Medo de pobre

Falência do governo Lula pode impulsionar onda reacionária

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19 de setembro de 2005, 18h41

A falência do governo Lula e do PT pode impulsionar “uma onda reacionária” no país. Essa é a avaliação do professor Luiz Felipe de Alencastro, titular de História do Brasil da Universidade de Paris-Sorbone, depois de passar uma temporada de dois meses pelo Brasil.

“É o retorno do recalque mais boçal do Brasil, da UDN de 1952, que diz que ‘pobre é pobre porque é burro’, que diz ‘nisso que dá eleger um encanador e uma empregada doméstica para morar no Alvorada”, afirmou o historiador em entrevista publicada nesta segunda-feira (19/9) pela Folha de S. Paulo.

Na entrevista, o historiador se lembra de uma frase do senador Jorge Bornhausen (PFL-SC) sobre a crise política do governo Lula: “Nós agora vamos nos livrar dessa raça por muitos anos”. Para Alencastro, a maneira de tratar a esquerda como raça é um “ranço profundo da UDN mais reacionária, de onde Bornhausen vem, e é isso que está no horizonte de um fracasso do governo Lula e do PT”.

“A direita mais inteligente, os conservadores mais inteligentes não têm interesse em ver o PT desaparecer”, afirmou o professor. “A questão de fundo é que a falência do governo Lula pode ter como resultado o medo do pobre, do negro, a distância do empregado”.

Alencastro avalia que tipo de projeto de esquerda é possível ou era possível. Para ele precisaria ser uma política social mais ampla, próxima das populações sem assistência. “É uma coisa incrível: há lugares no Rio onde a presença do Estado não é mais permitida. Há massacres e chacinas e não se vê o presidente indo ver esses problemas de perto. Isso já não existia no governo FHC”.

Alencastro afirma que vê na eleição petista, para definir o novo presidente do partido, um amadurecimento da vivência política, porque, pela primeira vez, o país estaria acompanhando um debate de idéias interno de um partido — mesmo que a causa disso seja a crise gerada pelo fato de o PT estar no centro do escândalo do mensalão.

“Essa eleição é muito importante. Um partido desse tamanho não acaba de uma hora para outra. O que é interessante é que pela primeira vez no Brasil há um acompanhamento pela imprensa e pela opinião pública de uma discussão interna de um partido”, afirma o historiador.

Na avaliação de Alencastro, o governo Lula já mostrou mais maturidade do que seus inimigos lhe atribuem. Em um primeiro momento, onde não houve uma mobilização de tipo “Chavista” para intimidar a imprensa e Congresso. E num outro momento, foi a reação do governo contra a proposta da oposição de elevar o salário mínimo para R$ 384. “O governo corrigiu o tiro no dia seguinte, não praticou uma política de avacalhação orçamentária”, afirmou o professor.

Alencastro também fez uma breve análise da situação das próximas eleições. “A debandada dos aliados do PT nos estados e dos candidatos fortes do PT vai tornar a campanha de Lula muito mais complicada. Essa é a principal vulnerabilidade do PT. Lula terá sempre um estoque de 30% dos votos, que é o estoque histórico dele. Isso o põe em segundo turno, num pleito em haja o Garotinho. Nessa circunstância Lula tende a ter um ‘handicap’ grave, não só porque o PT está desmantelado, mas porque não tem candidatos fortes em nenhum estado, talvez só em São Paulo. E isso torna a campanha muito cara e complicada”, analisa o historiador.

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