Novo comando

Raphael de Barros Monteiro Filho assume a presidência do STJ

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5 de abril de 2006, 17h50

Dificultar a subida de recursos e não aumentar o número de ministros do Superior Tribunal de Justiça. Esta é, na opinião do novo presidente do Superior de Justiça, Raphael de Barros Monteiro Filho, uma das alternativas para enfrentar o congestionamento de processos naquela corte.

Momentos antes de sua posse na presidência do STJ, na tarde desta quarta-feira, Barros Monteiro concedeu entrevista coletiva na qual defendeu maior seletividade na pauta de recursos.”O STJ não tem de ser uma terceira instância. É preciso desenvolver mecanismos para que subam ao STJ apenas os processos de interesse geral da sociedade”, afirmou o novo presidente. Também nesta quarta-feira (5/4), tomou posse na vice-presidência do STJ o ministro Francisco Peçanha Martins.

Barros Monteiro Filho lembrou que a Proposta de Emenda Constitucional 358-A prevê a súmula impeditiva de recursos e a possibilidade de alterar os critérios de admissibilidade de recursos em lei ordinária, o que trará maior celeridade às mudanças. A súmula impeditiva, como o próprio nome diz, impede que o juiz aceite recurso contra decisão que estiver em conformidade com matéria sumulada pelo STJ ou pelo Supremo Tribunal Federal. A PEC, depois de passar pelo Senado, tramita agora na Câmara.

O novo presidente do STJ acredita também que, em razão do caráter do Tribunal, de exame de matéria de Direito, o formalismo é necessário. Sustenta que o formalismo deve ser respeitado para que o Tribunal possa cumprir o seu papel, inclusive devido ao elevado volume de processos que a Corte enfrenta.

Perguntado sobre a conveniência de se manter o tom mais político e aberto no tribunal, imprimido por seu antecessor no cargo, Edson Vidigal, Barros Monteiro Filho afirmou que não vai conferir nenhum tom político à administração e sim o contrário. “Já tenho dito que me dedicarei mais à Administração de interesse interno da Corte”.

De pai para filho

O pai do novo presidente do STJ, Raphael de Barros Monteiro, foi ministro do Supremo Tribunal Federal. Seu tio, Washington de Barros Monteiro foi um mais célebres professores de Direito da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. O ministro é o segundo paulista a ocupar o cargo de presidente do STJ (diferentemente de informação publicada pelo Consultor Jurídico, que afirmou ser ele o primeiro paulista a ocupar o cargo). O primeiro foi o ministro Romildo Bueno de Souza, entre 1995 e 1997.

Barros Monteiro Filho entrou para a magistratura em 1965, como juiz substituto em Santos (SP). Foi promovido para a primeira entrância em Paulo de Faria, no interior paulista, no ano seguinte. Tornou-se juiz do extinto Tribunal de Alçada Criminal (Tacrim-SP) em 1979 e desembargador do Tribunal de Justiça em 1983. Em maio de 1989, foi nomeado para o recém-criado STJ onde presidiu a 4ª Turma e a 2ª Seção.

Ultimamente ele ocupava o cargo de vice-presidente, após a aposentadoria do ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. O ministro foi membro do Tribunal Superior Eleitoral, corregedor-geral da Justiça Federal, diretor da Escola Judiciária Eleitoral e da Revista Eletrônica de Jurisprudência do Tribunal.

Juiz por vocação, o ministro Raphael de Barros Monteiro Filho chega à Presidência do Superior Tribunal de Justiça com a experiência de mais de 40 anos de magistratura, numa conduta de técnica e dedicação.

Leia o discurso de posse de Barros Monteiro.

Exmo. Sr. Presidente do Colendo Supremo Tribunal Federal,

Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal,

Exmo. Sr. Vice-Presidente da República,

Reúne-se hoje o Superior Tribunal de Justiça para empossar o Presidente e Vice-Presidente há pouco eleitos. Embora seja um dia festivo, pairam graves preocupações acerca do futuro da Magistratura brasileira.

É sabido que, sem instituições políticas sólidas e confiáveis, não há sustentação ao Estado Democrático de Direito. Perenes e fortes, como devem ser, constituem elas a garantia da liberdade individual e da efetiva tutela dos direitos humanos. Cumpre, pois, defendê-las, valorizá-las e aprimorá-las a todo o tempo, de modo a que cumpram a missão constitucional para a qual foram criadas, independentemente das pessoas que passem a integrá-las. Bem assinala o escritor e jornalista Luiz Felipe D’Ávila, em recente obra, que “o desenvolvimento gradual das instituições é o único meio de fortalecer a democracia e preservar a liberdade”.

