Patroa não é empregada

Companheira não deve ser indenizada por serviços domésticos

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12 de setembro de 2005, 20h01

Dona de casa não tem direito a receber indenização do ex-marido pelos serviços domésticos que prestou durante a união estável entre os dois. A decisão é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás.

Para os desembargadores, mulher não tem direito a indenização por serviços domésticos prestados durante a união estável, porque a jurisprudência atual define esse tipo de relacionamento como semelhante ao casamento.

A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás reformou decisão da 2ª Vara Cível. A primeira instância acolheu pedido da dona de casa, fixando a indenização em R$ 24 mil.

O relator do caso no TJ, desembargador Walter Carlos Lemes, esclareceu que este tipo de caso deve ser julgado conforme as regras do Direito de Família e não as do Direito das Obrigações. “Conforme a doutrina e jurisprudência hodiernas, qualquer indenização por serviços prestados durante união estável é inadequada”, afirmou.

O desembargador explicou que o Superior Tribunal de Justiça tem definido companheira como “a mulher que une seu destino ao do homem solteiro, viúvo, desquitado ou simplesmente separado de fato, como se casados fossem aos olhos de quantos se relacionam com os companheiros de tal união” e que por esse motivo não cabe indenização durante relacionamento amoroso.

Walter Carlos Lemes lembrou que a concessão de uma indenização nesse tipo de caso não é compatível à nova realidade constitucional, que reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, assemelhando-se ao casamento.

Segundo a advogada Cinthia Pinheiro Guimarães Lerner, especializada em Direito de Família do escritório Advocacia Andere Neto, o TJ-GO acertou na decisão. “Não há que se falar em pedido de indenização por serviços prestados na constancia do casamento, na medida em que esta ‘prestação de serviço’ decorre da convivência marital”, esclarece.

Cinthia Pinheiro explica que o artigo 226, da Constituição Federal, alterou a concepção da palavra família. “Antes via-se família como aquela legitimada pelo DNA ancestral, ou seja, aquela proveniente do sangue. Todavia, este pré-conceito não é mais aceito pelo embasamento constitucional”.

“Não podemos mais distinguir a família legítima da ilegítima. Assim sendo, independentemente da forma utilizada para a constituição da família, núpcias ou convivência, os direitos e deveres existentes entre o marido e a mulher são os mesmos”, observa a advogada.

O advogado Luiz Kignel, especialista em Direito de Família do escritório Pompeu, Longo, Kignel e Cipullo Advogados, explica que, “quando a união estável ainda não se encontrava regulamentada em legislação específica, a única saída de algumas companheiras era solicitar indenização pelos serviços domésticos como forma de compensação pelos anos de convivência onde ela cuidada do lar e ele trabalhava”.

“Com o novo Código Civil a relação entre companheiros ficou absolutamente formatada. Os companheiros passaram a ter proteção antes apenas conferida aos cônjuges. Portanto, o pedido de indenização por serviços domésticos tem fundamento jurídico ultrapassado considerando a igualdade entre o homem e a mulher e os direitos reconhecidos na união estável”, observa o advogado.

Superior Tribunal

Se o caso chegar ao Superior Tribunal de Justiça, o entendimento da Justiça de Goiás pode ser modificado. Em 2003, o STJ garantiu a uma dona de casa de Duque de Caxias (Rio de Janeiro) o direito de receber indenização de R$ 3,6 mil pelos serviços prestados ao ex-marido.

O relator do recurso proposto pela defesa da mulher, ministro Barros Monteiro, orientou que a jurisprudência no STJ “é pacífica no sentido de que são indenizáveis os serviços domésticos prestados pela companheira durante o período de vida em comum”.

A mulher alegou ter convivido com o marido de 1972 a 1982, com quem teve dois filhos. Durante os dez anos, não exerceu atividade remunerada porque prestava serviços domésticos, como dona de casa.

Por causa da idade avançada, ela não teria mais condições físicas para exercer qualquer profissão e pediu a condenação do ex-marido ao pagamento de, pelo menos, um salário mínimo mensal, até o fim da vida.

A primeira instância negou o pedido. “A título de indenização por pretensos serviços prestados, ela quer, na realidade, haver alimentos de quem não está legalmente obrigado a prestá-los. Como é consabido, a obrigação alimentar deriva da relação de parentesco e, na hipótese de casamento, da imposição legal de mútua assistência. E só”, decidiu.

O Tribunal de Justiça do Rio manteve a sentença. “Não havendo comprovação da efetiva contribuição a ensejar a constituição de patrimônio comum, o que viria a caracterizar o enriquecimento sem causa do concubino em detrimento do esforço da concubina, não há como se reconhecer o direito à indenização por serviços prestados no seu sentido genérico”.

No STJ, porém, o ministro acolheu o recurso da dona de casa.“Tal entendimento, todavia, não consoa com a jurisprudência dominante no direito brasileiro, inclusive do STJ”, afirmou, na ocasião, Barros Monteiro.

Leia a ementa do acórdão

Apelação Cível. Indenização. União Estável. Resta superado pela legislação atual o pedido de indenização por serviços prestados, porque incompatível com o instituto da União, assemelhando ao casamento. Apelo conhecido e provido.

Apelação Cível 87.918-9/188 (2005.00736728)

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