Direitos humanos

General Oviedo apela à Corte Interamericana contra Paraguai

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26 de setembro de 2005, 12h44

O general paraguaio Lino César Oviedo Silva está apelando à a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, para reclamar de “grave lesão de direito individual, que lhe foi imposta pelo Estado Paraguaio, que o processou, julgou e condenou em um Tribunal Militar Extraordinário, sem previsão legal no seu ordenamento jurídico”.:. O pedido é do advogado Antonio Roberto Barbosa, de São Paulo. Oviedo foi condenado por um Tribunal Militar paraguaio a 10 anos de prisão pela tentativa de golpe de Estado frustrada em março de 1996 contra o então presidente, Juan Carlos Wasmosy.

Segundo o advogado, o Paraguai comete contra Oviedo “grave lesão de direito individual, que lhe foi imposta pelo Estado Paraguaio, que o processou, julgou e condenou em um Tribunal Militar Extraordinário, sem previsão legal no seu ordenamento jurídico”. O recurso levado a Washington refere que “os supostos delitos atribuídos a Lino César Oviedo Silva teriam sido praticados nos dias 22 e 23 de abril de 1996 e vieram à luz por intermédio de uma nota oficial do Senhor Presidente da República Paraguaia, engenheiro Juan Carlos Wasmosy, entregue aos meios de comunicação daquele País. Onze meses e sete dias depois, mais precisamente no dia 29.03.1997, Juan Carlos Wasmosy, Presidente da República, Chefe do Poder Executivo e Comandante em Chefe das Forças Armadas da Nação, com fundamento no artigo 290, da Lei 844/80 (Código de Procedimento Penal Militar), por intermédio do decreto número 17.365, instituiu um Tribunal Militar Extraordinário”

Barbosa sustenta que “este Tribunal Militar Extraordinário foi instituído para julgar as pessoas que mencionou e, entre elas, não constava Lino César Oviedo Silva. Foi instituído para apurar fatos que mencionou e, entre estes, não constavam aqueles que determinaram a condenação de Lino César Oviedo Silva”. Diz ele que “os oficiais que compuseram o tribunal mencionado, prestaram juramento ao Presidente da República, Juan Carlos Wasmosy”. Esse Tribunal Militar Extraordinário condenou Lino Oviedo em 9 de março de 1998.

Leia a íntegra do recurso:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR PRESIDENTE DA COMISSÃO INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS. WASHINGTON D.C.

LINO CÉSAR OVIEDO SILVA, paraguaio, casado, militar retirado, filho de Ernesto Oviedo e Eva Silva de Oviedo, nascido aos 23 de setembro de 1943, na Cidade de Juan de Mena – Departamento de la Cordilleira, atualmente preso, à disposição da Justiça Pública, no Presídio Militar de Viñas Cué, nos arredores de Assunção, pessoalmente, e por intermédio do seu advogado, vem a Vossa Excelência, requerer a instauração de procedimento perante a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, para apurar a grave lesão de direito individual, que lhe foi imposta pelo Estado Paraguaio, que o processou, julgou e condenou em um Tribunal Militar Extraordinário, sem previsão legal no seu ordenamento jurídico.

A matéria de Direito que por intermédio da presente se traz ao conhecimento dessa Comissão e eventualmente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, passou pelo crivo da Corte Suprema de Justiça, do Estado Paraguaio, em duas oportunidades, em 17.04.1998 e em 15.03.2005, e em ambas, legitimou uma condenação ilegal de 10 (dez) anos de reclusão, por supostos delitos contra a autoridade pública e a ordem pública, imposta por um tribunal de exceção, com ofensas a princípios constitucionais consagrados por quase todos os povos civilizados, como os do juiz natural da causa, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório penal.

Os supostos delitos atribuídos a Lino César Oviedo Silva teriam sido praticados nos dias 22 e 23 de abril de 1996 e vieram à luz por intermédio de uma nota oficial do Senhor Presidente da República Paraguaia, Engenheiro Juan Carlos Wasmosy, entregue aos meios de comunicação daquele País.

11 (onze) meses e 07 (sete) dias depois, mais precisamente no dia 29.03.1997, Juan Carlos Wasmosy, Presidente da República, Chefe do Poder Executivo e Comandante em Chefe das Forças Armadas da Nação, com fundamento no artigo 290, da Lei 844/80 (Código de Procedimento Penal Militar), por intermédio do decreto número 17.365, instituiu um Tribunal Militar Extraordinário, dando-lhe esta conformação:

“Decreto nº 17365

POR EL CUAL SE INTEGRA EL TRIBUNAL MILITAR EXTRAORDINARIO PREVISTO EN EL ART. 290 DEL CODIGO DE PROCEDIMENTO PENAL MILITAR PARA JUZGAR AL GRAL. BRIG. SINDULFO FERNANDO RUIZ RAMIREZ. EN EL SUMARIO INSTRUIDO SOBRE SUPUESTOS HECHOS IRREGULARES OCURRIDOS EN LA ACADEMIA MILITAR MARISCAL FRANCISCO SOLANO LOPEZ, INCOADO ANTE EL JUZGADO DE INSTRUCCION MILITAR DEL PRIMER TURNO.

Assunción, 29 de marzo de 1997.

