Morte no cinema

Shopping não pode ser responsabilizado por atos de atirador

Autor

24 de setembro de 2005, 7h00

O shopping Morumbi, em São Paulo, não pode ser responsabilizado pelos atos do ex-estudante de medicina Mateus da Costa Meira, de 29 anos, que descarregou o pente de uma submetralhadora 9 mm, com capacidade para 40 tiros, contra pessoas que assistiam ao filme “Clube da Luta”, na sala 5 do cinema do shopping. Ele matou três e feriu quatro pessoas.

A decisão é da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo no julgamento de recurso de Silvio Eduardo de Andrade, que pedia indenização por danos morais e materiais, por ter sido “emocionalmente atingido ao viver o triste episódio”. Na ocasião Andrade estava com a namorada, mas nenhum dos dois foi ferido. Essa foi a primeira decisão de segunda instância nos pedidos de indenização contra o shopping.

Representaram a defesa do shopping Morumbi os advogados Hélio Pinto Ribeiro Filho e Alexandre Carneiro de Albuquerque, do escritório Pires de Oliveira Dias Advogados.

O desembargador Gilberto Souza Moreira, relator do caso, entendeu que o shopping não pode ser responsabilizado pelo acontecimento, pois foi algo “absolutamente imprevisível, inimaginável” e que, portanto, foge da linha de desdobramento de qualquer responsabilidade originária. “Nenhuma violação de dever, nenhuma culpa de nenhuma espécie e grau pode ser atribuída ao shopping”, afirmou o relator.

Segundo Moreira, não havia como impedir e suspeitar que o indivíduo, certamente de boa aparência, e que se dirigia a um cinema, tinha a intenção de produzir um massacre. “Não cabe, portanto, falar na segurança que o shopping deveria garantir, argumento evidentemente exagerado e falacioso”. Para o desembargador, não houve dano moral ou material.

Primeira instância

Nos últimos dois meses, os advogados do shopping, Alexandre Carneiro de Albuquerque e Hélio Pinto Ribeiro Filho, conseguiram outras duas vitórias em primeira instância contra pedidos de indenização pelo episódio. Nos dois casos os autores das ações podem recorrer.

Num dos casos, Andréa Cury Lang, atingida nos glúteos por um dos tiros disparados, pedia indenização alegando danos morais e psicológicos. Disse, ainda, que houve falha na segurança do shopping e que não foram fornecidos meios adequados para socorro.

Na defesa do shopping, os advogados alegaram que não há responsabilidade civil uma vez que os prejuízos decorreram de “caso fortuito ou força maior”. Alegaram, ainda, que a responsabilidade do shopping só poderia ser reconhecida caso provada a falha de algum preposto ou representante, o que não ocorreu. Sustentaram também que o serviço de segurança do local não tem como garantir a proteção completa dos consumidores.

No julgamento, o juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São Paulo, entendeu que a culpa do shopping no episódio não pode ser aceita “pois se trata de critério sem qualquer razoabilidade jurídica, pois uma pessoa não pode ser tida como suspeita em razão de seu aspecto físico ou maneira extravagante de se trajar, nem pela raça, cor ou posição social”.

Outra sentença recente foi a que rejeitou o pedido de José Eduardo Andrade dos Santos, ferido pelos disparos de Meira. Santos alegou que o sistema de alarme e segurança do cinema estava inoperante no momento dos fatos, o que impediu a comunicação imediata do serviço de segurança do shopping. Disse também que o ambulatório do local estava fechado e que não foi socorrido, sofrendo abalos psicológicos que o impediram de trabalhar por quase dois meses.

A juíza Tonia Yuka Kôroku, da 25ª Vara Cível de São Paulo, rejeitou o pedido. Segundo a decisão, “embora tenha o autor sofrido abalo psicológico, não podem os réus ser responsabilizados pelo fato, já que não tinham eles como evitar o fato, por mais diligentes que tivessem sido na prestação de seus serviços”.

Para a juíza, não houve falha por parte do shopping, cuja atividade não é de risco, como é no caso dos bancos. Ela afirmou também que não é exigível ao shopping que reviste os clientes na entrada ou mesmo coloque detector de metais na porta do local.

“Mesmo com todos os seguranças atentos e as câmeras ligadas, com funcionários monitorando o movimento no shopping, o evento era inevitável”, afirmou Tonia.

Atirador do shopping

Mateus da Costa Meira foi condenado pelo 1º Tribunal de Júri de São Paulo a 120 anos e seis meses de reclusão por matar três pessoas, ferir outras quatro e colocar em risco a vida de outras 15 pessoas na sala 5 de cinema do Shopping Morumbi, em 1999. À época do crime, Meira, que ficou conhecido como o atirador do shopping, cursava o 6º ano de medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

A sentença, de 4 de junho de 2004, foi proferida por um Júri formado por quatro mulheres e três homens e anunciada pela juíza Maria Cecília Leone. A defesa recorreu da decisão, mas a apelação ainda não subiu ao Tribunal de Justiça.

No julgamento, os jurados rejeitaram a tese da defesa de que Meira sofre de desvio mental e que, por isso, seria semi-imputável (que ele tinha apenas consciência parcial dos fatos), o que poderia resultar na diminuição da pena em até dois terços.

Na sala de cinema estavam mais de 60 pessoas. Meira foi denunciado pelo Ministério Público por três homicídios e 36 tentativas, já que o pente da submetralhadora usada por ele tinha capacidade para 40 balas. Porém, um dos tiros havia sido disparado contra o espelho do banheiro do shopping.

Para o promotor de Justiça Norton Geraldo Rodrigues da Silva, ao efetuar os disparos na sala de cinema, Meira tinha consciência do que estava fazendo.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!