Inocente preso

Justiça manda estado indenizar vítima de prisão ilegal

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2 de setembro de 2005, 16h36

O Estado tem dever de indenizar vítima de prisão ilegal. A decisão é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Os desembargadores condenaram a administração do Rio Grande do Sul, por prender indevidamente um motorista sob a acusação de falsificar a Carteira Nacional de Habilitação.

O Tribunal de Justiça gaúcho fixou indenização em R$ 28,8 mil pelos danos morais. A intenção do motorista era receber R$ 90 mil. Ainda cabe recurso. A informação é do TJ-RS.

O episódio ocorreu durante uma blitz da Policia Militar, na cidade de Cachoeirinha. Após consultar o sistema informatizado, os policiais verificaram que não existia o registro da CNH do motorista. Preso em flagrante, o homem foi encaminhado à delegacia de policia, sem oferecer resistência. No mesmo dia, foi levado ao Presídio Central.

A vítima chegou a pedir às autoridades que confirmassem os dados junto ao Detran. A sugestão não foi aceita. Ele ficou em cárcere 24 horas, até o procurador se certificar de que sua CNH era autêntica e a falha estava no cadastro do Detran. O inquérito foi arquivado, o motorista foi liberado e entrou com ação por danos morais.

O relator do processo, juiz-convocado Antonio Vinícius Amaro da Silveira, acolheu os argumentos do motorista. “Os prepostos do Estado agiram de modo temerário e negligente ao efetuar o flagrante, pois sequer certificaram se as informações do homem eram verídicas. A prisão ilícita, por evidente, caracteriza dano moral. Houve violação às mais elementares garantias constitucionais”, observou.

O juiz-convocado avaliou que os danos suportados pelo motorista foram causados pela falha do sistema de informática estadual, além de negligência da Polícia Militar. “Ele experimentou prejuízos estimados em cerca de R$ 720, relacionados às despesas com multa, guincho e diárias no depósito de veículos em Cachoeirinha além claro, da situação vexatória”, explicou.

O voto do relator foi acompanhado pelos desembargadores Leo Lima e Umberto Guaspari Sudbrack.

Processo 70009150376

Leia a íntegra do acórdão

APELAÇÃO CÍVEL, RECURSO ADESIVO E REEXAME NECESSÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRISÃO ILEGAL. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. QUANTIFICAÇÃO. VERBA HONORÁRIA SUCUMBENCIAL. COMPENSAÇÃO.

Configurada a falha do serviço público, pela atuação incauta dos policiais que lavraram o auto de prisão em flagrante sem diligenciar minimante a fim de saber se era válida a Carteira de Nacional de Habilitação do autor, reconhecido resta o dever de indenizar. Até porque não resistira o autor quanto à prisão e pedira que fosse contatado com a delegacia de origem do documento para esclarecer sobre sua validade, o que não foi feito. Assim, é inarredável o dever de indenizar do Estado, porquanto ordenada e cumprida a prisão de pessoa que não cometera qualquer infração penal e que sequer dispunha de antecedentes criminais. A responsabilidade aqui é objetiva e o dano moral decorrente do recolhimento ao presídio por 24 horas é assente. A quantificação, considerando a gravidade do ato, suas nefastas repercussões, bem como a situação econômica de ambas as partes, está bem posta e desmerece minoração. Tendo em vista a ausência de dilação probatória, vai acolhido o apelo no ponto em que pugna pela redução do percentual relativo aos honorários da sucumbência, os quais vão arbitrados em 10% sobre o valor da condenação. Apelo adesivo que visava à majoração da verba indenitária, improvido. Viável a pretensão quanto à compensação de honorários, ante o entendimento reiterado do 3º Grupo Cível e o teor da Súmula 306 do STJ.

APELO DO RÉU PROVIDO EM PARTE.

APELO ADESIVO IMPROVIDO.

SENTENÇA, ADEMAIS, CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO.

