Valor do dano

Recurso Especial não serve para reajustar indenização

Autor

2 de setembro de 2005, 11h41

Em Recurso Especial é inviável conhecer a exata extensão do dano moral sofrido e estabelecer indenização diferente da que foi fixada em decisão anterior. Com esse entendimento a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitou recurso de um consumidor que pretendia rediscutir o valor e data da contagem dos juros e correção na ação de indenização que ganhou contra a Telemar Norte Leste S/A.

A Turma manteve decisão que condenou a empresa a pagar indenização de R$ 15 mil com juros moratórios e correção monetária a partir da data da condenação a Josemar Bezerra Raposo, do Maranhão. A empresa foi condenada pelo atraso de cinco anos na instalação de linha telefônica em área rural. As informações são do STJ.

O consumidor entrou na Justiça contra a Telemar para ser ressarcido por danos materiais e morais sustentando ilícito contratual, caracterizado pelo atraso na prestação do serviço. A primeira instância negou o pedido.

O usuário apelou e a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão acolheu o pedido. “Diante de todo exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para condenar a empresa apelada a pagar ao apelante a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), valor de hoje, que devem ser acrescidos de juros moratórios à taxa legal — artigos 293 do Código de Processo Civil e 1062 do Código Civil — e de correção monetária — pelos índices legais — até a data do efetivo pagamento, invertendo-se os ônus da sucumbência”, afirmou o desembargador.

Segundo o Tribunal, o contrato de prestação de serviços é de adesão e eventuais dúvidas se resolvem em favor do consumidor, cuja boa-fé é presumida. “O valor do dano moral deve ser arbitrado com moderação, de acordo com o grau de culpa, o nível sócio-econômico do autor e, ainda, o porte econômico da empresa-ré”.

Insatisfeito com os R$ 15 mil, o consumidor interpôs Embargos de Declaração para discutir o valor da indenização e o prazo inicial para contagem dos juros moratórios e da correção monetária. Os Embargos foram rejeitados, levando o usuário a recorrer ao STJ, alegando ofensa aos artigos 165, 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil. Segundo afirmou a defesa, as omissões apontadas não foram sanadas.

A 3ª Turma não conheceu do recurso. Para o ministro Antônio de Pádua Ribeiro, relator do caso no STJ, “conhecer a exata extensão do dano moral sofrido pela parte e determinar valor indenizatório diverso do que fixado com razoabilidade no acórdão recorrido é inviável em recurso especial”, observou, lembrando a súmula 7 do STJ, que impede reexame de provas.

Segundo explicou o ministro, se o prejuízo que o consumidor alega decorre justamente da demora na prestação do serviço telefônico, é possível estabelecer como termo inicial dos juros da indenização a data da publicação do julgamento, pois o valor arbitrado nesses casos já leva em conta o transcorrer do tempo.

Resp 618.940

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 618.940 – MA (2004/0002557-0)

RELATOR: MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO

RECORRENTE: JOSEMAR BEZERRA RAPOSO

ADVOGADO: SIDNEY FILHO NUNES ROCHA E OUTROS

RECORRIDO: TELEMAR NORTE LESTE S/A

ADVOGADO: CARLOS FREDERICO TAVARES DOMINICE E OUTROS

RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA

RIBEIRO (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional. O recorrente, Josemar Bezerra Raposo, ajuizou ação contra a recorrida, Telemar Norte Leste S/A, a fim de haver reparação por danos materiais e morais decorrentes de ilícito contratual. Alegou que a recorrida, passados cinco anos da conclusão do contrato, não tinha iniciado a prestação do serviço.

Em primeiro grau, os pedidos foram julgados improcedentes (fls. 212/218). A Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão deu provimento à apelação do recorrente, consoante se verifica da ementa do acórdão:

“PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONCESSIONÁRIA TELEFÔNICA. NÃO INSTALAÇÃO DE LINHA NA ZONA RURAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

I – O contrato de prestação de prestação de serviços é de adesão, onde eventuais dúvidas resolvem-se em favor do consumidor do serviço, cuja boa-fé é presumida, nos termos da exegese do art. 6.º, VIII, do Código do Consumidor.