VISTA: La nota elevada por el Presidente de la Suprema Corte de Justicia Militar por el conducto jerárquico correspondiente al Ministério de Defensa Nacional, en la que transcribe el Auto Interlocutorio nº 4/96 del 16 de diciembre de 1996 por el que el citado Alto Cuerpo Jurisdiccional declara la procedencia de la Formación del Tribunal Militar Extraordinário para juzgar al Gral. Brig. Sindulfo Fernando Ruiz Ramírez, y a quienes resulten cómplices o encubridores en relación a los hechos que se le imputan en la causa citada en el acápite del presente Decreto, de conformidad a lo previsto en el Art. 290 del Código de Procedimiento Penal Militar y el Art. 238 inciso 5º de la Constitución Nacional,


EL PRESIDENTE DE LA REPUBLICA DEL PARAGUAY DECRETA:

Art. 1º. – Intégrase EL TRIBUNAL MILITAR EXTRAORDINARIO, para juzgar al GRAL BRIG. SINDULFO FERNANDO RUIZ RAMIREZ y a quienes resulten cómplices o encubridores, en los supuestos hechos irregulares ocurridos en la Academia Militar Mariscal Francisco Solano López, con los siguientes Oficiales Generales:

– Gral. Div. JUAN EVARISTO GONZALEZ MALDONADO

– Valte. JOSE RAMON OCAMPOS ALFARO

– Gral. Div. PABLO IDOYAGA VIERA

-Gral. Brig. EULOGIO RODRIGUEZ ACEVEDO

-Gral. Brig. JM. FAUSTO A. FACETTI BRUYN

Art. 2º.- Nómbrase como Fiscal General Militar Ad- Hoc al Calte. MANUEL JESUS ROIG BENITEZ

POR EL CUAL SE INTEGRA EL TRIBUNAL MILITAR EXTRAORDINARIO PREVISTO EN EL ART. 290 DEL CODIGO DE PROCEDIMIENTO PENAL MILITAR PARA JUZGAR AL GRAL. BRIG. SINDULFO FERNANDO RUIZ RAMIREZ, EN EL SUMARIO INSTRUIDO SOBRE SUPUESTOS HECHOS IRREGULARES OCURRIDOS EN LA ACADEMIA MILITAR MARISCAL FRANCISCO SOLANO LOPEZ, INCOADO ANTE EL JUZGADO DE INSTRUCCIÓN MILITAR DEL PRIMER TURNO.

Art. 3º.- El Tribunal Militar Extraordinario integrado con los Oficiales Generales designados en el Artículo anterior del presente Decreto será presidido por el Gral. Div. JUAN EVARISTO GONZALEZ MALDONADO, quien designará como Secretario a un Oficial Superior de Justicia Militar.

Art. 4º.- El Tribunal Militar Extraordinário designado por este Decreto conocerá de la causa y procederá conforme a la Ley.

Art. 5º.- Comuníquese, publíquese y dése al Registro Oficial.”

Este Tribunal Militar Extraordinário foi instituído para julgar as pessoas que mencionou e, entre elas, não constava Lino César Oviedo Silva. Foi instituído para apurar fatos que mencionou e, entre estes, não constavam aqueles que determinaram a condenação de Lino César Oviedo Silva.

Os oficiais que compuseram o tribunal mencionado, prestaram juramento ao Presidente da República, Juan Carlos Wasmosy.

Referido Tribunal Militar Extraordinário condenou Lino Oviedo em 09.03.1998, nestes termos:

“1.- CONDENAR al Gral. Div. (SR) Lino César Oviedo Silva a sufrir la pena de diez años de prisión militar, que cumplirá el 12 de enero del año 2008, por la comisión de los delitos contra el orden y seguridad de las Fuerzas Armadas de la Nación e insubordinación, más la responsabilidad civil emergente de los delitos.”

Por estas razões:

“Al Gral. (SR) Oviedo le son aplicables las penas previstas en el Art. 89 inc. a), por la comisión del delito establecido en el Art. 88 inc. a) y b), contra el orden y seguridad de las FF.AA. de la Nación, los que intentaren por medio de la violencia subvertir el orden y la disciplina militar, alzándose a mano armada contra los poderes del estado y de los que instaren a éstos reberlarse em alzamiento público contra el Gobierno y sus autoridades; y en el Art. 138 por el delito de insubordinación en concordância con los Arts. 32, 33 y 91 del Código Penal Militar, con las circunstancias agravantes establecidas em el Art. 92, inc. a) y c) del mismo cuerpo legal, por ser Jefe o promotor y tener mando de tropa al tiempo de la perpetración del delito.”

A Corte Suprema de Justiça, do Estado Paraguaio, no dia 17.04.1998, exatos 38 (trinta e oito) dias depois, tornou definitiva a condenação proferida pelo Tribunal Militar Extraordinário. Fê-lo com estes fundamentos:

“SENTENCIA Nº 84

Asunción, 17 de abril de 1998.

“a) Si bien el art. 17 numeral 3º la Constitución Nacional, estabelece la prohibición de ser JUZGADO por tribunales especiales, dicha normativa debe interpretarse dentro del contexto en el cual se encuentra, armónica y sitematicamente con otras disposiciones legales.”

VISTOS: Los méritos del acuerdo que antecede, la CORTE SUPREMA DE JUSTICIA RESUELVE:

1º RECHAZAR el recurso de nulidad interpuesto por los Abogados Max Narváez Matto y José Francisco Appleyard Herrero de conformidad con lo expuesto en el considerando de esta resolución.

2º RECHAZAR el recurso de apelación interpuesto por los Abogados mencionados precedentemente, y en consecuencia confirmar la Sentencia Definitiva Nº 1 del 9 de marzo de 1998, dictado por el Tribunal Militar Extraordinário.

3º ANÓTESE, notifique y registrese.”

Provocou-se em 02.07.1998, com uma ação de inconstitucionalidade, a Corte Suprema de Justiça, para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 290/295, da Lei Federal 844/80, que permitiu a instalação do Tribunal Militar Extraordinário. Em 15.03.2005, 07 (sete) anos, aproximadamente, depois, a pretensão foi indeferida.

Lamentavelmente, a ação de inconstitucionalidade foi indeferida com fundamentos que não honram as tradições daquela Casa, que disse, literalmente:

“…no existe interes justificado para la promoción de la acción…”


Grifamos.

A sentença condenatória é, hoje, objeto de execução.

Referido Tribunal Militar Extraordinário foi instituído em 29.03.1997, para julgar supostos delitos que teriam ocorrido em 22 e 23.04.96. Vê-se que o tribunal foi configurado muito tempo depois dos fatos.