APELAÇÃO REEXAME NECESSÁRIO — QUINTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70009150376 — COMARCA DE CACHOEIRINHA

JUIZA DE DIREITO DA 1ª VARA CIVEL DA COMARCA DE CACHOEIRINHA — APRESENTANTE

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL — APELANTE/RECORRIDO ADESIVO

TALES XAVIER DE SOUZA — RECORRENTE ADESIVO/APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo do réu e desprover o recurso adesivo do autor. Ademais, confirmaram a sentença em reexame necessário.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. LEO LIMA (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. UMBERTO GUASPARI SUDBRACK.

Porto Alegre, 11 de novembro de 2004.

DR. ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA,

Relator.

RELATÓRIO

DR. ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA (RELATOR)

Cuida-se de apreciar ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por TALES XAVIER DE SOUZA em face de ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.


À peça portal, narra o postulante que em 24.10.2001, em uma ‘blitz’ realizada pela polícia militar junto à Rua Papa João XXIII, na altura do nº 1225, ao apresentar sua CNH – Carteira Nacional de Habilitação – foi surpreendido, sendo acusado de portar documento falso, vindo, então, a ser conduzido à Delegacia de Polícia. Refere que ali estando e tendo a autoridade policial verificado a inexistência de registro do documento na base de dados do sistema informatizado estadual, fora lavrado auto de prisão em flagrante que veio a ser homologado pelo juízo. Noticia que foi encaminhado ao Presídio Central por lá permanecendo cerca de 24h indevidamente preso. Com isso, busca reparação material consistente em prejuízos experimentados em decorrência da atuação abusiva da polícia, a saber R$ 718,74 (multa, guincho e diárias de depósito do veículo em Cachoeirinha), bem como reparação moral pela vergonha, humilhação, sofrimento e constrangimento provocados pela prisão. Quanto aos danos morais, postula montante equivalente a 500 salários mínimos e dá à causa o valor de R$ 90.000,00.

Lançada a sentença em sede de julgamento antecipado da lide, anota o sentenciante colha-se dos documentos juntados aos autos que os danos suportados pelo autor decorrem da falha no sistema de informática do Estado, bem como da negligência da autoridade policial. Refere que o autor restou indevidamente preso e recolhido ao Presídio Central por cerca de 24 horas, sendo motivado o ato ilícito pela inexistência de registro da Carteira Nacional de Habilitação no sistema informatizado do Estado. Assevera que o ato de prisão e condução ao Presídio viola elementares garantias constitucionais, destacando que a liberação somente ocorreu quando o procurador do autor apresentou documentos comprovadores da autenticidade da CNH, peticionando para trancar o curso do inquérito policial. Aponta tenham os prepostos do Estado agido de modo temerário e negligente ao efetuar a prisão, pois sequer vieram a certificar se a informação do autor, qual seja a de que o documento não era falso, era verídica. Sublinha que o postulante não tinha antecedentes criminais e que não se negou a acompanhar os policiais até a Delegacia. Neste passo, pontuando que tudo se deu em face da falha da máquina administrativa do Estado e de seus prepostos, firma pela caracterização do dano moral. Frisa que tal, por ser decorrente da prisão ilícita, é assente, igualmente destacando que a CNH autêntica fora retida por mais de 21 dias, o que o impossibilitou de utilizar o veículo para o trabalho. Fixa os danos morais em R$ 28.800,00 (correspondente a 120 salários mínimos). Quanto aos danos materiais, aponta reste comprovado nos autos a despesa de R$ 29,00. Julga procedente em parte a demanda e, em razão da sucumbência recíproca, condena o réu ao pagamento de 2/3 das custas processuais e honorários do advogado do autor em 15% sobre o valor da condenação. Condena o autor ao pagamento de 1/3 das custas e honorários da sucumbência em 10% sobre o valor da condenação, o que fica suspendo em face do deferimento da AJG.

