Advocacia de ponta

Cada vez mais advogados vão se especializar no exterior

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11 de setembro de 2005, 12h24

A globalização da advocacia pode demorar um pouco. Mas os contratos empresariais — com seus pesos e contrapesos, cautelas e mecanismos preventivos — já obedecem a uma mesma matriz em todos os países. Quem souber fazer advocacia consultiva no Brasil, nesse campo, está pronto para advogar em qualquer parte do mundo.

É aí que emerge a importância fundamental dos cursos de aprendizado internacional, explica Antonio Piccirillo, sócio de uma respeitada banca de advocacia norte-americana, a Mayer, Brown, Rowe & Maw LLP. E também explica a procura cada vez maior pelos mestrados chamados de LLM (Master of Laws) — o MBA da advocacia.

Todos os grandes escritórios brasileiros mantêm programas para financiar — totalmente ou em parte — a especialização de seus advogados no exterior. Os principais destinos são Estados Unidos e Inglaterra, mas outros países da Europa também fazem parte do roteiro. Na maioria dos casos, depois de cumprir a parte acadêmica, os advogados emendam um estágio num escritório estrangeiro.

A duração de um LLM é de cerca de um ano e os estágios nas bancas internacionais podem durar igual período. As áreas bancária, de mercado de capitais e societária são as preferidas e a experência desses profissionais já se faz sentir no mercado interno.

Qualidade melhor

“O reflexo da especialização no exterior pode ser vista, por exemplo, no aumento de qualidade de documentos brasileiros”, afirma Luis Antonio de Souza, fundador do Souza, Cescon, Avedissian, Barrieu e Flesch Advogados. “Uma escritura de emissão de debêntures, há alguns anos, era uma coletânea de documentos. Hoje, há um trabalho muito mais bem feito, capaz de informar e criar as bases de um grande mercado local de capitais”, garante. Dos 80 advogados do escritório, cerca de 30% já passaram pela experiência. Sete deles estão atualmente no exterior.

Desde sua fundação, no começo dos anos 70, o Machado, Meyer, Sendacz e Opice incentiva a especialização no exterior. “Em 2001, foi organizado um programa formal de incentivo para atender à demanda. Mas o escritório sempre deu bolsas de estudos para advogados estudarem no exterior”, diz Carlos José Santos da Silva, sócio da banca.

Com mais de 300 advogados, dos quais 53 já estudaram no exterior, o MMSO mantém parcerias com alguns dos principais escritórios de advocacia do mundo para facilitar o caminho para o estágio. Neste ano são oito que irão estudar e trabalhar fora do país.

O advogado Fernando Shayer, também sócio do escritório, que trabalhou por um ano no Skadden, Arps, Slate, Meagher & Flom LLP — um dos maiores escritórios no mundo — e cursou LLM na Columbia University, em Nova Iorque, afirma: “numa emissão de títulos no mercado internacional é preciso tornar a oferta atrativa aos olhos do investidor. Com a experiência fora do país, você sabe quais as exigências legais e as principais preocupações desse investidor”. Depois de trabalhar nos Estados Unidos, Shayer participou do lançamento de ações de empresas como Grendene, Localiza e CPFL, voltadas especialmente para investidores americanos.

Canal direto

Como um serviço bem feito é a melhor propaganda para qualquer negócio, as temporadas de advogados no exterior costumam render bons clientes. “É comum que empresas multinacionais nos procurem por recomendação de escritórios estrangeiros nos quais nossos advogados já trabalharam”, afirma Raphael de Cunto, sócio do Pinheiro Neto.

Também com cerca de 300 advogados, ao menos 25% do quadro atual do escritório já passou passou por alguma experiência no exterior. “Muitas vezes quem estudou e trabalhou fora mostra maior integração com clientes estrangeiros e, consequentemente, atende a grandes demandas de negócios”, diz o advogado de Cunto.

“É natural que você forme uma rede de relacionamentos quando faz um LLM fora do país. Num curso como esse você está em contato com pessoas de 20 ou 30 diferentes nacionalidades com objetivos semelhantes aos seus”, diz Carlos Augusto Nunes Junior, do Barbosa, Müssnich & Aragão.

De volta ao Brasil há dois meses depois de estudar por um ano na London School of Economics e trabalhar em Lisboa, numa filial da banca espanhola Garrigues Abogados, Nunes Junior acredita que a experiência confere uma vantagem a quem estudou fora porque “você esteve em contato com os problemas recentes e conhece as soluções de ponta adotadas”. Do quadro atual de 161 advogados do Barbosa, Müssnich, 24 já concluíram cursos de LLM em universidades americanas e européias. Atualmente, 8 advogados do time estão fora do país.

Um estágio em escritórios estrangeiros ajuda a entender melhor como funcionam importantes órgãos como Organização Mundial de Comércio e Fundo Monetário Internacional. “Além disso, o advogado passa a identificar os motivos pelos quais a Comissão de Valores Mobiliários ou o Banco Central caminham em determinada direção”, afirma Fernando Shayer.

O advogado Mário Nogueira, sócio do Demarest e Almeida concorda. “A parte acadêmica dá a base para entender as engrenagens do sistema e é cada vez mais difícil encontrar advogados que não fazem estágios em escritórios do exterior depois de concluir o LLM”, afirma.

A especialização caminha também para outras áreas como a contenciosa, trabalhista, de seguros, previdenciária, ambiental, entre outras. No caso do Demarest, dos seus 350 advogados, cerca de 70 já estudaram fora. No começo, as áreas empresarial e bancária eram predominantes, mas nos últimos cinco anos, a procura por outras áreas cresceu na mesma medida em que se abriram novas possibilidades de negócios.

“Um de nossos advogados da área ambiental vai se especializar em biotecnologia”, afirma Claudia Meirelles, diretora de desenvolvimento humano e organizacional do Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados. Nos últimos três anos, o escritório enviou 20 advogados para a dobradinha LLM-estágio, preferencialmente nos Estados Unidos e Inglaterra. Neste ano, cinco participam do programa.

Segundo Claudia, o Tozzini incentiva também um “intensivão” de 40 dias, sempre nos meses maio de junho, para que os sócios da banca se familiarizem com as leis norte-americanas.

O investimento tem o retorno nos grandes negócios. Como atesta Todd Crider, sócio do Simpson, Thacher & Bartlett LLP em Nova Iorque — um dos escritórios que acolhe dois advogados brasileiros por ano — “o trabalho jurídico que envolve o Brasil nos Estados Unidos cresce cada vez mais devido ao aperfeiçoamento dos marcos regulatórios e os estágios fazem com que se construam laços mais fortes entre os países”.

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