Acresça-se a isto, que os oficiais do Exército Paraguaio, que integraram mencionado tribunal, foram escolhidos, não pela capacidade individual para integrá-lo, mas, por serem adversários políticos ou inimigos pessoais do acusado.

Lino César Oviedo Silva não reconheceu, em momento algum, a legitimidade daquele tribunal para processá-lo e julgá-lo. Recusou-se a responder as perguntas que lhe foram formuladas e também não se defendeu. O tribunal, de tudo encarregou-se.

Aliás, o próprio nome, Tribunal Militar Extraordinário, encarrega-se de demonstrar que é um tribunal especial. “Extraordinário”.

Esta Comissão já se manifestou sobre estes fatos (caso 12.013). Todavia, não se pronunciou, especificamente, sobre o fato de que um tribunal de exceção, instituído com base numa lei derrogada, julgou e condenou o peticionário, violando as garantias fundamentais da pessoa humana, amparadas no artigo 8º, da Convenção.

O momento é oportuno. Heleno Cláudio Fragoso, saudoso advogado brasileiro, ocupando a Tribuna da Auditoria Militar, no Rio de Janeiro, no dia 29.06.1981, na defesa do Padre Reginaldo Veloso, perseguido pela ditadura militar, ao iniciar a defesa oral, perante o Conselho de Sentença, disse:

“…o padre Reginaldo só poderia ser condenado com argumento de lobo, ou seja, se o quisessem condenar de qualquer maneira. E contei a fábula de Fedro, depois repetida por La Fontaine: o lobo, querendo devorar o cordeiro, o acusou de estar sujando as águas do rio em que ambos bebiam. Observou, porém, o cordeiro que não poderia estar sujando as águas porque bebia em ponto inferior da correnteza. Disse-lhe, então, o lobo que o devoraria assim mesmo, porque não o cordeiro, mas o irmão dele sujara certa vez as águas do rio em que ele bebia. O cordeiro ponderou que não tinha irmão. Irritado, o lobo terminou por dizer: “Vou devorá-lo de qualquer maneira. Se não foi você que sujou as águas, nem seu irmão, então foi seu pai ou outro cordeiro qualquer.” O lobo também fez a mímica da justiça.

“Se o padre Reginaldo Veloso estava sendo julgado com argumento de lobo, não havia defesa possível. O nome disso, porém, era arbítrio, prepotência e opressão.”

Heleno Cláudio Fragoso. Advocacia da Liberdade. Editora Forense. R.J. 1984. Página 201.

A Constituição Nacional do Paraguai, quando trata dos direitos processuais, estabelece:

“Artículo 17: Em el proceso penal o en cualquier otro del cual pudiera derivar-se pena o sancion, toda persona tiene derecho a :

1- (…)

2- (…)

3- que no se lê condene sin juicio prévio fundado em una ley anterior al hecho del proceso ni que se le juzgue por tribunales especiales;”

Grifamos.

Tribunais especiais são tribunais especiais, configurados, geralmente, para condenar. São “instituições” espúrias, não previstas no ordenamento jurídico, ou quando previstas, são dissimuladas em leis que pecam pela falta de rigor legislativo.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, insigne jurista e renomado professor brasileiro, em parecer especialmente elaborado para este caso, e que esta petição instrui, leciona:

“A proibição dos tribunais de exceção deflui naturalmente do princípio do juiz natural. Trata-se de uma conseqüência lógica deste. Nem seria preciso enunciá-lo, se às vezes a malícia não se interpusesse entre o texto e a interpretação. De fato, se uma causa não pode ser subtraída do juiz pré-constituído, obviamente há desvio de poder em atribuí-la a outro juízo ou tribunal, para transferi-la a outro.”

Grifamos.

O inciso “3”, do artigo 17, da CNP, não permite o julgamento de seus cidadãos por tribunais especiais. Imperativamente.

Por outro lado, o artigo 248, da vigente Carta Política Paraguaia, que abaixo transcreve-se, estabelece a independência absoluta do Poder Judiciário. E mais, veda, expressamente, a possibilidade de que os demais Poderes da República possam atribuir-se funções judiciais:

“Queda garantizada la independencia del Poder Judicial. Solo este puede conocer y decidir en acto de carácter contencioso.

En ningún caso los miembros de los otros Poderes, ni otros funcionarios, podrán arrogar-se atribuciones judiciales que no estén expresamente establecidas en esta constitución, ni revivir procesos fenecidos, ni paralizar los existentes, ni intervenir de cualquier modo en los juicios. Actos de esta naturaleza conllevan nulidad insanable. Todo ello sin perjuicio de las decisiones arbitrales en el ámbito del Derecho Privado, con las modalidades que la ley determine para asegurar el derecho de defensa y las soluciones equitativas.


Los que atentasen contra la independencia Del Poder Judicial y las de sus magistrados quedarán inhabilitados para ejercer toda función pública por cinco años consecutivos, además de las penas que fije la ley.”

Grifamos.

Só o Poder Judiciário, por intermédio da Justiça Penal Ordinária ou da Justiça Militar Ordinária, poderia julgar Lino César Oviedo Silva.

Quando se combina o artigo 248 com o artigo 174, da Constituição Nacional do Paraguai, emerge, cristalinamente, esta competência, tal a clareza da redação deste comando constitucional que, só por só, vale a pena transcrever na sua literalidade:

“ Los tribunales militares solo juzgarán delitos y faltas de carácter militar, calificados como tales por la ley, y cometidos por militares em servicio activo. Sus fallos podrán ser recurridos ante la justicia ordinaria.

Cuando se trate de un acto previsto y penado, tanto por la ley penal común como por la ley penal militar, no será considerado como delito militar, salvo que hubiese sido, cometido por un militar en servicio activo y en ejercicio de funciones castrenses. Em caso de duda de si el delito es común o militar, se lo considerará como delito común. Sólo em caso de conflicto armado internacional, y en la forma dispuesta por la ley, estos tribunales podrán tener jurisdicción sobre personas civiles y militares retirados.”