II – O valor do dano moral deve ser arbitrado com moderação, de acordo com o grau de culpa, o nível sócio-econômico do autor e, ainda, o porte econômico da empresa-ré, guiando-se o aplicador da lei pelos critérios determinados pela doutrina e pela jurisprudência, valendo-se de sua prática processual e do bom senso, vigilante às peculiaridades do caso concreto.


III – Apelo provido” (fl. 278).

A fim de ensejar manifestação a respeito da correção monetária, dos juros moratórios, dos honorários advocatícios e do valor da indenização, o recorrente opôs embargos de declaração, que foram rejeitados pelo acórdão de 305/311.

Insatisfeito com a verba indenizatória, bem como com o termo inicial dos juros moratórios e da correção monetária, o recorrente aponta, no especial, contrariedade aos arts. 165, 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil. Sustenta que as omissões apontadas nos embargos não foram sanadas.

Procura demonstrar, também, a ocorrência de dissídio jurisprudencial quanto ao valor da indenização fixada e quanto aos juros moratórios e à correção monetária.

Em suas contra-razões, a recorrida alegou falta de interesse em recorrer do que decidido a respeito da indenização e ausência de comprovação analítica da alegada divergência pretoriana.

É o relatório.

EMENTA

Direito do Consumidor. Instalação de linha telefônica em área rural. Inadimplemento contratual da prestadora de serviços telefônicos. Dano moral. Valor da indenização. Termo inicial dos juros moratórios e da correção monetária.

I – Quando o acórdão recorrido está bem fundamentado e contém pronunciamento sobre toda a questão litigiosa que foi devolvida ao julgador, não se identifica ofensa aos arts. 165, 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil.

II – Conhecer a exata extensão do dano moral sofrido pela parte e determinar valor indenizatório diverso do que fixado com razoabilidade no acórdão recorrido é inviável em recurso especial, mercê da necessidade do reexame de prova. Aplicação da Súmula n.º 7 desta Corte.

III – Se o prejuízo que o recorrente alega decorre justamente da demora na prestação do serviço telefônico, que tardou anos para ser implementado, é possível estabelecer como termo inicial dos juros da indenização a data da publicação do julgamento, pois o valor arbitrado nesses casos já leva em conta o transcorrer do tempo.

IV – Recurso especial não conhecido.

VOTO

EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA

RIBEIRO (Relator):

O recurso especial não merece ser conhecido. Com efeito, diz o recorrente que o Tribunal a quo deixou de se manifestar sobre os temas suscitados nos embargos de declaração, razão pela qual teriam sido violados os arts. 165, 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil.

Ocorre que todos os temas suscitados pelas partes foram analisados em acórdão fundamentado e, portanto, não há como considerar violados aqueles artigos. Nos embargos que opôs, o recorrente pediu manifestação sobre a indenização, cujo valor entendia baixo, bem como sobre honorários advocatícios e o termo inicial dos juros e da correção monetária.

Como se verifica, tais temas já haviam sido tratados no acórdão embargado (fls. 278/285) e, por isso, os embargos haveriam mesmo de ser rejeitados. E no voto condutor do acórdão de fls. 315/321, ressaltou-se o que se segue:

“Com efeito, não vislumbro omissão quanto à não fixação de termo a quo para incidência de correção monetária, bem como dos juros moratórios, pois quando arbitrei o valor da indenização, deixei bem claro que os mesmos incidiriam a partir da prolação do decisum.

Sem embargo, foi a inação da prestadora de serviço que ensejou os danos morais. Assim, adotar como termo a quo a data da celebração do contrato, como quer o embargante, e sobre a mesma fazer incidir correção monetária e juros moratórios, implicaria bis in idem em detrimento da embargada.

Não bastasse, nenhuma das súmulas transcritas amoldam-se ao presente caso. A uma, porque a indenização resultou da não prestação de serviço pelo qual encontrava-se obrigada a embargada, desmerecendo, portanto, acolhida o ensaio de adotar por termo inicial a data da celebração. A duas, pois a responsabilidade que ensejou a presente indenização decorreu do inadimplemento de contrato, não se enquadrando, também, no verbete citado pelo embargante. A três, porque quando fixei o valor, arbitrei montante necessário a reprimir e inibir a empresa embargada repita tal conduta, assim como almejei ressarcir financeiramente o embargante pelos dissabores sofridos em virtude da conduta omissiva da prestadora de serviço.