Em razões de apelação (fls. 249/253), sustenta o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL a não-caracterização de atuação ilícita. Argumenta que a prisão foi legal, pois havia suspeita de falsificação da CNH, já que tal era de coloração diferente dos padrões e possuir espelho antigo, além de ser de outro Estado (Santa Catarina – Araranguá). Ainda anota que, tendo sido feita a pesquisa no sistema informatizado da Brigada Militar, nada fora encontrado sobre a veracidade deste documento, o que legitima a atuação dos agentes policiais. Sublinha que a prisão em flagrante foi devidamente comunicada à autoridade judiciária. Pontua pela inexistência de falha no serviço, pois se a CNH não estava no sistema, tal somente pode ser imputada ao serviço público do Estado de Santa Catarina. Impugna a quantificação da indenização, anunciando que, no caso concreto, o valor não pode ultrapassar 20 (vinte) salários mínimos. Também impugna a verba honorária, argüindo seja excessivo o percentual de 15% sobre o valor da condenação. Para o caso de não restar atendida essa postulação, requer seja deferida compensação de honorários.

Interposto e, em face de ser o apelante a Fazenda Pública, sem preparo, foi o recurso recebido no duplo efeito.

Pelo demandante, TALES XAVIER DE SOUZA (fls. 257/261), foi interposto recurso adesivo, tencionando a majoração da indenização por danos morais, com o que sinala em torno da gravidade dos fatos e da atuação do requerido.

Interposto e, em face de litigar ao abrigo da gratuidade de justiça, sem preparo, foi o recurso recebido no duplo efeito.

Ausentes contra-razões de apelação.

Nesta instância, opina do DD. Procurador de Justiça em atuação neste órgão fracionário, Dr. Antônio Augusto Vergara Cerqueira, pelo provimento parcial do recurso formulado pelo demandado e pelo improvimento daquele patrocinado pelo autor.


Após, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTOS

DR. ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA (RELATOR)

Há duplo manejo recursal, sendo que inicio por aquele perpetrado pelo demandado ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, sendo que reputo sejam necessárias algumas considerações iniciais acerca da responsabilização do Estado sobre o evento em testilha.

De há muito foi abandonada a idéia, decorrente da teoria da irresponsabilidade civil absoluta, de que o Estado estaria isento de qualquer imputação indenizável em face de dano suportado por particulares em conseqüência de atos (omissivos ou comissivos) de império praticados em nome administração pública.

Sob esta ótica, mesmo que tenha se tentado fazer a distinção entre ato de império e ato de gestão, não foi possível suportar a apregoada impunidade, já que não era aceitável que o cidadão, cumpridor de seus deveres, não tivesse o mesmo tratamento da administração, quando injustamente lesado.

A evolução do estudo sobre a matéria, pertinente à responsabilização do Estado frente aos prejuízos sofridos pelos particulares quando da ação ou omissão da administração, impôs a adoção de uma teoria bem mais moderada, baseada no estudo da culpa, através da qual se passou a admitir a indenização quando demonstrado que o agente, representante do Estado, tivesse agido com culpa ou com dolo.

Todavia, na prática, nada fácil ficava ao cidadão lesado fazer esta prova, que partia dos fundamentos atrelados à idéia de responsabilidade por fato de terceiro.

Posturas científicas bem mais modernas passaram então a adotar a Teoria Objetiva, tal como hoje é conhecida por nós desde sua inserção no texto constitucional de 1946, através da elucidativa redação de seu art. 194(1), que se insere na idéia do risco que a atividade administrativa proporciona a seus administrados, ônus este que deve ser suportado pelo Estado, em nome da isonomia de tratamento que deve dar a seus cidadãos.

Desta feita, não mais precisaria o cidadão lesado provar a culpa ou o dolo com que agiu o servidor público, bastando-lhe evidenciar o dano sofrido e o seu nexo de causalidade com o Estado.

