Referendo desarmado

Desarmamento: sim, com razão, mas sem passionalismo

Autor

  • Lélio Braga Calhau

    é promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Pós-graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha) mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ). Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce.

28 de setembro de 2005, 15h15

Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais.

Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha).

Mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ).

Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce (UNIVALE).

Presidente da seção mineira da Sociedade Brasileira de Vitimologia

Sou favorável ao voto da proibição do comércio de armas no Brasil. Avalio que o desarmamento é uma das medidas que devem ser adotadas conjuntamente com outras, tais como, o aumento da fiscalização das fronteiras para que sejam impedidas as entradas de armas de grosso calibre de origem estrangeira, aumento da punição para os reincidentes na prática específica desse delito, punição agravada para os fabricantes de armas caseiras etc. O desarmamento é a primeira das medidas que devem ser implantadas em conjunto para reduzirmos a violência no Brasil.

O referendo do desarmamento deve ser o ponto de origem da discussão de qual Política Criminal o Brasil deve adotar no tocante a esse tipo de criminalidade. A parte repressiva do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03) é um fiasco. Tanto a pessoa que é flagrada uma vez com uma arma pequena como o comerciante de armas ilícitas recebem uma punição muito semelhante ao final. Isso é injusto, porque são comportamentos criminosos que possuem as culpabilidades bem diferenciadas e não é razoável que, ao final de um processo criminal, casos tão diferentes sejam punidos com o pagamento de penas alternativas.

Outro fator me preocupa é a precipitação de alguns setores do governo federal que, liberaram de modo afoitado informações que ainda não possuem embasamento científico sólido, como se fossem realidades incontestáveis. Uma coisa é afirmar o possível. A outra é afirmar o certo. O relatório “Impacto da Campanha do Desarmamento no índice Nacional da Mortalidade por Arma de Fogo”, do Ministério da Saúde, de agosto de 2005, é um exemplo desse tipo de ação que, cheia de boas intenções, acaba por atropelar a realidade criminológica.

Quando tratamos de eventos criminológicos de tal dimensão, penso que prudente seria que esses dados fossem submetidos previamente ao conhecimento da comunidade científica para a sua análise e discussão. O relatório foi apresentado e sua conclusão não autoriza de forma alguma, ainda neste momento histórico, o título que lhe foi dado, com uma ilação direta entre a redução da mortalidade por arma de fogo e campanha de desarmamento. O relatório em suas conclusões (página 8) faz referência “a um possível impacto” do Estatuto do Desarmamento e do recolhimento de armas de fogo no referido índice de mortalidade. Ora, possível, não é provável e nem é o certo. Mais à frente, de novo, faz a seguinte afirmação de que “estas ações teriam impacto positivo” De novo, a pesquisa usa a palavra teriam, não fala que tem, nem faz afirmação categórica direta que autoriza a colocação do título do documento que liga diretamente o desarmamento e o recolhimento da armas de fogo à redução dos referidos índices.

Ao meu ver, houve precipitação na publicação de um documento com esse título, porquanto ainda não existe base científica sólida para essa conclusão, coisa que somente com um amplo debate junto à comunidade científica e a sociedade civil e a coleta de dados por um período maior, poderia ser conseguida. Entendo sim que a tese da proibição da armas de fogo é a mais apropriada pelo nosso momento histórico. Apoio também a campanha de desarmamento que vem sendo realizada. Mas que as mesmas sejam analisadas pela população com a razão, sem paixões, para que o povo ainda não seja confundido com ilações criminológicas precipitadas e que ainda não foram analisadas exaustivamente pela comunidade científica.

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    é promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Pós-graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha), mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ). Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce.

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