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STF manda Câmara refazer relatório contra José Dirceu

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27 de outubro de 2005, 17h36

O relatório que pede a cassação do deputado federal José Dirceu terá de ser refeito. Foi o que esclareceu nesta quinta-feira (27/10) o ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal.

Na prática, a decisão de Grau anula a votação do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, que aprovou na manhã desta quinta-feira o relatório do deputado Júlio Delgado (PPS/MG), que pediu a cassação do mandato de Dirceu. A defesa do ex-ministro de Lula, feita pelos advogados José Luís de Oliveira Lima e Rodrigo Dall’acqua, alegou que o relatório “não foi sequer refeito, apenas dele se retirou trechos”.

Isso porque o ministro Eros Grau havia determinado que o relator do Conselho de Ética não usasse no relatório informações relativas à quebra de sigilos bancário e fiscal de José Dirceu. Mas decidiu pela continuidade da tramitação do processo disciplinar no Conselho de Ética.

Contudo, no pedido feito pelos advogados nesta quinta-feira, o Eros Grau esclareceu que “sem prejuízo sem prejuízo da continuidade do procedimento, os atos contaminados hão de ser convalidados, o que exige a sua recomposição, isto é, exige sejam eles novamente praticados (…) Em suma, o relatório deverá ser refeito”.

Leia a decisão

EMB.DECL.NO MANDADO DE SEGURANÇA 25.618-4 DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. EROS GRAU

EMBARGANTE(S) : JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA

ADVOGADO(A/S) : JOSÉ LUIS MENDES DE OLIVEIRA LIMA E

OUTRO(A/S)

EMBARGADO(A/S) : CONSELHO DE ÉTICA E DECORO PARLAMENTAR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

DECISÃO: Passo à margem do debate sobre o cabimento de embargos declaratórios contra decisões monocráticas. O Relator não pode restar impedido de esclarecer o teor da decisão liminar, para que não pairem dúvidas a seu respeito nem pereça o direito assegurado ao impetrante.

2. Na decisão concessiva da medida liminar salientei que a prova obtida de maneira ilícita contamina os atos dela decorrentes, eivando-os de nulidade. Fiz alusão à doutrina dos “frutos da árvore venenosa” [fruits of the poisonous tree].

3. Anotei também a circunstância de o voto elaborado pelo Relator, a ser submetido ou já submetido à apreciação do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar [Apenso 7 – fls.73-134], apoiar-se também na documentação sigilosa objeto dos Requerimentos ns. 75, 77 e 78.

4. É certo que a análise que será procedida por esta Corte quanto à licitude da obtenção de determinada prova não deverá criar obstáculo ao desempenho das funções do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar. Mas o Conselho, por outro lado, evidentemente está jungido pelas imposições do devido processo legal.

5. A liminar foi deferida parcialmente a fim de que, sem prejuízo da continuidade de tramitação da Representação, sejam recompostos, isto é, refeitos, todos os atos decorrentes das provas sub judice ou que as tenham considerado. A decisão é clara: sem prejuízo da continuidade do procedimento, os atos contaminados hão de ser convalidados, o que exige a sua recomposição, isto é, exige sejam eles novamente praticados.

6. A convalidação, como ensina CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO1, “é o suprimento da invalidade de um ato com efeitos retroativos”. De resto, tal e qual a Administração,sempre que diante de ato convalidável, estará sujeita —como observa WEIDA ZANCANER2 — ao dever de o convalidar,também o órgão do Legislativo resulta no caso vinculado por esse mesmo dever. A convalidação, aqui também, é uma imposição da legalidade.

7. Não cabe, neste momento, determinar à autoridade coatora o cumprimento de decisão de cujo teor ela já fora intimada. A não convalidação do relatório — isto é, a continuidade da tramitação da Representação sem a produção de novo relatório, como determinado na decisão liminar —comprometerá a validade do procedimento.

8. Diversa é a situação no que concerne às próprias provas ilícitas. Aqui é inviável a convalidação. Então não se tratará, se o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar entender que elas são relevantes, indispensáveis ao julgamento da Representação, não se tratará — dizia eu —de convalidação da sua obtenção, mas da produção de outras provas, ainda que com o mesmo conteúdo, desde que de modo lícito.

Em suma: o relatório deve ser refeito. A validade do procedimento a que corresponde a Representação depende da convalidação [= recomposição, nova prática] de todos os atos decorrentes das provas sub judice ou que as tenham considerado.

Publique-se.

Brasília, 27 de outubro de 2005.

Ministro Eros Grau

Relator

Notas de rodapé:

1 – Curso de Direito Administrativo, 12a edição, Malheiros Editores, São Paulo, 2.000, pág. 405.MS 25.618-ED / DF

2 – Da convalidação e da invalidação dos atos administrativos, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1.990, págs. 53/57.

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