Grifos nossos.

A Constituição Nacional do Paraguai definiu a macroestrutura do Estado. Definiu para cada um dos Poderes da República, seu alcance, competência e limites, e assegurou a independência de cada um deles, do Poder Judiciário, em particular.

O artigo 174, da CNP, fala em “Tribunais Militares” e lhes dá, implícita e explicitamente, o caráter de Justiça Militar Ordinária.

A Lei Orgânica dos Tribunais Militares (840/80), com 70 (setenta) artigos, traz, em seu artigo 9º e letras respectivas, a composição dos Tribunais Militares em tempo de paz, cuja redação tem esta conformação:

“CAPÍTULO III

DE LOS TRIBUNALES EN TIEMPO DE PAZ

Art. 9º.-La jurisdicción militar en tiempo de paz,

será ejercida por:

a) la Suprema Corte de Justicia Militar;

b) los Jueces de 1ª Instancia;

c) los Jueces de Instrucción;

d) el Ministerio Público;

e) el Defensor de los Pobres; y,

f) por los demás funcionarios que en esta

ley se determinen.”

Como se observa, nada fala de tribunal militar extraordinário.

Os artigos 174 e 248, da Carta Política, demonstram que o monopólio para julgar pessoas, sejam elas de que classe forem, é uma reserva constitucional exclusiva do Poder Judiciário. Aí incluída a Justiça Militar Ordinária, com jurisdição na esfera penal, inclusive.

É indiscutível o “dogma jurídico que faz da santidade das formas a garantia essencial da santidade do direito” (Rui Barbosa, “O justo e a justiça política”, “in” “A imprensa”, Rio de Janeiro, 31.03.1899, “apud” “Obras Seletas de Rui Barbosa, vol. VIII, Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro, 1957, págs. 67/71).

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, no parecer referido, ao comentar as normas constitucionais do Estado Paraguaio, concretamente, assinalou:

“B) Normas pertinentes da Constituição Nacional do Paraguai de 1992.

“21. Ao observador desarmado que analise a Constituição paraguaia, os princípios da Convenção americana estão nelas consagrados (e não apenas pela inserção dela no direito constitucional do Paraguai, o que ocorre como já se demonstrou).

“22. Com efeito, no Título II – Dos direitos, dos deveres e das garantias, da Parte I – Das declarações fundamentais dos direitos e dos deveres e das garantias, está o Capítulo II, intitulado Da Liberdade. Ora, neste, encontra-se o art. 16:

“Da defesa em juízo.

“Artigo. 16: A defesa em juízo das pessoas e de seus direitos é inviolável. Toda pessoa tem direito a ser julgada por tribunais e juízes competentes, independentes e imparciais.”

“Juízes competentes”. Esta expressão exprime, segundo já se apontou, o princípio do juiz natural. Assim, pode-se deduzir que a Constituição paraguaia determina sejam as acusações contra quem quer que seja apreciadas pelos tribunais ordinariamente competentes para tanto, não por tribunais especiais, ou de exceção.

“23. Este entendimento é corroborado pelo que vem disposto no artigo seguinte:

“Artigo 17. No processo penal, ou em qualquer outro do qual possa derivar pena ou sanção, toda pessoa tem direito a:

…..

“3) não ser condenado sem juízo prévio, fundado em lei anterior ao fato do processo, nem ser julgado por tribunais especiais;

…..

“O texto é cristalino – e in claris cessat interpretatio. Ele abrange todo processo de que possa resultar “pena ou sanção”, portanto também o processo perante órgãos militares. Mais. Proíbe tribunais especiais, ou seja, tribunais instituídos e compostos ad hoc, destinados à apreciação de caso ou casos determinados.


“24. Baseada na separação dos poderes, a Constituição atribui ao Poder Judiciário a “administração da justiça” (art. 247).

É certo que admite “tribunais militares”, de caráter circunscrito à apreciação de “delitos e faltas de caráter militar” (art. 174).

“Claro está, porém, que tanto os juízos comuns como os militares hão de estar organizados de acordo com os preceitos constitucionais. Isto significa estarem sujeitos ao disposto nos artigos 16 e 17 da Constituição. Ou seja, ao princípio do juiz natural e à proibição de tribunais especiais ou de exceção.”

Pode-se argumentar, eventualmente, que a legislação infraconstitucional paraguaia prevê a existência de um Tribunal Militar Extraordinário.

Puro sofisma.

Os artigos 290 a 295, foram derrogados, expressamente, pelo artigo 137 (última parte), da Carta Magna, que passou a vigorar no dia 20 de junho de 1992, com a seguinte redação:

“Carecen de validez todas las dispociones y los actos de autoridad opuestos a lo establecido en esta Constitución.

Grifamos.

Os artigos 290 a 295, da Lei 844/80, que previa esta possibilidade, são anteriores à atual Carta. E esta, claramente, deixou de recepcioná-los, quando configurou a macroestrutura do Estado Paraguaio. Fê-lo, expressamente, por intermédio de seu artigo 248.

A atual Constituição Paraguaia entrou em vigor, no dia 20.06.1992, e derrogou os artigos 290 a 295, do Ordenamento Normativo sobre Militares, que vigia desde 12.08.1980.

Catedrático de Direito Constitucional, da Faculdade de Direito, da Universidade de São Paulo, por trinta anos, aproximadamente, num período dos mais atribulados da história constitucional do Brasil, no parecer referido, sentencia:

“25. Na verdade, a Constituição, no art. 137, particularmente na última parte, é expressa:

“Da supremacia da Constituição.

A lei suprema da República é a Constituição.

“Carecem de validade todas as disposições e atos de autoridade opostos ao estabelecido nesta Constituição.”