Assim, passou a ser unanimidade na doutrina e na jurisprudência que é o Estado responsável pelos danos que causar aos particulares quando do exercício (comissivo ou omissivo) de suas atividades, havendo ou não culpa (lato senso) de seus agentes, desde que “nesta qualidade”, a teor do que preconiza o § 6º do art. 37 da Constituição Federal, bastando que reste demonstrado o dano e o seu nexo com aquela atividade (ativa ou omissiva).

Desta orientação é que nasce a pretensão do autor, baseada na Teoria Objetiva da responsabilidade civil do Estado, segundo a qual bastaria a ele comprovar o seu prejuízo, ou seja, a lesão sofrida, já que é obrigação do Poder Público a prestação correta e adequada de seu mister, ao que se chega através da leitura que se faz do art. 144(2) da Constituição Federal.

Contudo, a questão imposta deve passar por um espectro de fundamentação muito mais complexo.

Com efeito, posto que situações como estas, impostas em face do pedido formulado pelo autor, fizeram com que a jurisprudência passasse a identificar distinções nos caso que se sujeitavam à passiva aplicação da chamada teoria do risco ou simplesmente teoria objetiva.

Constada a necessidade de se fazer algumas distinções, aprofundou-se a doutrina no estudo da preponderante teoria.

Assim é que, sem desprezar o enunciado objetivo da teoria do risco, o modelo mais razoável indica a necessidade de se associar a sua aplicação à possibilidade de ter a vítima contribuído para o resultado ou de existirem fatores externos, como circunstâncias determinantes do resultado danoso.

Neste caso, continuaria o particular dispensado de provar a culpa ou dolo do agente estatal, mas será possível a ressalva da obrigação indenizatória do Estado ante a concorrência da vítima para o resultado ou a ocorrência de fatores externos, tais como a força maior e o caso fortuito, já lembrados na teoria privatista da responsabilidade civil.

Renova-se, portanto, com força total a idéia de necessidade de demonstração da relação causal do dano com a estrita função administrativa, ou seja, sem que haja a intervenção de fatores a ela extraordinários.

Essa demonstração cabe à vítima fazer, pois a adoção da teoria objetiva apenas a isenta de provar a culpa do agente público, carecendo de prova o dano e o nexo de causalidade, sem os quais se torna inviável a pretensão indenizatória.

Nesse sentido, tendo em vista a prova coligida aos autos, verifica-se haver logrado êxito o postulante em demonstrar o nexo causal entre o prejuízo suportado e a atuação da Administração Pública.


Considerando, então, toda a narrativa fática que esses autos consubstanciam e bem assim comungando do entendimento ministerial nesta instância lançado, tenho não mereça acolhida a pretensão recursal do réu, pois manifesta se afigura a responsabilidade do Estado pelos danos perpetrados ao autor.

Ora, a par de inauguralmente não se vislumbrar irregularidade na conduta perpetrada pelos agentes policiais, os quais, frente aos indícios de falsificação de Carteira Nacional de Habilitação – CNH e ausência de registro no sistema informatizado, deveriam, sim, atuar e encaminhar o autor até a delegacia e fim de se perpetrarem os esclarecimento necessários, ao depois, incidiram em atuação ilícita os prepostos do Estado.

Isso porque, em que pese a existência de indícios relativos à falsificação, resta inadmissível não tenha a autoridade policial efetuado diligência no sentido de se certificar quanto à veracidade das alegações do autor, valendo anotar que para tanto bastava contato telefônico com o órgão responsável pela emissão das carteiras no Estado de Santa Catarina.

Cumpre pontuar que, consoante os termos do Auto de Prisão em Flagrante (fl. 32 – ‘o indiciado não recalcitrou ao ato de sua prisão’), sequer o autor resistira à prisão, além de não possuir antecedentes criminais (fl. 50), o que torna ainda mais razoável o cumprimento de demais diligências antes de se lavrar o auto de prisão em flagrante que restou homologado (fl. 51) com conseqüente encaminhando do demandante ao Presídio Central por cerca de 24 horas.

