Lista negra

Fininvest é condenada por incluir nome de cliente na Serasa

Autor

18 de setembro de 2005, 15h15

A Fininvest Administradora de Cartões terá de pagar indenização por danos morais de 50 salários mínimos a Henrique Domingos dos Santos, que teve seu nome incluído indevidamente no cadastro da Serasa. A decisão é da juíza da 21ª Vara Cível do Rio de Janeiro, Ana Lúcia Vieira do Carmo Diniz. Ainda cabe recurso.

Segundo os autos, apesar de não ter pedido o cartão da financiadora, Santos foi considerado devedor por não pagar uma fatura e teve seu nome incluído na lista de restrição ao crédito. No extrato, constavam vários saques, que ele negou ter feito.

A Fininvest alegou que Santos aceitou receber o cartão, tanto que forneceu seus dados pessoais pelo telefone. A financiadora também sustentou que foi o cliente quem desbloqueou o cartão.

A juíza Ana Lúcia Vieira do Carmo Diniz não acolheu os argumentos da empresa, que foi condenada a pagar a indenização. “O procedimento utilizado pela Fininvest na contratação não foi seguro o suficiente para garantir a regularidade da operação”, considerou.

Leia a íntegra da sentença

JUÍZO DE DIREITO DA 21ª VARA CÍVEL DA CAPITAL Processo nº: 2004.001.040715-3 Autor: Henrique Domingos dos Santos Réu: Fininvest S/A Administradora de Cartões de Crédito.

SENTENÇA

Trata-se de ação com processo pelo rito comum ordinário, proposta por Henrique Domingos dos Santos em face de Fininvest S/A Administradora de Cartões de Crédito, objetivando, em antecipação dos efeitos da tutela, a exclusão de seu nome de cadastros restritivos ao crédito; indenização por danos morais, ao prudente arbítrio do Juízo; cancelamento de faturas.

Inicialmente, foi requerida a concessão do benefício da gratuidade de justiça, o que foi deferido a fls. 30. Como causa de pedir, alega o Autor que celebrou com o Réu contrato de financiamento, no valor de R$ 93,50, a ser pago em três parcelas de R$31,17, tendo cumprido com suas obrigações.

Entretanto, no mês seguinte ao término do pagamento da última parcela, recebeu fatura cujo demonstrativo das despesas apontava para a realização de vários saques efetuados mediante utilização de cartão de crédito, o qual nunca requereu. Assim, não efetuou qualquer pagamento, já que não reconheceu a dívida, o que ocasionou a inclusão de seu nome em cadastros restritivos ao crédito.

Com a inicial, vêm os documentos a fls. 11/21. Antecipação dos efeitos da tutela a fls. 30. Citada (fls. 47), a parte Ré apresenta contestação a fls. 49/57, alegando que o Autor anuiu com a remessa do cartão de crédito, ao ser contactado e informar seus dados pessoais. Assim, aduz que não perpetrou qualquer ato ilícito, não havendo que se falar, pois, em indenização. Alega que, ainda que houvesse extravio do cartão, este dependeria do desbloqueio para seu uso, o que somente poderia ter sido feito pelo Autor.

Sustenta que se suposto meliante o fez, trata-se de fato de terceiro, a excluir sua responsabilidade. Argumenta que os alegados danos morais não restaram comprovados; entretanto, requer, em caso de procedência dos pedidos autorais, que o quantum indenizatório seja fixado com moderação. Com a peça de bloqueio, vêm os documentos a fls. 58/77.

Certificada a tempestividade da contestação a fls. 81. Réplica a fls. 82/90. Em provas, o Autor informa que não pretende produzir outras provas além das constantes nos autos (fls. 93); a parte Ré requer a produção de prova documental superveniente (fls. 95/96). Audiência de conciliação a fls. 99, na qual não foi possível o acordo entre as partes. Este o relatório.

Decido.

Impõe-se o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 330, inciso I, do CPC. De fato, para a solução da questão veiculada na inicial, faz-se desnecessária a produção de provas complementares.

Segundo o v. Acórdão da Colenda 3ª Câmara Cível do nosso Tribunal de Justiça, sendo seu Relator o Des. SERGIO CAVALIERI FILHO, ficou estabelecido que: ´… Não se deve olvidar que ao direito de ampla defesa contrapõe-se o poder-dever do Juízo de indeferir as provas inúteis e diligências meramente protelatórias (CPC, 130), pelo que se rejeita a preliminar.´ (Ap. civ. 6776/93, julg. 18.08.94). Com efeito, o documento a fls. 12 comprova que o nome do Autor foi anotado junto aos cadastros do SERASA, por iniciativa da Ré, fato que, inclusive, não foi por esta negado.

Por outro lado, não logrou a Ré demonstrar que o Autor tenha celebrado com ela qualquer contrato de prestação de serviços ou aquisição de produtos que autorizasse a demonstrada negativação. Veja-se que não logrou refutar o argumento autoral de que não requisitara o cartão de crédito, que terminou por gerar despesas por ele não efetuadas, tendo o Réu agido, pois, em desacordo com a norma estatuída no artigo 39, III, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Logo, inexistindo qualquer cartão de crédito contratado por parte do Autor e, por conseguinte, sendo indevidas as despesas efetuadas, a negativação realizada pela Ré é manifestamente indevida. Frise-se que o financiamento contratado pelo Autor foi devidamente quitado, consoante fls. 13/16, e não guarda qualquer relação com as despesas geradas pelo uso do cartão de crédito.