Nessa esteira, cabe transcrever referidos trechos, os quais funcionam como uma pá de cal sob a dita omissão:

(…)

Portanto, não há qualquer omissão no acórdão impugnado, pois diferentemente do suscitado pelo embargante, não subsistem as alegadas omissões à uma leitura do acórdão embargado.

No que concerne à fixação dos honorários advocatícios, entendo que não existe a dita obscuridade, pois quando inverti o ônus da sucumbência, o valor arbitrado, no montante de 20% (vinte por cento), incidiu sobre a condenação, tendo em vista a natureza jurídica da decisão embargada, bem como a exegese do art. 20, § 3.º, do Código de Processo Civil.


Logo, em sendo a natureza jurídica da decisão prolatada por esta Câmara diversa da decisão do juiz monocrático, é manifesto que o valor considerado é o da condenação.

Ora, os honorários arbitrados no juízo singular foram escorreitos. Destarte, a partir do momento que esta Câmara reformou tal sentença, julgando procedente a apelação, condenando o apelado ao pagamento de indenização, bem como invertendo o ônus da sucumbência, os honorários incidiram sobre o percentual do valor da condenação.

“Logo, não estando presentes os requisitos ensejadores dos embargos declaratórios, verifico que este recurso deve ser rejeitado, pois que com o fito exclusivamente procrastinatório, ato repugnado pelo ordenamento jurídico pátrio” (fls. 317/320). Não existe, pois, omissão nem ausência de fundamentos. Constata-se que o objetivo do recorrente, quando opôs os embargos, era apenas rediscutir a causa e obter julgamento favorável, sem que o julgado tivesse realmente algum dos vícios enumerados no art. 535 do CPC.

No que se refere ao alegado dissídio jurisprudencial na aplicação do art. 159 do Código Civil (1916) e no valor fixado para a indenização, melhor sorte não tem o recorrente.

Apurar a exata medida do dano moral suportado pelo recorrente com o fito de alterar aquele valor não prescinde do exame de matéria probatória, o qual não pode ser levado a efeito em recurso especial. Avaliar a extensão do dano, sua repercussão na esfera moral do recorrente, a capacidade econômica das partes, entre outros fatores, implica afronta ao disposto na Súmula n.º 7 deste Tribunal.

É bem verdade que, segundo vem sendo decidido, o valor da indenização por dano moral está sujeito ao controle desta Corte, sendo recomendável que a sua fixação seja feita com razoabilidade.

Mas a revisão tem em mira resguardar o direito federal, que seria ofendido quando a indenização fosse arbitrada em valores irrisórios ou excessivamente altos. Entretanto, consideradas as peculiaridades do caso, não se vislumbra exorbitância no valor fixado capaz de superar o óbice sumular e justificar a intervenção deste Tribunal.

O recurso especial também não comporta provimento quanto aos outros temas a respeito dos quais se alegou a existência de dissídio jurisprudencial.

O Tribunal a quo, ao fixar o termo inicial dos juros e da correção monetária, assim se pronunciou:

“Diante de todo exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para condenar a empresa-apelada a pagar ao apelante a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), valor de hoje, que devem ser acrescidos de juros moratórios à taxa legal — artigos 293 do Código de Processo Civil e 1062 do Código Civil — e de correção monetária — pelos índices legais — até a data do efetivo pagamento, invertendo-se os ônus da sucumbência” (fl. 285).

Como se vê desse trecho e do teor do acórdão proferido em embargos de declaração (fl. 317, especificamente), os juros e a correção monetária incidirão, consoante decidido, a partir da data da prolação do julgado.

No ponto, o recorrente procura estabelecer divergência com julgados desta Corte em que se determinou, peremptoriamente, que os juros deveriam ter como termo inicial a data da citação. Assim se decidiu nos julgados proferidos no Resp. n.º 401.115/RJ e no Resp. n.º 292.472/SP, apontados como paradigmas (cópias acostadas às fls. 455/471). Outrossim, o recorrente apontou dissídio com julgados em que se determinou que a correção monetária deveria incidir a partir do efetivo prejuízo e em que se aplicou a Súmula n.º 43 deste Tribunal.

