Lei ameaçada

CNJ aprova nota técnica contra mudança da Lei dos Juizados

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19 de outubro de 2005, 10h02

O Conselho Nacional de Justiça encaminhou nota técnica às presidências da República, da Câmara e do Senado contra as propostas de mudança da Lei 10.259/01. Uma emenda apresentada pelo Senado à Medida Provisória 252 previu o adiamento do pagamento das sentenças proferidas pelos Juizados Especiais Federais.

A MP 252, também conhecida como MP do Bem, foi derrubada no dia 11 de outubro na Câmara dos Deputados. Mas há o receio de que o governo tente recolocar a emenda em qualquer outra medida provisória. Para o juiz federal Fernando Gonçalves, “isso seria um retrocesso porque poderia atrasar em até dois anos o cumprimento de uma ordem”.

Fernando Gonçalves explica que a Lei dos Juizados Especiais Federais implantou o sistema do pagamento de Requisições de Pequeno Valor. O que a Emenda 27 pretende é colocar o sistema de precatório nos Juizados Especiais para que os valores devidos sejam colocados na ordem de pagamento do ano seguinte. Hoje, a União tem 60 dias para pagar decisões cujo valor não ultrapasse 60 salários mínimos.

A alegação da União para não pagar as requisições é a indisponibilidade orçamentária específica. Para o CNJ, “esta conquista, foi diretamente ameaçada pela Emenda 27”. Segundo o Conselho, a Emenda 27 afeta os interesses de milhares de usuários do Poder Judiciário, na sua maioria pessoas de baixo poder aquisitivo. Ainda de acordo com o Conselho, em 2004, os Juizados Especiais Federais tiveram mais de 523 mil beneficiários de pagamentos. Até julho deste ano, já foram mais de 375 mil.

Leia a íntegra da nota

CONSIDERANDO o seu compromisso constitucional estabelecido pelo art. 103-B, §4°, II em zelar pela observância do princípio da eficiência na atuação do Poder Judiciário, determinada por sua vez pelo caput do art. 37 da Constituição Federal;

CONSIDERANDO que, conforme o disposto no art. 19, XV de seu Regimento, compete ao Conselho se pronunciar sobre anteprojetos de lei, quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

CONSIDERANDO que, durante a apreciação da Medida Provisória n° 252 pelo Congresso Nacional, foi apresentada no Senado Federal a emenda 27, dispondo sobre o adiamento do pagamento por parte do governo federal de requisições dos Juizados Especiais Federais por falta de disponibilidade orçamentária específica;

CONSIDERANDO a possibilidade da Emenda 27 ser reapresentada no esteio de alguma Medida Provisória que, mesmo editada para outros fins, já esteja em tramitação no Congresso;

O Conselho Nacional de Justiça vem dirigir-se ao Congresso Nacional e posicionar-se sobre a referida emenda.

1. A emenda 27 afeta os legítimos interesses de milhares de usuários do Poder Judiciário, sua imensa maioria oriunda das camadas mais pobres da população, além de interferir profundamente na estrutura de funcionamento dos juizados especiais federais. Em 2004, Juizados Especiais Federais tiveram mais de 523.000 (quinhentos e vinte e três mil) beneficiários de pagamentos e em 2005 até julho mais de 375.000(trezentos e setenta e cinco mil) beneficiários.

2. Já é senso comum o entendimento de que um dos principais responsáveis pela lentidão judicial é o atual sistema de precatórios, que necessita ser reformulado. A legislação dos juizados especiais federais (Lei 10.259/01) transformou-se numa decisiva conquista da cidadania democrática no Brasil, sobretudo graças ao disposto no seu art. 17, §2°, que prevê o seqüestro da receita dos governos caso estes não paguem as obrigações resultantes das decisões judiciais nos Juizados. Esta conquista, que assegura o pagamento devido pelos governos no prazo de 60 dias, foi diretamente ameaçada pela Emenda 27.

3. A celeridade da prestação jurisdicional é um dos objetivos principais do “Pacto do Estado por uma justiça mais ágil e republicana”, assinado pelos Três Poderes da República, e deve continuar resultando da convergência dos esforços comuns.

4. O adiamento permanente e a incerteza do cumprimento das obrigações judiciais dos governos é uma das principais fontes da insegurança jurídica e da imprevisibilidade financeira que nos distanciam das práticas dos países democráticos mais desenvolvidos.

5. O Brasil tem muito se beneficiado da legislação de responsabilidade fiscal, que contribuiu para ordenar e conferir previsibilidade às contas públicas. Agora, faz-se necessário seguir este exemplo e expandi-lo, criando uma legislação de responsabilidade judicial capaz de assegurar aos cidadãos, suas organizações e empresas o imediato cumprimento governamental das sentenças judiciais. Uma legislação que inclusive torne obrigatória a definição realista de provisões orçamentárias necessárias ao pagamento dessas obrigações.

6. É também fonte de insegurança jurídica alterar a legislação vigente, modificando aspectos fundamentais da administração e funcionamento do Poder Judiciário, sem que as alterações propostas tenham gozado da publicidade necessária ao debate e à discussão pela sociedade, conforme inclusive determina o art. 37 da Constituição Federal.

7. O Conselho Nacional de Justiça reafirma sua crença na capacidade da sociedade e das autoridades governamentais e políticas de encontrar soluções capazes de assegurar o equilíbrio orçamentário sem afetar o funcionamento e a eficiência do Poder Judiciário, indispensáveis à consolidação do Estado Democrático brasileiro de Direito.

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