“Em face desta norma, que está expressa, embora desnecessariamente dada a lógica do direito constitucional, as normas destoantes dos artigos 16 e 17 de seu texto, que estão inscritas no art. 290 da Lei 884/80, foram revogadas quando da entrada em vigor da Constituição. Ou se se preferir, perderam eficácia nesse momento e não a recobraram, em vista de sua incompatibilidade material com os novos mandamentos constitucionais. Não é preciso, para sustentá-lo, invocar o ensinamento dos juristas, por exemplo, o de Kelsen.”

E conclui:

“27. Primeira conclusão.

Postos os fatos narrados na consulta em confronto com o texto e correspondente exegese da Convenção Americana dos Direitos do Homem, resulta patente e insofismável a violação do art. 8º desta.

“Lino César Oviedo Silva foi submetido a processo e julgamento em face de um tribunal de exceção, tribunal este instituído após os fatos que deveria apreciar. Estes ocorreram em 22 de abril de 1996 e o tribunal foi instituído em 29 de março de 1997. Recorde-se que, no art. 8º da Convenção. Está que o “tribunal competente …” há de estar “estabelecido anteriormente em lei”…

“Este tribunal foi claramente instituído para apreciar um caso determinado, e seus membros foram escolhidos para isto e apenas para isto. Trata-se, pois, de um tribunal ad hoc, voltado para caso concreto, o que tipifica o juízo de exceção

“28. Segunda conclusão.

Ao observador estrangeiro, impõe-se, data venia, a conclusão de que, em face do direito constitucional paraguaio, Lino César Oviedo Silva não poderia ter sido julgado pelo tribunal militar que o julgou. Este tribunal seria um tribunal especial, de exceção, o que contraria os artigos 16 e especialmente 17, 3) da Lei Magna do Paraguai.

“Na verdade, o art. 290 da Lei 884/80, que serviu de fundamento para a instituição de tal tribunal, foi revogado pela Constituição, por ser materialmente incompatível com ela. Portanto, como deflui do art. 137, parte final da Constituição, teria perdido validade.

Lino Oviedo foi processado, julgado e condenado por um órgão do Poder Executivo, numa afronta inegável à vigente Constituição Nacional do Paraguai, que em nenhum momento descreveu um Tribunal Militar Extraordinário e/ou autorizou o Poder Executivo a criar ou instalar este tribunal para processar, julgar e condenar quem quer que seja. Esta tarefa está reservada, com exclusividade, ao Poder Judiciário.

O Tribunal Militar Extraordinário que processou, julgou e condenou Lino César Oviedo Silva ao cumprimento de uma pena de 10 (dez) anos de reclusão, é um tribunal especial, de exceção, que mais se assemelha a uma Corte Marcial disfarçada. E assim se diz porque a sua existência não encontra amparo no Direito Positivo Paraguaio. Sua Excelência, o Presidente da República Paraguaia louvou-se numa legislação infraconstitucional, da década de oitenta (artigos 290 a 295, da Lei 844/80), derrogada pela atual Carta Política, que entrou em vigor no dia 20 de junho de 1992, para “instalar” um tribunal, única finalidade era condenar Lino Oviedo. Nada mais.


Não poderíamos deixar de citar, nesta oportunidade, aquilo que disse o Ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, do Brasil, em 24.05.2002, em voto vencedor (documentos inclusos), indeferindo a extradição de Lino Oviedo, pretendida, então, pelo Estado Paraguaio:

“Permito-me ressaltar um dado: não se coaduna, com as noções do juiz natural, a criação de um tribunal para julgar imputação já verificada, para apreciar fato ocorrido. A condenação pelo Tribunal Militar excepcional já seria suficiente a votar-se pelo indeferimento da extradição, à luz da Lei nº 6815/80.”

Grifamos.

O Estado político moderno se organiza a partir de uma Carta Política. É dogmático em Direito Administrativo e Constitucional. Toda a sua macroestrutura deve, obrigatoriamente, estar ali prevista, expressamente. E como já se disse, Tribunal Militar Extraordinário é instituição que não existe no ordenamento jurídico paraguaio.

Quando um governo investe num tribunal de exceção, a verdade dos fatos é a que menos interessa. Ao contrário, a versão do governo haverá de prevalecer. E para tanto, sabe-se que as garantias fundamentais da pessoa humana, não serão respeitadas. Foi o que, de fato, ocorreu. Não se mencionará, uma por uma, as ofensas. E elas chegam a algumas dezenas. A questão de fundo (tribunal especial), tão evidente, uma vez reconhecida, fará com que fiquem prejudicadas.

No caso concreto, o governo poderia dispor da Justiça Penal Ordinária e/ou da Justiça Militar Ordinária, ambas com previsão na Constituição Nacional do Paraguai. No entanto, delas abdicou. Fez opção pelo Tribunal Militar Extraordinário, composto por oficiais que devem obediência hierárquica, com disciplina por todos conhecida, ao Presidente da República, que também é, por disposição constitucional, o Comandante em Chefe das Forças Armadas da Nação.

Feriu-se, iniludivelmente, os artigos 7º e 8º, da Convenção Americana dos Direitos Humanos, ratificada pelo Estado Paraguaio, onde tem força de lei ordinária. Transcreve-se, por necessário, tais artigos:

Convenção Americana dos Direitos Humanos:

Artigo 7º:

(…)

“Toda a pessoa privada da liberdade tem o direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade da sua prisão ou detenção e ordene a sua soltura se a prisão ou a detenção forem ilegais. Nos Estados Partes cujas leis prevêem que toda a pessoa que se vir ameaçada de ser privada da sua liberdade tem o direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente a fim de que este decida sobre a legalidade de tal ameaça, tal recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou por outra pessoa.”

E ainda:

Artigo 8º:

“Toda a pessoa tem o direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, no apuramento de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para se determinem os seus direitos ou obrigações de natureza civil, de trabalho, fiscal ou de qualquer outra natureza.”