Uma vez omitida pelos policiais essa verificação requerida insistentemente pelo autor, qual seja de que se efetuasse ligação telefônica para a delegacia de origem do documento a fim de ver da validade do documento, corolário lógico é reconhecer que este tenha sido injustamente autuado em flagrante e recolhido ao Presídio Central, prescindindo o fato, nessa ordem de coisas, de comentários maiores sobre a caracterização do dano moral, o qual é assente.

A tão-só circunstância de a CNH – Carteira Nacional de Habilitação não estar registrada no sistema informatizado já serve para caracterizar a falha estatal, notadamente porque tal documento é de circulação e validade nacionais. Aqui, pois, simplesmente dizer que a falha fora do órgão público do Estado de Santa Catarina é inábil ao intento de ver afastada a responsabilidade.

Portanto, a atuação ilícita do Poder Público é manifesta e consiste na falha do serviço de informações do órgão estatal, bem como da conduta incauta e negligente de seus prepostos que se omitiram em diligenciar proficuamente antes de encaminhar o indiciado à prisão.

Ademais disso, convém que se diga que, afora os nefastos danos que a prisão e conseqüente recolhimento ao Presídio Central causaram e isso tanto psicologicamente como socialmente, ainda logrou suportar o postulante reflexos outros, mormente porque sua carteira de habilitação restou retida por 21 (vinte e um) dias, tendo despesas com guincho e depósito.

Na esteira que, em caso de prisão ilegal, há caracterização de responsabilidade civil pelos danos causados, já se manifestou esta Corte:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS. PRISÃO ILEGAL. ERRO DO ENTE DE DIREITO PÚBLICO AO DETERMINAR NOVO RECOLHIMENTO A PRISÃO DE QUEM JÁ SE ENCONTRAVA COM A PUNIBILIDADE EXTINTA. 1. Inarredável o dever do estado de indenizar ao, indevidamente, determinar o recolhimento a prisão de quem já tinha extinta a punibilidade por fato delituoso por ele praticado. 2. Responsabilidade objetiva mitigada. Art. 37, § 6º, da Constituição Federal. 3. A responsabilidade do ente público por prisão sem justa causa, encontra respaldo constitucional, no art. 5º, LXXV. Sentenca confirmada. (APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO Nº 70002246478, QUINTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: CLARINDO FAVRETTO, JULGADO EM 13/12/2001). (grifei)

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL CONTRA O ESTADO. PRISÃO INJUSTA. Caracterizada a ilegalidade da prisão, realizada por falha da máquina administrativa, submetendo o autor a situação vexatória, em plena via publica, com a privação de sua liberdade, merece ser mantida a sentença de procedência da ação. Quantum indenizatório fixado com adequação. Apelo improvido. (3fls) (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70000246512, QUINTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: SÉRGIO PILLA DA SILVA, JULGADO EM 10/02/2000). (grifei)

Outro não é o entendimento sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça:

Ementa DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PRISÃO ILEGAL. DANOS MORAIS.

1. O Estado está obrigado a indenizar o particular quando, por atuação dos seus agentes, pratica contra o mesmo, prisão ilegal.

2. Em caso de prisão indevida, o fundamento indenizatório da responsabilidade do Estado deve ser enfocado sobre o prisma de que a entidade estatal assume o dever de respeitar, integralmente, os direitos subjetivos constitucionais assegurados ao cidadão, especialmente, o de ir e vir.

3. O Estado, ao prender indevidamente o indivíduo, atenta contra os direitos humanos e provoca dano moral ao paciente, com reflexos em suas atividades profissionais e sociais.

4. A indenização por danos morais é uma recompensa pelo sofrimento vivenciado pelo cidadão, ao ver, publicamente, a sua honra atingida e o seu direito de locomoção sacrificado.

5. A responsabilidade pública por prisão indevida, no direito brasileiro, está fundamentada na expressão contida no art. 5º, LXXV, da CF.