A tese seduz, mas não merece ser acolhida. Isso porque, nos casos tratados nos paradigmas, cuidou-se de eventos específicos, pontuais, que trouxeram prejuízos patrimoniais ou extrapatrimoniais à parte contratante.

No Resp. n.º 401.115/RJ, tratou-se de queda de passageiro de composição ferroviária. No Resp. n.º 292.472/SP, cuidou-se de acidente que causou ferimentos em passageiro de ônibus. No Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento n.º 270.077/RS (fls. 473/476), tratou-se de pagamento, a menor, de importâncias em contrato de representação. E no Resp. n.º 101.033/RJ, tem-se o caso, novamente, de lesões em passageiro de ônibus.

Em todos esses casos, portanto, tem-se um ilícito contratual que se traduz por um fato cuja ocorrência se dá em um momento determinado no tempo. A indenização que ensejam pode ser fixada em um certo montante sobre cujo valor correm juros a partir da citação e correção a partir do efetivo prejuízo.

Ocorre que, no caso de que ora se cuida, o fato que trouxe prejuízo ao recorrente, segundo ele mesmo alega desde a petição inicial, foi justamente a demora na instalação de sua linha telefônica, ou seja, o decorrer do tempo sem a prestação do serviço contratado.


Vejamos o que consta da petição inicial:

“Portanto, decorridos mais de cinco anos da inauguração e instalação do sistema DDD daquela localidade, bem como da aquisição, pelo Autor, do direito de uso da linha telefônica de número 464-1106, a Ré permanece inerte quanto ao adimplemento de sua obrigação. Tal fato está causando sérios constrangimentos e danos ao Autor, que se tem visto impedido de utilizar serviço público essencial que desde há muito deveria ter-se iniciado.

(…)

Do ano de 1998 até a data presente, como já se afirmou, o estado de saúde do Autor tem-se agravado, predominantemente como decorrência da conduta ilícita da Ré.

Como comprova o doc. n. 03, o Autor é portador de úlcera bulbar. Essa enfermidade agrava-se significativamente com a instabilidade emocional do doente, a qual tem sido causada pela desídia da Ré.

(…)

“Destarte, presentes estão os três pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: a ação danosa, consistente na omissão da Ré em instalar o terminal telefônico do Autor, decorrido o prazo de mais de cinco anos a contar da celebração do contrato, mesmo instada administrativamente a fazê-lo; o dano moral, com a lesão a aspectos diretos e indiretos da esfera jurídica do Autor, com violação aos seus direitos; e, por fim, o vínculo ou nexo causal entre os danos provocados e o comportamento da Ré, já que, uma vez instalado o indigitado telefone, as lesões não teriam ocorrido” (fls. 5/14, sublinhei).

Ou seja, não se trata de um evento isolado no tempo, a partir do qual emana um prejuízo. Ao contrário, o prejuízo decorre justamente do fato da passagem do tempo. E isso foi considerado pelo Tribunal a quo ao arbitrar a justa indenização para o caso:

“Sem embargo, foi a inação da prestadora de serviço que ensejou os danos morais. Assim, adotar como termo a quo a data da celebração do contrato, como quer o embargante, e sobre a mesma fazer incidir correção monetária e juros moratórios, implicaria bis in idem em detrimento da embargada”

(fl. 317).

No acórdão, fixou-se uma quantia que se entendeu que o recorrente estaria a merecer hoje. É o transcorrer do tempo que lhe trouxe prejuízo, não um evento ocorrido em uma data certa. Logo, é a partir da decisão que haverão de correr juros e correção.

Essa é a diferença crucial que ora se aponta entre os fatos versados nos paradigmas e aquele tratado no acórdão recorrido. Para aqueles, adotou-se uma solução que leva em conta o momento em que ocorre o prejuízo. No acórdão paragonado, o prejuízo não é instantâneo, mas é causado pelo transcorrer do tempo. Adotar como termo inicial dos juros uma data anterior à decisão é admitir bis in idem em desfavor da recorrida.

Ante o exposto, não caracterizada nem a contrariedade à lei federal nem o dissídio pretoriano, não conheço do recurso especial.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!