Assevere-se, ainda, que o contrato informado pelo Réu não veio aos autos, razão pela qual não pode ser considerado como prova a fim de eximir sua responsabilidade. Estabelece o artigo 14 da Lei n. 8.078/90 que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.

Nos termos do respectivo parágrafo primeiro, considera-se defeituoso o serviço quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar. No caso vertente, conclui-se com facilidade que o procedimento utilizado pela Ré na contratação com terceiros não foi seguro o suficiente para garantir a regularidade da operação. Bastaria à parte Ré, simplesmente, buscar uma contra-prova dos dados fornecidos por terceiros, buscando informações cadastrais ou a confirmação do teor dos documentos, de modo a impedir a fraude na sua origem.

Ao contrário, na busca do lucro, limitou-se a adotar seu falho ´procedimento padrão´ na aceitação dos dados fornecidos por terceiros e, com isso, legitimou a fraude e permitiu que fosse imposto razoável gravame ao crédito da parte Autora. A hipótese dos autos não é a de culpa exclusiva de terceiro a que alude o inciso II do parágrafo 3° do art. 14 do CDC, já que a ação de terceira pessoa que se utilizou indevidamente dos dados do autor não teria êxito caso a parte Ré, como já dito, fosse mais diligente e cuidadosa na aceitação de propostas de contratação de seus serviços.

Ademais, fatos dessa natureza são decorrentes dos riscos da própria atividade comercial desenvolvida pela ré que, também por isso, deve reparar os danos daí ocorrentes. Aliás, quem colhe o bônus deve também arcar com o ônus inerente à atividade. A parte Autora, no caso vertente, é consumidora por equiparação, podendo ser considerada vítima do evento, conforme dispõe o art. 17 do CDC.

O nexo de causalidade está presente entre o serviço defeituoso acima indicado e a negativação promovida pela Ré, com quem a parte Autora não mantém relação contratual, ensejando, assim, os danos morais postulados. Quanto ao dano moral, vale transcrever os ensinamentos do eminente Desembargador Sérgio Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil. Malheiros: 78. 1998.), a saber: ´(…) só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral (…)´.

Observe-se que na hipótese de danos morais, como a do caso vertente, não é exigível que a parte Autora os comprove. Sua verificação constitui corolário do próprio ato ilícito em análise, do qual se extrairá, pelo menos nos seus limites mínimos, a configuração da situação danosa.

Conforme decidiu a Décima Primeira Câmara Cível de nosso Tribunal, tendo por relator o insigne Desembargador Nilton Mondego, ´sendo a financeira responsável pela informação que cadastrou o apelado, como devedor relapso, no SPC, de maneira indevida, com reflexos negativos daí decorrentes, restando evidente a sua culpa na produção do dano moral, tem ela o dever de ressarci-lo nas suas exatas proporções, não se exigindo, na espécie, a prova de sua existência.´ (julgamento em 19/03/1998).

E, ainda, conforme o acórdão abaixo transcrito: ´Inscrição sem justa causa do nome de pessoa no SPC legitima pedido e condenação por dano moral. A dor, o suplício moral, não são suscetíveis de prova, presumem-se provados na base do id quod plerumque accidit ou na base das máximas de experiência comum.´ (Décima Sexta Câmara Cível, TJRJ, julgamento 07/04/1998, Relator Desembargador Jayro S. Ferreira).

Uma vez reconhecidos os fatos geradores do dano, que aqui restaram patenteados, passa-se à questão do arbitramento desse dano. Como informado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, adiante transcrito: ´Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso´ (Recurso Especial 135202/SP, Quarta Turma do STJ, julgado em 19/05/98).

Entretanto, não se confunde moderação, razoabilidade e bom senso com bondade, brandura ou clemência e nem mesmo com severidade ou excesso de rigor, que são qualidades estranhas à objetivação de uma decisão judicial justa. Assim sendo, no caso vertente, deve-se atentar, na fixação do dano, para sua repercussão na vida da parte autora, cuja reputação creditícia foi concretamente abalada pela indevida negativação, conforme demonstra o documento de fls. 12.

Desta forma, atentando-se ao princípio da proporcionalidade e da lógica razoável, e tendo em vista as circunstâncias do dano, sua gravidade e repercussão, considero moderada a fixação do dano moral no valor equivalente a 50 (cinqüenta) salários mínimos, na data da citação, o que não é vedado, uma vez que aqui não é utilizado como índice de correção. Aliás, neste sentido vem decidindo o STF (RE 352.780-1/RJ; RE 338.760).

A Suprema Corte, ao julgar o Ag RRE 353.412, sendo Relator o Ministro Carlos Velloso, assim decidiu: ´Constitucional. Civil. Responsabilidade Civil. Salário-mínimo: vinculação. I- A vedação inscrita no artigo 7º, IV, Constituição Federal, diz respeito à hipótese da vinculação das majorações do salário-mínimo como índice de atualização da indenização. Utilização do salário-mínimo para expressar o valor inicial da condenação: legitimidade. II – Precedentes do STF. III – Negativa de trânsito ao RE. Agravo não provido.´

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido proposto por Henrique Domingos dos Santos em face de Fininvest S/A Administradora de Cartão de Crédito, para: 1) condenar o réu a pagar à parte autora, a título de danos morais, o equivalente a 50 (cinqüenta) salários mínimos, na data da citação, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora a contar da citação; 2) declarar a inexigibilidade do débito objeto desta lide. Condeno a parte Ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% sobre o valor da condenação. Torno definitiva a antecipação dos efeitos da tutela deferida. P.R.I. Rio de Janeiro, 08 de setembro de 2005.

Ana Lúcia Vieira do Carmo Diniz

Juiz de Direito

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!