Grifamos.

E mais uma vez, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, no parecer referido, ensina:

“A) O art. 8º da Convenção Americana dos Direitos do Homem.

“4. Esta Convenção foi, como se sabe, adotada em 22 de novembro de 1969, pelos Estados da América, em conferência realizada em São José da Costa Rica.

Assinou-a o Paraguai nessa data, tendo feito depositar o instrumento de ratificação em 24 de agosto de 1989. Mais tarde, em 26 de março de 1993 aceitou a competência da Corte Interamericana.

“5. Aponte-se desde logo que, por força do art. 142 da Constituição paraguaia, se pode considerar que as normas de tratados internacionais referentes a direitos humanos têm valor constitucional. É o que se infere do texto:

“Da denúncia dos tratados.

Os tratados internacionais relativos aos direitos humanos não poderão ser denunciados a não ser pelos procedimentos que regem a Emenda a esta Constituição”.

“6. Na Convenção Americana, inscreve-se o art. 8º – “Garantias judiciais”, em cujo § 1º se lê:

“Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação formal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza, civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.”

“7. Este preceito reflete o art. 10 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948:

“Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a que sua causa seja ouvida, eqüitativa e publicamente, por um tribunal independente e imparcial, que decidirá, seja de seus direitos e obrigações, seja acerca de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela.


“8. Decorrem do texto da Convenção Americana alguns pontos, que merecem particular destaque: Ou seja, que o processo e o julgamento de qualquer pessoa deve ser realizado por: 1) “um juiz ou tribunal competente”; 2) tribunal este “independente”; e 3) “imparcial”; e, enfim, 4) “estabelecido anteriormente por lei”.

“Aqui transparecem dois princípios de magna importância. Um, o princípio do juiz natural, ou como preferem dizer os juristas de origem hispânica, do juiz competente. Outro, que resulta deste, mas o enfatiza, a proibição dos tribunais especiais, ou de exceção, como se prefere designá-los no Brasil.

“9. O primeiro – o princípio do juiz natural – está há séculos consagrado. Aponta a Profª Ada Pellegrini Grinover, em conhecido estudo, “O princípio do juiz natural e sua dupla garantia”, que ele já está nos arts. 21 e 39 da Magna Carta de 1215. Afirma-o, de modo indelével, a Petição de Direitos, de 1627, nos itens III, VII, VIII e IX.

“Exprime ele a idéia, importantíssima para a salvaguarda da liberdade individual, de que toda questão que interesse a direito pessoal, há ser submetida ao juiz pré-constituído pelo ordenamento jurídico. Ou seja, na linguagem usual dos documentos jurídicos, pela lei.

“Traduz-se nisto a absoluta proibição de discricionariedade quanto à competência para apreciar qualquer causa judicial. Quer dizer, para cada causa há na lei um juiz natural, um juiz competente, e este, e somente este, há de processá-la e julgá-la.

“10. Esta norma, aliás, faz parte do ordenamento jurídico internacional e do ordenamento constitucional de numerosos Estados.

“Quanto àquele, mencione-se que ela está implícita no art. 10 da Declaração Universal acima citado. Também aparece na Convenção Européia de salvaguarda dos Direitos do Homem, adotada em Roma em 4 de novembro de 1950. Nesta, o art. 6º determina:

“Toda pessoa tem direito de que sua causa seja apreciada eqüitativa e publicamente e num prazo razoável por um tribunal independente, estabelecido pela lei…” (grifei).”

É preciso registrar, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, do Brasil, ao negar o requerimento do Estado Paraguaio, de extradição de Lino Oviedo, deixou assentado:

(…)

“Em que pese estar-se diante de pedido de extradição, no qual é vedado a esta Corte adentrar o exame da instrução feita no país requerente – e eu não cometeria esse agravo aos colegas – não posso deixar de registrar que creio não poder o juiz, na formação do seu conhecimento, furtar-se a dosar a circunstância de que os mandados de prisão expedidos contra o extraditando partem de meras ilações e conjecturas, sem nenhuma base probatória ou indiciária de autoria.

(…)

“Anote-se, tão só como dado destinado à ponderação, que tais atos foram conduzidos e praticados por magistrados que, em momento posterior à sua consumação, se declarou impedido de atuar no caso.

(…)

“Tais constatações, a meu juízo, tornam hoje inconsistentes as evidências que ligavam o “grupo de Oviedo” à prática intelectual e até mesmo material do delito.

(…)

“Ora, sendo idênticos os fatos e os indícios que resultaram nos decretos de prisão do extraditando e dos demais supostos co-autores, o mesmo tratamento deveria ser dado ao primeiro, seja porque igualmente enfraquecidos os sinais aparentes de culpa ou em razão da prevalência dos princípios democráticos da inocência presumida e do favor da dúvida, tudo a exemplo do que se apurou em relação aos outros integrantes do chamado grupo conspirador.

“Ora, verificado o tratamento desigual dispensado ao extraditando, a manutenção do decreto de sua prisão ratifica e reforça a convicção de que a hipótese caracteriza mesmo extradição política disfarçada.

“No meu sentir, o pedido em exame, agora considerados ambos os fatos em causa, dissimula propósito de perseverar-se na perseguição política ao extraditando.

“Como antes explicitei, tal persuasão pessoal emerge não apenas da apreciação de um fato isolado, mas do conjunto deles, nos quais o extraditando é e foi um dos principais protagonistas, desde a era Stroessner até os dias de hoje.

(…)

“Ante essas circunstâncias, indefiro a extradição requerida pela República do Paraguai e determino se expeça a favor do extraditando LINO CÉSAR OVIEDO SILVA alvará de soltura, já que não consta dos autos haja sido condenado por crime no País.”