Fortes embora, as instituições políticas nacionais passam nos dias atuais por uma crise geral de credibilidade, que pode e deve ser banida a todo custo, mediante o necessário resgate do respeito à Lei e ao Direito. Consoante já teve ocasião de observar o Ministro Antônio de Pádua Ribeiro em um de seus inúmeros trabalhos, reportando-se a ensinamento de Norberto Bobbio: “numa república democrática, o governo é das leis e não dos homens”.


Como a crise é do Estado, dela não fica isento o Poder Judiciário que, no entanto, reconhecendo as deficiências existentes, está sendo o primeiro a remodelar-se e a adequar-se às exigências dos novos tempos.

Gradativamente, com uma administração austera e eficiente, hoje coordenada e orientada pelo Conselho Nacional de Justiça, os órgãos do Poder Judiciário terão condições de, em breve, atingir a meta de prestar a jurisdição de forma mais ágil, transparente e eficaz.

Para tanto, é preciso que se modifique a cultura existente no País que tolhe a celeridade processual e empece a pronta solução dos litígios. Ao compromisso com a ética, em verdade, devem concorrer todos os que participam da administração da Justiça, os Juízes, os representantes do Ministério Público e os Advogados.

É consenso que a maior dificuldade na rápida tramitação dos feitos se encontra na primeira instância. Para ela devem dirigir-se os olhos da Nação, que está sempre a clamar contra a demora na solução das lides. Não é somente o incremento das tecnologias modernas, entre elas a da informática, que deve ser promovido. Penso, sobretudo, que o Magistrado deve efetivamente residir na Comarca de que é titular. Somente assim terá condições de conduzir, orientar e fiscalizar os serviços prestados pelos Auxiliares da Justiça, nem sempre qualificados e em número suficiente. De outro lado, como bem observou o Conselheiro Joaquim Falcão, membro do Conselho Nacional de Justiça, a solução dos problemas do Poder Judiciário só em parte depende do Juiz: as partes fazem uso abusivo dos recursos, muitas vezes com a conhecida estratégia procrastinadora. Isso faz com que os feitos vão progressivamente acumulando-se, emperrando a já lenta máquina judiciária.

“O tempo é um inimigo do direito, contra o qual o juiz deve travar uma batalha sem tréguas”, escreveu o notável Francesco Carnelutti. Não é por isso, porém, que se vá decidir açodadamente os litígios, sem nenhuma consideração em torno da qualidade das sentenças. A par da necessidade de estudar-se com seriedade o processo, há que se obedecer ao devido processo legal e, bem assim, aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Tudo isso determina e impõe a dilação temporal dos processos, mormente os de natureza mais complexa.

O Superior Tribunal de Justiça nesse particular enfrenta, como se sabe, o problema do volume excessivo de feitos submetidos a seu crivo, a despeito dos esforços que os seus Ministros têm desenvolvido para atender à demanda. A Corte registra o ingresso em sua Secretaria neste ano de 2006, até o momento, em média, novecentos e dez processos por dia, enquanto no ano anterior, no mesmo período, a média era de seiscentos e noventa.

Os números são ascendentes: em 2003, foram julgados pelo Tribunal 216.999 feitos; em 2004, 241.309 e, em 2005, 271.428.

Achavam-se pendentes de julgamento, em 28 de fevereiro do corrente ano, 124.193 processos, aos quais devem ser acrescentados aqueles ainda não distribuídos (19.903), perfazendo um total de 144.096.

Como se vê, se o Tribunal não chegou à inviabilização, dela está perto.

Por isso, aguarda-se dos demais Poderes da República, em especial, da Câmara dos Deputados, sempre receptiva às justas postulações do Poder Judiciário, que promova a célere tramitação da Proposta de Emenda Constitucional n. 358-A.

Advertia o saudoso Ministro Victor Nunes Leal que o Supremo Tribunal Federal não é uma terceira instância que deva julgar de novo as mesmas questões decididas pelos outros.

O mesmo é de ser dito em relação ao Superior Tribunal de Justiça, nos dias atuais.

