O vendaval Francenildo

O Estado precisa privatizar a Caixa Econômica Federal

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3 de abril de 2006, 19h44

Desde há muito, a nação brasileira tem sido enfastiada com o bordão “Vem pra Caixa você também. Vem!”, que compõe a propaganda oficial da Caixa Econômica Federal, empresa pública do ramo dos negócios financeiros e sem capital aberto.

Efetivamente, muitos têm empreendido verdadeira profissão de fé nos objetivos da instituição como fomentadora dos negócios financeiros, sobretudo das camadas menos favorecidas, mesmo quando dissuadidas de políticas públicas mal conduzidas no grosso assim como no varejo do gerenciamento dos inúmeros negócios sugeridos como os que decorrem do Sistema Financeiro da Habitação e da atividade lotérica sob monopólio do Estado, por exemplo.

A enormidade de causas judiciais oriundas desses cenários agrava o quadro de morosidade crônica da administração da Justiça no Brasil, agudizando-lhe as estatísticas mais perversas, e revela — o que é bem pior — um cenário de persistentes hipossuficiências e desigualdades pelas quais a sociedade brasileira vem atravessando sem solução de continuidade e que, nada obstante a propaganda oficial, faz recrudescer, ilusoriamente, o sonho de redenção econômica de muitos.

Acontece que o “vendaval Francenildo” — o indefectível caseiro de Brasília — sepultou inteiramente o que havia de social nos propósitos da referida empresa pública. Com efeito, a julgar como verdadeiros os fatos articulados amplamente pela imprensa nacional e, sobretudo, os passos daqueles personagens envolvidos na cena política do momento, não será difícil estabelecer o juízo segundo o qual a Caixa deixou de servir às suas finalidades institucionais específicas para servir de pano de fundo às abjeções do meio partidário.

Como terá sido possível às instâncias de direção central da instituição, mediante o decidido apoio de maus funcionários, sectários e incapazes de responder com um sonoro não às invectivas dos poderosos, abrir — sem figura e forma legais — a intimidade dos ativos de correntista humilde? Qual a segurança que se pode antever da propaganda oficial difundida em larga escala no que se refere às economias do povo diante desse quadro absurdo? Que diferencial de qualidade pode ser revelado em relação às entidades de natureza privada diante de um episódio desestabilizador de tal magnitude?

Ao que parece, os males formativos da sociedade brasileira não ficam afastados em razão da componente pública de suas instituições. Sendo assim, por que insistir com que a Caixa mantenha a natureza de empresa pública de fomento financeiro? O Estado não deveria estar ocupado com outros intentos mais imediatos e urgentes como a segurança pública, a prestação dos serviços de saúde e, sobretudo, a educação de qualidade para todos?

Além do mais e ao lado de um quadro de hipossuficiências operacionais, objetivamente revelado pelo exagerado quantitativo dos litígios dessa proveniência e nem sempre dissimulados ante a estética das rotinas procedimentais, cênicas e das carreiras intestinas, é evidente que, na compreensão do que é historicamente inadequado na sociedade brasileira, sempre sucede o óbvio da etiologia tupiniquim: o corporativismo!

Vencer, portanto, a gana corporativista do meio economiário parece de fato o próximo passo no sentido de erradicar ou restringir os enredos de fantasia em que o povo se acha igualmente envolvido, também na perspectiva de seus negócios financeiros e privados.

Desse modo, é melhor que se desconstitua, de lege ferenda, a Caixa Econômica Federal como agência pública de fomento para conferir-lhe a natureza privada com a qual poderá concorrer em igualdade de condições no mercado financeiro, sem riscos de impurezas do iguais àquela que levou o infeliz caseiro de Brasília a ter sua intimidade exposta, desnecessariamente, à mídia. Dado que a instituição, doravante, passa a sujeitar-se às mesmas rotinas de controle e repressão a episódios da espécie sobre os quais jamais se insinuem relações incestuosas no âmbito de uma só e única estrutura de poder.

Portanto, eliminar a visão de rede pública no gerenciamento dos negócios essencialmente privados é a lição que se extrai desse episódio para que o Estado se requalifique, à luz de um regime moral universal, como instância fiscal harmonizadora das relações sociais, jurídicas e políticas. Também como fonte de normatização e gestão de governo, e nunca como operador substitutivo da atividade privada.

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