Lino César Oviedo Silva despolitizou, nesta sede, a condenação que lhe foi imposta. Com humildade, deseja, tão só, uma manifestação jurídica da Comissão, a fim de que a honorável Corte Interamericana dos Direitos Humanos, dentro do ponto de vista jurídico, unicamente, se pronuncie, reconhecendo, eventualmente, que foi julgado e condenado, por um tribunal de exceção.


Todavia, e apenas para ilustrar, traz, compilando aquilo que disse o Ministro Nelson Jobim, também do Supremo Tribunal Federal do Brasil, quando votou contra o Estado Paraguaio, indeferindo o requerimento de extradição do peticionário:

“Lembro à Corte que em 1993 foi eleito Presidente da República paraguaia o Dr, Juan Carlos Wasmosy, que era líder do Partido Colorado – a Associação Nacional Republicana – ANR, um partido fundado em 1887, na república paraguaia.

“Juan Wasmosy nomeia como comandante do exército o General Lino Oviedo.

“Em 1997, depois da posse, já no final do mandato de Wasmosy, o Partido Colorado e a ANR, reúnem-se em convenção nacional e indicam como candidato à presidência da república o General Lino Oviedo, que derrota, nessa convenção nacional, o grupo “argañista”, que era a posição antibrasileira, inclusive, do Partido Colorado.

“É indicado como vice,na chapa de Oviedo, o Sr. Raul Cubas, que depois viria a ser presidente da república.

“Logo após a convenção do Partido Colorado, em 7 de setembro de 1997, com a escolha de Oviedo, o Presidente Juan Carlos Wasmosy decreta a prisão domiciliar de Oviedo.

“Em dezembro de 1997, o General Oviedo se apresenta à presidência da república a fim de cumprir essa prisão domiciliar.

“Em março de 1998, e, aqui, há um dado importante, no que diz respeito às circunstâncias políticas e históricas do processo, ou melhor, antes disso, o Presidente Juan Carlos Wasmosy convoca um Tribunal Penal Militar Extraordinário que condena o General Oviedo a dez anos de prisão.

“Os fatos pelos quais o Presidente Wasmosy convocou o Tribunal Penal Militar Extraordinário são de abril de 1996, ou seja, anteriores à convenção do Partido Colorado que havia escolhido Oviedo.

“A decisão do Tribunal Penal Militar Extraordinário diz que a atividade desenvolvida pelo enclausurado General de Divisão Lino César Oviedo Silva, “desde que tuvo conocimiento de su relevo como comandante de L’Ejercito”, diz assim, deliberações com políticos, membros do Poder Legislativo, numerosas pessoas vinculadas aos distintos “qui há seres” de nosso meio, convocatórias a comandantes de grandes unidades e outras subordinadas, desde uma unidade altamente operativa, como a Primeira Divisão de Cavalaria.

“O presidente Wasmosy, em 1998, depois da escolha, pelo partido Colorado, do candidato Oviedo, acusa-o de fatos que teriam ocorrido em 1996, onde ele teria organizado um golpe de estado.

“Esse tribunal reúne-se e o condena a dez anos de prisão.

“A decisão é de março de 1998.

“Afirmo que é um Tribunal Penal Extraordinário, embora não tenha nos autos, porque disponho da publicação do fato institucional paraguaio, onde leio, aqui, que o Tribunal Penal Militar Extraordinário resolve etc., e depois vem a condenação.

“Subseqüentemente ao fato, um mês após, colocada politicamente em questão a legitimidade desse Tribunal Penal Militar Extraordinário, a Corte Suprema de Justiça paraguaia, em 17 de abril de 1998, na Sentença nº 84, também dispõe de um dado, indefere um recurso de nulidade e confirma a sentença do Tribunal Penal Internacional.

“Temos, aqui, uma condenação confirmada pela Corte Suprema de Justiça paraguaia que entende constitucional essa decisão do Tribunal Penal Militar Extraordinário.

“¿O que se passa?

(…)

“Com a condenação do General Oviedo, Cubas, seu candidato a vice-presidente, o substitui na candidatura do Partido Colorado. Negocia politicamente com o “grupo Argañista” e Luis Argaña vem a ser candidato a vice-presidente.

“Em princípio, teria havido uma solução política para isso.

“Na campanha eleitoral de Cubas, há uma promessa feita por ele, de que concederia um indulto a Oviedo.

“Cubas e Argaña tomam posse em 15 de agosto de 1998.

“Logo a seguir, o congresso oposicionista ao grupo “oviedista”, liderado pelo presidente Wasmosy, pelo grupo de Wasmosy, agora senador – aqui começam as injunções – vota a Lei nº 1.285, , que passa a exigir para o indulto, prometido por Cubas no processo eleitoral, o cumprimento prévio de, pelo menos, a metade da pena da condenação indultada, com a continuidade das inabilitações, ou seja, o Congresso, a maioria anti-Cubas, vota uma legislação e inviabiliza a promessa política feita por Cubas a Oviedo.

“¿Por quê?

“Porque o grupo oviedista, conforme os levantamentos e estatísticas paraguaias que hoje compõe a chamada União Nacional de Los Colorados Éticos, dispõe de um terço do eleitorado, no que diz respeito ao Partido Colorado, composto de mais ou menos cinqüenta por cento do eleitorado paraguaio.

“Não obstante a Lei, o Presidente Cubas, para cumprir a promessa de campanha ao General Oviedo, não concede indulto, mas comutou a pena com o Decreto nº 117, referido pelo Relator.


“O Presidente Cubas convoca um novo Tribunal Penal Extraordinário, que reviu o processo e absolveu Oviedo.

“Em face dessa circunstância, a oposição “argañista” entra com uma ação de inconstitucionalidade contra o decreto comutador da pena de Cubas, e a Corte Suprema acolhe a demanda, anula o decreto, como também desconsidera a decisão do segundo Tribunal Penal Militar Extraordinário.

“Com essa situação, Cubas comunica a sua decisão de não cumprir a situação em manter Oviedo solto.