Em situação normal, às partes faculta-se o duplo grau de jurisdição. A análise da prova, o exame das questões de fato acham-se adstritos às Cortes de Justiça locais. O recurso especial deve ser, como o seu nome está a indicar, admitido apenas em hipóteses excepcionais, quando, excedente ao interesse privado partes, for necessário o pronunciamento deste Tribunal Superior, dada a relevância jurídica da matéria discutida e o conseqüente interesse geral para a sociedade.

É preciso, de maneira urgente, que o legislador defina em que casos o recurso especial deve ser admitido e processado. Há necessidade imperiosa de um filtro seletivo adequado, a fim de que os Julgadores desta Casa não se percam no universo de causas destituídas de qualquer importância.

Evoco, a propósito, as palavras proferidas pelo Ministro Waldemar Zveiter em trabalho publicado sob o título “O Superior Tribunal de Justiça e o Federalismo Nacional”:

“Afigura-se ter ficado clara a razão preponderante pela qual, sob a ótica que sustento, na verdade, em nosso país o Sistema Federativo nacional, instituído com a República, não se tem feito presente no que diz com o Poder Judiciário, repita-se, pela constante preocupação, inclusive das elites dirigentes, como resulta das discussões referidas quanto ao dualismo do Judiciário, com a indevida ingerência do Poder Político, mesmo que eventual, dotando o legislador as partes de instrumentos recursais que lhes propiciem levar as causas à apreciação das Cortes Supremas, cuja missão, como visto, não é decidi-las, senão que dizer o direito, seja constitucional ou infraconstitucional, na prevalência da tutela do interesse público, geral do Estado, sobre os interesses dos litigantes.


Esse temor, reconheça-se justificável pelo processo histórico de nossa formação cultural, hoje não pode mais constituir óbice a que se pratique o federalismo no Judiciário, contemplando-se os Tribunais locais como instâncias máximas para compor o litígio entre os interessados, reservando-se ao STJ sua função precípua, como Corte Superior, nacional, de superposição, de dizer o direito federal quando presente acima dos interesses dos litigantes o interesse público e geral que deva ser preservado ou aplicado”.

Carecem de análise urgente da Câmara dos Deputados:

a) a possibilidade de a lei estabelecer os casos de admissibilidade do recurso especial;

b) a criação de súmula impeditiva de recurso, quando contrariar súmula aprovada pelo STJ.

Trata-se de providências necessárias para obstar a massificação dos recursos, que impede o desenvolvimento normal dos julgamentos nesta Casa, perdida que fica em meio ao volume gigantesco de processos. Atende-se, de outro lado, aos princípios da segurança jurídica e da efetividade do processo, uma vez que, em assim sendo, terá a Corte como examinar cada uma das questões relevantes que lhe são apresentadas.

Devo reproduzir aqui o alerta que Ministros deste Tribunal têm feito a respeito de uma das proposições insertas na referida PEC 358-A. Diz com a sugestão de admitir-se também o recurso especial interposto no STJ quando a decisão recorrida contrariar dispositivo constitucional.

O STJ foi criado pelo legislador constituinte para exercer a guarda e o controle do ordenamento jurídico infraconstitucional, permanecendo o Supremo Tribunal Federal, de outro lado, sobretudo como o guardião da Constituição Federal.

Assim deve continuar, pois, do contrário, o STJ estará definitivamente destinado a ser um Tribunal meramente de passagem, sem dar cabo de seu acervo de processos e, certamente, cumulando o Supremo de maiores encargos.

Senhoras e Senhores,

Este é um dia festivo e memorável, tanto para mim como para o Ministro Francisco Peçanha Martins.

O novo Vice-Presidente da Corte colou grau na Faculdade de Direito da Bahia, tendo participado intensamente da vida política universitária, de cujas passagens se lembra com freqüência e entusiasmo em suas conversas com os colegas, amenas e agradáveis. Mantenho com o Ministro Francisco Peçanha Martins estreitos laços de amizade, de vizinhança, e por que não dizer de afinidade de pensamentos, a despeito de algumas divergências que costumeiramente ocorrem nos julgados do dia-a-dia. Oriundo da advocacia, S. Exa. tem prestado relevante contribuição para o aperfeiçoamento das decisões tomadas pelo Tribunal, transmitindo a certeza de que continuará agora colaborando, no novo cargo, não somente para a pronta e justa solução dos litígios, mas também na administração da casa e do “Programa de Assistência aos Servidores do Superior Tribunal de Justiça – Pró-Ser”.