6. Recurso especial provido. (In REsp 220982/RS, STJ, 22/02/2000, Relator Min. José Delgado, Órgão Julgador T1 – Primeira Turma)


Superada a questão atinente ao reconhecimento da atuação ilícita do Estado, passo a enfrentar a pretensão de ver minorada a verba indenitária, a qual foi fixada em R$ 28.800,00 (vinte e oito mil e oitocentos reais, correspondente a 120 salários mínimos), corrigida pelo IGP-M e acrescida de juros de mora legais.

Nesse tocante, considerando a gravosidade da conduta irregular levada a efeito pela Administração Pública e a facilidade com que poderia agir a fim de evitar tal nefasto dano, pois bastaria realizar o suplicado pelo autor, ou seja, ligar para a delegacia de origem do documento para saber que não se cuidava de documento falso, a par de, por falha, não constante do sistema informatizado, descabida se afigura a pretensão de minoração, pois a monta arbitrada para o dano moral é adequada a reparar o abalo suportado.

No tópico, convém citar a forma esclarecedora e objetiva com que já se manifestou esta Câmara (Apelação Cível nº 70000862839, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Clarindo Favretto, julgado em 21/12/2000) quando do voto lavrado pelo eminente Relator em que discorrera acerca do quantum indenizatório.

‘(…).

É razoável tudo aquilo que é sensato, comedido, moderado, isto é, que guarda uma certa proporcionalidade. O magistrado, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita e a gravidade do dano por ela produzido, servindo-lhe, também, de norte, o princípio acima citado, de que é vedada a transformação do dano em fonte de lucro.

Qualquer quantia a mais do que a necessária à reparação do dano moral importará em enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano.

(…)’.

Diante de tais parâmetros e levando em conta o dano ocorrido e o perfil da vitima (trabalha em empresa de transporte, além de ser microempresário naquela localidade) e do ofensor (Estado), sublinho desmereça acolhida a intenção de ver diminuída a quantificação posta na sentença, pois tal é suficiente para reparar os danos suportados, atendendo, ainda, aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade

.

Nos mesmos moldes, então, improcedendo o apelo do autor, já que sua pretensão era a de ver majorada a verba indenizatória, que se verificou razoável.

Por outro lado, tendo em vista o fato de não ter havido instrução probatória, se afigura demasiado o arbitramento da verba honorária da sucumbência em 15% sobre o valor da condenação. Assim, considerando o disposto no § 3º do art. 20 do CPC, reduzo a condenação sucumbencial do demandado para o percentual de 10% sobre o valor da condenação.

Em que pese entendesse pela impossibilidade de compensação da verba honorária, revejo meu posicionamento, ante as decisões do 3º Grupo Cível, que unificaram o entendimento, e o teor da Súmula 306 do STJ, recentemente publicada, a qual estabelece que “os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.”

A par disso, havendo condenação recíproca, como de fato ocorre no caso concreto, ainda que se trate de verba exclusiva do advogado, possível a compensação pretendida, razão pela qual acolho a irresignação nesse ponto, para o fim de determinar a compensação dos honorários advocatícios.

Fica, portanto, provido em parte o apelo do réu ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, restando improvido o recurso adesivo do autor.

Com essas considerações, então, dou parcial provimento ao apelo do réu ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ao efeito de reduzir a condenação sucumbencial para o percentual de 10% sobre o valor da condenação, admitindo-se a compensação da verba honorária, assentando o improvimento do apelo adesivo formulado pelo postulante TALES XAVIER DE SOUZA e bem assim confirmando no mais a sentença em sede de reexame necessário.

É, então, como voto.

DES. LEO LIMA (PRESIDENTE E REVISOR) – .Aqui seria só a questão da compensação. Daí seria dar provimento ao apelo do Estado também quanto à compensação, conforme a Súmula nº 306.

DES. UMBERTO GUASPARI SUDBRACK – De acordo.

Julgador(a) de 1º Grau: VIVIANE MIRANDA BECKER

Notas de rodapé

1 – art. 194. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”.

2- “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio…”.

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