“Em face disso, em janeiro de 99, instaura-se, no Congresso Paraguaio, o processo de “impeachment” contra o presidente Cubas.

“Aí passa-se o tempo, chega março e começa então o que ficou conhecido na história paraguaia como “Março Paraguajo.”

“Em 23 de março é assassinado Argaña; no dia 24 de março – veja bem, no dia subseqüente ao assassinato de Argaña-, Oviedo se apresenta no palácio do governo, perante Cubas, então Presidente, que estava respondendo ao processo de “impeachment”, iniciado em janeiro, e pede que seja preso pela guarda presidencial por motivos óbvios, já que teria problemas se fosse recolhido em prisão comum.

“Levado, no dia 24, à guarda presidencial, dois dias depois ocorremos incidentes na Praça do Congresso, onde são assassinadas as várias pessoas e feridas outras tantas – o chamado “Conflito da Praça do Congresso” -, entre os governistas, os argañistas e a oposição, entre o grupo de Cubas, o grupo “argañista” e o grupo de oposição.

“Em 28 de março, ou seja, depois do fenômeno da Praça, o Presidente Cubas renuncia à presidência.

“No dia 29, apresenta-se à embaixada brasileira, em Assunção, pedindo asilo político, sendo-lhe concedido, tanto que o Presidente Cubas se encontra no Brasil.

“¿Com essa situação posta, o que aconteceu?

“Ficou o Paraguai sem Presidente da República; Cubas homiziado na Embaixada brasileira, sem o Vice-Presidente que tinha sido assassinado dias antes.

“Com isso, assume o Presidente do senado, o Senador Luiz González Macchi, ao entendimento – inclusive faz um discurso no Senado paraguaio – de que convocaria eleições complementares.

“Ocorre que em consulta à Suprema Corte paraguaia, esta entende que Macchi deveria assumir para completar o mandato de Cubas, sendo confirmado Presidente da República até 2003, data do final do mandato do Presidente Cubas.

“Macchi tenta formar um governo de unidade nacional entre o Partido Colorado – Ação Nacional Radical, o Partido Liberal Radical Autêntico, que era a antiga oposição, e ainda o Partido do Encontro Nacional – PEN, tentando formar esse entendimento.

“Em agosto de 2000, convocam-se eleições gerais para Vice-Presidente da República, já que no Paraguai, diversamente do modelo brasileiro, há uma eleição de vice-presidente autônomo, ou seja, o vice-presidente é votado diretamente, conforme tínhamos no regime militar.

“Nessa eleição o Partido Colorado sofre a primeira grande derrota histórica.

“O Partido Colorado indica como candidato o filho de Argaña, Nelson Argaña, derrotado por Júlio César Ramon Franco, Gomes Jorgito Franco, que hoje é o vice-presidente da República – tive oportunidade de conhecê-lo-, membro do Partido Liberal Radical Autêntico.

“Conforme o Relator referiu, Jorgito Franco foi eleito pelos votos do Partido Liberal Radical Autêntico, mais os votos dos Colorados Éticos de Oviedo, já que este deixou no Paraguai o Dr. Carlos Galherno Perrone, líder desse movimento da UNACE, exatamente a facção do Partido Colorado que elegeu Jorgito Franco.

“Dessa visão global, constata-se o seguinte: há uma condenação no Tribunal Penal Extraordinário, em cuja extradição não é requerido nada.

“Aqui não há pedido de extradição para o General Oviedo cumprir a pena de dez anos determinada pelo Tribunal Militar Extraordinário, tipicamente de exceção.

“Subseqüentemente, antes da renúncia de Cubas, ocorreu o fato do assassinato de Argaña e, dois dias depois, o “Caso da Praça”.

“Temos, então o envolvimento de Oviedo, referido pelo Relator com todos os dados sobre as circunstâncias do fato.

“Parece-me claro e absolutamente tranqüilo estarmos exatamente na hipótese suscitada pelo Sr. Ministro Sepúlveda Pertence na sua famosa palestra, referida no Memorial da Defesa.

“Ou seja, estamos perante a atribuição de um crime comum dentro de um contexto nitidamente político.

“Se me permitirem avançar – conheço a política paraguaia com certas, digamos, ingerências -, não vejo nenhuma forma de entender como a morte de Argaña pudesse beneficiar politicamente Oviedo; pelo contrário, tanto não beneficiava que acabou assumindo a presidência do Partido Colorado o Dr. Nicanor Frutos, com o entendimento do General Oviedo.

“Nota-se, com isso, um conjunto de circunstâncias que me levam brevemente, a acompanhar o Sr. Ministro-Relator.

O Estado Paraguaio é membro da Organização dos Estados Americanos. É, também, subscritor do Pacto São José da Costa Rica, cujos mandamentos legais incorporou ao seu Direito Positivo.

E, diante daquilo que aqui se disse, comprovando com documentos, principalmente, não há dúvida que referido Estado-membro violou os artigos 7º e 8º, da Convenção Interamericana Dos Direitos Humanos.

Nada obstante este petitório seja redigido em língua portuguesa, as transcrições do decreto presidencial que instituiu o tribunal militar extraordinário, as sentenças judiciais proferidas a respeito do tema versado, a legislação ordinária e constitucional pertinentes foram, no original, em língua espanhola, para melhor compreensão de sua literalidade.

Pelo exposto, requer a Vossa Excelência, digne-se receber e determinar o processamento desta representação-denúncia. Ao depois, uma vez reconhecida, por esta douta Comissão, a violação apontada, demandar o Estado Paraguaio perante a Corte Interamericana dos Direitos Humanos que, certamente fará Justiça, declarando o Tribunal Militar Extraordinário, que condenou Lino César Oviedo Silva, um tribunal especial, um tribunal de exceção, e determinando a sua imediata liberdade.

Nestes termos

pede deferimento.

São Paulo, 02 de setembro de 2005.

antônio roberto barbosa

advogado

lino césar oviedo silva

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