Há, como não poderia deixar de ser, inúmeros desafios à frente da novel administração, que não se cingem à mera supervisão e fiscalização. Exigirão empenho e dedicação a instalação da “Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados” (a “ENFAN”); a construção da sede da referida Escola e do Conselho da Justiça Federal; a projetada edificação de uma creche em prol dos servidores da Casa; a atualização do Regimento Interno; o aperfeiçoamento e modernização dos serviços prestados aos jurisdicionados e usuários, sobretudo em relação à informática; a simplificação e racionalização de procedimentos; a ação conjunta com outros órgãos e instituições; a capacitação e estímulo aos servidores; o intercâmbio de dados processuais em meio eletrônico entre os órgãos do Poder Judiciário; o necessário canal de comunicação com os Tribunais Estaduais e Regionais; a intimação “on line”; o uso da certificação judicial; o protocolo postal integrado; a agilização dos atos de cooperação jurídica internacional etc, sem prejuízo de outros projetos que já se encontram em andamento.

De outro lado, não posso, nesta hora, deixar de prestar a justa homenagem ao nosso ilustre colega, o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, recentemente aposentado como Vice-Presidente do Tribunal. Convivi com S. Exa. por longos anos, quando ambos exercemos a judicatura como membros da Quarta Turma da Corte. Nesse período todo aprendi a admirar o talento de S. Exa., a dedicação ao trabalho e a sua disposição para desempenhar, ao mesmo tempo, inúmeras atividades, como as de professor, escritor, palestrante, e outras, sem esquecer uma de suas principais vocações, que é a de cuidar da formação e aperfeiçoamento de nossos Juízes.

Permitam-se, Senhoras e Senhores, concluir para manifestar os meus agradecimentos:

Às Senhoras Ministras e Senhores Ministros que sufragaram o meu nome na eleição há pouco realizada, depositando em mim a confiança, à qual procurarei corresponder da melhor maneira possível;

Aos oradores de hoje, Ministro Humberto Gomes de Barros, Subprocurador-Geral da República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, e ao Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Roberto Antônio Busato, cujas palavras me cativaram, fruto, porém, da generosidade e da bondade de Suas Excelências;

Aos Srs. Servidores da Casa, cuja proficiência em suas atividades é por todos reconhecida;

Aos parentes e amigos que vieram abrilhantar esta cerimônia, muitos deslocando-se de lugares longínquos e deixando as suas ocupações habituais;

À “Associação Paulista de Magistrados”, da qual sou associado desde o ingresso na Magistratura há quase quarenta e um anos; à Associação dos Magistrados Brasileiros” e à “Associação dos Juízes Federais do Brasil”, de que também sou sócio há anos, todas elas sempre presentes e solidárias;

Aos meus pais, Raphael de Barros Monteiro, Ministro do Supremo Tribunal, falecido, a quem procurei ter por modelo, como tenho feito até hoje, na vida pessoal e profissional, e Marina Vieira de Moraes de Barros Monteiro, a quem devo a minha criação e formação, ambos aqui representados pelos meus irmãos Ralpho Waldo, Ronaldo e Ruy Carlos, com quem compartilho, porque co-partícipes da minha carreira de Magistrado, o júbilo por esta investidura.

À minha mulher, Maria Auxiliadora, companheira de todas as horas, que permaneceu sempre à retaguarda, cuidando da família, para que pudesse eu dedicar-me quase que exclusivamente ao exercício profissional; às queridas filhas Anna Luísa e Flávia Marina, e à neta Lia, alegrias do nosso viver. Esta solenidade volta a reunir a família, em Brasília, quase dezessete anos depois da minha chegada ao Tribunal, o que é motivo também de lembranças e comemorações.

Senhoras e Senhoras, o Superior Tribunal de Justiça é, na realidade, o Tribunal da convergência nacional, seja porque para cá aportam as causas comuns dos cidadãos brasileiros, seja porque é integrado por Juízes dos Tribunais Federais, por Desembargadores dos Tribunais de Justiça, por membros do Ministério Público e Advogados, oriundos de todas as regiões do País. Com a união de todos e acreditando na supremacia dos valores fundamentais, como a liberdade, a ética e a transparência, o STJ não só estará cumprindo a sua precípua missão constitucional, como ainda mantendo o seu prestígio como instituição do Poder Judiciário.

Muito obrigado a todos.

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