eletivo ou, na iminência da perda, renunciam ao mesmo é incompatível com as regras morais que deveriam reger a vida profissional dos que se investem em qualquer cargo, emprego ou função pública, sejam eles de natureza efetiva ou transitória.

O contra-argumento de que houve efetiva contribuição para o gozo de tal benefício se revela frágil, pois a cassação é medida condenatória e não deve gerar nenhum efeito compensatório, tal como ocorre com a antecipada concessão de aposentadoria ao que sofre a respectiva sanção. Do mesmo modo, a renúncia ao mandato eletivo deve ser encarada como uma renúncia tácita aos direitos dele decorrentes, estando incluída aí a própria aposentadoria.

O vínculo entre a administração pública e o servidor público é, por disposição legal, pressuposto lógico para a concessão da aposentadoria. Por analogia, a concessão de aposentadoria voluntária em regime próprio deve exigir como requisito indispensável que o parlamentar esteja vinculado à Câmara ou ao Senado, devendo-se aplicar ao detentor de cargo eletivo o mesmo raciocínio utilizado ao detentor de cargo efetivo, pois onde há a mesma razão, deve haver a mesma disposição legal.

Com esta visão, o TCU enfrentou de forma contundente um importante tema que, além dos aspectos puramente jurídicos, envolve a proteção e aplicação de conceitos principiológicos elementares relativos à moral e à ética. A decisão liminar contida no Acórdão 1.877/05 concluiu pela inadmissibilidade de os políticos cassados, após o devido processo legal, serem premiados com aposentadorias precoces e privilegiadas.

Neste delicado momento de profunda crise de valores vivenciada no Brasil — cujo apogeu deu-se com o inusitado e desagradável espetáculo de desrespeito ao eleitor após a nauseabunda coreografia transmitida em rede nacional — só nos resta aguardar a decisão final do Tribunal de Contas da União e o julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República. Afinal, a sociedade clama pela credibilidade nas instituições públicas.

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